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AO DOUTO JUÍZO DE UMA DAS VARAS DE CONSUMO DO SISTEMA DE JUIZADOS

ESPECIAIS DA COMARCA DE LAURO DE FREITAS – BAHIA.

GABRIELA SANTOS VILAS BOAS, brasileira, solteira, advogada, RG nº 14.516.289-35,


CPF nº 052.921.795-31, residente e domiciliada na Avenida Professor Theócrito Batista, n.º 37,
Condomínio Parque Sun Valley, Bloco 01, apartamento 403, Caji – Lauro de Freitas – Ba, CEP:
42.721-810, atuando em causa própria, nos termos do art. 103, parágrafo único do CPC, razão
pela qual dispensa-se a apresentação de procuração, vêm à presença de Vossa Excelência,
com fundamento no artigo 319 do CPC e na Lei 9.099/95, propor

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO LIMINAR

em face de COELBA COMPANHIA DE ELETRICIDADE DO ESTADO DA BAHIA, pessoa


jurídica de direito privado, devidamente inscrita no CNPJ sob número 15.139.629/0001-94, com
sede na Avenida Edgard Santos, n.º 300, Cabula VI, Salvador – Ba - Brasil, CEP: 41181900,
pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

PRELIMINARMENTE

I - DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA.

Requer a Autora o benefício da gratuidade de justiça, nos termos da Legislação Pátria,


inclusive para efeito de possível recurso, tendo em vista ser a Autora impossibilitada de arcar
com as despesas processuais sem prejuízo próprio e de sua família, conforme artigo 4º e
seguintes da lei 1.060/50 e artigo 5º LXXIV da Constituição Federal/98.

II – DO JUÍZO 100% DIGITAL.

A Parte Autora manifesta interesse pela adesão ao “Juízo 100% Digital”, conforme
Resolução nº 345, de 09 de outubro de 2020 do CNJ e Art. 2º, § 1º do Ato Normativo Conjunto nº
32, de 14 de dezembro de 2020 do TJBA.

III – DA AUDIÊNICA DE CONCILIAÇÃO

A parte autora manifesta-se no sentido de concordar com a realização da audiência de


conciliação, nos termos da lei 9.099/95.
IV – DA LEGITIMIDADE ATIVA

A legislação processual civil pátria dispõe que, para propor ou contestar ação, é
necessário ter interesse e legitimidade (art. 3º do CPC). Neste azo, a Autora vem informar que,
apesar da conta contrato não estar em seu nome, a mesma possui a posse e propriedade do
imóvel, tendo em vista que adquiriu esta por meio de contrato de compra e venda em março de
2022, conforme documento acostado aos autos.

No caso em concreto, a autora se encontra enquadrada na denominação de “consumidor


padrão” (Standard), definido no caput do art. 2º do CDC, que diz:

“Art. 2º. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire


ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.”

Tal afirmação é ratificada também pelo artigo 17 do próprio Código de Defesa do


Consumidor, in verbis:
“Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se a
consumidores todas as vítimas do evento.”

Posto isto, presentes a legitimidade e o interesse de agir da autora diante do dano sofrido,
concluindo-se no sentido da plena possibilidade do exercício do direito de ação daquela em face
de um terceiro, com o qual não mantenha relação estrita de direito material.

Isto porque o Código de Proteção e Defesa do Consumidor constitui-se como disciplina


jurídica autônoma, uma vez que encerra em si um conjunto sistematizado de princípios e regras
que lhe conferem identidade própria, elementos necessários ao efetivo cumprimento de seu
desiderato.
Assim, conclui-se que a demandante possui todos os requisitos para figurar como autora
na presente ação.

DOS FATOS

A autora é proprietária de um apartamento situado na Avenida Professor Theócrito Batista,


n.º 37, Condomínio Parque Sun Valley, Bloco 01, apartamento 403, Caji – Lauro de Freitas – Ba,
CEP: 42.721-810, cuja ligação de energia elétrica se encontra em nome do antigo proprietário,
Sr. José Pereira Farias Filho.

Tal ligação é identificada pelo “código do cliente” nº.:7031907165.

Destaca-se que a autora reside sozinha no respectivo imóvel, trabalhando em regime de


home office, permanecendo diuturnamente no imóvel, de onde precisa de energia elétrica para
mantença dos serviços essenciais para a sua sobrevivência e labor, como: internet, refrigeração
dos seus alimentos, carregar seus aparelhos eletrônicos e materiais de trabalho, uso de fogão
elétrico, etc.

No dia 15 de fevereiro de 2023, quarta-feira, véspera de carnaval, a autora, feliz de estar


em companhia de sua afilhada (uma bebê de apenas 1 ano e 5 meses de idade) com quem
passaria todo o período festivo – recebeu um telefonema da portaria do seu condomínio
informando sobre a chegada de prepostos da Ré com um mandado de corte de energia elétrica
do seu imóvel.

Com efeito, como estava com uma bebê sob sua responsabilidade, e diante da dificuldade
em descer 4 andares de escadas com a mesma no colo, procedeu com o envio dos
comprovantes de pagamento das faturas de energia para o whatsapp da portaria do condomínio
e solicitou a gentileza do porteiro que apresentasse os comprovantes para o preposto da ré, com
o fito de impedir a interrupção dos serviços em razão da adimplência. Entretanto, para a sua
desagradável surpresa, não obteve êxito.

O porteiro então informou que os prepostos lhe deram a seguinte informação:

“- Vocês já sabem como a gente trabalha. Não adianta vir com


comprovante de pagamento se o aviso de corte já está na nossa
mão. A gente vai cortar!” (sic)

A autora, por meio dos porteiros, suplicou que os prepostos da ré não procedessem
com a interrupção da energia, haja vista que a mesma estava com uma bebê e não poderia
ficar sem eletricidade sob nenhuma condição, mas o pedido não foi atendido, mesmo
informando que todas as faturas estavam pagas e mostrando os comprovantes de
pagamento!

Importante destacar que a residência não possui telefone fixo instalado, assim, o aparelho
celular da autora era o único meio de comunicação e o mesmo não se encontrava com a carga
de bateria completa. O desespero de ficar incomunicável era iminente!

Com efeito, no mesmo dia, ao entrar em contato com o 0800 071 0800 da referida
empresa, a autora solicitou a religação de emergência, gerando nota de serviço de n.º
5011367058. Neste momento, foi informada de que em até 24h, ou seja, no dia seguinte, uma
equipe de urgência estaria em seu domicílio para religar sua energia. O que não aconteceu.

No dia seguinte, 16/02/2023, a autora ligou novamente para a ré informando sobre o


atraso na religação da energia de sua residência. Dessa vez, foi atendida pelo preposto Joelson,
gerando número de protocolo de n.º 20230216006642452, aonde o mesmo admitiu o atraso e se
desculpou, informando que passaria para o setor responsável de religação – momento em que
a ligação foi derrubada.
A autora procedeu com nova ligação, gerando n.º de protocolo 20230216006643578, sem
sucesso. A ligação foi novamente interrompida.

Mais uma vez a autora ligou para a ré, gerando n.º de protocolo 20230216006644241,
sendo atendida pela preposta Larissa. Dessa vez, a representante da ré pediu novo prazo de
24h para religação. Que – obviamente – não foi cumprido.

Em 17/02/2023 a autora procedeu com novo pedido de religação. Dessa vez sendo
atendida pela Ester, que passou para Luan, gerando protocolo de n.º 8154196333. Ambos
pediram novo prazo de 24h para religação.

A residência já se encontrava por mais de 48 HORAS sem energia e a autora deveria


aguardar, incrivelmente mais VINTE E QUATRO HORAS para o, suposto, retorno da
eletricidade.

E mais uma vez a solicitação da autora não foi atendida.

A essa hora, Exª., toda a geladeira da autora já se encontrava completamente


descongelada, com os alimentos em estado de putrefação. Os alimentos congelados já tinham
sido perdidos.

Ressalta-se, novamente, que no meio deste imbróglio havia uma bebê de apenas 1
ano de idade, totalmente dependente, que foi submetida a humilhante situação de se
alimentar com uma mamadeira de mingau FRIO pois não havia como a autora aquecer o
seu leite, devida a negligência da ré em proceder IMEDIATAMENTE com a religação da
energia elétrica da consumidora!

Cabe salientar aqui que, de acordo com a Resolução Normativa Nº 414, de 9 de setembro
de 2010 da ANAEEL - Agência Nacional De Energia Elétrica, a religação em caráter de urgência
deve ocorrer em ATÉ quatro (04) horas a partir da solicitação, conforme abaixo:

Resolução Normativa nº. 417/10

“Art. 176. A distribuidora deve restabelecer o fornecimento


nos seguintes prazos, contados ininterruptamente:
[...]
III – 4 (quatro) horas, para religação de urgência de unidade
consumidora localizada em área urbana”

Revoltada, a autora deixou sua residência em 20/02/2023, MAIS DE 120 HORAS após a
interrupção de energia elétrica, em razão da impossibilidade de aguardar mais prazos de 24
horas – que certamente NÃO SERIAM CUMPRIDOS, além de permanecer sem o fornecimento
de eletricidade por mais um dia, dirigindo-se à casa de seus parentes no interior da Bahia para
passar o seu resto de carnaval.

Preocupada e temerosa de retornar para sua residência e perceber que o serviço de


energia não fora restabelecido, a autora ligou novamente para a ré no dia 20/02/2023, gerando
um número de protocolo de n.º 20232022000695499, solicitando providências quanto ao
restabelecimento da energia, ao passo que foi informada que a religação teria sido realizada às
12h do mesmo dia.

De imediato, ligou para a portaria do seu condomínio para confirmar a religação,


entretanto foi informada pelo porteiro de que não houve nenhum registro de religação de energia
da unidade consumidora da autora. Informou também que os prepostos da acionada deixam
claro que não realizam a religação da energia sem a presença do responsável pelo imóvel,
indignando mais ainda a autora quanto a conduta negligente, mentirosa e irresponsável da ré.

Repise-se que a autora exerce atividades laborais em regime de home office e por conta
da interrupção de energia, a mesma não pôde trabalhar durante três dias seguidos - quarta (15),
quinta (16) e sexta-feira (17) -, lhe prejudicando no seu trabalho e a colocando em uma situação
minimamente vexatória e humilhante perante sua superior hierárquica, quando se viu obrigada a
compartilhar com ela a motivação de não conseguir realizar o seu labor durante os referidos três
dias – doc. anexo.

Vislumbra-se aqui uma total falta de respeito com a consumidora, que se vê obrigada a
aguardar a boa vontade da equipe em realizar a religação de sua energia elétrica, no calor, com
fome, com uma bebê de 1 ano apenas, e sem poder ter uma noite tranquila de descanso, em
pleno feriado de carnaval, onde se consubstancia o verdadeiro dano moral.

Assim, diante dos abalos morais por estar na companhia de um bebê de 1 ano HÁ MAIS
DE 5 DIAS energia elétrica em sua residência, estando com TODAS as contas referente ao
serviço devidamente pagas e do abalo financeiro que, devido à demora na prestação do serviço,
vivenciou com a perda dos alimentos em sua geladeira, em pleno feriado de carnaval, não restou
alternativa senão buscar a tutela jurisdicional do Estado, para ser ressarcida de forma pecuniária
pelos danos morais e materiais sofridos.

DO DIREITO

O art. 37º, § 6º, da Magna Carta, preceitua expressamente a responsabilidade dos entes
prestadores de serviços públicos, in verbis:
“Art. 37. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito
privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos
danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável
nos casos de dolo ou culpa...”

Assim, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas das pessoas de direito privado
prestadoras de serviço público, caso em que se enquadra a empresa ré, baseia-se no risco
administrativo, sendo, portanto, objetiva, bastando que a vítima, ora autora da presente ação,
demonstre o fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão.

Ressalva-se desde já o verbete de nº. 192, seguido pelo TJRJ, na qual descreve-se
integralmente abaixo:

SÚMULA TJ Nº 192:

“A INDEVIDA INTERRUPÇÃO NA PRESTAÇÃO DE


SERVIÇOS ESSENCIAIS DE ÁGUA, ENERGIA ELÉTRICA,
TELEFONE E GÁS CONFIGURA DANO MORAL.
REFERÊNCIA: PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº. 0013662-
46.2011.8.19.0000 - JULGAMENTO EM 22/11/2010 -
RELATOR: DESEMBARGADORA LEILA MARIANO. VOTAÇÃO
UNÂNIME.” (grifo nosso)
.
Portanto, as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado respondem pelos
danos que seus funcionários causem a terceiro, sem distinção da categoria do ato.

Mesmo que não houvesse expressa determinação legal da responsabilidade civil objetiva
da empresa Ré, esta, diante da forma ilegal e injusta com que procedeu ao efetuar o corte de
energia elétrica, teria sua responsabilidade civil prevista no art. 186 do Código Civil, que
prescreve:

"Artigo 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,


negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

A lei nº 7.783/89 define o fornecimento de energia como serviço essencial e o CDC


(Código de Defesa do Consumidor), no seu art. 22, afirma que os serviços essenciais devem ser
contínuos.

Quem tem a luz cortada injustamente experimenta, sem dúvida, dano moral, inclusive, o
Superior Tribunal de Justiça reconhece que o corte do fornecimento de energia elétrica fere a
dignidade da pessoa humana. Não obstante, o corte é admitido em hipóteses excepcionais para
garantir a estabilidade do sistema, porque configura forma indireta de compelir os devedores a
pagar, caso este que, não se adequa ao processo em tela.

O corte do fornecimento de energia, ainda que ocorra por poucas horas, enseja a
reparação do dano moral. Já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo que:

“O fato de se cuidar de episódio que durou poucas horas


não indica que se deva tê-lo por transtorno comum
impassível de indenização. Na situação, o prejuízo moral é
presumível; decorre do senso comum de justiça”,
(Apelação nº 980.597-0/6, 36ª Câmara, Rel. Des. Dyrceu
Cintra.)

Assim, diante dos abalos morais por estar com uma bebê de 1 ano há mais de CINCO
DIAS sem energia elétrica em sua residência, estando com TODAS as contas referente ao
serviço devidamente pagas e do abalo financeiro que, devido à demora na prestação do serviço,
vivenciou com a perda dos alimentos em sua geladeira, não restou alternativa senão buscar a
tutela jurisdicional do Estado, para ser ressarcida de forma pecuniária pelos danos morais e
materiais sofridos.

a) DO DANO MORAL

O dano moral foi inserido em nossa carta magna no art. 5º, inc. X, da Constituição de
1998:
“Art. 5º:
[...]
X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo
dano moral ou material decorrente dessa violação ...”

Seguindo a mesma linha de pensamento do legislador constituinte, o legislador ordinário


assim dispôs sobre a possibilidade jurídica da indenização pelos danos morais, prescrevendo no
art. 6º, VI, da Lei 8.078/90:

“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:


[...]
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e
morais, individuais, coletivos ou difusos; “

Savatier define o dano moral como:


“Qualquer sofrimento humano que não é causado por uma
perda pecuniária, abrangendo todo o atentado à reputação da
vítima, à sua autoridade legitima, ao seu pudor, a sua segurança
e tranquilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de
sua inteligência, as suas afeições, etc...”
(Traité de La ResponsabilitéCivile, vol.II, nº 525, in Caio Mario
da Silva Pereira, Responsabilidade Civil, Editora Forense, RJ,
1989).

Quando se pleiteia uma ação visando uma indenização pelos danos morais sofridos, não
se busca um valor pecuniário pela dor sofrida, mais sim um lenitivo que atenue, em parte, as
consequências do prejuízo sofrido. Visa-se, também, com a reparação pecuniária de um dano
moral imposta ao culpado representar uma sanção justa para o causador do dano moral.
A ilustre civilista Maria Helena Diniz, já preceitua:

“Não se trata, como vimos, de uma indenização de sua dor, da


perda sua tranquilidade ou prazer de viver, mas de uma
compensação pelo dano e injustiça que sofreu, suscetível de
proporcionar uma vantagem ao ofendido, pois ele poderá, com a
soma de dinheiro recebida, procurar atender às satisfações
materiais ou ideais que repute convenientes, atenuando assim,
em parte seu sofrimento. A reparação do dano moral cumpre,
portanto, uma função de justiça corretiva ou sintagmática,
por conjugar, de uma só vez, a natureza satisfatória da
indenização do dano moral para o lesado, tendo em vista o
bem jurídico danificado, sua posição social, a repercussão do
agravo em sua vida privada e social e a natureza penal da
reparação para o causador do dano, atendendo a sua situação
econômica, a sua intenção de lesar, a sua imputabilidade etc...”
(DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 13. ed.
São Paulo: Saraiva, 1999, v.2)

A tormenta maior que cerca o dano moral, diz respeito a sua quantificação, pois o dano
moral atinge o intimo da pessoa, de forma que o seu arbitramento não depende de prova de
prejuízo de ordem material.

Evidentemente o resultado final também leva em consideração as possibilidades e


necessidades das partes de modo que não seja insignificante, a estimular a prática do ato ilícito,
nem tão elevado que cause o enriquecimento indevido da vítima.

O dano moral sofrido pela Autora ficou claramente demonstrado, vez que a ligação de
energia do seu imóvel se encontra desligada até o protocolo desta ação, tendo a autora ficando
isolada em seu apartamento durante 5 DIAS esperando a boa vontade da ré em proceder com a
religação da sua energia, em um calor insuportável, na companhia de sua afilhada (uma bebê de
1 ano de idade), em pleno feriado de carnaval, vendo seus alimentos putrefarem em sua
geladeira, sem nada poder fazer e por um motivo alheio a sua conduta.

b) DA TEORIA DO DESVIO DOS RECURSOS PRODUTIVOS DO CONSUMIDOR

A teoria do desvio dos recursos produtivos do consumidor deixa claro que o consumidor,
por ficar absolutamente vulnerável e tendo em vista as práticas abusivas por parte das
fornecedoras de produtos e serviços, evidencia que a autora sofreu com a PERDA DE SEU
TEMPO PRODUTIVO, ou seja, o tempo que a mesma teria – tempo esse de um ano – para
outras atividades (seja descansar ou trabalhar) não foi utilizado para o seu devido fim, por um
problema ocasionado NÃO por sua culpa, mas por culpa da empresa.

A responsabilidade é objetiva nas relações de consumo, sendo assim, não é necessário a


demonstração de culpa.

A doutrina e jurisprudência já entendem pela aplicação da teoria, uma vez que o tempo
produtivo do consumidor não pode ser retirado por um problema causado pela empresa ré. A
empresa deve ser punida por este fato. Mesmo entendendo que não há no Brasil o dano punitivo
(punitive damage), o entendimento é que o dano moral, através da aplicação do desvio produtivo
– referente, também ao dano existencial – seja aplicado.

“Neste sentido, o advogado Marcos Dessaune desenvolveu a


tese do desvio produtivo do consumidor, que se evidencia
quando o consumidor, diante de uma situação de mau
atendimento (lato sensu), precisa desperdiçar o seu tempo e
desviar as suas competências - de uma atividade necessária ou
por ele preferida - para tentar resolver um problema criado pelo
fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza
irrecuperável. Em outra perspectiva, o desvio produtivo
evidencia-se quando o fornecedor, ao descumprir sua missão e
praticar ato ilícito, independentemente de culpa, impõe ao
consumidor um relevante ônus produtivo indesejado pelo último
ou, em outras palavras, onera indevidamente os recursos
produtivos dele (consumidor). (...) Considerando não ter havido
abalos maiores nos direitos de personalidade da autora, fixo a
indenização por dano moral em R$ 5.000,00 (cinco mil reais),
quantia que atende aos princípios norteadores da reparação por
dano moral, com juros de mora a partir da citação e correção
monetária a partir do arbitramento, conforme Súmula 362 do
Superior Tribunal de Justiça. Condeno a ré ainda, ao pagamento
de custas e honorários, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre
o valor da condenação.” (grifo nosso - 2216384-
69.2011.8.19.0021)

“0026400-23.2017.8.19.0205 – APELAÇÃO. 1ª Ementa. Des (a).


WILSON DO NASCIMENTO REIS - Julgamento: 01/11/2018 -
VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL. APELAÇÃO.
CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C
INDENIZATÓRIA C/C TUTELA ANTECIPADA. ALEGAÇÃO DE
DESCONTOS INDEVIDOS REFERENTES À CONTRAÇÃO DE
SEGUROS E TÍTULOS DE CAPITALIZAÇÃO. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA PARCIAL QUE DEVE SER REFORMADA. A
matéria devolvida ao Tribunal para conhecimento repousa em
verificar a existência de danos morais advindos da conduta da
parte ré, além do termo inicial de incidência dos juros quanto
aos danos materiais. Em análise aos autos, verifica-se que a
parte ré que apresentou os contratos assinados quanto aos
títulos de capitalização, inexistindo impugnação do autor quanto
as assinaturas nos contratos. Ao revés, quanto aos contratos de
seguros não restou demonstrado a efetiva contratação devendo
os valores serem restituídos na forma dobrada tal como fixado
na sentença. Incidência da Teoria do Desvio Produtivo do
Consumidor. Exposição do consumidor à perda de tempo
excessiva e inútil, na tentativa de solução amigável de problema
de responsabilidade do fornecedor. O tempo na vida de uma
pessoa representa um bem extremamente valioso, cujo
desperdício em vão não pode ser recuperado, causando uma
lesão extrapatrimonial. Dano moral in re ipsa. O valor da
indenização que deve ser fixado em R$ 3.000,00 (três mil reais),
levando-se em consideração a peculiaridade do caso concreto.
No que se refere aos juros sobre o valor a ser ressarcido a título
de danos materiais devem incidir desde a data de cada débito
indevido realizado na conta do autor, em conformidade ao
disposto no Verbete nº 331 TJRJ. Precedentes deste Tribunal.
PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO AUTOR PARA: (I)
CONDENAR A RÉ EM COMPENSAR OS DANOS MORAIS
FIXADOS EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS), QUE DEVERÁ
SER CORRIGIDA MONETARIAMENTE A CONTAR DO
PRESENTE JULGADO, NA FORMA DA SÚMULA 362, STJ E
ACRESCIDA DE JUROS DE 1% AO MÊS CONTAR DA
CITAÇÃO; E (II) DETERMINAR A INCIDÊNCIA DOS JUROS
MORATÓRIOS SOBRE OS DANOS MATERIAIS INCIDAM A
PARTIR DE CADA DESCONTO INDEVIDO, NOS TERMOS DO
VERBETE 331 DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Ementário: 00/0 -
N. 0 - 31/12/0.”

0040906-62.2012.8.19.0210 – APELAÇÃO. 1ª Ementa. Des (a).


DENISE LEVY TREDLER - Julgamento: 30/10/2018 -
VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO DE
INDÉBITO E DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS Controvérsia recursal
relativa a ter restado caracterizado o dano moral e o
correspondente direito do autor à indenização compensatória.
Caracterizados os requisitos necessários à configuração da
responsabilidade civil da ré, vez que inegável o abalo
psicológico ocasionado ao autor, haja vista que possuía
produtos artesanais anunciados na internet e quando os
interessados de várias localidades do país ligavam para fazer
pedidos, recebiam a informação de que a linha não mais existia,
o que lhe causava constrangimentos. Assim, deve a ré ser
condenada a compensar-lhe o desgaste físico decorrente dos
transtornos ocasionados, haja vista que o consumidor ficou sem
o seu número de telefone fixo, após adesão ao plano de
telefonia, em razão de falha na prestação do serviço, causando
angústia, frustração e mal-estar ao demandante, um senhor de
70 anos de idade, que em muito extrapolam o simples
aborrecimento cotidiano. Teoria do desvio produtivo do
consumidor, segundo a qual o fato de o consumidor ser exposto
a perda de tempo na tentativa de solucionar amigavelmente um
problema causado pelo fornecedor do serviço, e apenas
posteriormente descobrir que só obterá uma solução pela via
judicial, é gerador da obrigação de indenizar. Esta independe de
prova relativa ao prejuízo material, vez que se trata de dano in
re ipsa, consoante o disposto nos artigos 186 e 927, do Código
Civil, c/c o inciso X, do artigo 5º, da Constituição Federal. Verba
compensatória dos danos morais arbitrada em R$ 10.000,00
(dez mil reais). Fixação dos honorários recursais. Inteligência
do § 11, do art. 85, do CPC. Recurso a que se dá provimento.
Ementário: 00/0 - N. 0 - 31/12/0.”

Conforme exposto acima, a teoria do desvio produtivo vem sendo aplicada de forma
ampla no judiciário brasileiro. O entendimento encontra-se base no fato, como salientado na
explicação anterior a jurisprudência, na perda do tempo útil do consumidor para dirimir
problemas causados pela fornecedora de produto ou serviço.

c) DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.

O presente caso trata-se de relação de consumo, sendo amparada pela lei 8.078/90, que
trata especificamente das questões em que fornecedores e consumidores integram a relação
jurídica, principalmente no que concerne a matéria probatória.
Tal legislação, faculta ao magistrado determinar a inversão do ônus da prova em favor do
consumidor conforme seu artigo 06º, VIII:

"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:


[...]
VIII- A facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a
inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil,
quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando
for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiência"
(grifamos).

Da simples leitura deste dispositivo legal, verifica-se, sem maior esforço, ter o legislador
conferido ao arbítrio do juiz, de forma subjetiva, a incumbência de, presente o requisito da
verossimilhança das alegações ou quando o consumidor for hipossuficiente, poder inverter o
ônus da prova.

Assim, presentes a verossimilhança do direito alegado e a hipossuficiência da parte autora


para o deferimento da inversão do ônus da prova no presente caso, dá-se como certo seu
deferimento para que a ré apresente nos autos o teor das ligações dos números de protocolos
elencados nesta exordial, além da comprovação de cumprimento da obrigação de religar a
energia da consumidora em tempo hábil estipulado por lei.

d) DA MEDIDA LIMINAR

Como é do conhecimento deste Douto Juízo, assegura o art. 300 do novo Código de
Processo Civil (Lei nº. 13.105/15) que “a tutela de urgência será concedida quando houver
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado
útil do processo”.

Além disso, o § 2º do mesmo dispositivo impõe que “a tutela de urgência pode ser
concedida liminarmente ou após justificação prévia”.
Assim, certamente a requerente da presente demanda faz jus a concessão da tutela
provisória de urgência inaudita altera pars, em razão do preenchimento dos pressupostos
exigidos pela lei processual, conforme demonstrado.

É sabido que os requisitos da tutela de urgência consistentes na prova inequívoca e


verossimilhança, que se traduzem, conforme a doutrina e jurisprudência, no conceito de
probabilidade, estão sobejamente atendidos. Não é difícil imaginar os danos irreparáveis
suportado pela requerente que está sendo privada do direito de obter energia em seu imóvel
mesmo com as faturas pagas, conforme se comprova com os documentos anexos, razão pela
qual necessitam urgentemente da medida liminar inaudita altera pars.

Portanto, restam demonstrados:

1 - a ‘probabilidade do direito’, por meio das fundamentações e documentos anexos, que


são totalmente capazes de convencer esse Juízo quanto à procedência do pedido autoral em se
confirmando os danos causados pela ré;

2 - a ‘verossimilhança da alegação’, uma vez que as provas acostadas e os fatos narrados


têm o poder de não deixar qualquer dúvida para esse Juízo quanto à verossimilhança das
alegações aqui formuladas;

3 - a ‘reversibilidade da decisão’, a concessão da tutela de urgência poderá ser reversível


a qualquer momento, até porque é muito simples fazer ou desfazer o ligamento da energia
elétrica e a restrição do nome nos órgãos de crédito, sendo sua concessão plenamente cabível –
e necessária! – quanto ao caso em análise;

4 - o ‘receio de dano irreparável ou de difícil reparação’, face a situação danosa e


extremamente grave que acomete a requerente, que está impedida de retornar à sua residência
pois não se sabe, até então, quando o serviço de energia voltará a funcionar;

Desta feita, considerando tais elementos e a verossimilhança das alegações articuladas


nesta peça processual, requer seja concedida a tutela antecipatória de mérito com urgência para
determinar que a requerida seja compelida a religar a energia elétrica da unidade do imóvel a
qual foi suspenso.

DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer a Vossa Excelência:

a) A procedência do pedido quanto à gratuidade de justiça, inclusive para efeito de


possível recurso;
b) A tramitação da presente demanda sob o juízo 100% digital;

c) Reconhecimento da relação de consumo, bem como da legitimidade ativa, com base


nos arts. 2º, 3º, e 14º, da lei 8.078 de 1990 e sendo aplicado a responsabilidade objetiva da ré;

d) A citação da empresa Ré para comparecer à audiência de conciliação a ser marcada,


podendo esta ser convolada em audiência de instrução e julgamento nos termos da Lei 9.099/95,
sob pena de revelia e confissão;

e) A inversão do ônus da prova, determinando que a ré apresente nos autos o teor das
ligações dos números de protocolos elencados nesta exordial, além da comprovação de
cumprimento da obrigação de religar a energia da consumidora em tempo hábil estipulado por
lei;

f) Que seja concedida a TUTELA DE URGÊNCIA EM CARÁTER LIMINAR para


determinar que a requerida seja compelida a religar a energia elétrica da unidade do
imóvel da autora IMEDIATAMENTE, sob pena de multa diária no valor sugerido de
R$200,00 (duzentos reais), ou outro valor que este Douto Juízo entenda pertinente;

g) Que julgue procedente a demanda em todos os seus termos, caso não seja concedida
a tutela de urgência, que ao final a requerida seja compelida a religar a energia elétrica do imóvel
da autora, o que se encontra suspenso, sendo que para tanto Vossa Excelência poderá arbitrar
multa pecuniária por dia de atraso em caso de descumprimento, nos termos dos art. 536, § 1º do
Código de Processo Civil;

h) Que a empresa Ré seja condenada ao pagamento a título de DANOS MORAIS no valor


de R$ 15.000,00 (quinze mil reais);

i) Que a empresa Ré seja condenada ao pagamento a título de compensação pela


PERDA DO TEMPO PRODUTIVO da consumidora no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais);

j) A condenação da requerida ao pagamento de custas processuais e honorários


advocatícios;

A produção de todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente as


testemunhais e as documentais que acompanham esta peça e demais que oportunamente
poderão ser juntadas.

Atribui-se à presente causa o valor de R$ 25.000,00 (Vinte e cinco mil reais).

São estes os termos.


Pede e aguarda deferimento.

Lauro de Freitas – Bahia, 22 de fevereiro de 2022.

Gabriela Santos Vilas Boas


OAB/BA 62.526

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