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outros usos não-comerciais permitidos pela lei de direitos autorais.
O artigo 184 do Código Penal tipifica como crime, apenado com detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano,
ou multa, a violação de direito de autor. Pela Lei nº 10.695/2003 incluiu, em seu tipo penal, a violação dos
direitos conexos aos direitos de autor, que são aqueles relacionados aos artistas intérpretes ou executantes,
aos produtores fonográficos e às empresas de radiodifusão, conforme o disposto nos artigos 89 a 96 da Lei
nº 9.610, de 19.2.1998 ("Lei de Direitos Autorais"), mantendo-se a mesma pena.
SUMÁRIO
SINOPSE
NOTA DA AUTORA
DEDICADO
INTRODUÇÃO
PRÓLOGO
CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 02
CAPÍTULO 03
CAPÍTULO 04
CAPÍTULO 05
CAPÍTULO 06
CAPÍTULO 07
CAPÍTULO 08
CAPÍTULO 09
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
EPÍLOGO
EXTRA 1
EXTRA 2
AGRADECIMENTOS
LIVRO FÍSICO
OUTROS LIVROS DA AUTORA
SOBRE A AUTORA
SINOPSE
Olá, Leitores(as)
Sejam bem vindos ao meu livro “Vendida ao Sultão”, que foi um grande desafio
para mim, envolvendo, o estudo sobre uma cultura tão diferente da minha.
Assim como a forma de escrita e evolução de enredo, me desafiando ao limite. E
após tantos meses, consegui encontrar o equilíbrio entre o que estudei e a licença
poética, para trazer apresentá-lo como eu queria para vocês.
Inspirada no “Império turco otomano” e a forma de narração na forma em que
“Mil e uma noites” fora contata. Tendo em vista a realidade e perspectiva do
povo na época, significa que haverá; cenas de violência, tortura física e
psicológica. Morte, sexo, contestações reflexivas voltadas a sociedade e religião.
Embora não seja o nosso protagonista que causará mal a nossa mocinha,
respeite os seus limites de leitura.
Reforço que tudo era resolvido por meio de lutas, guerras e que você se via de
fato livre de seus inimigos, quando tivera certeza que eles estavam mortos.
Mulheres não eram respeitadas na época, sendo comercializadas de forma direta
ou indireta, através de acordos. E eu não compactuo e não concordo com isso. É
um livro fictício e seu único intuito é o entretenimento.
Tenham uma boa leitura.
Att
Mellody Ryu
DEDICADO
Khalid via-se tomado pelo mais forte instinto de proteção que um dia já
sentiu. Quando viu a menina dos olhos azulados mais bonitos que já vira em
risco, seu corpo moveu-se por puro impulso, jogando-a para o lado e indo em
sua defesa. Desarmou o homem que a colocava em perigo, com facilidade. No
entanto, o homem era rápido e rodopiou o sabre em sua mão para num segundo
golpe o acertar em cheio. O oponente se mostrou mais rápido, pois já tinha
desembainhado seu sabre e defendeu-se. Como se não fosse o bastante, outro
homem surgiu logo atrás dele vindo também em sua direção.
Não tendo outra opção senão apenas defender-se dos golpes desferidos
pelos dois, por impulso, Khalid olhou em direção à menina em um rápido
movimento, para saber se ela já tinha saído dali. Contudo, a pequena
amedrontada não havia movido-se e pior que isso, percebendo a brecha
impensada que o príncipe deu, um de seus inimigos viu a oportunidade de
desferir um golpe na altura do seu rosto e por sorte, o príncipe conseguiu safar-se
do mesmo, desviando, mas não a tempo de evitar fazer uma fina linha em seu
rosto com o corte do sabre de seu inimigo.
Um fino grito de horror ecoou, vindo de sua prometida, este que causou
certa diversão em seus adversários. Vangloriando-se entre si, ambos sorrindo em
pura vaidade. E neste momento de vulnerabilidade pelo ego deles, Khalid
rodopiou em seu lugar, abaixando-se ao mesmo tempo em que erguia a sua
perna, acertando com a parte traseira do pé, as mãos de seus oponentes.
Aliviando a pressão deles ao segurar seus sabres, não obstante para desarmá-los,
mas o suficiente para que tivesse brecha para no fim do rodopio usar a força do
impulso do giro para desferir um corte profundo na altura do peito de ambos.
Seus corpos penderam para trás, devido à dor, um deles caiu sentado no chão.
O som do tilintar de seus sabres chamou atenção daqueles que estavam
nas proximidades, o príncipe escutou sons de passos aproximando-se, todavia,
não era o único a ouvir. O primeiro atacante que havia caído no chão,
covardemente apanha um pouco de areia e joga na direção do jovem herdeiro.
Este que não teve tempo de cobrir o rosto, acaba com seus olhos e a ferida feita
em sua face anteriormente, ardendo. Os oponentes aproveitam a oportunidade
para fugir.
Khalid, que era um príncipe valente na mesma medida em que era
teimoso, deu um passo em direção a eles, mas foi impedido quando sentiu uma
mão em meu ombro. Por instinto, virou-se erguendo o seu sabre, com a visão
ainda um pouco afetada, não conseguiu identificar de imediato quem era, no
entanto viu-se com o sabre parado, encostado suavemente no pescoço de sua
jovem prometida, fazendo um corte superficial no mesmo, uma pequena gota de
sangue brotou ali.
Arrependido, o príncipe tira o sabre de perto dela, enquanto Ayla,
petrificada, nem sequer falara algo e apenas engolira em seco, ao mesmo tempo
em que algumas lágrimas surgiam em seus olhos. Khalid deixa o sabre cair no
chão, e ao perceber que as pernas dela fraquejaram, ele a segura, impedindo que
a mesma caísse.
— Perdoe-me por assustá-la, pequena. Mas não deveria tocar em um
homem quando este empunha um sabre... — disse o jovem rapaz com a voz
contida para acalmá-la.
Como se sua fala a trouxesse de volta a si, Ayla ergueu-se nas pontas dos
pés, ao mesmo tempo, em que levantava a mão à altura do rosto dele, usando um
pedaço de suas vestes para limpar o fino risco de sangue ainda úmido na face do
príncipe.
— Eu que devo desculpar-me, vossa alteza... — então a fala dela é
cortada quando as pessoas chegam, mas não apenas isso.
Khalid percebe que ela novamente se petrifica e quando a observa de
cima abaixo, nota uma cobra passando sobre os pés de sua prometida.
Sem muita preocupação, até de forma descuidada, o rapaz a solta, se
abaixa, pega a cobra pela cauda e rapidamente a arremessa o mais longe que
pode. Ayla fica em absoluto choque e ele sorri.
— Me parece pequena prometida, que me dará algum trabalho — disse
ele achando graça, ao vê-la corar novamente. Despreocupadamente, o rapaz
encantado pela inocência dela, ergueu uma mão e pegou uma madeixa de seus
cabelos longos e levou próximo ao rosto para cheirá-lo.
— Príncipe! — exclamou ofegante, o conselheiro do sultão Fahir, que
fora o encarregado de acompanhá-lo naquele encontro — O que aconteceu? Não
o encontrávamos...
— Ayla... Onde você estava? Estávamos... — sua mãe veio falando, mas
parou levando a mão à boca.
Diversas pessoas estavam com eles e tiveram a mesma reação. Então um
silêncio reinou. Todos abismados olhando os dois tão próximos. Ayla molhada e
coberta de areia, com o rosto corado em meio a toda sujeira, enquanto o príncipe
herdeiro, se encontrava sujo, mas apenas nas suas vestes, na parte da frente, onde
manteve sua prometida em seus braços anteriormente, ademais possuía um risco
de corte em face, como prova da luta travada. Ao mesmo tempo, mantinha-se
segurando uma mecha de cabelo da menina com um sorriso em face.
Certamente não era algo que se via todos os dias. Nem Ayla ou Khalid
sabiam exatamente como começar a se explicar, tão pouco tiveram a
oportunidade. Assim que o torpor de surpresa de todos passou, foram separados
para terem os devidos cuidados e voltarem a ficar apresentáveis. Os responsáveis
de Ayla obviamente perguntaram o que houvera e fora chamada a atenção por ter
escapulido e que talvez isso não tivesse acontecido se ela apenas obedecesse às
ordens. Nada pior aconteceu, pois o próprio príncipe interveio em um pedido de
desculpas por atrair assassinos a tribo.
Mesmo que ele não tivesse certeza sobre por quem foram mandados,
Khalid não podia deixar fazerem mal à frágil menina que agora estava sentada
obedientemente em seu lugar cabisbaixa.
— De alguma forma descobriram sobre minha visita hoje, por isso seria
imperdoável que ela sofresse quaisquer males por minha culpa.
Era de domínio público o conhecimento de que o jovem príncipe era
bravo e valente, que tinha muito interesse em lutas com sabres, honra e glória.
Inclusive, uma de suas metas era se tornar o melhor com espadas do império.
Dado a pequenas aventuras heroicas, por onde passava, o rapaz fez uma fama
sobre si. O que fez os mais velhos suspirarem e aceitarem as suas ações em
conjunto de sua prometida.
— Vossa alteza, será um grande sultão. Não há dúvidas — disse
amistoso o pai de Ayla, tentando desfazer a tensão formada.
Entre todas as regras da oficialização do noivado e formalidades, Khalid
não conseguia tirar da mente o brilho do claro olhar de Ayla. Ansiando que ela
olhasse em sua direção, suas preces pareciam ter sido atendidas, pois a menina
virou o seu olhar ao príncipe no mesmo instante e o rubor doce que cobria sua
delicada face o fazia acreditar que casar-se com ela não seria tão mal. Tirou um
de seus brincos e mandou um de seus homens entregar de presente a ela. Ele
pode ver os olhares, enquanto seu presente fora recebido com surpresa, não
apenas por ela, mas por todos.
Talvez estivesse sendo sincero demais diante de tantas pessoas, mas já
não se importava. Sentia-se docemente cativo pela jovem menina que seria sua
esposa, companheira e... Por que não, sua diversão e dor de cabeça, enquanto se
envolvia em situações perigosas. Ponderou, bem-humorado.
Infelizmente, para o nosso casal, a paz durará um curto tempo, fazendo-
os acreditar que talvez este dia turbulento não passasse de um sonho agradável,
doce e surreal. Suas vidas mudariam drasticamente e eles não faziam ideia do
quanto.
CAPÍTULO 01
Dias depois…
A yla estava encontrando dificuldade para dormir. Algo que se repetia nas
últimas noites, desde que conhecera o seu prometido Khalid. Ela não
conseguia evitar se sentir abalada ao recordar os curtos momentos em
que estiveram juntos, o sorriso dele a assombrava, fazendo seu coração palpitar
loucamente. Assim como o toque em sua cintura e o seu olhar sempre direto,
como se pudesse ver a sua alma.
Inconscientemente, Ayla levava a mão ao brinco que ganhara,
acariciava-o com o polegar e um sorriso tolo em seu rosto. Desde que o ganhara,
passou a usar apenas ele em sua orelha, negava-se veemente a tirá-lo, até mesmo
para dormir.
Perdida em memórias do herdeiro, olhava a fresta de sua tenda, em que a
luz da lua entrava como um bonito feixe, trazendo uma sensação de encanto,
similar ao que sentia em seu estômago quando Khalid sorria para ela.
Ayla suspirou sonhadora, mas de um momento para o outro, tudo
mudara!
A calma que tomava a noite fora arrebatada pelos gritos de horror que
adentravam os seus ouvidos e ressoavam em sua mente. A luz que emergia na
tenda escura oscilava conforme as pessoas passavam apressadas diante dela.
Ayla não sabia o que estava acontecendo, mas seu corpo todo se retesou. Ela não
conseguiria ficar ali parada e encolhida, sem saber o que se passava. Reunira
coragem em um profundo puxar de ar, para caminhar até a fresta da tenda e
espiar de fato o que se passava.
Com seus pés descalços, caminhou em direção à luz, mas assim que
estava prestes a ver o que ocorria, alguém apareceu. Um homem alto, forte e
assustador, vestido com algo semelhante a uma armadura e um rosto
parcialmente coberto por um tecido negro.
Ayla podia ver o brilho maligno em seus olhos e quando ele se abaixou
suavemente estendendo a mão em sua direção, ela dera um passo para trás por
puro instinto, mas o que nem a menina ou o homem esperavam, era um golpe
certeiro em sua cabeça com uma lança, onde a ponta transpassou pela orelha e o
matou instantaneamente, fazendo-o tombar para o lado. Amedrontada e
horrorizada, a jovem sentiu suas pernas vacilarem e caiu no chão,
completamente em choque.
Safirah, a irmã mais velha de Ayla, de repente apareceu pela fresta da
tenda, entrando no local abruptamente olhando para todos os lados como se
procurasse por algo ou alguém. Ela estava com as suas vestes rasgadas e sangue
respingado por todo o seu corpo. Ayla sobressaltou-se ao vê-la, já que a última
notícia que tivera da irmã, fora que estava grávida e passara os últimos dias um
tanto afastada do contato com os demais para ter o final de sua gravidez
tranquila. Mas longe de toda e qualquer tranquilidade, Safirah estava
transtornada voltando seu olhar aflito para Ayla. Logo que se aproximou da
menina a segurou pelos ombros e a olhou com atenção de cima a baixo.
Ao constatar que Ayla estava bem, suspirou aliviada e disse:
— Minha pequena Ayla, precisamos esconder você!
As palavras de Safirah, mal entraram nos ouvidos de Ayla, que ainda
estava em choque a encarando, diante de seus olhos tudo parecia estar passando
na mesma lentidão dos beduínos no deserto, como se ela não fizesse parte do
cenário e fosse apenas uma mera espectadora. A jovem mulher, com pressa e
sem dar muito mais tempo para a menina reagir, segurou-a pelos braços, como se
não pesasse nada. Caminhou com Ayla até a arca, colocando-a no chão apenas
para poder tirar de dentro algumas coisas e assim que o fez, colocou-a dentro.
Sem contar os gritos e sons aterrorizantes que vinham de fora da tenda,
um silêncio pesado se instalou entre as duas.
Safirah, antes de fechar a arca, contemplou Ayla encolhida lá dentro e
uma lágrima solitária rolou por sua face, querendo guardar uma última
recordação da menina, sabendo de seu próprio destino, contemplou por rápidos
instantes aqueles olhos incríveis. Engoliu em seco e num segundo que parecia ter
levado uma eternidade, levou a mão para dentro de suas vestes e de lá, tirou
alguns papéis e os colocou dentro da roupa da irmã.
— Ayla, mantenha-se abaixada e escondida. Não saia por motivo
nenhum… Fique bem, minha menina — disse enquanto concluía com a voz
embargada.
E essas foram as últimas palavras que Ayla escutou de sua irmã.
Após a tampa da arca ser fechada, muito barulho escutava-se próximo
dela. Muitas vozes desconhecidas se faziam presentes, a tenda havia sido
invadida, mas a cabeça da garota estava tão transtornada pelos eventos que se
desenrolava de forma caótica naquela noite, que nenhuma palavra parecia fazer
sentido. A única coisa que a fez despertar do torpor, foi o som de um grito
feminino agudo e seguido de algo pesado caindo no chão.
Sua irmã estava morta, Ayla tinha certeza.
Lágrimas brotaram em seus olhos somente quando a última frase da irmã
finalmente tivera sido assimilada.
Fique bem, minha menina...
Fique bem, minha menina...
Fique bem, minha menina...
Ela sabia que seria morta! O pensamento gritou na mente de Ayla,
paralisando-a. No lugar de proteger a si e o bebê que estava em seu ventre,
Safirah foi ao encontro de sua irmã. O conhecimento disto a deixou transtornada,
ao ponto em que soluçava compulsivamente de tanto chorar.
Seu choro fez sua presença ser percebida pelos invasores, eles se
entreolharam e seguiram a origem dos soluços. E tão logo que descobriram a
origem dos sons, avidamente abriram a tampa da arca, sorriram perversamente,
como lobos famintos que encontram a presa perfeita para a próxima refeição. O
medo a fez se encolher ainda mais, escondendo o seu rosto entre seus joelhos,
abraçando-se com muito mais força, como se isso pudesse protegê-la de seus
algozes, mas eles sem qualquer traço de piedade, agarraram seu braço direito, o
apertaram com força ao ponto de machucá-la e fazê-la soltar um gemido de dor.
Ayla soltou as suas pernas na tentativa de se soltar, ao mesmo tempo em que
choramingava a sua dor.
Ergueram-na a altura dos olhos, apreciando novo prêmio encontrado,
segurando-a por apenas um braço. Ayla fugiu do olhar deles. Se o primeiro que
tinha aparecido em sua tenda parecia um homem cruel, estes certamente não
seriam diferentes. E Ayla tinha medo de ver sua própria morte refletida na íris
dos olhos daqueles homens que a observavam e debochavam de sua fraqueza e
corpo frágil.
— Não iremos matá-la criança... — falou rudemente um deles —
Apenas vamos brincar, menininha.
Eles pareciam ser loucos, demônios vindos do outro mundo para trazer
infortúnio. Os homens seguiram falando coisas para ela, como se não pudessem
fazer nada para evitar que brinquedos eventualmente quebrassem. Ayla sentiu
uma forte pontada no peito ao pensar em sua irmã morta, sua ira falou mais
forte que sua prudência, então os encarou e começou a gritar para que calassem
a boca, mas assim que seus olhos encararam os deles, o humor morreu. Ayla se
viu em choque, com todas suas palavras tomadas de seus lábios, assim como
eles, ela os olhava embasbacada.
Já não apresentavam risos ou gracejos irônicos, ninguém tinha coragem
de falar qualquer coisa enquanto se entreolhavam. Ayla não pôde evitar de sua
raiva esvair-se da mesma forma abrupta em que se sugira.
Fora chocante, estes homens cruéis diante dela, os mesmos que haviam
matado sua irmã e que estavam atacando toda a sua tribo, tinham os mesmos
olhos que ela! Entre seu povo era comum olhos negros, alguns verdes ou
amarelados, mas somente Ayla tinha olhos azulados tão claros quanto o céu.
Ela não sabia o que falar, então se manteve em silêncio tanto quanto eles,
mas o silêncio não imperou por muito tempo, de um momento para o outro, a
jogaram no chão com brusquidão, como se ela fosse algo sujo e repugnante.
Logo os homens começaram a discutir em um idioma que ela não conhecia. Ayla
se encolheu contra a arca, temendo que eles voltassem a sua atenção para ela e a
matassem. Ponderou fugir, mas por onde? Ela buscava com os olhos algum
caminho que pudesse tomar, mas não encontrava.
Em sua busca de fuga, Ayla viu algo semelhante a um pé e se abaixou
para tentar ver melhor. Deveria ser sua irmã… E sentia tanto por ela. Uma dor
rompeu seu coração novamente, mas Ayla conteve o choro. Neste momento, os
homens pareceram lembrar-se dela, pegaram-na pelos cabelos e a arrastaram sem
rodeios para fora da tenda. Sem qualquer chance de poder ver o corpo da irmã ou
pensar em qualquer coisa mais.
— Vamos lá para fora, não se debata — disse um dos homens que a
arrastavam.
Assim que saíram, começaram a gritar, chamando os outros homens que
faziam parte daquela corte de demônios da morte. Pior que o pavor imposto pelo
seu destino incerto, fora a visão dos corpos caídos por todos os lados, inertes.
Entre eles os de sua família: sua mãe estava caída com o braço esticado em sua
direção, assim como o seu pai um pouco mais próximo à entrada de sua tenda.
O grito escapou dos lábios de Ayla antes que ela pudesse conter. A dor
no peito explodindo muito mais forte do que pela irmã, uma dor que ela jamais
imaginou que sentiria, seu peito rasgava e suas lágrimas pareciam queimar ao
rolar por sua face.
Todos aqueles que chamava de família estavam mortos.
Tudo estava banhado em sangue, como a visão do próprio inferno.
Algumas tendas rasgadas, outras pegando fogo... Jamais havia visto ou
presenciado algo assim. Apenas ela e mais algumas jovens garotas estavam
vivas. Todas, assim como ela, tinham o terror estampado em suas faces sem cor
e suas vestes regadas com sangue, contudo, diferente delas, Ayla era a única
ainda limpa e sem qualquer ferimento.
Mas talvez entre todas, era a que mais desejava estar morta também. Não
queria viver em um mundo onde não tivesse presente aqueles que ela amava, não
queria viver com aquela lembrança de todos mortos de forma vil. Só queria que
isso acabasse logo. Ayla se debateu e provocou o homem que a segurava até que
ele estapeou a sua face e a jogou como se não passasse de uma boneca sobre as
demais meninas da tribo que ainda estavam vivas.
Elas choravam e murmuravam por socorro ou qualquer tipo de salvação,
mas a dor no peito da pequena menina valente era ainda mais forte do que o
desejo natural de salvação. Ela tentou se levantar, mas um dos homens próximos
ergueu o sabre em sua direção, o que a fez se retesar no lugar. Ainda que
desejasse morrer, não tinha coragem de dar mais um passo. Seu corpo não
obedecia, simplesmente não reagia.
— A coragem acaba na frente de uma espada, não é? Contenha-se,
menina, se não sua cabeça irá rolar! — calmamente, disse o homem que lhe
apontava o sabre, com um profundo e gélido olhar.
Outro homem veio com correntes pesadas de ferro e prendeu todas as
meninas uma às outras, incluindo Ayla. Eles ainda discutiam e por vezes
olhavam em sua direção. E desta vez, não importava o quanto seu peito doía,
Ayla não chorava. Mas parecia estar morta dentro de um corpo ainda vivo. Todas
as meninas foram jogadas em uma carruagem de escravos com grades grossas e
um cadeado, nada mais. Algumas choravam e pediam por misericórdia, outras
estavam em silêncio conformadas. Ayla manteve-se em silêncio, sentindo-se
quebrada demais enquanto a carruagem partia e ela via os corpos de todos seus
familiares no chão e as tendas em chamas.
O homem ordenou que as soltassem e mais que isso, ele mesmo fora
quebrando corrente por corrente com a sua espada, até que todas
estivessem bem. Com medo, as meninas olhavam-no com receio. Mas ao
contrário do que era suposto, revelou-se um salvador, ao menos era isso o que
ele disse a todas as meninas. Contudo, não era o que Ayla acreditava, mas
ninguém lhe escutaria. Não quando elas o olhavam como se fosse um oásis em
meio ao deserto.
As levou para o seu palácio e se apresentou como Sheik Said, um
homem de muitos poderes e posses, mas que infelizmente nunca fora abençoado
com filhos. Ele havia sido informado de que homens maldosos tinham
sequestrado crianças próximas ao seu território, e não poderia perdoar tal ato.
— Vocês não possuem pais e eu não possuo filhos, tomarei todas como
minhas filhas e então poderei fazer por vocês o que jamais tivera oportunidade
de fazer ao meu sangue e carne — Ponderou, pensando em voz alta.
Elas ficaram totalmente emocionadas e embargadas pelo sentimento de
tristeza que ele entoava em suas palavras, contudo, não tivera uma lágrima
sequer rolando pela sua face, notou Ayla.
A maioria aceitou sua proposta com extrema gratidão, agarrando-se a ele
e ao desejo de calar a dor que sentiam em seus corações. Agradeciam a Alá por
ter posto um homem bom como ele em suas vidas. Ayla concordou, porém não o
abraçou e ficou à distância. Se o Sheik notara isso ou não, não demonstrou.
Ayla, que muito escutava às escondidas as conversas dos adultos, nunca
tivera ouvido algo sequer próximo a isso. Falso e enganador, provavelmente
estava mancomunado com os atacantes da tribo para saber sobre elas e no
momento mais propício, pegá-las para si. Ela pensou, sem acreditar em qualquer
um dos sorrisos que lhe eram ofertados.
O Sheik até as renomeou, uma a uma, alegando que assim seria mais
fácil recomeçar suas vidas sem as lembranças tristes daqueles que se foram ao
altíssimo descansar. E que a nova vida que elas teriam seria de pura felicidade.
Ayla, assim não carregava mais este nome e fora renomeada como
Amira. Parecia uma piada, mas não tivera escolha.
— Bem cuidada como uma princesa, Amira, este será seu nome, espero
que goste — Ayla lutava internamente contra o homem. Odiava-o por completo,
sua voz e sua presença. Apenas queria pegar as meninas e sair dali, mas como
não tivera opção, apenas afirmou em silêncio com a cabeça.
Ele percebia que ela havia sido educada com mais zelo que as demais
meninas, embora fosse um tanto geniosa e selvagem. Seus planos para ela
começavam a ser moldados, desde o movimentar felino até seus delicados
traços.
Conforme os dias iam passando, Ayla ia se acostumando a ser chamada
pelo seu novo nome, "Amira", mas jamais se esqueceria de suas origens ou de
como vieram parar naquele lugar, mas o tempo ia passando e o nome Ayla ia se
perdendo na lembrança. Como recordação do passado, ainda tinha o brinco e a
carta, mas não sabia ler. Então, apenas sempre tinha os objetos próximo ao
coração. Mãe, pai, irmãs e todas as pessoas que foram importantes em sua vida
passada, quando ainda era Ayla, a prometida do príncipe de Anatólia.
Tudo parecia perfeito nos primeiros dias, aos poucos todas as meninas
iam se recuperando de suas dores, seus traumas e passando a aceitar melhor a
perda dos seus amados familiares e seus novos nomes. Porém, Amira seguia sem
conseguir, sequer por um momento, acreditar nas palavras do seu "salvador".
Entretanto, sentia-se feliz pelas meninas irem lentamente parando de chorar
todas as noites e tendo menos pesadelos.
Por diversas vezes ela tentou fugir, mas ainda que ele fosse tomado
como um homem "bom", não deixou de açoitá-la, como castigo por tentar fugir.
Ferida, retornava ao dormitório do harém todos os dias.
— Crianças devem ficar com seus pais... — dizia ele.
— Você não é meu pai! — retorquiu ela com desgosto.
— Então, passarei a ser apenas o homem que a cria — disse friamente e
ela sabia então, que aquele era o verdadeiro rosto que ele tanto escondia.
Todos os dias, ele as fazia ter diversas aulas, sejam de boas maneiras,
dança, música ou política. Todas deveriam aprender o máximo de línguas
diferentes, dizendo que seria o melhor que ele poderia fazer por elas e seus
futuros. Quando ninguém via, Amira abraçava a carta de sua irmã e beijava o
brinco que ganhara. Era sua única forma de consolo, pois naquele lugar mais
ninguém a compreendia.
As meninas, desejando que Amira parasse de apanhar, pois já estava
com muitas cicatrizes pelo corpo, pediam que se comportasse. Que ele não era
cruel ou mal de propósito, que ela fazia por merecer os castigos que recebia.
Falavam também que ele era o salvador e estava cuidando bem de todas. Queria
provar a elas o quanto estavam erradas e foi assim que, em uma noite, Amira viu
novamente a verdadeira face de seu falso salvador.
Estava andando pelo palácio do homem, roubando algumas das frutas
mais frescas que lhe foram negadas como castigo, quando caminhou até a ala
leste. Esta que, por mais de uma vez, fora proibida de ir, mas sendo como era,
Amira vira a oportunidade de adentrar o local na hora de descanso do eunuco.
Toda a verdade que se passara por lá, era muito pior do que ela imaginaria.
A primeira visão não era diferente de um harém comum, com diversas
mulheres se apresentando ao seu senhor, para quem sabe ter uma noite com ele.
Porém, se olhasse por mais tempo, poderia ver o que de fato era.
Ele as assistia dançar e em cada erro, as batia em lugares certos em que
não as marcaria em definitivo, o mesmo acontecia a cada uma que tocava algum
instrumento ou recitava algum poema.
— Se empenhe mais! Como poderei te conseguir um bom marido, se não
fizer as coisas direito? Eu vou ter que te dar a um estrangeiro gordo de algum bar
qualquer em troca de alguns barris de vinho? — exclamava ele grosseiramente a
jogando no chão e apoiando seu pé sobre a cabeça da mulher infeliz que
chorava.
— Perdoe-me, meu senhor, dai-me outra oportunidade que farei melhor
desta vez — implorou a mulher com a voz embargada pelo arrependimento.
— Assim espero — falou asperamente ele.
Quando ele se afastava, ordenava que levantasse e recomeçar-se.
Repetidas vezes ela acabava errando ainda mais, tamanho o seu
nervosismo e medo. Todas tremiam e temiam pela ira dele, que detestava
qualquer coisa menos que a perfeição. A pior cena que Amira teve o desprazer
de assistir fora quando uma das mulheres errou o verso da recitação. Ele pegou-a
pelos cabelos e a arrastou até uma pequena fonte e afundou repetidas vezes o seu
rosto na água, enquanto a ofendia de nomes que Amira nem sequer imaginou
que existisse.
Para não arfar qualquer exclamação de horror, Amira levou a mão à
boca, tampando-a.
— Seja por bem ou por mal, todas vocês renderão o retorno equivalente
a mim! E em circunstância alguma permitirei que maculem meu nome! Sou
conhecido por treinar as melhores mulheres e do mais alto nível e menos que
isso, é imperdoável! — ele se virou para todas elas — Voltem a estudar do zero,
em alguns dias irei novamente me certificar se estão qualificadas ou não.
Amira sempre soube, e sorriu satisfeita sob a mão que tapava a sua boca,
não errara seu julgamento. Saiu de seu refúgio cuidadosamente e correu para
poder falar às demais meninas, o mais rápido que pôde, contudo, no meio deste
caminho acabou fazendo barulho ao esbarrar e derrubar uma bacia de metal.
Isto despertou a atenção do Sheik para si e de um momento para o outro,
via-se perseguida pelo homem.
— Amira!!! — exclamara ele em sua busca frenética por alcançá-la.
Embora ela fosse rápida, não era o suficiente para escapar de suas garras.
— Me solte! Eu sabia! Eu sabia! Homem nojento e pútrido! — afirmara
agitadamente ela, furiosamente debatendo-se em seus braços.
— Calada! — dizia ele, enquanto tentava contê-la.
— Não vou me calar! Eu sabia que não deveríamos confiar em você!
Um mentiroso, cruel e covarde! Alá o punirá! Alá fará com que o pecador e
demônio pague por tudo! Ele vê sua crueldade! — Amira gritava.
Alguns empregados passavam um pouco ao longe e, neste momento,
Amira percebeu que todos compactuavam com este monstro.
Mulheres são só objetos, sem importância. Pensou amargurada. Mas não
se renderia, não quando tinha as meninas para proteger. Com esse pensamento,
Amira fingiu acalmar-se um pouco, pedindo ao Poderoso para dar-lhe a força
necessária para fugir e então, ao deixar o homem tentar tapar-lhe a boca, neste
momento, ela aproveitou para morder com toda força a mão de Said.
O sabor do sangue dele invadiu a boca de Amira e ele, devido à dor, a
soltou com força contra o chão.
— Sua prostituta! — gritou ele.
Amira ousadamente sorriu o olhando, enquanto passava a língua nos
lábios, recolhendo o sangue dele que escapava, para então, cuspir próximo aos
pés do homem.
— Você vai pagar por isso! — esbravejou indo para cima de Amira com
seus olhos vermelhos em pura fúria.
Mas por meio segundo, parou e pareceu ponderar o que deveria ser uma
oportunidade em que Amira poderia fugir, mas que não o fez, pois um arrepio
subiu-lhe a espinha, no mesmo instante em que um sorriso tenebroso nasceu nos
lábios de Said.
— Eu tenho um plano melhor para você.
Amira não tivera coragem de perguntar que plano seria este, pois sabia
que não importava qual fosse, tão pouco gostaria. Ele a pegou pelos cabelos e a
arrastando, levou-a para uma de suas torres. Ela gritou por todo o caminho,
fazendo-se ser ouvida por todo o palácio, mas Said não parecia se importar.
Jogou-se no chão e ele a arrastou, ferindo-a contra a superfície áspera. Nas
escadas fora ainda pior, pois ela tentou se travar com as pernas, implorando por
socorro e ele apenas parou de caminhar. Por alguns segundos Amira pensou que
tudo estava acabado, que enfim seria a sua morte.
Ele então se virou para ela e um sentimento de extremo pavor a tomou,
se levantou e tentou correr, mas o Sheik foi mais rápido e a pegou, jogou-a nos
ombros e voltou a subir as escadas.
Said não se importava, nem sequer vacilou. Apenas seguia andando até o
seu destino e quando chegou nele, abriu uma porta e a jogou dentro.
— Aqui será seu novo lar... Amira.
— O que você vai fazer? — perguntou Amira, em uma voz fraca.
Said se aproximou dela e ela se arrastou no chão para trás, tentando fugir
de sua aproximação.
— Tive um plano melhor para você, pequena. Irei criar uma esposa que
até mesmo o sultão irá desejar! Você será o meu melhor trabalho, se tornará uma
lenda e farei você se tornar a mulher mais desejada de todo o império! Você vai
ser o meu caminho para cair nas graças do Sultão — ele segurou o rosto com
apenas uma mão e se aproximou do de Amira e concluiu: — Deveria estar grata
a mim, sua natureza e vivacidade podem ser trabalhadas e sua força será o que a
diferenciará das demais. Existe a possibilidade de se tornar uma favorita.
A face de Amira perdeu a cor e então por meio segundo, lembrou-se de
Khalid sorrindo, como um fio de esperança agarrou-se a essa lembrança como se
tivesse vivido em outra vida distante. Instintivamente levou a mão ao peito onde
continha a carta e o brinco entre os tecidos de sua vestimenta. Ela queria ter a
esperança de que ele a salvaria, afinal era um rapaz corajoso e de bom coração e
que já a salvara, antes de todas as desgraças acontecerem em sua vida, mas seu
fio de esperança estava arruinado diante do olhar cruel daquele homem à sua
frente.
Ela duvidava se conseguiria sobreviver a ele, para pensar em ser salva
por qualquer pessoa.
Os ferimentos de Amira foram tratados com cuidado por uma das servas
do Sheik. Contudo, ela não podia aceitar o destino que lhe ofertavam. Por isso,
tentativas de fuga ocorreram assim como diversos castigos. Fome, chicotadas,
golpes com as mãos e pés, humilhações de diversos tipos.
Dia após dia, Said parecia ter menos paciência e mais prazer em vê-la
sofrer. Desde que ela chegou ao seu palácio, não teve um dia sequer de paz.
Amira fazia questão de ser insuportável, sendo a morte algo mais tolerável do
que viver em desgraça.
Said a princípio não percebia a sua intenção, até um dia em que ele
parecia estar de bom humor, lhe apresentou uma grande agulha. Amira não
compreendia o porquê de ele parecer feliz, isso a fazia estremecer por dentro e
quando ele ordenou que a segurasse, ela se debateu como se sua vida dependesse
daquilo. Seu instinto gritava em desespero, mas seu corpo não era forte o
suficiente para poder se livrar das fortes mãos que a seguravam.
— Você anseia pela morte, menina. Eu sei que fui tolo em demorar a
notar, mas não lhe darei este prazer — afirmou.
Said com suas próprias mãos, enfiava a agulha em alguns lugares em sua
carne e a dor alastrava-se por seu corpo. De um braço a outro ele fez, depois nas
pernas, e por fim segurou-lhe a mão e sob suas unhas a agulha fora enfiada
causando enorme dor e agonia.
— Interessante, não é? Aprendi com um dos meus conhecidos
estrangeiros para o qual vendo tecidos — comentou.
Amira não conseguia responder, pois mesmo com a agulha fora de seu
corpo a dor ainda era pulsante e insistente.
— A partir deste dia, todos os dias será ferida. Até quando eu disser que
está pronta — pronunciou em voz clara e limpa.
E então se aproximou lentamente, sem tirar seus terríveis olhos
castanhos dos dela.
— Se eu fosse você, menina, aprenderia a valorizar mais a vida, pois a
morte é algo que não lhe concederei até estar satisfeito.
— Ifrit[5]… — murmurou Amira. Ela o olhou aterrorizada, não via mais
um homem à sua frente e sim, um demônio. Pensara que era uma das histórias de
sua mãe, mas não, este homem era a própria personificação de um, em corpo
humano.
Em um ágil movimento, ele golpeou-a no rosto e mandou que a
deixassem no chão. Ordenou que lhe tirassem por hoje toda e qualquer
comodidade. Levaram a cama e tudo que lhe desse conforto e ao tentar se mover,
Amira entendeu o porquê ele fizera esses pequenos ferimentos. Não causaram
cicatrizes profundas como das vezes em que ele perdera a cabeça, mas causou
incômodo e dor. Uma eterna recordação à desgraça que fora acometida sobre sua
vida, que independente da dor, ainda estava viva e assim seguiria.
Compadecendo-se de Amira, uma das criadas foi cuidar de suas feridas
às escondidas e pediu chorando a menina que parasse de desafiar o Sheik. Ele
poderia ser um homem bom quando agradado, dando-a em um bom casamento
que lhe daria uma vida confortável e livre de desgraças. Ela parecia ter boas
intenções, mas na mente da jovem menina, se tornava inadmissível qualquer tipo
de defesa a aquele homem repugnante.
Amira empurrou a mulher que lhe tratava e a bacia de ferro que ela
segurava com água ao limpar seus ferimentos fizera barulho ao cair no chão. Os
homens do sheik entraram no quarto poucos momentos depois, a seguraram
pelos cabelos e estavam a arrastando para fora do aposento enquanto a mesma
gritava e chorava, Amira tentou impedir, mas recebeu um chute que a fez cair
para trás.
A porta que a trancava ali fora fechada. Obviamente, a garota se
arrependeu de tê-la empurrado, aquela que de alguma maneira queria o seu bem.
Mas Amira viera a chorar pesadamente no dia seguinte, quando uma bandeja de
ferro lhe fora entregue em seu aposento coberto com um tecido. Dentro da bacia,
estavam ambas as mãos de alguém e de alguma maneira Amira sabia, eram as
mesmas mãos que trataram suas feridas... A mulher que se compadeceu dela,
agora estava morta por culpa dela.
A força e voz de Amira se foram em uma sensação de luto. Naquele dia
não quis comer e passou a noite em claro, mesmo com seus pertences de volta ao
aposento. Naquele mesmo dia, enquanto observava o sol nascer, ela tomou uma
decisão.
Independente do destino acometido a ela, que a subjugou e condenou-a
aqueles infortúnios, os faria padecer na desgraça, mesmo que, para isso tivesse
que se tornar submissa e aprender tudo que quisessem ensiná-la. Tudo que eles a
treinariam para ser: A concubina do sultão.
A cada dia em que ela envelhecia, era mais um dia em que estava se
tornando mais mulher. Os dias passavam rapidamente e antes que o Sheik se
desse conta, nove anos se passaram desde que a acolheu e Amira, havia se
tornado de fato, a mulher mais bela do continente.
Deixando por vezes o próprio Sheik tentado a tocá-la. Por este motivo
ele soube que era hora de conseguir chegar ao sultão. Saíra em viagem e dessa
vez, jurou que retornaria apenas quando ela fosse vendida a ele e, de fato, fora o
que aconteceu, um desenho dela chegou às mãos do Sultão que se viu
perdidamente encantado pela jovem mulher. Assim, o contrato de casamento
fora selado entre o sultão e o sheik.
Amira seria a nova concubina do Sultão Fahir.
CAPÍTULO 03
ACORDO SELADO
Por todos os dias e noites seguintes que seguiram a sua viagem, ficou
perdida em seus devaneios, sendo pega de surpresa quando se viu tendo que
mudar de montaria, saindo do camelo para um cavalo, alto e de pelos quase
dourados. Levantou o olhar e se vira rendida pelo que tinha ao seu redor.
O terreno era árido e com alguma vegetação, tão logo que continuaram
adentrando e seguindo viagem. Amira pôde ver rochas enormes, algumas árvores
de vários tipos, mantos verdes de grama pelo chão. Ela jamais havia visto isso,
mesmo viajando com sua tribo frequentemente. Ao fundo, montanhas e tudo o
mais parecia tão lindo aos olhos de Amira que por vezes se vira tentada a tirar o
véu, descer de sua montaria e sair correndo sem direção pela paisagem que via.
Se pudesse definir a imensidão que tinha ao redor, seria: Liberdade.
Não era apenas areia infinita que dava a sensação de não sair do lugar,
não eram apenas pequenos lugares com um punhado de água e alguma vegetação
como os oásis. Amira sentia-se feliz e triste ao mesmo tempo, pois gostaria de
ter alguém ao seu lado que entendesse a sua felicidade e festejasse com ela.
Contendo-se, ficou o resto da viagem perdida em pensamentos e quando estava a
poucas horas de chegar em Anatólia, vira os homens que a acompanhavam
exclamarem felizes.
No caminho do palácio, já no território de Fahir, o atual Sultão, vira-se,
sendo pega de surpresa em ver tamanha pobreza. Seu coração sangrava ao ver as
pessoas vivendo em uma situação tão catastrófica que não sabia se chegaria ao
fim do dia.
E como prova de seus pensamentos, alguns se aproximaram dos guardas
que se viram obrigados a afastá-los com força bruta. Amira se compadeceu e
implorou para que não fizessem isso. Pediu que como logo chegariam em seus
destinos, não faria falta dar a comida que ainda tinham para eles.
— Minha senhora... — começou uma escrava, mas ela se calou,
encolhendo-se com uma expressão transtornada.
Amira não entendeu o porquê da sua reação, mas todos os criados
fizeram o que ela pediu e deu água e comida aos necessitados.
Porém, ela logo entendeu o que a escrava quis dizer, pois os famintos
ali, logo que começaram a receber os alimentos passaram a brigar severamente
uns contra os outros, longe de qualquer repartição de comida.
Amira nunca viu tamanha selvageria, e no final tudo estava sujo de terra,
e mesmo assim os que conseguiram alimento, o comeram rapidamente antes que
qualquer um tivesse a oportunidade de lhes tomar.
Os olhos da Amira encheram-se de lágrimas e os criados apressaram-se a
se afastar. Quando distante o suficiente, a mais desacanhada das criadas baixou a
cabeça e disse:
— Minha senhora, perdoe minhas palavras. Mas não deveria dar auxílio
casual aos necessitados, se a senhora deseja realmente ajudar os pobres, um dia
de alimentação cuidadosamente dividida não irá salvá-los — E com essas
palavras ela sequer tinha coragem de olhar nos olhos de Amira, não sabia se
seria condenada por suas palavras, mas era preciso. E Amira sabia disso,
precisava ter visto para ter entendido o que ela queria dizer e tristemente
concordou.
— Sim... fui muito ingênua por não ter ideia do desespero dessa gente.
A imagem ainda gravada em sua mente, fez com que Amira não soubesse
mais se havia feito algo de bom. Era atormentador e ela podia entender o que sua
serva tentou alertar, e o que a outra falou de forma mais ousada, mesmo que
contida. E principalmente porque Khalid fez com que o seu desejo de vingança
parecesse tão tolo, quando comparado à situação que o povo vivia e que acabara
de presenciar. Aflita seguiu a viagem, refletindo se realmente não estava
pensando muito em si. Ansiava a vingança com sua alma, em seu coração queria
Khalid e na mente se via em uma tormenta de pensamentos.
Quando enfim chegou à cidade em que ficava o palácio, a pobreza era
igualmente vista em contraste com a riqueza no mesmo lugar. Ouvira falar da
boa fama do passado pelas criadas, assim como da má fama atual, mas ver com
seus próprios olhos era realmente assustador.
Todos festejavam a chegada da misteriosa mulher, as histórias sobre sua
beleza se espalharam para todos os lados, todos que tinham forças para ficar de
pé esticavam-se para tentar espiar. E isso causou uma dor descomunal no peito
de Amira. Ela não era tudo isso que o Said falava e muito menos o que as
pessoas aumentaram de sua fama.
Mas mesmo assim, teria que se fazer passar por isso. Fez uma expressão
firme, embora ninguém pudesse ver nada além de sua postura, mas fora feito
mais para si do que para os outros, tinha que levantar as muralhas ao redor do
seu coração. Ou ao menos era isso que ela pensava.
Entretanto, sua confiança e raciocínio foram interrompidos quando uma
criança entrou no meio do caminho em frente ao seu cavalo. Amira puxou as
rédeas, gritando com tamanha força que o cavalo empinou relinchando, ela caiu,
sentindo uma forte pancada em seu traseiro, dor pulsante, desnorteamento e
confusão, nublavam seu raciocínio e visão, mas ela só tinha um pensamento: O
menino.
Queria tirar o acúmulo de véu da frente dos seus olhos para procurar o
menino, porém os servos vieram em sua direção, cercando-a, assim como as
pessoas que assistiam. Todos estavam em seu caminho e isso a irritava e a
deixava ainda mais preocupada.
— Estou bem, estou bem... o menino! O menino! — exclamou
desesperada ainda no chão tentando engatinhar até a criança e neste instante, o
que ela viu a surpreendeu.
Vestes negras, uma pessoa com o corpo completamente coberto de vestes
negras estava encolhido ali. Tentou levantar-se sozinha, mas suas pernas
fraquejaram. Então, a pessoa que estava ali abaixado onde estava o menino
levanta-se com ele nos braços, provando ser um homem, pelo seu tamanho. De
alguma maneira, Amira sentiu uma sensação familiar, que fora confirmada
quando ele tirou o tecido que cobria sua cabeça e tampava seu rosto. Sorrindo e
acenando para o povo que começara a exclamar e agradecer.
— Príncipe Khalid! É o príncipe!
Muitas pessoas exclamavam de forma que Amira pôde entender apenas
isso. Tudo parecia ser tomado por uma grande festa. As criadas de Amira a
ajudaram a se levantar e arrumar-se. Independente de como parecesse, estava se
sentindo feliz que nada aconteceu com o menino e com o coração aquecido ao
poder retornar a ver o príncipe.
— Abençoado seja! — gritou uma mulher aos prantos, indo em sua
direção e tomando a criança de seus braços.
— Tomamos um grande susto, não é? — falou docemente a ela que não
parava de agradecer com o menino nos braços.
Ele se virou de frente para Amira logo depois, de onde estava curvou-se
à ela respeitosamente. Como o que de fato era em toda sua majestade. Um
príncipe de um império.
— Famosa Flor do Deserto. Seja bem-vinda e recebida pelo nosso povo,
todos ficaram animados e esse menino um pouco mais. Espero que não pense
mal de nós.
— Jamais pensaria tal coisa, vossa alteza. Lamento que tenha passado
por uma situação tão perigosa, eu deveria ter percebido a movimentação do
menino...
— Por favor... não fale mais... Você até mesmo caiu do seu cavalo para
evitar o pior. Você também deveria estar recebendo os elogios do meu povo! —
ele disse isso e as pessoas que estavam em silêncio pareceram perceber a falta de
tato que estavam com ela e voltaram a fazer barulho, mas desta vez
agradecendo-a e elogiando pela bondade. Neste momento, Khalid aproveitou
que as atenções do povo recaíram sobre Amira, cobriu sua cabeça e partiu. Ela
teve então a certeza que ele era um homem amado pelo seu povo e,
independentemente do que aconteceria esta noite, o povo o aceitaria sem
ressalvas.
CAPÍTULO 07
A mira estava com os olhos fixos ao longe e com a mente dispersa demais
para notar os movimentos ao seu redor. Todos estavam curiosos sobre
ela e isso já não era um segredo, então, as pessoas estavam se
aproximando, para de alguma maneira ter um vislumbre de seu rosto. Um dos
guardas, por precaução, tomou a frente, segurou-a firmemente pelo braço e a fez
andar até o seu cavalo que acabara de ser recuperado, e com cuidado e alguma
rapidez a ajudou a subir.
— Falta pouco, tenha um pouco de paciência e aguente um tanto mais a
dor. — disse o homem de maneira gentil, enquanto ela arfava de dor.
Amira assentiu delicadamente, grata, mas fora sôfrega o final da viagem
até o palácio, tendo a sensação de que a dor aumentava a cada segundo.
Na chegada ao palácio, ela mal conseguiu ver qualquer coisa, pois fora
encaminhada diretamente para o harém, onde como era suposto todas as
mulheres estavam presentes e alinhadas para recebê-la. Assim como alguns
eunucos de vigia atrás delas, próximos à parede.
Amira estava sendo tratada como uma princesa, devido à fama que a
antecedia.
Sentia-se como se fosse uma existência de outro mundo, um objeto raro
ou uma joia nunca vista. Sentia sua confiança vacilar, quando pensava pela
primeira vez na extensão que pode tomar uma história passada de boca em boca.
Ela podia ser boa em tantas coisas, mas não tão incrível quanto eles imaginavam.
Engoliu em seco e como os professores diziam: “Ninguém se importa com o que
não podem ver. Cative quem realmente interessa e do resto conquiste a
simpatia.” Desde que as inseguranças não transparecessem, ela acreditava que
ficaria tudo bem. Mulheres não tinham muito poder, mas com algum charme sua
opinião poderia ter alguma valia.
Ademais, não acreditava que a boa recepção duraria por muito mais
tempo, afinal independente da fama, ainda era só uma escrava e como prova de
seus pensamentos e suposições, quase todas as mulheres olhavam-na com
cuidado sem saber o que esperar. No entanto, havia uma pessoa no final do
corredor com tantos rostos desconhecidos, que Amira não teve que pensar muito
para saber quem era. A criada Chefe.
Não tinha uma expressão de pessoa gentil e tão pouco parecia que seria
com ela, seu olhar deixava isso bem claro. Não escondia sua animosidade com
ninguém. Amira vestiu sua melhor “máscara” e seguiu andando em direção à ela
com suas servas como companhia e a cumprimentou devidamente sem perder a
classe e sem se curvar mais do que uma criada merecia.
Amira fazia naquele instante a personificação da calmaria serena, do
vento que molda o seu caminho e faz sua tempestade quando preciso. Parada,
esperando a reação da criada, seja para desdenhar ou apenas mostrar o caminho
que deveria seguir.
A mulher a cumprimentou em uma reverência. Um breve silêncio reinou
no ambiente quando a criada chefe ainda com o corpo baixo, escutou um som
vindo atrás de si e saiu do caminho. Amira levantou os olhos ao mesmo tempo
em que surgiu em seu campo de visão uma forma brilhante e reluzente, uma
mulher coberta de joias e uma coroa muito brilhante.
De cabelos vermelhos, olhos esverdeados e uma expressão doce, assim
como uma pele branca, como uma pétala de flor. Pequena e delicada, não tão
jovem, mas com uma presença leve e juvenil. Algo suspeito existia nela, uma
falsa sensação de bondade.
Tudo naquele semblante parecia calculado.
Estonteante, bonita e perigosa. Se Amira estivesse supondo
corretamente...
— Sultana, sinto-me agraciada em vê-la logo à minha chegada... —
reverenciou curvando-se.
— Oh! Parece que foi bem instruída! — disse animada e empolgada
como uma jovem menina e então olhou para as criadas atrás de Amira. A garota
sentiu um forte arrepio tomar-lhe a coluna. — Estava interessada com a célebre
Flor do Deserto, é uma pena que esteja tão coberta...
Ela parecia lamentar, mas Amira nunca se deixaria levar, não passava de
uma escrava bem cara e ela uma Sultana. Por reflexo, lembrou-se do príncipe
Khalid, prometendo-lhe o cargo de sultana. Não sabia se deveria se agarrar a
isso, mas no momento era a única coisa que podia fazer.
— Rogo o seu perdão, Sultana. São ordens do Sultão... Lamentaria que
a Sultana recebesse algum castigo de vossa alteza. Informaram-me das ordens de
castigo à quem me visse antes do tempo... Se possível, gostaria que ninguém
sofresse por minha culpa — Amira falou de maneira serena, ao mesmo tempo
em que virava a cabeça para as pessoas ao redor com preocupação.
— Sim... Bom, contaram-me que se feriu ao proteger uma criança, quão
virtuosa e valiosa é. Deve estar ferida. Tadinha. Veja! Está suando frio! — falou
em uma voz lamuriosa, se aproximando e tomando sua mão — Precisa de um
médico!
Esta mulher sabia atuar de forma aterrorizante, guiando-a entre as
pessoas rapidamente como uma serpente, até chegar a um corredor longo e bem
iluminado, deixando as pessoas para trás sem soltar a sua mão.
Quando Amira deu-se conta do que estava acontecendo, de que
simplesmente a tiraram de seu caminho, seu instinto se alarmou e o coração
perdeu o compasso sem entender absolutamente nada. Ao mesmo tempo, a
mulher falava de uma forma tão dócil que poderia confundir e até mesmo fazê-la
simpatizar. Perguntava à Amira se os passos estavam rápidos demais para ela e
se sentia dor, e então enquanto esperava de alguma forma ser jogada cruelmente
para fora do palácio, fora entregue aos cuidados de um médico.
— Oh! Grande médico, a tempo não o vejo! Espero que esteja passando
bem, peço com humildade que cuide com zelo de nossa bela flor do deserto.
Sim? Pobre, tão boa com o povo e acabou se ferindo. Bom, agora deverei partir,
não irei mais intervir em seu caminho, deve estar fadigada... — disse levando a
mão ao rosto de Amira sobre o tecido.
Ela virou-se a deixando ali com as criadas de companhia e o médico do
palácio. De alguma forma, esta mulher assombrosa levava Amira a seguir o seu
fluxo como água. Sequer conseguira notar o caminho que foi feito, tamanha a
manipulação da mulher.
Se Amira não tomasse cuidado, ela seria pega e castigada, pois diferente
do Sheik, a Sultana fazia da mentira uma verdade irrefutável.
(...)
O doutor encheu-a de perguntas. Fez Amira narrar em detalhes o que
aconteceu e falar de suas dores. Quando terminou o relato, o médico a examinou
e mandou passar um tipo de pasta onde estava ferido que logo melhoraria nos
próximos dias.
Amira estava ajeitando as vestes quando a criada chefe adentrou a sala.
Olhou-a friamente e então levou o olhar ao médico.
— Fui permitida pelo sultão a verificar a legitimidade da Amira.
Ao contrário de todos que Amira vira recentemente, a criada parecia
infeliz em ter sido incumbida deste dever. A garota concordou com a cabeça e
logo que o médico lhes deu alguma privacidade, junto com as demais criadas,
começou a tirar os tecidos que lhe cobriam a face. Quando terminou, ficou
parada encarando a mulher. Fazia tempo que não viam seu rosto e ela mesma se
perguntava se tinha algo surpreendente nele.
A criada tirou do meio de suas vestes um papel, o abriu e intercalava o
seu olhar entre o papel e Amira. Fez tamanho pouco caso, que a deixou um tanto
acuada, apenas a avaliou como um pedaço de carne ou mercadoria qualquer.
Aproximou-se mais e levantou bruscamente as vestes dela, verificou suas pernas
e pés. Aproveitou que ali estava e enfiou sua mão entre as pernas de Amira,
verificando sua virgindade de uma forma brusca, machucando-a no processo. A
jovem se sentiu constrangida, ao mesmo tempo, que surpresa, porém se manteve
imóvel até o fim da avaliação rude da mulher.
Tinha certeza que ela buscava qualquer defeito para que a pudesse
condenar. Por isso, controlou suas expressões para não demonstrar dor ou
desconforto.
Neste momento Amira teve um vislumbre do papel que ela segurava,
parecia o desenho que alguém tinha feito dela de memória, pois de fato jamais
tinha posado para qualquer artista. Se perguntou se fora um de seus professores.
Assim que terminou, limpou a mão com nojo e desdém, e como
aparentemente não encontrou nada de errado, afastou-se. Amira voltou a vestir
os véus sobre o rosto e quando terminou, a criada chefe saiu do aposento e as
criadas retornaram.
Amira fora levada a um aposento grande, preparado para os seus
cuidados, assim como da primeira vez, banharam-na e cuidaram de sua senhora
da melhor maneira possível. Levando em conta que não poderiam ver seu rosto.
A garota já estava cansada destes véus e como isso interferia em uma simples
tarefa.
Tão logo que seu corpo foi limpo e massageado, com cuidado, banhado
de elogios pelas criadas que insistiam em a bajular. Ao se sentir completamente
limpa e seca, sentia-se renovada e por pouco quase não se esquecia das dores no
traseiro que tinha.
— O sultão ficará perdidamente apaixonado por você, minha senhora.
Amira sabia que não era a intenção, mas as palavras da criada a fez abrir
bem os olhos e sentir o ar faltar em seus pulmões. Sua mente vagou para o dia
em que o Sheik pareceu se interessar nela sexualmente. O toque dele a fez ter um
grande mal estar, a sensação daquele dia, o desespero de tentar se livrar das mãos
dele... Amira tinha medo que com o sultão isso se repetisse, de demonstrar isso
em sua feição, tinha medo, muito medo e desta vez ela não poderia fugir, não
poderia lutar. Este não era um lugar que ela poderia ser indomada, como no
palácio de Said. Não se ela tivesse o mínimo desejo de viver.
Puxando o ar com força e o retendo, nervosamente, sentia o sangue
parecendo pulsar lentamente pelo seu corpo. Amira tentou não se movimentar
muito, não transparecer com muito sacrifício.
As servas seguiram embelezando-na, alheias aos pensamentos de
Amira. Trouxeram para perto dela os seus baús de joias. Os abriram e de lá
retiraram finos cordões de ouro e joias dos mais diversos tipos, os colocaram nas
suas mãos, pés, braços... A vestiram com um fino tecido, leve, sedoso, que lhe
moldava o corpo, mas que também era fácil de retirar.
Amira tampouco se importava com as joias, tecidos ou o que mais a
fizesse irresistível ao Sultão Fahir. Não era como se não soubesse, ou tivesse
conhecimento. Mas irracionalmente via-se aterrorizada.
Somente quando as garotas terminaram, Amira saiu de sua própria
mente, via-se em pé, como uma boneca ornamentada preciosa, reluzente e de
fato, podia imaginar que estava atraente a qualquer olhar masculino, devido ao
tanto de suspiros que suas criadas davam, felizes com o seu trabalho. Amira lhes
agradeceu, com um sorriso trêmulo. Elas pareciam tranquilas, embora
eventualmente a olhassem de soslaio, devido ao seu silêncio. Talvez ela estivesse
exagerando, ponderou. Talvez, não deveria ter tanto medo. Mas agora que
estava próximo, não conseguia evitar.
— Senhora...
A mais dócil das criadas aproximou-se cuidadosamente, já não tão
empolgada e animada.
— Está nervosa devido sua noite com o sultão, não é?
Ela se ajoelhou diante de Amira, que não tinha confiança na sua voz para
qualquer coisa que fosse. Por este motivo, apenas engoliu em seco e acenou.
— Minha senhora, hoje você tem a oportunidade de cativar o sultão.
Pode acabar virando uma favorita e viver na comodidade. Poderá quem sabe
mudar a realidade daqueles pobres miseráveis. Ou... apenas viver como um
adorno no harém. Também não é ruim, se a senhora for obediente. Com tristeza,
informo o que já sabe, a única escolha que a senhora não tem, é sobre estar com
o sultão — disse lamuriosa, mas em um tom de consolo e simpatia pela
preocupação de Amira.
Desde o início, ela parecia mais disposta a se apegar com Amira. E seria
mentira se dissesse que não sentia a sinceridade e o bom coração da mulher
diante de si.
— Qual o seu nome? — perguntou simplesmente Amira.
— Aaliyah…
Era um nome parecido com o que teve um dia e fora esquecido, isso fez
o coração de Amira vacilar um pouco mais. E um sorriso doloroso tomou os seus
lábios antes de dizer:
— Obrigada, Aaliyah… — agradeceu com a voz embargada de tamanha
gratidão.
Há quanto tempo Amira não recebia este tipo de cuidado? Da última vez
ela falhou e alguém pagou o preço. Desta vez não. Amira tomou a mão da serva
entre as suas, sentando-se no chão diante dela em uma gratidão que não lhe cabia
no peito quando infelizmente, suas lágrimas romperam de uma só vez e ela não
conseguiu parar de chorar.
Valorizaria de todo coração, todos que de fato fossem bons com ela.
Todavia, em meio as suas lágrimas, sentia o peso de suas escolhas e seus
deveres.
sol que já estava alto, iluminando bem o caminho de Khalid. Este que ia
Amira, que tinha sido deixada no aposento, viu-se cercada pelos poucos
guardas que ficaram para trás, ao longe escutava as falas de forma sibilada de
Khalid. Ela sabia que eles estavam tão intrigados com o que aconteceria quanto
ela, mas ficaram exatamente no mesmo lugar. Contudo, ela por outro lado, dera-
se conta que ele não deixou ordens expressas para que ela fosse impedida de sair
daquele local. Amira sorriu travessa, enquanto com cuidado fora pelos cantos,
para poder ir espiar sem que fosse muito notada, ao menos por quem estava lá
fora.
Observou que estava um silêncio mortal agora, Khalid estava em frente
aos seus súditos e ao seu redor tinham alguns de seus homens que faziam a sua
escolta. Amira não sabia o que estava causando aquela tensão toda. Será que
algo nos planos de Khalid deu terrivelmente errado? Indagava-se ela.
Os homens diante de Khalid pareciam inseguros e os guardas em alerta.
Amira tinha que ajudar ele, as pessoas não sabiam quem era ela, pois devido ao
falecido sultão Fahir, estivera o tempo todo com o rosto coberto, contudo,
mesmo que as pessoas não a reconhecessem, bastava Khalid confirmar a sua
identidade, certo?
Amira corrigiu sua postura e estava pronta para ir lá fora e contar o que
aconteceu na noite anterior e o que mais tivesse que fazer. Pois se sentia muito
aflita com toda a tensão e exposição de Khalid ali diante de seu povo. O que a
fazia lembrar-se de quando estavam em meio ao deserto e ele disse como se
preocupava com eles. Khalid podia não ser portador de toda a confiança de
Amira, mas ela sentia em alguns momentos a sua verdade e este era um deles.
Mas ao mesmo tempo e sem que Amira se desse conta dos barulhos de
passos que vinham de trás dela, pois estava perdida demais em pensamentos para
reparar, a sultana Kelebek a passos largos, rápidos e nervosos, ia em sua
direção. A mulher parecia transtornada e como se um espírito maligno tivesse a
possuído e deixado em um estado de loucura fulminante, com seus cabelos
vermelhos despenteados, o vestido amassado e o rosto com marcas de lágrimas.
Quando Kelebek alcançou Amira, sem qualquer cerimônia, apenas
passou a mão pelos longos cabelos negros dela, enrolou entre seus dedos e sem
se importar como a garota caminharia, apenas saiu a puxando para fora,
ignorando os sons de protesto e de dor da menina, apenas focada em fazê-la
cambaleante ou não, sair de onde estavam e serem vistas à luz do dia.
Amira não sabia sequer de onde aquela mulher havia aparecido. O que
tinha acontecido e como foi que subitamente ela foi parar diante de todos, sem
uma bela postura para poder ajudar Khalid, mas sim como uma mulher
diminuída e inferiorizada, sob as mãos da grande Sultana. Khalid, como os
demais homens que faziam a sua escolta, assim que escutaram os sons vindos de
trás deles, apenas se viraram e se viram surpreendidos quando Kelebek jogou a
garota aos pés de Khalid e exclamou:
— Exijo a morte desta mulher! Eu sei, sei que está ligada à morte de
Fahir! — exclamou ela dramaticamente, olhando furiosa para Amira.
Amira a olhou de baixo para cima, chocada e confusa, enquanto a
mulher apenas gritava e apontava para ela. Se parecendo de fato uma mulher
atormentada pela morte do marido, muito diferente da Kelebek que tinha visto
mais cedo, aquela que parecia transtornada por seus planos não estarem indo
como queria. Amira ainda estava confusa, de como tudo acabou assim e o seu
curto plano de ajudar Khalid, se converteu em um descuido, em sua possível
ruína. Amira abaixou a cabeça, olhando para o chão, fazendo-se de
extremamente triste. Porém, na realidade, apenas pensava em como sair daquela
situação.
A sultana queria se fazer de coitada, a pobre mulher que perdera seu
amado e que apenas queria justiça, pensou Amira, ponderando. E esta era uma
coisa que ela também poderia fazer...
E então, Amira levantou o olhar e se virou para Khalid, agarrando a
barra de suas vestes.
— Estou sendo injustiçada! — clamou — rogo pela misericórdia e pela
sua incrível sabedoria, vossa majestade. Cheguei a pouco ao palácio, caí de um
cavalo e fui tratada por estar ferida, por quase todo o dia até o momento de
encontrar-me com o sultão. Ele mandou-me dançar! Apenas isso e logo depois
os homens de preto chegaram! Eu não sabia, vossa majestade! De nada… Oh!
Por Alá! Eu estava tão apavorada!
Khalid queria levantar a sua adorável prometida, mandar decapitar a
mulher que lhe causara mal e lhe fizera passar por esse papel ridículo, entretnato
não poderia fazer como queria em uma situação desta. E neste momento todo seu
autocontrole e desejo de proteger Amira, fora colocado em teste. Enquanto,
Khalid sentia-se entre a cruz e a espada.
— Mentirosa! — exclamou a sultana — Eu perdi meu marido no dia
em que você chegou… eu o quero de volta!
Kelebek deixou-se cair no chão de joelhos chorando como uma menina,
inconsolável.
Amira, ao recordar da face do velho sultão, realmente sentira tristeza. O
homem parecia gentil e ele realmente foi, parecia solitário de alguma forma...
Não conseguia odiar, ou não lamentar a morte do homem. Lágrimas se formaram
em seus olhos, enquanto olhava Khalid, que parecia impassível. E então com
cuidado, Amira virou-se para a população de civis e soldados que estavam ali
assistindo tudo:
— Senhores, jamais viram meu rosto. Mas sabem quem sou, devido à
conversa: A flor do deserto! Vocês me viram ontem quando cheguei! O quanto
me machuquei. Mal tive contato com alguém se não as criadas mandadas pelo
próprio sultão. Vocês têm que acreditar em mim, sou inocente! — exclamava
Amira, com seus olhos muito azuis, devido ao destaque que recebiam em meio
às lágrimas.
O som das vestes da Sultana se levantando, fez com que o olhar de
Amira se voltasse para ela. Assim como dos demais. Até que ela anunciou:
— Eu… — começou a sultana, levantando o olhar, pousando-o sobre
Amira e então voltou a si mesma, quando levou as mãos ao próprio ventre —
Sequer tive tempo de dizer a ele que seria pai novamente!
CAPÍTULO 11
T
odo o palácio se viu mergulhado em um profundo silêncio, ao ponto em
que se uma agulha caísse ao chão, o som chegaria aos ouvidos de todos.
A tensão imperava, todos estavam sem fala por motivos diferentes,
perdidos em seus pensamentos. Por coincidência, tanto Khalid quanto Amira,
pensaram o mesmo, ao mesmo tempo: Maldita víbora!
Ainda dentro dessa coincidência, seus olhares se encontraram, buscando
a reação um do outro. Amira estava pálida, pois tinha escutado a conversa da
sultana, embora não tivesse contado a Khalid. O que a fez se arrepender de não
ter dito no instante em que o tinha visto. Independente de suas inseguranças, ele
era o seu único aliado. E para piorar e pesar ainda mais sua própria culpa, no
instante em que seus olhos se encontraram, soubera que não era ele que estava
com ela. Pois assim como todos, ele estava chocado e surpreso.
O ar saiu com um pouco mais de força pelas narinas de Amira, que
descia o olhar ao chão. Sentindo-se uma completa tola. Levantou o olhar em
seguida e viu a sultana que ganhava cada segundo mais olhares de piedade do
povo e inclusive dos soldados que faziam a guarda de Khalid. Dentre todas as
horas para falar sobre isso... justo agora a sultana tinha que ter falado.
Amira se lamentou desta vez num suspiro suave, quase imperceptível.
O som dos passos chegara aos seus ouvidos e fizeram tanto Amira
quanto Khalid levantarem seus olhares. Vizires[6], Pashas[7], Eunucos [8]e tantas
pessoas mais do palácio foram ao pátio ver o que estava acontecendo e oferecer
alguma ajuda. Contudo, pararam perto das portas ao perceber o clima que estava
pairando, tenso, embora não estivesse mais tão hostil como anteriormente.
Tudo aconteceu e se desenrolava rapidamente, trocas de olhares,
pensamentos agitados, raiva, confusão, lamento, tantos pensamentos em curtos
segundos, tantas conclusões, tantas reações em uma velocidade que poderia ter
uma margem de erro enorme em alguma decisão precipitada. Todos prendiam as
suas respirações ansiosos e nervosos.
Mas mesmo assim as emoções tomaram a mente de Khalid e Amira de
uma forma em que não poderia ser diferente.
Amira tinha medo do seu futuro incerto, a morte nem era o que mais
temia. Se fosse trancada novamente em algum aposento e se pior ainda, fosse
devolvida ao Sheik. Se voltasse, seu retorno iria ser muito pior. Ele estaria
furioso, e não teria mais nenhum motivo para pensar em não lhe fazer mal.
Amira mordia o interior dos seus lábios, com lágrimas se formando em seus
olhos em apenas pensar no homem que dispunha de todo o seu ódio e lhe
causava, em igual medida, terror.
Khalid só sabia recordar do passado, maldizer mentalmente a posição
que tivera que se meter para poder alcançar seus objetivos. Pois a mesma
posição que lhe dava poder, o impedia de apenas mandar essa mulher caluniosa,
falsa e manipuladora, calar-se e queimar no canto mais escuro do inferno. A
sultana Kelebek tinha muitos aliados e este era o maior problema, ela construiu
uma boa imagem perante a maior parte da população. Ademais, a posição o fazia
se lamentar de não poder simplesmente acolher Amira e protegê-la de todo o
mal, pois isso o faria igual ao pai, burlando todas as regras por uma mulher.
Khalid olhou para Amira, não conseguia ver a sua face, mas uma vez
que fez a sua escolha, sua expressão ficou dolorosa por alguns instantes antes de
voltar o seu olhar para frente.
Ela é o amor da minha vida, a pessoa que fez morada nos meus sonhos
mais doces. Ainda que a magoe, ela estará segura. Pensou Khalid.
Amira sentiu um arrepio percorrer sua espinha, uma sensação de terror
invadia suas entranhas, enquanto olhava paralisada, as pessoas que pararam atrás
da sultana. Além disso, escutava o povo começar a murmurar lamentando-se
pela mulher. Sentia-se cercada de pessoas que a odiavam e isso lhe trazia uma
sensação de pânico e desespero, inquieta, sozinha, perdida, sem ninguém ao seu
lado.
Sua respiração travava na garganta e não importava o quanto de ar
puxasse, não era o suficiente. Queria simplesmente levantar e sair correndo,
coisa que não lhe era permitido. Seria o mesmo que dizer que sim, era culpada.
Mas não era, não totalmente.
Em sua mente ela sabia que as pessoas lhe olhavam com atenção, mas
em seu entendimento era como se os olhares não fossem curiosos e sim
acusatórios e isso causava outra reação na jovem, a lembrança dos olhos azuis
das pessoas que massacraram todo o seu povo e família.
Mas você não está mais naquela época, é um passado muito distante.
Dizia a si mesma, tentando se agarrar num fio de lucidez.
Ela ergueu o olhar a Khalid, sabia que ele era um sultão, que tinha que
agir de acordo com a sua posição. Mas se todos estavam de acordo com a
sultana, sua cabeça estava em risco. Ela temia, Amira tremia, pois tudo
dependerá das escolhas de seu senhor. Ele só poderia fazer uma coisa se fosse
pressionado demais, obedecer aos desejos dela devido seus apoiadores.
Amira engoliu em seco e olhou para o chão, conforme as lágrimas
molhavam a sua face, mas não poderia ficar parada esperando a sua condenação.
Calma, Amira. Você não pode se deixar levar pelas coisas que estão na sua
cabeça. Pensou consigo, tendo um pouco mais de confiança em si mesma.
Colocou-se com cuidado de joelhos no chão e ousadamente segurou a ponta dos
dedos de Khalid.
— Vossa majestade... — falou Amira em um murmúrio, ainda com os
olhos lacrimejantes — Acredite em mim… Também desejo justiça ao sultão
anterior, o qual me tratou com tamanha doçura. Jamais ninguém tratou uma mera
escrava como eu, como algo tão… valioso.
Khalid nem sequer virou o olhar em sua direção, seu maxilar apenas
ficou mais marcado conforme ele fechava a boca com força. Ela não poderia
julgá-lo, tinha plena consciência que Khalid era agora o Sultão que tanto queria
ser e por dever teria que ser imparcial. No entanto, nada impediria que ela se
sentisse magoada e traída, pela indiferença vinda dele. Ele a tratava com tanto
carinho, entretanto, quando ela mais precisava de qualquer tipo de consolo dele
para aliviar o pavor que sentia dentro de si, ele parecia não se importar com ela.
Khalid engoliu em seco, desejando tomar em seus braços a mulher
amada, mas apenas afastou a mão dela e ainda sem a olhar, disse usando toda a
sua supremacia:
— Levante-se, é a minha concubina e se você está mentindo, eu também
estaria, já que nossas versões de história são praticamente as mesmas. Apenas de
ângulos diferentes — disse, envolto numa confiança e calma assombrosa que
nem de longe Amira sentia. Ela se recompôs, não queria ser vista como vergonha
ou algo parecido.
Neste ponto a sultana engoliu seu choro, ao se dar conta que de fato, se
Khalid tinha contado uma versão similar à da menina, independente de qual
fosse, ao acusar a garota de farsante, estaria acusando o próprio sultão. Então,
neste instante a cor fugiu de sua face.
Amira se levantou, ainda aturdida com as palavras dele e quando por
instinto buscou o olhar da mulher que a acusou, percebeu que não fora a única
que recebeu o impacto das palavras de Khalid. Assistiu o homem caminhar
calmamente até a Sultana Kelebek.
— Imagino o quão grande é a dor em seu coração — disse sonoro ao
estender a mão à mulher ruiva que ainda tinha os olhos vermelhos devido o
choro e sua mão ainda estava pousada sobre seu ventre — Lembro-me que
quando a peste assolou o palácio e você adoeceu, meu honroso pai ficou
completamente devastado. Na sua melhora, no entanto, que teve o preço da vida
do filho de vocês, meu irmão e este lugar caiu no mais completo luto.
Khalid respirava com calma, mantinha sua voz neutra em uma
tranquilidade soberana de quem conta uma história. Mal sabiam as pessoas que o
assistiam levantar a mulher, limpar seu vestido e até mesmo arrumar a coroa de
diamantes que estava em sua cabeça, o ódio mortal que tinha por ela, o nojo que
sentia de si mesmo e o grande desejo de banhar-se e limpar seu corpo da sujeira
impregnada na alma da sultana. E como se lamentava em não poder ser o
homem que Amira merecia naquele instante. O homem que não deixaria
ninguém a inferiorizar, nem que a fizesse se sentir assim. Porém, naquele
momento, ele tinha que fazer o que tinha que ser feito.
— Agora, um novo filho em seu ventre. Oh! Sultana, é triste e tão feliz
notícia. Mas tranquilize-se… — disse ele fazendo uma pausa, pouco antes de se
virar de frente para todos e sorrir — No meu sultanato, não faltará nada ao meu
irmão. Farei tudo para que ele seja feliz e tenha os mesmos grandiosos
ensinamentos que meu pai me deu.
Neste instante, quase ninguém percebeu, entretanto, Amira sim. O
contraste do sorriso de Khalid e a expressão aturdida da sultana no instante em
que ele falou “Meu sultanato”, fora quase cômico e os temores da menina
pareciam se diluir. Aos olhos nus era nada além de uma constatação da verdade:
ele era o novo sultão e ninguém poderia mudar isso. Além disso, soaria aos
outros que ele realmente apenas desejava o melhor ao futuro jovem príncipe ou
princesa. Mas aos olhos de Amira e aparentemente da sultana, parecia uma
provocação deliberada e Khalid, não o bastante, não acabou por aí:
— Lamento imensamente a morte do meu pai e não pouparei esforços
para pegar cada um dos responsáveis — falou ele claramente, com um quê de
raiva de quem busca a justiça pelo preço que tivesse, contudo, em seguida ele se
virou de costas para seus súditos e falou apenas para que a sultana escutasse: —
Lamento que meu irmão nunca sequer chegue a ser um possível sucessor, já que
dois sultões não existem na mesma dinastia, não mandarei que executem meu
irmão. Não derramarei mais sangue de minha família do que já foi derramado.
O olhar da Sultana vacilou, ela acabou por dar um sorriso discreto, como
se visse ali uma oportunidade, porém o mesmo sorriso foi roubado logo em
seguida:
— Claro, que é possível às facções virem me derrubar… Mas terão que
trabalhar um pouco mais arduamente para isso — concluiu ele, dando-lhe um
olhar desafiador e virando-se ao seu povo, ao mesmo tempo em que enfiava a
mão dentro de suas vestes, tirando um pedaço de tecido.
Ele levantou o tecido e mostrou para todos.
— Fui interrompido mais cedo, mas seguirei com minha narração, pois
informações importantes ainda não foram ditas. Sob as investigações minuciosas
dos meus servos, encontramos uma importante pista de quem foi um dos
culpados.
A sultana exclamou surpresa e se aproximou perguntando:
— Khalid! Sabe quem é? Preciso saber que o culpado foi pego e
somente então poderei encontrar paz para o meu sofrimento! — A mulher
continuou em seu jogo de manipulação, então Khalid, apenas em silêncio, olhava
para a mão da mulher que se agarrava à barra de sua roupa.
Ao se dar conta de sua ousadia, ela o soltou, mas seguiu o olhando
esperançosa. Amira, de igual maneira, caminhou cuidadosamente um pouco
mais para perto. O povo estava ansioso para finalmente saber mais informações.
Khalid, caminhando mais para frente para que eles pudessem ver melhor,
prosseguiu sua narração:
— Como sabem, os atacantes vestiam-se de preto e como podem ver este
tecido não é preto. Pensei que poderia ser de alguma outra pessoa, contudo,
quando pensei e refleti sobre isso, cheguei à conclusão. Os envolvidos são
pessoas de dentro, ninguém entraria no palácio sem ser notado ou se aproximaria
do aposento do sultão sem que ninguém visse, muito menos escaparia se já não
estivesse aqui. A pessoa jogou as vestes negras por cima de sua roupa habitual.
O palácio passou a noite inteira em alvoroço, poucos tiveram o luxo de dormir,
então o culpado ainda está com suas vestes originais… faltando um pedaço.
A exclamação foi geral, todos os vizires, eunucos e pashas discutiam
entre si, exclamando que condenariam a morte aquele que tivesse com as vestes
rasgadas. Porém, o que eles não contavam é que, no instante em que virassem
um para falar com o outro, a verdade viria à tona. Entre um deles, havia um vizir
e não qualquer um, mas o Grão Vizir[9], com as suas vestes rasgadas.
Khalid tomou o cuidado de não ser ele a apontar este fato, pois
finalmente os seus planos, voltaram a se alinhar embora tendo todo o transtorno
não planejado. E assim como ele queria, a própria sultana se virou procurando o
culpado, olhando os soldados e então deu-se conta que algumas de suas criadas
pareciam surpresas olhando algo. Neste instante um sorriso lento, vingativo e
satisfeito, brotou nos lábios de Khalid.
O olhar da sultana, assim como de todas as pessoas que também
pareciam ansiosas, recaiu sobre o Grão vizir. A sultana perdeu a cor em sua face,
as pessoas próximas a ele, pararam de falar e entreolharam-se e então o olhar
deles repousou nas vestes do homem. O homem, confuso, olhou para baixo e viu
o rasgo. Ele engoliu em seco e levantou o olhar lentamente, empurrando sua
roupa para trás caminhando até o sultão Khalid.
— Não fui eu vossa alteza, não fui. Alguém está tramando contra mim!
Sou inocente! — exclamava ele.
Os homens que faziam a guarda de Khalid, tomaram a frente e entraram
no caminho do Grão Vizir, que pareceu muito irritado com a interferência deles.
Os homens frente à insistência do vizir puxaram suas espadas forçando-o a se
afastar. O homem se silenciou com uma expressão de pura ira, se virou e olhou
para os demais membros importantes que pouco falavam com ele normalmente:
— Um de vocês! Eu sei que foi um de vocês querendo o meu cargo! Eu
não fiz nada contra o sultão, daria minha vida por ele! Mas um de vocês quer se
livrar de mim…
— Diante das provas e seu comportamento, ainda sim, insiste em sua
inocência? — Khalid perguntara com nojo e repugnância.
O mais novo sultão desprezava o tal homem que dotava de toda
confiança de seu pai e que era um aliado da mulher responsável por todos os
males dentro do palácio. Mas isso era só o começo e pegando primeiramente o
Grão Vizir, mostrava a todos em uma só jogada que ninguém, do mais alto ou
mais baixo nível, sairia impune. E Kelebek entendeu o recado, esquecendo até
mesmo de continuar atuando. Apenas ali nervosa e agora mordendo a ponta das
unhas em silêncio. Claro, que ninguém notaria tal coisa, afinal, estavam todos
prestando atenção demais no vizir que lutava contra a guarda pessoal de Khalid.
— Você crê, de fato, que alguém acreditará em suas palavras? —
continuou em tom de escárnio o jovem sultão — Homens, levem-no e tirem
dele todas informações possíveis, tenho certeza de que há mais pessoas
envolvidas! Eu farei justiça e limparei esse palácio do mal que está espalhado
como uma praga.
Assim que o homem finalmente foi levado, Khalid voltou sua atenção à
sultana e então se virou para Amira. A olhou ternamente então ergueu o olhar.
— Meus súditos, eu Khalid Alev Volkan, juro por minha vida que
corrigirei a distribuição de alimentos e tudo mais, para que possa fazer de nossas
vidas, não apenas as dos moradores do palácio, como de meu povo, mais leve. A
guerra já nos tirou tudo; pais, filhos, irmãos… Somos um império sem igual.
Mas por hora devemos olhar um pouco mais para dentro de nossas próprias
terras. Tantas lutas travei e nada é melhor do que estar de volta para casa.
Lamento que infelizmente dadas estas circunstâncias. Contudo, confiem na
minha palavra e que Alá me faça pagar por isso se mentir. Quero fazer deste
sultanato, próspero a todos nós. Provarei em minhas ações, começando por
executar todos que estiveram envolvidos com a morte de meu pai. Trabalharei
dia e noite para colocar em ordem tudo que fora deixado para trás. Por isso,
retornem às suas casas em segurança.
As pessoas pareciam finalmente voltar a se sentirem aliviadas, todo
nervosismo, ansiedade, medo e insegurança, toda agitação que deixava o clima
pesado em seus súditos parecia mais leve. Todavia, nem tudo tinha sido
resolvido. Khalid virou-se à sultana Kelebek.
— Sultana… — disse calmamente, sua voz não passava emoção
alguma à sua face. A mulher o olhou como se nunca tivesse o visto antes e por
alguns segundos os seus olhos faiscaram de ira — irei desconsiderar em um ato
de benevolência o fato que alegou que a minha concubina e eu estivéssemos
mentindo. Repouse, descanse. Tenho certeza que seu atual comportamento é
apenas reflexo de sua dor.
A mulher curvou-se de forma suave, em gratidão.
— Sim, meu senhor. Rogo seu perdão, não estava pensando como
deveria e lamento imenso pelas minhas palavras. Refletirei sobre isso na
mesquita, como o seu desejo… Acredito que realmente devo descansar… não,
não posso acreditar que aquele homem que possuía total confiança de meu Fahir,
pudesse ser o culpado… — concluiu ela em uma voz tão baixa como se falar em
voz alta era tornar pior ainda o que havia acontecido.
Para todos, uma mulher fragilizada de fato e se fosse só por isso, Khalid
quase teria acreditado. Se não a odiasse de todo o coração.
E la o repreendeu, apenas falando o seu nome e para quem visse de fora, era
quase um enorme “pecado”, afinal ele era o grande sultão! No entanto,
Khalid se divertia. Via com humor a jovem garota, exclamando como se
ele tivesse falado uma blasfêmia ou algo terrivelmente obsceno... Era doce como
estava surpresa, sequer parecia a mesma mulher capaz de seduzir um homem
com o olhar. Sua fragilidade tinha imensa força, uma força arrebatadora que
mesmo quando se fizesse de forte, em meio às suas próprias guerras, fazia com
que desejasse protegê-la a todo custo. Em contrapartida, também o instigava à
um desejo cru de conhecer mais das suas reações.
Controlando a sua expressão, Khalid se aproximou da garota, olhando-a
sério, mergulhando na profundeza dos seus olhos azuis, destacados pelo
vermelho que tomava o seu rosto. Ele sorriu somente quando seu rosto não
estava mais que um palmo de distância do dela. Então, disse em tom de
provocação:
— Oh… Parece que deixei corada a famosa Flor do Deserto... —
sussurrou ele, com seu olhar passeando pela face dela, antes de voltar para as íris
azuladas que tanto o encantavam.
Amira, em resposta deu um passo para trás, quase voltando à chuva.
Seus olhos mostraram sua surpresa e os seus lábios entre abriram sedutoramente.
Ela não sabia, no entanto, que este pequeno detalhe não passara despercebido a
Khalid. Ele que teve sua atenção atraída aos lábios dela, perdendo no caminho, o
seu sorriso. O seu pensamento sendo nublado pela vontade de simplesmente
puxá-la para si e provar o seu sabor.
Ela, diante das palavras e atitudes de Khalid, sentiu seu coração disparar.
Quando o homem se aproximou, tinha certeza que por alguns segundos seu
corpo inteiro parou, voltando a funcionar apenas quando ele terminou a frase.
Era absurdo como ele era capaz de mexer com ela tão fortemente, pois assim que
os seus olhos desceram aos seus lábios, ela sentiu seu coração voltar a bater forte
contra o seu peito dolorosamente.
A garota sentia sua boca seca, sob o olhar atento de Khalid e então
mordeu o lábio inferior, seu corpo todo estava quente e ela não sabia para onde
olhar ou o que fazer, nenhum daqueles treinamentos de seus antigos professores
a tinham preparado para um momento como aquele. A perspectiva de voltar aos
braços de Khalid era mais do que simplesmente atraente, era sedutora, mas
também muito constrangedora. Afinal, da última vez Amira se aproveitou da
situação nos braços daquele homem majestoso e do conforto que sentiu.
Um sorriso teimoso insistia em florescer em sua boca, pois a garota não
sabia e sequer conseguia conter sua felicidade, aqueles curtos momentos
descontraídos com Khalid eram muito bons. Somente ele, fora capaz de
proporcionar essas emoções à ela.
— Vossa majestade, está se divertindo em me constranger! — exclamou
a garota, num tom pouco convincente em sua revolta.
Na verdade, ela não se importava desde que fosse ele. Khalid não a
tratava como um objeto, mesmo diante da Sultana odiosa, ele a tratou como
igual e mesmo se ele a fizesse sentir tal constrangimento, ela sabia em seu
íntimo que era apenas uma forma que ele havia de divertir-se com ela e que não
eram seus verdadeiros sentimentos.
— E você gosta! — afirmou Khalid, ainda divertido.
O rapaz gostava de como ela não conseguia esconder seus sentimentos
dele, por mais que tentasse.
— O senhor está sendo desrespeitoso… — resmungou Amira, num fio
de voz, ponderando suas palavras. Entretanto, desejava dizer-lhe “Khalid! Seu
abusado!”. Somente para não admitir e dizer-lhe que desejava que ele a levasse
em seus braços.
O carisma de Khalid simplesmente a envolvia. Ele em um todo, era
sempre tão sério, embora suas falas fossem tão doces... Em seus polos opostos,
ela se via cativa.
Khalid queria continuar, adorava ver como ela ficava ruborizada. Era
doce, a forma como um sorriso teimoso insistia em seus lábios. Revelando que
embora estivesse constrangida, não era como se odiasse. Amira se afastava
abraçando-se, tímida e inconscientemente, instigava-o com o seu sorriso
divertido a continuar.
Ela o fazia sentir-se uma fera faminta.
Ademais, quando ele desceu o olhar e a viu abraçando-se, como se
pudesse ler os seus pensamentos, notou os seus seios sob o tecido molhado,
revelando mais do que deveria, embora ela estivesse alheia à este fato, o fez
engolir em seco e recuar à um espaço seguro da garota.
Amira se sentia acanhada, diante do olhar intenso e avaliativo, quando se
abraçou, foi na esperança de dominar seu coração. Seu olhar fugiu dele,
voltando-se aos seus pés, mas logo percebeu que ele se afastou. Por uma fração
de segundos, se perguntou o que fez de errado. Levantou os olhos, mas não
assimilou o que estava acontecendo. Apenas viu o pesado manto que outrora
estava nos ombros de Khalid, passando diante dos seus olhos e então, o sentiu
envolvendo-a com o tecido.
Cuidadosamente, ele a cobriu com seu manto, fechando-o na frente de
seu corpo cuidadosamente. Amira o olhava com curiosidade e ele sem falar,
apenas a tomou em seus braços, para carregá-la novamente.
O homem não tinha qualquer traço de humor em sua face, estava
sombrio e na mente da jovem, se formava milhares de perguntas. Ele caminhou
com ela até as pesadas portas, para retornar à parte interna do palácio, mas parou
e respirou fundo, antes de falar com sua voz completamente rouca e carregada
que apenas ela poderia escutar:
— Amira, antes de tudo, quero deixar bem claro: Da raiz de seus
cabelos negros, até a ponta dos dedos dos seus pés, Você me pertence — afirmou
olhando-a profundamente com aqueles seus bonitos olhos escuros como a noite.
Eles se completavam, ela era o dia, era o calor e a impulsividade e ele
era o mistério e a calmaria perigosa da noite. Pensou ela por meio segundo
fascinada por ele, ao mesmo tempo em que seu corpo todo se arrepiava.
— Entretanto... — seguiu ele, pesaroso — Não poderei te dar um filho,
por enquanto, seria muito arriscado para ambos. Espero, por favor, que
compreenda.
Sem mais, ele voltou a andar. Amira se encontrava em choque, surpresa
e sem palavras. Não era como se ela estivesse desesperada para ter um filho,
após a morte do sultão. Seus próprios planos de vingança, simplesmente ficaram
em segundo plano no instante em que viu Khalid.
Ter um filho homem seria a sua garantia à posição de sultana e à sua
vingança.
— Como você me fará sua sultana? — deu voz aos seus pensamentos,
insegura. Ela ainda não tinha mudado seus planos, embora não tivessem mais um
peso imediato em sua vida.
Ele olhou para ela, calmo e tranquilo.
— Te farei sultana, te farei mãe dos meus filhos. Porém, primeiramente,
devo me livrar de cada verme dentro desse palácio. Apenas, confie em mim —
misterioso e ao mesmo tempo exigente, ele não lhe contava tudo, mas exigia a
sua fé incondicional.
Amira não tinha opção se não acreditar nele, mas não se sentia satisfeita
com as meias verdades. Ocultando o que mais desejava saber, ao mesmo tempo,
não se sentia no direito de exigir nada dele, ela mesma ainda não falou nada,
esperava que quando o fizesse ele também se abrisse para ela, e certamente,
aquele não seria o momento.
Khalid por sua vez, queria perguntar o porquê ela queria ser uma
Sultana, ele com certeza a tornaria uma, mas algo lhe dizia que tinha mais do
que Amira estava falando. Ele precisava tirar isso dela, de uma forma ou outra,
pois uma vez que o dia seguinte nascesse, ele teria muitos deveres a tratar.
Ambos estavam perdidos em suas mentes, eram muito perspicazes e
instintivos, mas também muito inseguros e como sempre uma das partes tinha
que se dobrar, Amira acabou por suspirar e concordar com ele simplesmente
com um manejo de cabeça, aninhando-se em seu ombro enquanto se deixava ser
carregada.
(...)
Khalid e Amira atravessaram o palácio, o silêncio se manteve imperando
entre os dois. Os servos os olhavam ao longe, assim como todos que por um
acaso cruzavam o caminho. Khalid não se abalava e Amira sequer lembrava que
eles existiam.
Ela só tinha uma coisa em sua mente: Khalid. Não conseguia sequer
adivinhar o que se passava na mente dele, pois sua expressão estava como
sempre: séria e quase ilegível. No entanto, ela foi afastada dos seus
questionamentos quando alguns dos vizires entraram no caminho.
— Vossa alteza! — exclamou um deles, chamando a atenção.
Amira elevou um pouco a cabeça e seu olhar procurou quem chamava
Khalid, fora por instinto e sequer tinha pensado muito sobre isso. Mas quando o
fez, deparou-se com todos os membros da corte do sultão. Seus olhares eram
tensos, julgadores e ela quase podia sentir uma onda pesada de toda negatividade
que emanava daqueles homens. Eles não transpareciam isso em suas faces, longe
disso. No entanto, o simples caminhar de olhos deles avaliando-a nos braços do
sultão, já dizia muito mais do que qualquer palavra que fosse dita. Ela se sentiu
pequena, não de tamanho, mas de significância. Quase como se fosse uma
pequena formiga, diante dos grandes e perigosos homens maus, que poderiam
pisar e dar cabo de sua vida facilmente.
Eles queriam saber o que aquela escrava estava fazendo ali, o que ela
tinha de tão especial para ter tamanho cuidado e a clara afeição de Khalid. O
jovem sultão ajeitou mais o corpo de Amira contra o seu, na intenção de fazer
com que ela escondesse seu rosto em seu pescoço, protegendo sua face dos
olhares maldosos. Não queria que a vissem por nem um segundo mais.
Khalid não queria a deixar exposta tão cedo a estes homens, sabia que
eles procuravam informações e malditamente sabia que até mesmo o afeto dele
seria usado contra ela no futuro.
— O que... está fazendo, majestade? O que iremos fazer sobre os
traidores? E sua mão? Me perdoe, vossa alteza, mas está fazendo uma trilha de
gotas de sangue pelo palácio, deve priorizar o cuidado consigo mesmo — falava
sem parar, fazendo questionamentos, parecendo se preocupar com o jovem
sultão — Questionaram-me também sobre a sultana, ela ficará quanto tempo na
mesquita? Ela está grávida… Deve ser cuidada.
— Primeiramente, Tunç, devo-lhe satisfações? — respondeu seco e
objetivo — Sobre os demais assuntos, iremos tratar no tempo adequado. Se não
tem mais nada a dizer, irei me retirar. Reunirmo-nos mais tarde.
Sem mais, Khalid voltou a andar, levando Amira com ele. Deixando os
homens surpresos e estarrecidos atrás dele. Estava de bom humor até então,
apenas olhá-los fazia seu humor quase se esvair por completo. Se não fosse o
perfume dos cabelos de sua amada, fazendo-o se lembrar de sua presença,
provavelmente estaria com puro asco ao responder o homem. Uma vez que aos
seus olhos nenhum deles era confiável.
Quem diria que sua prometida, se tornou um amuleto de paz ao seu
coração.
(...)
Amira se sentiu inquieta em seus braços, desde que o tal “Tunç”
questionou Khalid. Ela tinha se esquecido do ferimento em sua mão e por causa
dela, ainda estava sangrando. Ele tinha que cuidar daquele ferimento. Exclamou,
em pensamento.
Ela concordava com o velho homem, sentia-se inquieta, mas não poderia
fazer ridículo diante dessas pessoas. Então, esperou que saísse de perto dos
demais homens para não piorar ainda mais a situação.
— Vossa majestade, ponha-me no chão. O seu ferimento, por favor,
chame um médico… — pediu ela, afastando-se o suficiente do seu pescoço para
poder olhar-lhe a face, tomando cuidado para não piorar o machucado conforme
ele segurava-a.
— Iremos economizar água, pequena prometida — murmurou ele, com
certo humor. Pouco se importando com o pedido dela — Você irá tomar banho
comigo.
O corpo de Amira enrijeceu-se instantaneamente ao ouvir tais palavras
nos braços de Khalid e seu mau-humor se foi por completo, mediante à reação
da garota. Realmente divertia-se com as reações de sua prometida, estas que
pareciam afastar todas as névoas negras, que pareciam obscurecer o seu coração.
Ele esperou a sua reação agitada como de costume, mas ela não veio,
estranhando, ele voltou a provocá-la.
— Nós dois estamos molhados pela chuva, não quer que fiquemos
doentes devido à friagem, certo? — indagou ele, provocando-a.
E ela tentou falar, mas nenhum som saiu.
Não é como se ela não estivesse preparada para isso, quando foi ao
quarto do antigo sultão, sabia o que iria acontecer. Contudo, tudo que envolvia
Khalid transtornava-a, fazendo-a sentir-se frágil, tímida e dependente de suas
reações. Tentou respirar fundo, como se isso pudesse trazer de volta alguma
sanidade e lucidez. Se era isso que ele queria, ela o faria. Afinal, ela pertencia a
ele. Deixou o ar sair lentamente de seus pulmões, enquanto se acalmava
ponderando as suas emoções.
Esteve muito agitada, comportando-se como a criança mimada que não
era há muito tempo. Claro, que na maior parte das vezes, era isso que Khalid lhe
inspirava e dava abertura para se comportar, mas era uma mulher agora. Ao
puxar na memória, não era qualquer mulher. Seus professores garantiram isso à
ela. Além do mais, se tinha uma pessoa que Amira entregaria seu corpo sem
lutar, era Khalid. Amira agradeceu à Alá pela lucidez de seus pensamentos se
acalmando e então, ela levou a mão ao rosto de Khalid acariciando-o.
— Sim, majestade. Se for o seu desejo, o farei — respondeu com um
tom doce.
Chocado, Khalid concluiu que de todas as reações que pudesse receber
de Amira, ele não tinha imaginado que seria essa. Seus olhos eram doces, e o
toque de sua mão quente o confortava. Quando ele achava que tinha começado a
desvendar a mulher e previr suas reações, ela lhe mostrava o quão errado ele
estava.
— Talvez, de fato, devemos ir ao médico, minha pequena — disse ele
olhando-a com preocupação em seu rosto.
— Sim, para sua mão… — começou ela novamente.
— Não, para a sua cabeça — interrompeu divertido.
Amira parou, olhando-o até entender o que ele quis dizer com isso, coisa
que não durou mais que alguns segundos.
— Muito engraçado, Vossa majestade. Eu estou falando de algo sério, e
o senhor... — disse ela, estreitando os olhos para ele.
— Estou falando algo sério também. Desde que a conheci, nunca foi
uma garota obediente — lembrou-se com bom humor, com um sorriso que fez
Amira estremecer.
No entanto, o sorriso não durou, uma vez que ele encontrou a criada
chefe pelo caminho, ordenou-lhe que o seu aposento fosse preparado para o
banho. Assim como uma muda de roupas para a sua Favorita Amira deveria ser
providenciada em seu aposento com a mesma urgência.
O brilho de surpresa não durou mais que alguns milésimos de segundos.
A criada se curvou e saiu na frente apressada. Amira, não sabia como reagir à
tantos cuidados, por isso mantinha-se quieta. Apenas insistindo até chegarem ao
aposento de Khalid que ele a colocasse no chão.
Ao chegar nos aposentos, o médico já estava lá. O que surpreendeu
Amira. Ele os olhou silenciosamente e só então Khalid colocou-a no chão. O
médico apressadamente se encaminhou até Khalid, cuidou do ferimento de sua
mão, aconselhou-o com cuidados que deveria ter e que senão os tomassem,
correria sérios riscos de perder a mão. Ao contrário do tratamento frio que
Khalid dispensara aos vizires, ele apenas era obediente ao médico sorrindo,
enquanto o velho lhe passava um sermão sobre segurar lâminas de espadas.
Isto fez Amira pensar que o médico devia ser de confiança, uma vez que
não inspirava o mau-humor do Khalid. Ele examinou Amira em silêncio e como
ela tivera mais de uma pancada no corpo em um curto período de tempo, ele a
instruiu a tomar um banho com infusão de ervas para poder aliviar as dores. O
médico informou que um dos viajantes, que ele encontrou, falou sobre o banho e
realmente teve resultados positivos sobre isso. Mas que as dores a
acompanhariam por um bom tempo.
— Além disso, minha filha estará chegando em breve de viagem, então
ela a atenderá em breve e fará um acompanhamento mais minucioso —
informou sem meias palavras e Amira entendeu o que ele quis dizer.
Afinal, não era natural, mesmo sendo apenas para fins médicos, um
homem ficar examinando a concubina. E então, partiu dos aposentos depois de
uma educada reverência ao seu soberano. Logo atrás do médico, foram as
criadas, pois Khalid odiava a ideia delas lhe dando banho.
Logo que o médico saiu, Khalid chegou à conclusão que tinha sérios
problemas. Queria não pensar sobre isso, mas não tinha opção. Amira agora
estava sem o manto que ele mesmo tinha colocado cobrindo-a e protegendo-a da
visão de terceiros, assim como da dele mesmo. Quando a chamou para tomar
banho com ele, estava brincando em um jogo de provocação, não imaginou que
ela aceitaria e pior ainda, que chegaria de fato a este momento. Nunca encontrou
problemas para tirar as suas roupas diante de uma mulher, mas ao pensar em
tudo que a garota passou, não conseguia deixar de se preocupar.
Estaria ela, preparada para vê-lo tirando sua roupa e revelando um
membro ereto apontando diretamente para ela? Óbvio que não. Pensou ele,
transtornado. Porém, na expectativa de tê-la nua diante de si, dividindo o banho
com ele, as reações do seu corpo eram inevitáveis. Seu mastro pulsava
dolorosamente, era incômodo, mas ele não revelaria seu estado.
Sentia-se sujo em comparação à ela, ao mesmo tempo, em que isso
aumentava ainda mais a sua excitação. Sua mente vagava em memórias criadas
das expressões dela enquanto a tinha nos braços e ele sabia que isso era um
caminho sem volta, por este motivo tentou pensar em trabalho, para tirar a sua
mente desses pensamentos pecaminosos. E agradecia imensamente pela túnica
que vestia, cobrindo boa parte de seu corpo e o ajudava a esconder seu real
estado.
Amira, que estava alheia aos pensamentos libidinosos de Khalid, apenas
sentia que o seu corpo estava paralisado, pois os olhos de Khalid sempre tão
atentos quanto os de um falcão, iria a reparar como ele disse antes “da raiz do fio
de seus cabelos até a ponta dos seus pés”, estava insegura. O medo que outrora
ela teve retornou fortemente, a vergonha de seu corpo e de suas cicatrizes,
deixavam-na desconfortável a ponto de fazê-la estremecer.
Khalid a viu tremendo, preocupado, pensou que ela estava com frio.
Deixou toda a sua agitação de lado, focou-se apenas em fazer o melhor para ela.
Tinha um medo aterrorizante de que ela adoecesse, assim como sua mãe e todos
os outros do palácio naquela época não tão distante assim. Aproximou-se dela
silenciosamente e rapidamente, sem qualquer palavra, a pegou nos braços e se
encaminhou para água a adentrando, e se abaixou até que a água cobrisse os seus
ombros.
Amira ainda estava com os olhos muito abertos, espantada com a forma
impaciente que Khalid a tratava. Perguntava-se se ela estava sendo um
inconveniente, por ter demorado a entrar na água e por isso ele fez isso. Ao
mesmo tempo, ela francamente não sabia o que fazer com este homem que
estava ferido e não parava de levantá-la nos braços. Quase parecia que ele tinha
lido seus pensamentos e soubera que ela de fato, adorava estar entre eles.
— Ayla, você está segura. Se aqueça e afaste a friagem que está em
você. Não vou tocar em você mais do que o necessário — prometeu Khalid,
com um humor que não tinha, em busca de relaxá-la, uma vez que estava
claramente nervosa.
Ele a soltou e se afastou dela alguns centímetros, olhando-a, levantou a
mão até a sua face e continuou:
— Não se sinta nervosa, apenas aqueça o seu corpo, não quero que fique
doente.
— Sua mão… — começou ela preocupada.
— Não se preocupe, eu estive na guerra por todos estes anos em que
estávamos separados, não será um corte na minha mão que realmente me fará
perdê-la. Se banhe… — disse ele contido e controlado, voltando a se afastar um
tanto dela.
Amira desceu o olhar para a água, e então ergueu o olhar para ele.
Perguntava-se o que tinha que fazer neste momento, ele sempre parecia se
preocupar com ela, que não lhe dava mais do que problemas. Ela sentia-se
tímida, com a sua roupa colada e pesada em seu corpo. Mas maior que sua
timidez, era o desejo de fazer algo por ele.
Ela moveu-se corajosa para perto dele e levou a mão ao seu peito.
— O senhor está com sua mão ferida... — disse Amira com a melhor das
intenções e Khalid, sem pensar direito, apenas por um novo hábito que ele nem
sequer sabia que tinha criado, maliciosamente, tomou entre as suas mãos, as
mãos de Amira.
— Então você será a minha mão. Não é…?
Khalid queria rir de sua própria desgraça, pois não cansava de se afundar
ainda mais quando estava envolto à Amira. Ele entrou nesta situação, por uma
brincadeira, uma provocação. Agora, estava se enfiando em um buraco ainda
mais fundo quando a bochecha da garota corou fortemente e para piorar, ela
meneou a cabeça concordando.
Ayla, não caia nas minhas brincadeiras pelo amor de Alá! Pensou ele,
fechando os olhos por alguns segundos tentando conter o riso. Esquecendo por
completo todo o nervoso que estava sentindo, assim como o seu próprio corpo
mais leve. Novamente, ele estava tenso e ela o salvou dele mesmo. A felicidade
que sentia não podia ser contida enquanto elevou os olhos novamente para ela e
num ímpeto impensado de felicidade, ele apenas puxou-a em seus braços e a
abraçou.
— Obrigado por existir — murmurou ele, com a boca encostada em sua
orelha.
Amira sabia e percebia que ele via em sua timidez um divertimento e
não se importava. Mas este abraço, seus corpos colados, ela sentia o movimento
de sua expiração e o batimento do coração dele. E o dela estava tão agitado que a
própria duvidava que Khalid não pudesse sentir ou perceber como ele estava a
deixando. Contudo, ele não parecia se importar e, então sentindo uma súbita
coragem, Amira o abraçou de volta e ele pareceu se dar conta do que estava
acontecendo e se afastou o suficiente dela para poder ver a sua face.
Ela lamentou ser distanciada do seu abraço e talvez isso se refletiu em
seu rosto, pois uma vez que o olhar de Khalid alcançou o seu, sua íris desceu
lentamente aos seus lábios e ele a apertou mais forte em seu abraço, o ar fugiu de
Amira em um arfar enquanto o belo rosto de Khalid foi se aproximando do dela
para beijá-la.
CAPÍTULO 13
Khalid, uma vez que observou Amira seguindo a criada chefe, olhou para o
chão e então se virou, partindo pelo corredor, ao mesmo tempo em que se
sentia um pecador. Principalmente porque ele não iria a ver por alguns dias
e sabia que ela ficaria magoada com isso. Não a avisou, mesmo depois de todas
as promessas que fez quando estavam juntos nos últimos minutos... Mas não viu
o momento certo para poder lhe dizer:
"Irei ali matar alguns bastardos, forjando provas falsas que não
deixarão dúvidas da minha acusação e condenação à morte deles. Eu me
tornarei um tirano e provavelmente os meus feitos recairão sobre você, então
tome cuidado. Em paralelo, tenho que te fazer ser vista por todos como um anjo
e vou ordenar que tragam o homem que te fez mal, alegando satisfação contigo,
assim querendo comprar outras como você. Farei isso para poder vingá-la,
quando ele chegar aqui com seus próprios pés. Por isso, durante algumas
semanas não vou poder te ver.” Suspirou com tal pensamento, que jamais daria
certo. Ele se via em uma situação complicada, pois sua amada já sofrera muito e
ainda conseguia ouvir os ecos do choro de Amira quando ele matou o seu
próprio pai na frente dela.
Seus amigos e companheiros se aproximaram dele ansiosos para saber o
que estava acontecendo. Eles não faziam sequer ideia de quem era “Ayla” para
ele, apenas Jaffar sabia, por isso, duvidava que eles o entenderiam. Fizeram-se
amigos quando não tinham que falar de nada do tipo. Ademais, em sua maioria
queria um líder, apenas isso. Tampouco Khalid se sentia confortável em se abrir
com qualquer um sobre suas dores e preocupações que não envolvessem o
império. Com o maxilar retesado, viu que não tinha escolha.
No momento em que iniciou os seus planos, não mais poderia parar.
— Sabem o que têm que fazer, misture-se, infiltrem-se. Façam tudo de
acordo com os planos, sem se afobar. A construção de uma nova Anatólia não se
faz de um dia para o outro — disse Khalid, com sua face como sempre
inexpressiva, não transparecendo nada que fazia morada em seu coração.
— Sim, senhor… E sobre a concubina? — questionou um deles curioso.
— Em breve, resolverei tudo e os colocarei a par da nova situação.
Protejam-na, não permitam que ela veja ou que saiba. Mantenham-me
informado.
— Mas… estaremos tão ocupados… — comentou um deles.
— Os planos foram alterados — anunciou ele — Não o crucial, mas ela
permanecerá ao meu lado. E vocês, protejam-na como a sua futura Sultana.
Alguns deles se empalideceram, eles não tinham boas visões sobre
mulheres. Para alguns, mulheres não eram nada além de cobras manipuladoras,
demônios que destroem os homens e os corrompem com um sorriso no rosto. E
de fato, Khalid não poderia negar, todas as mulheres que conhecia eram assim,
mas para ele, em seu íntimo, Ayla não era.
(...)
Khalid começou o seu dia já atrasado. Primeiro, prestou os respeitos ao
seu pai, como mandava as normas. O velório não era longo e sequer deveria ser,
já que o intuito era para diminuir inclusive o sofrimento de todos. É o que
diziam as normas, mas como o falecido era o sultão, todo o povo prestou seus
respeitos, acompanhando as orações feitas pelo Imã[10], que recitava súplicas e
pedia a Alá absolvição e bênçãos.
Foram promovidas reuniões para oração pelo falecido sultão, tão bem
quanto para abençoar o novo e todo este processo exigia a presença de Khalid.
No harém também, Nuray promoveu por dias orações, e organizou para que as
mulheres separassem tudo que fossem doar: alimentos aos necessitados, tecidos,
bordados pelas mulheres do harém e até mesmo alguns animais. O inverno
estava chegando e prometia ser pesado e longo, assim como a tensão que se
formava dentro do palácio, pois todos tinham muita curiosidade e expectativa
com o novo sultão, mas de toda forma, cada um que fazia morada e tinha alguma
possibilidade de ajudar ao próximo, fez por ordem do sultão.
“Em meio à dor, todos podem se erguer, uma vez que um ajude o
outro.”
Foi o primeiro anúncio voltado à ajudar o seu povo dado por Khalid, o
que acalmou o povo e os fez acreditar que dias mais prósperos viriam.
Em segundo lugar, entre os períodos de orações, Khalid nomeou Jaffar
como o novo Grande Vizir. Os demais vizires que estavam ali presentes foram
contra, uma vez que o natural era que um dos vizires já existentes tomasse o
posto na hierarquia, em especial o Vizir mais velho. Contudo, com apenas um
olhar frio, que parecia atravessar a carne e alcançar a alma, fez todos os homens
se silenciarem. Khalid sorriu para confusão dos homens:
— Este é um anúncio do sultão, não pedi qualquer opinião. Agradeço
imenso o conselho sábio dos mais experientes, mas como podem imaginar, após
a morte do meu pai, com o traidor estando dentre um de nós no poder, não posso
vir a confiar facilmente em qualquer um de vocês. Jaffar esteve ao meu lado
desde a minha infância, na guerra e no meu retorno. Ele é o melhor para o
cargo.
Retornando aos seus anúncios, Khalid informou que estava
demasiadamente satisfeito com Amira. De fato, a flor do deserto se provara a
mais bela de todas, por isso daria a Jaffar uma esposa vinda do Sheik que a
disciplinou com tanta diligência. Sendo assim, ordenara que o homem fosse
trazido ao palácio com as demais mulheres, para livre escolha do homem.
E assim, mais um plano de Khalid se iniciava. Dentre todos, o mais
rápido e prático, o mais importante. Amira merecia sua vingança e ele tinha sede
no sangue do homem que lhe fez mal. O homem foi responsável pelas marcas
em sua amada e o faria pagar amargamente por isso.
Uma vez que o nome dela fora mencionado, era chegada a hora de
colocar tudo em pratos limpos. Salvaria a honra de Amira.
— Imagino que das mais diversas histórias estão passeando por este
palácio — falou claramente, sem nenhum rodeio, deixando claro no aviso que
ele sabia de tudo que se passava dentro daqueles muros, em um aviso para não se
arriscarem — E deixarei tudo claro sobre o meu envolvimento com a conhecida
Flor do Deserto, anunciada minha atual favorita, a escrava Amira.
Os homens que até aquele momento pareciam estar evitando o assunto,
tiveram dificuldade de conter as suas curiosidades.
— Há algum tempo atrás, que nem sequer é tão distante, estava em meio
à uma luta feroz contra nossos inimigos na fronteira. Descobri que tínhamos um
traidor entre nós, e tamanha foi a traição, que estávamos lutando lado a lado e
em um último momento, ele se virou em minha direção e golpeou-me. Não
sabemos a quem ele se aliou, mas meus homens de confiança ainda estavam
lutando. Fui levado inconsciente ao deserto, e me deixaram completamente
perdido e jogado entre as dunas. Os meus homens só perceberam minha ausência
tardiamente e então lhes restou encontrar meu rastro, o que era quase impossível
de conseguir. Mas insistentes e fiéis, foram à minha procura.
Khalid olhava os olhos de todos enquanto narrava a sua história. Via-os
com atenção em cada palavra, procurando cuidadosamente suas reações.
— Meu rosto estava coberto, meu corpo ferido e desnorteado. Em meio
à noite, o frio foi severo e quase vi minha vida se esvair. Firmemente aguentei e
no nascer do dia ainda estava consciente pela minha força de vontade e desejo de
vingança. No entanto, quando já não tinha mais forças e estava quase
inconsciente, foi ela quem apareceu e salvou a minha vida! Ordenou que os seus
criados cuidassem de mim, mesmo que isso a colocasse em risco — disse solene,
vendo os homens surpresos e cativos — Foi enviada por Alá! Amira me salvou,
para que hoje eu pudesse estar aqui. Em momento algum perguntou meu nome
ou de onde vinha, demonstrando a luz que fazia morada em seu peito. Sem nada
em troca, ela ajudou um moribundo e completo desconhecido.
O silêncio imperou por alguns momentos quando o senhor mais velho
deu um passo em sua direção.
— Não se deixe enganar, vossa alteza! Ela deve ter feito com segundas
intenções, mulheres são animais ardilosos. Dizia... — alertou um pasha já idoso
em um tom sábio, começando a falar algum provérbio antigo, mas Khalid o
interrompeu:
— Passei muito tempo na guerra, honroso senhor, conquistando e
trazendo glória ao nosso império. Se nem a criadagem reconheceu-me, o que o
faz pensar que uma mulher que foi mantida em cárcere pelo seu proprietário, iria
me reconhecer? — contestou Khalid em um tom calmo.
— Faz sentido, vossa alteza — O homem se silenciou e acabou por
concordar, depois de um curto tempo a refletir.
— Em todo caso, a mulher não sabendo quem eu era, salvou-me. E isso
tocou o meu coração, pois ela estava pronta para assumir qualquer consequência.
Pude escutar o aviso de preocupação da criadagem e ela ainda sim, insistiu em
me ajudar. Não pôde permitir um moribundo sofrer caído em meio à areia.
Abençoada seja por me ajudar, embora soubesse que minha presença ali era um
risco. Por este motivo, uma vez que tive forças para me erguer e os meus homens
me encontraram, fui-me, sem me despedir. Contudo a segui, e supus que era a
Flor do Deserto pelos servos que a acompanhavam. Eu a vi oferecer seu próprio
alimento aos necessitados e chorar pelo desespero deles. Ela, mais de uma vez,
demonstrou compaixão ao nosso povo indiscriminadamente, uma vez que estava
à caminho do palácio.
“Oh!”, “honrosa”, “bondosa”, “anjo”, “abençoada e iluminada
seja”... eram murmúrios entre os homens presentes.
— Chegou ao meu ouvido que ao chegar aqui, ela caiu de um cavalo
para que não passasse por cima de uma criança — disse o velho pasha, em
concordância como se recordasse neste instante deste fato.
O velho na verdade era um aliado de Khalid e neste momento ele sorriu
vitorioso.
— Sim… Vi o que ia acontecer com os meus próprios olhos e os homens
que faziam a minha escolta também. Estava ali e pensei que não daria tempo, por
este motivo intervi. Em todo caso, logo que cheguei, tentei encontrar o meu pai,
para poder reivindicá-la. Uma mulher tão boa, uma mulher a quem devo minha
vida… Enviada por Alá, sua bondade transcende e toca o meu coração. Contudo,
não consegui encontrar meu pai até a invasão. Surpreendentemente, quase como
se meu honroso pai soubesse, ele me ordenou que ficasse com ela e a protegesse
se caso algo ocorresse, e com grande infortúnio ocorreu.
— Muito conveniente, não? — disse um dos vizires com um olhar
especulativo.
Khalid, que encontrava-se sentado, levantou-se em um rompante.
Caminhou em passos firmes, pesados e rápidos, com sua máxima autoridade e
presença marcante de um soberano. Parou diante do homem, e com uma
expressão de severidade, puxou a espada e apontou para o pescoço dele. O
movimento foi tão rápido que a espada provocou um som ao cortar o ar que
deixou todos os outros que partilhavam da mesma opinião num arfar baixo.
— Tem a audácia de dizer que minto, Demir? Sua ousadia não pode ser
perdoada! — falou firmemente Khalid, fazendo que sua voz ecoasse por todo o
aposento.
Se uma agulha caísse no chão do aposento de certo todos os presentes
escutariam, pois suas respirações estavam presas, na expectativa do que viria a
seguir. Contudo, Khalid conhecia Demir, e ele sempre fora a voz da dúvida e da
discórdia, mas acima de tudo…
— Oh, grande Sultão, me perdoe! Não era minha intenção dar a entender
isso. Não ousaria, vossa majestade. Apenas comentei que era conveniente, pois
Alá em seus planos perfeitos, tocou o coração de seu pai para que ela se tornasse
sua — desculpou-se humildemente ao seu sultão, curvando-se trêmulo.
Um covarde.
— Controle sua língua, Demir. Caso contrário, a perderá e a sua cabeça
fará par à ela no chão no dia de sua execução. É imperioso que minhas palavras
sejam transmitidas como serão ditas agora — disse tirando a espada da frente
do homem e se voltando para todos os outros — Participarei das reuniões e
acompanharei a investigação pessoalmente, e dependendo do feito, eu punirei.
Os assuntos políticos, assim como financeiros e todos que eram distribuídos a
todos vocês, eu os esperarei em minha biblioteca pessoal. Aviso que o meu
pessoal os acompanhará até o lar de vocês e investigará seus pertences.
Exclamações de surpresa ecoaram por todo aposento.
— Isso é um exagero… — disse um que recebeu o olhar mortal de
Khalid.
— Mas vossa majestade, estamos aqui para auxiliá-lo a conseguir lidar
com tudo que possui… sua desconfiança em nós... — interveio um dos homens
que foi interrompido por Khalid:
— Uma vez que eu mate o último homem que teve a mínima
participação na morte de meu pai, ninguém dentro desses muros estará livre da
investigação — O clima se tornava mais e mais pesado a cada declaração
objetiva e até rude de Khalid — Assim encerro esta reunião.
(...)
Os dias se passaram um atrás do outro, as horas pareciam rápidas em
demasia, começando cedo e terminando tarde, tendo poucas horas de descanso.
Uma semana, duas e na terceira semana, os comentários se espalharam mesmo
fora do palácio. Khalid se empenhava mais que qualquer um, dedicado sempre a
um bem maior. Nunca antes fora visto um sultão andando tanto por todo o
palácio, cuidando de tantas coisas sozinho e ele mesmo executando traidores
descobertos. Um atrás do outro, sem o menor traço de piedade. Seu corpo estava
sempre em movimento, treinando entre seus próprios homens e até mesmo
domesticando um leão, que se fazia tradição entre os sultões.
Khalid expandiu o comércio, fazendo alianças com alguns povos e assim
fazendo o seu povo cada vez mais próspero. Os seus planos até o momento
estavam em sua perfeita execução e não poderia estar mais satisfeito, pois em
poucos dias de mandato, ele se tornou oficialmente um senhor amado pelo seu
povo, respeitado pelos seus servos e temido por todos os traidores.
Mesmo aqueles que se aproveitaram de seu pai para tomar mais ouro que
o necessário, foram expulsos e seus pertences tomados como punição.
Mortes e expulsões faziam dele um tirano e salvador. Cada um o via de
uma forma… Khalid pessoalmente não se importava. Aquilo que lhe bastava era
que tudo estava se encaminhando e logo ele poderia falar que todos os
infortúnios valeram a pena. Porém, quando descobriu que ainda havia os
rumores e maus dizeres, criados sobre sua Amira, ele ficou irado.
Entretanto Khalid não os podia negar... Diziam que ele a deixou de lado,
ocupado como era, mas que um homem encantado por uma mulher, jamais a
deixaria só por tanto tempo. Estivera tão absorto que realmente não a procurou.
Soube notícias dela por todo o tempo, assim não sentira sua falta tão fortemente.
Contudo, para ela era diferente, estava só e alheia a tudo que se passava,
escutando apenas o que lhe era dito.
Não sabia como faria com a sua rebelde e tempestuosa Ayla, que
provavelmente não estava muito feliz com ele. Tinha certeza de que poderia
conquistar a confiança de um leão, mas não tinha a certeza de acalmar aquela
que por vezes era feroz, por vezes frágil… Ayla era inconstante, como o céu, o
mar e principalmente as areias de onde veio.
Um dia, em meio às suas andanças, disfarçado de soldado, Khalid
escutou conversas que uma mulher vagava pela noite e por vezes no nascer do
dia pelo palácio. Os homens pareciam assombrados, pois falavam que quando se
aproximavam, ela simplesmente sumia.
Ele que não acreditava em algo do tipo, sabia que só tinha uma pessoa
teimosa o suficiente para sair dos seus aposentos e ficar vagando por aí, rápida o
suficiente para se esconder e não ser pega. Ela era inteligente e ardilosa, para que
sua liberdade não fosse privada.
Recordou-se ele de quando ela não era mais que uma criança e fugiu dos
pais para o oásis, quando tentou fugir da tenda na noite em que ele encontrara
seus homens e como quando já estava no palácio, em suas andanças encontrou
sozinha o jardim e assim acabou escutando a conversa de Kelebek.
Não podia deixá-la sozinha por muito tempo, Amira tendia a se
envolver em situações perigosas, refletiu.
Amira, logo após a partida de Nuray naquele dia, não fazia ideia de que
teria tantos deveres, assim como os deveres em relação à morte do Sultão, que
havia lhe tomado vários dias. Ela tinha dos mais diversos estudos para aprimorar
o que já sabia, assim como aprender coisas novas. Aprendia costumes diferentes
dos seus, mas que não faria uso ali.
Amira passava tardes entediantes dentro do aposento e recebia eventuais
visitas da sultana Nuray, que de fato tinha se apegado à Amira, assim como ela
pela mulher. Eventualmente a mulher lhe dava conselhos sábios. E a jovem
apreciava isso. Entretanto, ainda assim, não podia não responder ao seu ímpeto
de sair apenas por sair. Passara muito tempo trancada para aceitar esperar de
bom grado e silenciosamente a visita de alguém que não aparecia há dias. Não
era do seu feitio.
Sabia que Khalid estava ocupado, sabia de todas as responsabilidades
dele, mas sentia-se abandonada e esquecida. Magoava saber que por vezes ele
iria lutar com seus homens, mas nem sequer uma visita fez à ela, neste período
de tempo. Para piorar, escutara provocações das outras mulheres do harém,
quando estavam todas fazendo coisas juntas para doar. Escutava coisas como “O
sultão só a fez favorita por ter salvado a vida dele.”, “Que ela não era tão incrível
assim”, embora de fato e amargamente elas concordassem que Amira era muito
bonita. “Mas que beleza aparentemente não era tudo para se conquistar um
homem”, concluíam maliciosas.
Todos os dias ela usava o brinco que ele mandou usar, todos os dias ela
recebia notícias dele através das criadas, da criada chefe e até de Nuray. Grandes
eram os feitos de Khalid, não tinha como não saber. Todos só sabiam falar de
seus feitos e das mortes dos traidores.
Eram tantas as notícias que chegavam aos seus ouvidos, contadas sempre
com felicidade. Porém, enquanto isso, ela só conseguia imaginar Khalid com
uma espada banhada de sangue. A jovem se encontrava em uma luta interna.
Queria muito vê-lo, mas ao mesmo tempo, tinha medo.
Apenas ouvia o que falavam. Eles diziam “traidores”, mas ela sabia que
quem matou o pai foi ele próprio.
Diziam “justo”, mas ele estava manipulando tudo à sua vontade, para
poder derrubar aqueles com quem tinha desavenças. Amira não sabia quais eram
as desavenças, não sabia nada… Aos olhos dela, as atitudes de Khalid não eram
diferentes dos malignos que apenas matam e destroem aqueles que entram em
seu caminho.
Um tirano salvador? Um bom opressor? Havia lógica nisso?
Nuray visitou Amira no período da tarde. Como sempre, a mulher a
aconselhava sabiamente sempre como ser melhor e como algum dia ela viria se
tornar sultana. Por alto, Amira até contou o que lhe aconteceu. Contou que tinha
uma vida tranquila, que todos foram mortos e ela se tornou uma escrava. Não
dizia nomes, se não de Said, por exemplo, pois não era segredo.
A mulher confessou, em retribuição à conversa, que era uma escrava
também, mas que tinha sido enviada como um presente em troca de um acordo, e
que tinha sido enviada junto com Derya, por isso era tão ligada à ela. Eram não
mais que crianças quando chegaram ao palácio e por anos foram treinadas
severamente. Por sorte tinha cativado a atenção de Fahir e se empenhou em
conquistá-lo, junto com seu lugar no palácio. Ela não sabia o que era este amor
que Amira sentia por Khalid e admitiu até um pouco de inveja. Criada como ela
havia sido a devoção dada ao marido nada tinha com este sentimento de desejar
tê-lo apenas para si.
Amira entendeu neste momento o porquê que ela foi tão direta quando se
conheceram. Ela não fizera por mal, apenas era a sua realidade e a própria Amira
possuía a mesma, mas os seus sentimentos eram maiores que os seus
pensamentos lógicos.
Ela continuou e falou mais sobre a criada chefe. Derya viu a
oportunidade de se tornar a criada chefe quando a anterior faleceu sob as ordens
da falecida valide sultana. Parecia que as duas tinham alguma desavença, contou
em tom de segredo. E para concluir, como se não fosse nada demais, Nuray
finalizou:
— Então agarrou a oportunidade.
— Mas ela é tão… — começou Amira.
— Ranzinza? Mortalmente sincera? Sempre foi uma característica
dela… Por muitos foi odiada, mas Honde gostava dela e isso a salvou diversas
vezes. — disse com humor Nuray — A vida é como a vontade de Alá… apenas
dele.
Entretanto, mesmo após escutar a mulher e sua história de vida, Amira
ainda tinha aquelas três perguntas em mente, insistentes e desconfortáveis: “Um
tirano salvador? Um bom opressor? Havia lógica nisso?” Engolindo a
desconfiança que Amira tinha de todos, ela fez estas três perguntas à mulher
após dizer o seu incômodo.
A mulher a olhou e sorriu, terna e paciente. Levantou-se, foi ao lado
direito de Amira e a levou até a janela.
— O sol que nos ilumina, é tão necessário quanto a lua que traz a noite.
E a noite é a pausa, antes do novo nascer do dia. Pense que estamos por muitos
anos em uma noite eterna. Pois pessoas espertas fazem proveito daqueles que
estão tristes e sem luz, dizendo-lhes para preencher o vazio com coisas
supérfluas, como uma pequena chama de uma vela em meio à escuridão. Pessoas
espertas viram que dava certo e de alguma forma se espalharam. A corrupção
está na natureza do ser humano. Mas um sol chegou, com seus fortes raios
calorosos dizimando todos aqueles que traziam escuridão e trazendo luz para
quem tinha não mais que uma vela. O que o nosso jovem sultão está fazendo, é
necessário. Mesmo que no processo ele acabe banhado em sangue.
Amira ficou pensativa, a analogia podia fazer sentido, mas…
— Na prática a visão é horrível — deixou escapar, sentindo um enorme
aperto no coração.
— Na prática, minha menina, nada é bonito. Veja você, se um dia você
virou escrava, foi por que um dia mataram sua família. Você foi vendida, e foi
treinada. Tenho certeza de que passou por muitas coisas, viu muitas outras. Mas
tudo isso foi necessário para que você se tornasse a flor esplendorosa do deserto
que está diante de mim. O caminho sempre será feio para um resultado
maravilhoso — disse calma a sultana colocando a mão no topo da cabeça de
Amira.
— O mal e o maligno também são feios e não sai nada belo — insiste
Amira se sentindo infantil perto da mulher que a tratava com carinho e como se
fosse uma criança. Instintivamente ela respondia como tal, principalmente
quando pensou em tudo que passou e quanta força de vontade foi preciso para
que ela não se rendesse à dor que viveu.
— Saiba que Alá é justo e os pecadores cairão de uma forma ou outra.
Você está muito melancólica, não fique. Nem escute rumores, apenas ouça o que
o seu coração diz.
Amira ficou com isso na cabeça, mesmo após a sultana ter ido embora.
Permitiu-se dançar, algo que não fazia há muito tempo, deixando todos seus
pensamentos fluírem pelo seu corpo até que ela se sentisse liberta deles de
alguma maneira. Dançou incansavelmente, por vezes permitindo que lágrimas
rolassem e que todo o peso do seu corpo fosse extravasado.
Quando todos seus músculos doíam, ela chegou à conclusão que tinha
decidido confiar em Khalid, então assim o faria. Não adiantava ter dúvidas,
inseguranças e tentar encontrar as respostas, sozinha. E isso significava que não
deveria ficar ali parada, esperando-o a encontrar, pois isso não aconteceu antes e
tampouco aconteceria naquele instante.
Cansada, depois de tanto dançar, com ajuda das criadas, ela se trocou e
foi dormir cedo, pouco depois do sol se pôr. Acordou antes do sol nascer e como
das outras vezes, pela falta de sono, fora andar pelo palácio.
Queria o conhecer por completo para não se perder, antes de chegar ao
seu amado. Ela se vestiu sozinha e na ponta dos pés, saiu dos seus aposentos.
Amira conhecia as proximidades, então colocara na cabeça que iria um pouco
mais longe.
Corredores e mais corredores, salas e mais salas...
Mesmo com a luz fraca do nascer do dia, tudo parecia lindo. Por vezes
muito branco, cada detalhe muito decorado, cores lindas e apaixonantes. Às
vezes Amira parava apenas para tocar a parede ou o chão, era absolutamente
encantador.
Por horas se perguntava como em um lugar poderia ter tantas pessoas
ruins, já que parecia abençoado por Alá, com tamanha prosperidade para todos
os lados.
Tentou lembrar o caminho que fez para a área do sultão, mas como
sempre estava perdida demais em pensamentos para decorar o caminho. O único
ainda vívido em sua mente era para o jardim que Khalid plantou e lhe deu seu
nome, pois uma vez que fosse aos muros e fosse caminhando, eventualmente
chegaria nele. No entanto, como não tinha pressa, foi caminhando
tranquilamente, mas para a sua surpresa, no meio do caminho, alguém a abraçou
por trás, e seu coração errou a batida, o ar pareceu prender em sua garganta e
rapidamente, a pessoa tapou a sua boca, e a carregou com seus braços para
dentro de um dos aposentos.
Medo, terror e adrenalina. Seu corpo fora tomado pelo instinto e ela se
debateu, forte, desesperada. A porta que os separava do aposento para o corredor
fora fechada logo que entraram e ela viu sua vida por um fio. Não teria como
escapar.
A pessoa a imobilizou, contudo não a feria e não usava mais força do
que preciso. Usando apenas dos seus conhecimentos para contê-la, achando que
já era o suficiente o susto que estava lhe dando, o homem se aproximou dos seus
ouvidos e disse com uma voz saudosa e familiar:
— Pequena prometida, sabe que não é certo ficar vagando por aí ao
nascer do dia, certo?
Khalid!
CAPÍTULO 16
A jovem Amira estava nervosa, engoliu em seco novamente. Ela não sabia
o que a esperava, não se encontrava confortável para ir ao encontro da
Sultana. Mas tampouco a jovem tinha escolha, uma vez que era
imperioso cumprir as regras de hierarquia e, além disto, uma vez que Amira não
passava de uma favorita do jovem Sultão, não era nada, ou melhor, ninguém,
para se negar a ir a um chá com a mulher que possuía em seu ventre um filho do
falecido sultão.
Um príncipe ou uma princesa, que poderia rivalizar o trono com Khalid.
Por tradição, Khalid tinha direito de se livrar de todos os seus rivais e se desfazer
de todo o harém do seu pai, contudo ele não desfez e os manteve aos seus
cuidados e responsabilidades, todas as mais de trinta mulheres que viviam no
harém do falecido sultão, juntando-as ao seu próprio harém e familiares que
moram no mesmo.
Amira pensava que Khalid tinha um coração bom, uma vez que alguém
cruel, se livraria de todo o peso que pudesse lhe trazer transtorno, por prudência
até mesmo poderia mandar a Sultana de volta à sua terra de origem, entretanto,
como o povo tinha uma boa visão da mesma, ele preferia desmascará-la. Amira
entendia isso, realmente entendia, porém, seu lado egoísta, mimado e por vezes
de índole duvidosa, fazia-se presente, através de uma voz maligna no fundo de
sua mente dizendo: Ele poderia apenas mandar matar, decapitar, assim como fez
com seu pai. Assim como fez com sua primeira esposa.
E ao recordar disso, Amira notou que ainda não tivera coragem de fazer
algumas perguntas a Khalid, então prometeu a si mesma que não deixaria de
perguntar e colocar tudo em pratos limpos. Khalid sabia o seu passado, todavia,
Amira não sabia nada sobre ele, no entanto, no momento não tinha nada a fazer.
Tinha que arrumar-se para começar suas atividades do dia e ir encontrar seu pior
pesadelo: A Ifrit Sultana Kelebek.
Amira rezou e em sua oração da manhã pediu que Alá trouxesse à sua
mente serenidade e sabedoria para que pudesse lidar da melhor forma com os
desafios que lhe eram impostos. E somente quando as criadas estavam testando
sua bebida com uma agulha de prata, Amira tivera um momento de iluminação.
Tendo ideia do que faria a seguir e assim sentindo-se mais confiante para o chá
com a sultana, agradeceu mentalmente a Alá.
Organizando o plano em sua mente, como afazeres, Amira se sentia mais
ela, mais controlada e menos emocional. E nestes momentos, ela entendia a
importância da solidão e de lutar os seus próprios desafios. Sentia-se naquele
instante mais calma e serena, surpreendendo as criadas que a olhavam com certa
curiosidade.
— Meninas, me tragam o baú em que estão as roupas que ganhei de
Khalid e que como estava chateada, sequer o abri para ver o que tinha dentro —
ordenou Amira, as criadas não entendiam a súbita calma, de quem até então
parecia que tinha recebido a pior das notícias.
— Perdoe a audácia, minha senhora. Poderia nos dizer qual o seu plano?
— indagou a astuta Nehir.
Nehir era o nome da criada mais rígida, que com alguma insistência
Amira conseguiu descobrir o seu nome. Amira disse que se sentia incomodada
em não saber como chamá-la e não a queria chamar de criada, uma vez que a via
como uma preciosa amiga.
— Desta vez, é imperioso que apenas me obedeçam, quando meu plano
estiver em andamento, tenho certeza que irão perceber. Vamos ao banho e nos
trocar, pois vocês irão comigo — disse Amira, misteriosa e a mulher obedeceu
silenciosamente.
As criadas abriram os baús com os presentes de Khalid e assim como ela
esperava haviam muitas roupas simples e extremamente luxuosas, com bordados
em fio de ouro e prata. Ao contrário dos presentes exagerados de Fahir, a grande
beleza das vestes estava em seus detalhes e era disso que a jovem precisava.
Amira revirou o baú, separando suas vestes ela mesma, sem esperar qualquer
movimento das criadas, o que as surpreendeu e uma vez que Amira encontrou o
tecido que queria se levantou segurou-o e revelou à elas com um grande sorriso.
Entretanto, as criadas ficaram surpresas.
Uma roupa em sua maioria branca, com detalhes bordados em prata e
ouro, com pequenas luas e estrelas. Um vestido leve, com alguns tecidos por
cima dele que eram translúcidos e uma longa manga também ornamentada com
esses detalhes em prata. Se forjasse um acidente e derrubasse um pouco de chá
em sua manga o veneno iria escurecer a prata e assim teria uma prova contra a
Sultana.
(...)
Chegada a hora do chá, devidamente banhadas, perfumadas e vestidas,
Amira, em conjunto de suas criadas, caminharam pelo interior do palácio ao
encontro de Kelebek tirando olhares admirados de todos que cruzavam seu
caminho. Amira tinha seus cabelos penteados e decorados com joias que eram
ornamentados com diamantes e em seu centro rubi. O brinco que Khalid lhe
mandara usar estava bem visível. O véu que a concubina usava preso ao seu
cabelo de tão leve parecia flutuar, assim como algumas das camadas de sua
roupa.
Por onde quer que ela andasse, parecia ganhar os olhos de todos com sua
beleza, fazendo justiça à sua fama de mulher mais bela. Por vezes, Amira jogava
olhares para as pessoas ao redor, usando de seu charme para enfatizar o seu
impacto sobre elas, assim como Nuray a instruiu alguns dias antes.
Uma vez que chegaram ao jardim pessoal da Sultana Kelebek, a viram
vestida de vermelho com detalhes claros. O extremo oposto de Amira, mas não
menos bela. Sua barriga começava já a fazer algum volume, mas não muito. O
Jardim da Sultana, ao contrário do que fora feito para Ayla, possuía uma grande
variedade de flores e cores, dando a sensação a quem entrasse nele de adentrar
no paraíso.
A mulher estava sentada perto de uma fonte, quase parecendo um
quadro, mas assim que viu Amira e as suas criadas, levantou segurando a barra
do seu vestido e caminhou rapidamente e completamente animada em direção a
Amira.
Seu comportamento assustava e deixava confusa a jovem garota, mas a
mesma fez o melhor para não transpassar isso em sua face, pois esta mulher
tinha um talento de acabar com a sua confiança.
Uma cobra astuta, que sorria para ela como se nunca antes tivesse feito
algo de ruim. Exatamente como se estivesse encontrando a melhor amiga, que há
muito não vira. Uma vez que perto o suficiente, as mãos frágeis e pequenas da
Sultana envolveram Amira em um caloroso abraço e o corpo de Amira se
arrepiou, como se o próprio corpo rechaçasse o toque da mulher.
Após envolver a jovem no abraço, Kelebek se afastou de Amira para
olhá-la bem, como se fosse uma amiga preocupada com o seu bem estar.
— Você está bem? E as suas feridas? Curaram-se completamente? Por
Alá! Estava tão preocupada com você! Perdoe-me por aquele dia — dizia
parecendo arrependida com os olhos marejados, e então desatou a falar sem
parar enquanto guiava Amira pelo jardim. — Eu não estava no meu estado
normal, não sei sinceramente que mal me acometeu… Eu estava tão triste com o
falecimento do meu marido e pai do meu filho. Apenas queria um culpado, por
isso lamento imenso o mal e as acusações que lhe fiz. Por isso que a convidei
para o chá, eu queria me desculpar enquanto o tomávamos, mas estava muito
ansiosa para te falar o que fazia morada no meu coração, você entende, certo?
Implorar seu perdão, afinal, você poderia estar morta se Khalid não fosse tão
centrado. Um bom homem, o Khalid, não é? Impediu que você fosse morta e eu
vivesse com um arrependimento.
Sua maldade não podia ser vista, suas intenções não eram fáceis de
serem lidas, mas uma vez que se tinha consciência da sua crueldade, era
assustador a forma como a mulher tinha capacidade de mentir e manipular.
Antes que Amira percebesse já estava sendo guiada à cadeira que se sentaria
para o chá. Novamente, assim como das demais vezes, a Sultana fazia com que
tudo fosse à sua forma, mesmo que a pessoa não percebesse, manipulando a
situação de uma maneira indireta, mas controlando-a por completo. Essa era sua
característica mais assustadora, parecendo que tudo ao seu redor estava sob o
domínio da mulher diante de si.
— Sente-se, descanse, por favor. E desculpe a minha agitação, estava
nervosa de sobre como falar tudo isso com você — disse puxando o ar e
parecendo se acalmar. Indo para o outro lado da mesinha e pegando um pouco
do chá para tomar, como se subitamente percebesse que parecia uma pessoa
louca, então optou por ir com calma: — Eu me arrependo verdadeiramente e por
isso quis imitar algo que me falaram dos países vizinhos, neste chá a céu aberto.
Quero ser sincera com você.
— Uma mulher de luto não deveria ser julgada pelos seus atos… —
Amira se viu dizendo sem querer dizer, mas é isso que ela diria a uma amiga. A
forma franca com que a sultana falava, parecia servir de influência para as
próprias falas de Amira.
Amira sentia-se afundando no jogo da mulher e ficou ainda mais em
alerta. Tinha dúvidas, se a mulher era uma cobra ou um uma aranha, tecendo a
sua teia, prendendo-a como se fosse a sua próxima vítima.
— Realmente, é como falam! Você é como um anjo… — comentou a
mulher olhando com alguma doçura para Amira, enquanto seu sorriso parecia
vacilar — Mesmo diante da pessoa que poderia ter te matado, se faz clemente.
— Não sou um anjo ou algo perto disso, sou alguém que segue o que
acredita… — respondeu sincera, uma vez que não tinha para que mentir.
— Jovem, doce e abençoada por Alá a olhos nus... Permita-me contar a
minha história e entenderá o meu amor ao sultão. Um dia fui uma pessoa
prometida a casar com o próximo rei de nosso reino, mesmo sendo filha de um
caso de meu pai, o conselheiro com uma estrangeira, e eu era muito grata.
Ninguém parecia gostar de mim — disse ela mostrando os seus cabelos —, fora
o meu prometido e Aysha, a irmã mais velha do futuro rei.
Amira sentiu uma pequena fisgada em seu coração, imaginando que esta
história não terminaria bem, ao mesmo tempo que se identificava com a
narração.
— Cresci, devotando o meu amor a eles, porém, um dia a irmã nosso
futuro líder se matou, pois foi descoberto que se negava a casar, ela se apaixonou
por um homem de um reino rival e seria forçada a se casar com outro. Éramos
novos e mantidos afastados dos adultos, não sabíamos o que havia acontecido, a
solidão e o sentimento de traição foi algo que tomou nossos pequenos corações
na época. Os anos passaram e acreditávamos que ficaríamos juntos para sempre,
pois apenas nós nos entendíamos. Ou eu era a única que acreditava nisto, pois
mais uma vez fui traída. Ele veio a se apaixonar por uma mulher de uma
pequena tribo e rechaçou-me. Humilhada, traída, magoada, meu pai não me
aceitou de volta, ninguém queria ajudar alguém com cabelos ruivos, por
acreditarem ser maligno. Tornei-me uma escrava quando tentei sair do reino. Fui
sequestrada, espancada e de alguma forma, vim parar aqui. Pensei que poderia
ser diferente, entretanto, da mesma forma ninguém se importava comigo ou
oferecia qualquer abrigo.
— As pessoas podem ser cruéis… — disse Amira em um reflexo dos
seus próprios pensamentos e vivências, se sentindo de alguma forma familiar à
mulher.
— Quando estava à beira da morte, o sultão estava retornando de uma
viagem e me viu, justamente pelos meus cabelos. Veio até mim e nossos olhares
se encontraram… Ele parecia emocionado. Me acolheu, fez de mim uma das
mulheres do seu harém, me tratou muito bem, dando a mim tudo o que eu não
tive. E eu pensava ter encontrado meu pequeno pedaço do paraíso. Mas os
infortúnios começaram e uma doença veio e levou o nosso filho logo depois.
Fahir se fez um bom amante consolando-me e o amei mais, contudo, no dia que
descobri a nova gravidez, fora o dia em que ele foi morto…
— Sinceramente eu lamento a morte do sultão Fahir, o pouco que o vi,
realmente parecia ser um bom homem… — falou Amira descendo o olhar para o
chá que agora estava frio.
Amira podia sentir verdade nas palavras e isso a assustava, sua confiança
absoluta e até mesmo seus planos fugiram a sua mente, não conseguia parar de
pensar na história. Não sabia, simplesmente até onde era verdade e o que era
mentira. A jovem também sentia seu coração se compadecer com a história, mas
a lembrança da mulher exigindo sua morte se fazia presente. Confusa, Amira não
conseguia falar mais nada. A Sultana também se silenciou e para a sua surpresa,
Kelebek exclamou pouco depois:
— Nuray! Há quanto tempo! Estava aqui tomando um chá com a nossa
querida favorita do Khalid! Tinha que me desculpar, não é? — Amira podia
sentir o sorriso da mulher em sua voz e algo mais que não conseguia definir, mas
seu maior foco era Nuray. Sua “mãe” de coração, que parecia ter chegado no
momento certo para salvar sua mente daquele turbilhão.
Neste momento, Amira levantou o olhar e foi em busca da mulher da
qual ela tinha confiança e apego. Nuray estava a alguns passos de distância de
Amira e parecia reluzente como sempre, com a sua calma e tranquilidade.
Trazendo conforto ao coração confuso de Amira.
Nuray...
— Kelebek, nem sequer pensou em me convidar? — questionou Nuray,
num tom calmo e então seu olhar focou em Amira — Amira, querida. Faz algum
tempo que não a vejo, está bem?
Nuray parecia tranquila, embora não fosse toda sorrisos ou gentil como
costumava ser, Amira podia quase sentir o gosto da antipatia que ela tinha por
Kelebek. Amira se levantou e fez sua reverência à sultana Nuray, torcendo que
sua ira não se voltasse para ela. Com um olhar ela tinha um poder aterrorizador.
— Sultana Nuray, que seja abençoada por Alá. Fui convidada
subitamente pela manhã pela Sultana Kelebek ao chá, não tive muito tempo para
lhe contar… — cumprimentou Amira, educadamente.
Kelebek também se levantou e era nítido que a inimizade das duas era
recíproca. E quando Amira disse que não teve tempo de contar, o olhar de
Kelebek escorregava entre Nuray e Amira, astuto e perigoso. Embora fosse
escondido, como sua típica face sorridente e simpática.
— Me desculpe, Nuray — falou sedosamente Kelebek — Eu realmente
estava tão nervosa em pedir desculpas que nem sequer... passou pela minha
cabeça.
— Entendo, a jovem é a primeira favorita de vossa majestade o Sultão.
Podendo se converter em uma Sultana também, imagino como seria
desconfortável a inimizade, uma vez que enquanto nós envelhecemos ela está na
flor da idade — nesta fala de Nuray, o canto do rosto de Kelebek tremeu e Amira
pôde perceber o quanto Nuray não se importava em envelhecer, mas Kelebek por
outro lado...
Nuray, sincera como sempre indo direto ao ponto sem dar volta alguma.
Isso a admirava e ao mesmo tempo trazia um choque de realidade, afastando de
Amira toda a sua confusão e insegurança que sentia a pouco devido à história de
Kelebek. Por pouco Amira não foi pega pelas palavras da víbora.
— Verdade, seria muito ruim! — exclamou Kelebek, como se fosse algo
terrível e então, se virou para a mesa de leve e pegou o chá — Eu deveria tê-la
convidado mais cedo, me desculpo por isso Nuray, mas aparentemente e
infelizmente, agora o nosso chá está frio. Falamos tanto, que nem sequer tivemos
tempo de tomá-lo, uma pena!
Nuray olha bem para Kelebek, silenciosamente a avaliando.
— Uma pena, acho que teremos que deixar para uma próxima. Uma vez
que Amira estava aqui e a tenho como uma filha querida no meu coração, vim
ver o que se passava. Mas como o chá está frio, me contento em um passeio
pelos jardins do castelo com a sua companhia.
— Sua filha do coração? Por isso ela tinha que te informar aonde ia? —
indagou Kelebek.
— Oh! Sim, em algumas semanas muitas coisas podem acontecer
Kelebek. Você sabe disso — respondeu com um sorriso Nuray e então o seu
olhar pousou em Amira — Vamos? Ou ficará aí?
— Oh! Sim. Se me permite… — disse Amira, se curvando levemente
para Kelebek. E então se voltou à Nuray e foi em sua direção caminhando sem
parecer tão desejosa de ficar longe da víbora, quanto estava realmente —
Perdoe-me por lhe fazer esperar, Sultana.
Nuray olhou a menina e sorriu, levando a mão gentilmente à face de
Amira. — Não existe motivo para se preocupar, em primeiro lugar vim aqui por
você, adorável flor do deserto.
Amira, como sempre, ficava levemente sob um efeito de encanto com o
afeto de Nuray. Ainda que Kelebek e Nuray, não usassem palavras hostis à ela, a
sensação que ambas causavam era totalmente antagônicas. Enquanto uma
passava desconforto, a outra parecia a salvação. Contudo, ainda que Nuray fosse
gentil com Amira, a jovem detestaria ser o alvo da ira da mesma, pois assim
como o apego, Nuray não esconde o desgosto.
Conforme andava para fora do jardim da Sultana Kelebek, Amira não
olhou nenhuma vez para trás. Sabia que suas criadas estavam próximas e acabou
por sorrir, quando a mais sincera delas suspirou de alívio. Ela também tinha esta
mesma sensação, a cada passo mais longe daquela pessoa uma onda de alívio a
tomava.
— Amira… — disse Nuray parando em frente a um dos jardins — O
que aconteceu? No momento em que te vi estava pálida.
— Nuray… — murmurou Amira e então sua voz sumiu.
A sultana, vendo o cansaço da menina, em silêncio apenas a
acompanhou até o seu aposento. Uma vez que chegaram nele, Nuray mandou
que as criadas trancassem a porta e se abaixou em frente à jovem que se sentava
em uma cadeira, para olhá-la nos olhos.
— Me diga, minha menina. O que aquela pessoa lhe disse?
Assim, Amira contou tudo à mulher. Como uma criança assumindo de
uma só vez as coisas erradas que ouviu, e os sentimentos que a deixavam
transtornada.
— Se apenas um lado da história foi contado, apenas um será o vilão…
— comentou Nuray — Minha menina, eu estava lá no retorno da viagem. Atrás
do sultão, assim como Honde, mãe de Khalid. Estávamos sim, voltando de
viagem, pois tínhamos ido ao túmulo de alguém. Mas isso não é o importante,
visto que não foi assim que a história aconteceu.
Amira olhava para Nuray com grande expectativa e a mulher suspirou,
mostrando uma humildade e despreocupação sem tamanho ao se sentar no chão
e se esticar para trás, olhando para a janela, relaxada voltando suas memórias a
um passado que para ela não parecia assim tão ruim.
— Kelebek não estava à beira da morte, por falta de cuidados ou algo do
tipo. Mas a primeira vez que a vimos, ela estava se apresentando perto de onde o
Sultão e a sua família passariam no retorno da viagem. Conveniente, não é? —
disse com sarcasmo — Não foi a primeira vez que alguém tentou chamar
atenção do sultão desta forma, mas em todo caso, um vento forte bateu e o véu
vermelho dela saiu de seus cabelos, descobrindo-os e acabou parando no
caminho do cavalo do sultão. Como um homem que não podia ver uma mulher
bonita, Fahir foi devolver o véu… E uma vez que seus olhos encontraram
Kelebek, ele a trouxe conosco. E pela primeira vez o truque da dançarina perto
do palácio deu certo. Kelebek estava saudável, bonita, atraente e com uma
história de estar trabalhando com a única coisa que sabia para poder sobreviver
já que não tinha mais família. E foi assim que nada de tão interessante na
chegada de Kelebek aconteceu.
Amira subitamente se sentiu uma idiota. Kelebek sempre foi
manipuladora, escolhendo as suas verdades e ela não sabia o que a levou à
acreditar na história da Sultana. Mas talvez seus pensamentos tenha ficado
evidente, pois uma vez que passos agitados no corredor se faziam presentes e
algumas pessoas chamando a sultana chegaram aos ouvidos de Amira, Nuray se
levantou, bateu suas roupas e com um sorriso disse:
— Menina, Kelebek é uma excelente mentirosa. Alá abençoou você com
um ótimo instinto para as pessoas e um lindo coração, não permita que as
pessoas turvem sua visão. E não se sinta mal por ter um bom coração e ter pena
de uma pessoa cruel, o erro está nela e não em você — Nuray foi até a porta, ela
mesma a destrancou, virou-se para Amira e disse: — Tenho que ir querida, fique
bem.
(...)
No final do dia, Amira já tinha se recolhido para dormir e suas criadas
ido para o harém. A garota estava sem sono, pensando em tudo que tinha
acontecido naquele dia desde que ele começou e encontrou Khalid até o último
evento com a sultana. Amira se virou e ficou olhando para a luz que entrava pela
janela, com a lua iluminando fortemente.
Entretanto, uma sombra parecia estar se formando em sua base. A
mulher engoliu em seco. Um assassino mandado por Kelebek? A própria vindo
para me matar pessoalmente? Pensou Amira. A sombra foi subindo, ao mesmo
tempo em que Amira virou o olhar em direção à janela. Ela viu a sombra ganhar
a forma de um homem. O coração da concubina estremeceu de medo, tentou
deslizar sem chamar atenção para o lado da cama e tentar se esconder, contudo,
viu que era tarde demais, ela escutou o farfalhar das vestes e quando escutou o
som do pé do homem descendo e entrando no aposento, Amira pensou que dessa
vez sim, seria o seu fim.
Amira estava a ponto de gritar pelos os guardas, quando conseguiu
reconhecer Khalid olhando pelo quarto à sua procura.
— Ay...la?
Irritada pelo segundo susto de morte no mesmo dia, a garota pegou um
sapato que estava ao lado da sua cama e o jogou em direção a Khalid. Pegou
tudo que encontrou próximo de si, e jogou em sua direção enquanto o maldizia
em um tom baixo.
— Qual é o seu problema? Você quer me matar de susto? Você esquece
quem é e acha que é um ladrão, assassino, mercenário ou algo do tipo? Por Alá!
Homem, você é o Sultão… — rosnava Amira para ele que o tempo todo ficou
entre se esquivar e se proteger.
— Isso é para você aprender a manter as janelas fechadas! — provocou
ele em um murmuro e um sorriso de canto.
— Khalid… — sibilou Amira, parando os seus movimentos e olhando
para ele com os olhos estreitados, sem palavras o suficiente para ofender o
jovem sultão.
Em pouco tempo alguns eunucos bateram à porta, perguntando o que
houve. Contendo sua ira, Amira olhou para Khalid e mandou ele se esconder. A
garota apenas falou falsamente num tom fraco aos eunucos que foi desastrada e
acabou tropeçando e caindo, levando algumas coisas consigo. E lamentou a
vergonha de chamar a atenção deles.
— A senhora está bem? Precisa que chame o médico? — questionaram
sem abrir as portas.
— Estou bem, foi apenas um acidente — respondeu Amira, já vendo as
más línguas no dia seguinte de como a garota era desastrada e no meio da
madrugada estava derrubando o quarto. Tudo por culpa de Khalid! Amira
pensou se virando para ele, que a espiava como um gato travesso, por de trás de
um baú que estava de pé.
Contudo, assim que se deu conta que era Khalid, o grande sultão tirano
dos traidores, escondido atrás dos seus baús de roupa, com uma cara de gatuno,
por que invadiu o seu quarto no meio da noite, Amira teve muita dificuldade
para se manter brava com ele e não rir de toda esta confusão feita em tão curto
tempo.
— Vossa majestade… — murmurou ela — Você não está tão majestoso
assim...
— Eu deveria pedir desculpas por isso? Um rei, imperador, sultão ou o
que for, conseguimos domar leões, conquistar territórios, mas uma mulher
jogando nele tudo que encontra pela frente é algo arriscado! — respondeu
Khalid, claramente segurando o riso, saindo do seu esconderijo e indo em sua
direção, com seus passos firmes e obstinados, com a mão estendida à Amira.
Parando a um pouco menos de dois passos dela.
— Sei… Em todo caso, por que veio pela minha janela? — indagou
curiosa, não se contendo e segurando a mão de Khalid.
— Queria falar com você sobre ter ido ao chá com a Kelebek, sobre
aquela carta também e principalmente, ver com os meus próprios olhos como
você está. Mas se eu mandasse você ir me encontrar, suas criadas te dariam outro
banho, te trocariam, arrumariam e isso levaria horas infinitas.
— Não sei se já te falaram, mas você é um sultão diferente... —
comentou a jovem.
— Ultimamente tenho escutado isso... Em todo caso, nada disso importa.
Como você está? Kelebek lhe fez algo?
Khalid estava muito preocupado com Amira, sua mãe ia à chás com a
víbora quando viva, assim como sua avó e outras mulheres do palácio, contudo,
nunca foi descoberto quando começou aquela doença, de onde veio ou até
mesmo o que causava. Apenas tiveram uma sequência de pessoas adoecendo e
morrendo sem respostas.
Se algo acontecesse à sua amada, Khalid não sabia o que faria, pois desta
vez, não iria deixar o palácio em pé se algo acontecesse sob aquele teto.
Por fim, Amira e Khalid se sentaram no sofá. Primeiro a menina contou
sobre o conteúdo da carta que encontraram, e que ela desconfiava que Kelebek
usou os olhos semelhantes à Aysha para manter o sultão cativo. E em
complemento, contou a história que a Sultana tinha dito, mais a verdade
esclarecida por Nuray.
— Kelebek, aquela víbora! — rosnou Khalid — Meu pai teve um amor
antes de minha mãe vim ao harém, escutei por aí que ele jamais superou, mesmo
quando legalizou minha mãe como esposa e a fez sultana. Quando jovem, meu
pai era um homem que queria viajar por todo o território que seria seu, era
naquela época o homem que fez uma boa fama. E foi esta fama que cresci
escutando do meu pai, por isso, quando criança o admirava. Mas ele mudou,
como bem sabe. Minha mãe sabia que o meu pai ainda era apaixonado pela
mulher que lhe foi proibida, mas parece que um tempo depois da legalização do
casamento deles, chegou a notícia que a tal mulher se matou. Não sei sobre o
passado de Kelebek, mas quando pequeno escutei isso sobre essa mulher. Talvez
Kelebek apenas juntasse informações que foi conseguido e montou esta história,
com algumas ocasiões verdadeiras.
Amira se recorda da imagem da mulher que se assemelhava à uma
pintura em frente à fonte com sua barriga já definida. E uma pergunta lhe
escapou pelos lábios.
— O que você fará com seu irmão no ventre dela, uma vez que consiga
desmascarar a todos?
Khalid desceu os olhos para a mão de Amira que segurava e a acariciou.
— Se ele não herdar os cabelos ruivos dela, pretendo criá-lo como nosso
filho — disse Khalid, então finalmente levantando os olhos, para olhar
fixamente para a jovem — Tudo bem para você?
— Claro que sim, ele é um ser inocente. Mas e se ele herdar? —
perguntou Amira sentindo um frio de temor subindo pela coluna.
— Acha que irei matar meu irmão? — falou em uma voz que passava
certo tom de mágoa e Amira se arrependeu da pergunta não feita — Não, não
farei. Mas pagarei à uma família para que o adote e o crie muito bem, uma
família com os cabelos da mesma cor, para que ele não se sinta diferente.
— Não teme que ele cresça e volte para se vingar? — era apenas uma
possibilidade e uma curiosidade.
— Não se pode vingar, por algo que não sabe, mas ainda que ele viesse
eu iria aceitar — respondeu Khalid dando de ombros, então deixou os braços
cair, encostou-se por completo no sofá e fechou os olhos, aparentemente cansado
— É justo, matei o meu pai pela sua ausência de atitude que causou a morte da
minha mãe. Se a criança vier me matar por ter executado a sua mãe, será justo.
— Entendo… — murmurou Amira ficando em silêncio pensativa e
assim, Khalid também ficou. Ambos estavam sentados próximos, muito
diferente do clima de sedução que tinha começado naquele dia. O ar agora estava
tenso, por motivos muito diferentes e palavras pareciam não ser boas o suficiente
para desfazer o clima pesado.
— Vossa majestade… — começou Amira.
— Khalid… — corrigiu ele.
— Khalid, eu tenho umas perguntas a te fazer… — disse a jovem sem
coragem de olhar para ele. Pousando o seu olhar fixamente para o seu próprio
colo.
— Sou todo ouvidos… — disse ele se ajeitando para se virar de frente
para ela.
— Por que você matou a sua primeira esposa?
CAPÍTULO 18
O sorriso de Khalid era resplandecente, ao ver o rosto da sua amada tomado pela
cor avermelhada. E por aquele instante, a mente de Amira foi tomada apenas
pela existência de Khalid que, como sempre, causou agitação em seu coração
pela surpresa de sua atitude. Amira se sentia tímida e sabia que ele tinha
consciência disso. No entanto, Khalid sempre sentia um prazer infantil em
provocá-la e mimá-la. Porém, daquela vez, ele recorreu a este sorriso, para não
deixar transparecer a sua preocupação.
Era perceptível a olhos nus, que Amira estava com muita dor, com seu
rosto pálido e coberto de suor, mãos tremendo, olhos sem tanta vida, enquanto
fingia estar bem só para acalmar a menina e Khalid.
O jovem sultão quase pôde vislumbrar naquele instante em sua mente,
Ayla com uma miniatura dos dois em seus braços, sendo uma boa e zelosa mãe.
Por ora, ele não poderia ofertar aquilo a ela, e isso o deixava mal-humorado.
Contudo, longe daquele devaneio emocional, ele tinha que tratar os
ferimentos de sua Ayla, pois quando ela tropeçou, soube que eram seus pés que
estavam machucados. Mas quem a conhecia minimamente, sabia que a garota
não se permitiria ser cuidada, enquanto os seus homens procuravam pelas
crianças.
Com ela em seus braços, ao menos a dor seria mais tolerável.
— Khalid! Me coloque no chão… — sibilou ela, constrangida.
Amira mal o olhava nos olhos, constrangida com a sua fraqueza. Khalid
percorria com os olhos cada pequeno detalhe dela e ela em resposta, parecia
estar totalmente consciente que não era alvo apenas dos olhares de Khalid, mas
de todos ao redor. Fazendo-a sentir- se pequena, não por tamanho, mas por
existência.
Khalid a manipulou para o seu próprio bem, sabendo como estava sendo
teimosa mesmo ferida, trazendo-a para mais perto de si e aproximou a boca de
seu ouvido:
— Pequena prometida, veja a criança na qual você se apegou… —
murmurou Khalid, sabendo que assim ela não se forçaria por ora a andar.
Amira sentiu um arrepio percorrer fortemente o seu corpo, ao sentir a
respiração de Khalid próximo à sua pele. Ela prendeu a respiração, mas fez
exatamente o que ele ordenou e virou lentamente o olhar, em sentido à menina
que estava parada perto de Jaffar. Contudo, ela não esperava ver o brilho de algo
mais, a esperança que se revelava nos olhos da menina. Como se observasse algo
além de um homem com uma mulher nos braços, algo que transcende as
palavras existentes.
A menina não parecia mais assustada, na verdade, em meio aos seus
olhos brilhantes a pequena valente abriu um sorriso que aqueceu o coração de
Amira. Fazendo-a esquecer da sua timidez ou qualquer outra coisa menos
relevante. Algo como “Ele realmente é bom. Ele realmente se preocupa.”
Amira sentiu seu próprio sorriso se abrir também, não era a esperança
que brilhava, mas algo mais próximo de um futuro, algo além do que ela
imaginava existir. Um futuro que contrastava aos olhos dela de antes, onde só
existiam homens ruins.
— Viu? Ele não é malvado. Não comigo. Mesmo “eu” uma escrava, não
tão diferente de você... mas continue sempre alerta...— Amira disse à menina,
piscando em seguida — Está bem, você ganhou dessa vez...
— Não gosta de ser vista nos meus braços? — Khalid não resistiu em
provocá-la.
— Khalid! — Amira repreendeu-o em tom severo.
(...)
Com Ayla em seus braços, Khalid se virou de frente para os seus
homens. Seguindo com naturalidade, arrastou o olhar por eles e encontrou um
que não estava tão ferido. Ordenou a ele que retornasse ao palácio com as
seguintes palavras:
— Informe à sultana Nuray o que ocorreu, ela saberá o que fazer e
mande-a se encontrar conosco no retorno na parte da frente do pátio do palácio.
Ademais, encontre o médico, que deverá estar garantindo que o traidor não
morra, para que mande sua filha para cá — Khalid parou reflexivo, em um
silêncio misterioso e continuou num tom mais baixo e severo: — Me informe
rapidamente retornando, se algo estiver errado no palácio.
— Sim, vossa majestade! Irei agora mesmo! — respondeu o soldado, se
virando para partir rapidamente em direção ao palácio.
Khalid se virou para outro homem que estava menos ferido e ordenou:
— Procure por todos os médicos e pessoas com conhecimento sobre.
Reúna as mulheres do povo, toda ajuda será necessária. Vendedores e moradores
que estavam na área devem estar feridos. Leve alguns homens com você e
levantem uma tenda para poder separar os feridos dos demais. Além disso, os
corpos deverão ser recolhidos. O restante…
Amira não deixou Khalid terminar de falar, pois viu saindo do beco de
que saíra, os vendedores que se fizeram de escudo para que ela pudesse fugir
com a menina. Eles carregavam olhares preocupados, estavam feridos e como
não eram mais tão jovens, Amira sentiu o seu coração se apertar.
Amira ergueu a mão apertando um pouco as vestes de Khalid para
chamar sua atenção.
— Khalid, espere só um instante, por favor. Graças a aqueles senhores
pudemos fugir — confidenciou Amira, mostrando os senhores que tinham
chegado.
Entendendo a situação, Khalid foi em direção a eles em passos largos,
passando por Jaffar e os seus homens remanescentes. Os senhores, surpreendidos
ao reconhecer o seu sultão, baixaram o olhar e curvaram-se.
— Oh! Grandioso sultão, abençoado seja!
— Abençoados sejam os senhores… — disse Khalid colocando
cuidadosamente Amira no chão diante deles.
— Vieram, pois estavam preocupados conosco, certo? — disse Amira
bondosamente, se abaixando para pegar a mão de dois dos senhores — Honrados
senhores, lhes devo imensamente! Não existem palavras para agradecer.
Humildemente, Amira curvou-se respeitosamente a eles. Ela podia sentir
suas mãos ásperas pelo trabalho duro e sujas pelo próprio sangue. Eles soltaram
suas mãos da dela, dizendo que estavam com as mãos sujas.
— O que são mãos sujas, senhores, senão a prova de que são fiéis servos
de Alá, trabalhadores e honrosos? Que a benção de Alá recaia sobre vocês...
Lamento imensamente que se feriram no processo...
Eles pareciam maravilhados e ao mesmo tempo emocionados, com o
agradecimento humilde da garota, que agora tinha grande parte dos seus longos
cabelos negros caídos para fora da vestimenta masculina. Dando-lhe um ar
desleixado, mas incrivelmente belo e surpreendentemente delicado.
— A flor do deserto, Amira! É a concubina do nosso sultão, não deve
nos agradecer! — respondeu o mais velho dentre eles.
— Tocou-me profundamente a ação dos senhores. Não é o suficiente,
mas… — disse Khalid que tomou a frente, tirando de suas vestes dois sacos de
ouro e lhes entregando — Com essa humilde oferta, poderão restaurar suas
barracas e suas mercadorias. Se necessitarem de mais alguma coisa, podem falar
diretamente com o Grão Vizir Jaffar… Estamos em débito.
Enquanto Khalid dizia, segurou Amira, lhe dando suporte para continuar
em pé e deu visão a Jaffar, que estava com a menininha e os cumprimentou em
silêncio.
— A menininha… — comentou um dos vendedores, reparando-a.
— Sim, ela e outras crianças estavam com mercadores. Elas foram
usadas em uma emboscada — disse abertamente Amira, surpreendendo os
homens. Afinal, politicamente falando, quando ocorriam coisas desse tipo, a
situação era abafada para que o povo não ficasse admirado e inseguro — No
momento da luta as demais crianças que vieram com ela, se espalharam e
estamos procurando-as. Se os senhores puderem nos ajudar a procurá-las
também. Conhecendo tão bem a cidade…
Compadecendo da sinceridade e preocupação de Amira, viram-se
motivados a ajudar. Enquanto murmuravam que era um absurdo, uma
emboscada para líderes e senhores tão bons, preocupados com seu povo. Que os
traidores mereceram suas mortes. De boca em boca a conversa foi se espalhando
e o povo de cada canto da cidade logo saberia que “o seu senhor apaixonado por
sua senhora, tinham saído em um passeio e pessoas ruins que não suportavam o
bom sultão e sua bondosa favorita, fizeram uma emboscada envolvendo até
mesmo crianças.” Assim como todos, procuraram as crianças em cada canto,
dentro de suas casas, nas ruínas que um dia foram suas tendas e até mesmo nos
galhos das árvores. E surpreendentemente, cada criança foi encontrada com não
mais que alguns arranhões e assustados.
Quando todas as crianças foram reunidas na tenda erguida anteriormente
para os cuidados médicos, Jaffar soltou a menininha que foi correndo ao
encontro das demais. As abraçando, virando um bolo de crianças chorando.
Assim, Khalid foi forçado a permitir que Amira, mesmo mancando, fosse até
elas para tranquilizá-las.
Todos conseguiram ser cuidados, inclusive Amira, esta que era tratada
pela filha do médico do palácio que já estava ali há algum tempo. Amira teve
uma torção agravada pela corrida e esforço. Por este motivo estava com o
tornozelo inchado e dolorido, mas tranquilizou-se sendo informada que logo
estaria melhor. Khalid também teve que ser tratado, mas só o aceitou após que
todos, até mesmo os humildes moradores, tivessem terminado de serem
cuidados.
Quando todos estavam bem, Khalid subiu em uma caixa de madeira.
— Silêncio todos, o seu sultão irá falar! — exclamou um dos soldados.
— Meus honrosos súditos! Irei me responsabilizar por toda a ajuda para
restaurar tudo que foi perdido. No entanto, visto que todos passaram por
cuidados médicos, irei retirar-me por hoje, com a minha favorita e levarei as
crianças conosco. Mas meus servos que não estão feridos continuarão aqui, sob o
meu nome para auxiliá-los em tudo que for preciso. Sinto muitíssimo, que por
infortúnio sofreram pelos corrompidos pela ganância, que ainda existem por
estas terras. Juro pela honra de minha família, que eliminarei esta peste que
atormenta as nossas terras.
Tão logo que ele terminou de se pronunciar, um dos seus servos se
aproximou com um cavalo. Ele desceu de sua caixa e se encaminhou para
Amira, passando pelas pessoas. No entanto, sem aviso prévio, se abaixou e
inesperadamente a pegou nos braços. Erguendo-a com facilidade, causando uma
exclamação de surpresa em todos.
— Crianças, sigam-nos — informou Khalid a elas, que se levantaram
rapidamente sob a ordem, obedientemente.
Caminhou com Amira em seus braços até o cavalo e a colocou sobre ele,
sentada. Ela não sabia o que falar a Khalid, tamanha a sua surpresa. Não sabia se
ele achava que era uma boneca para manipular seu corpo como fosse sua
vontade, ou se ele a achava incompetente até mesmo para simplesmente andar.
Ela queria brigar com ele, mas não poderia fazê-lo neste momento.
Contudo, se viu em um conflito de emoções, quando ergueu o olhar ao
povo e viu sorrisos. Mais que isso, Amira tinha certeza que todos os homens da
cidade, moradores ou estrangeiros, queriam maridos para as suas filhas que as
tratassem com tanto zelo quanto Amira era tratada pelo homem mais poderoso
do império.
As mulheres não esperariam menos que isso de seus parceiros.
Amira até queria se sentir tímida, mas ao mesmo tempo, sentia até um
tanto de graça. Pois com o honroso exemplo de homem que Khalid era, Amira
pôde ver por cima algumas mulheres olhando de soslaio seus maridos.
(...)
As crianças foram levadas ao palácio, em carruagens junto com Jaffar
que os seguia a cavalo enquanto Khalid estava com Amira em um único cavalo.
Rapidamente chegaram à entrada do palácio e foram recebidos por Nuray junto
com vários criados. Ela que veio ao encontro deles, preocupada como se fosse
realmente a mãe de ambos.
— Por Alá! O que se passava na cabeça de vocês para saírem às
escondidas?! — reclamou ela — Mas fico aliviada que retornaram com apenas
alguns ferimentos…
Khalid desceu do animal e então ajudou Amira a descer também, mas
quase imediatamente, um criado se aproximou e murmurou algo a Khalid que
pareceu ficar furioso imediatamente — Terei que ir imediatamente, sinto muito
não poder ficar mais. Nuray, confio Amira e as crianças a você.
— Sim, meu sultão — confirmou ela se curvando.
Khalid virou-se para Amira, se aproximou e tocou levemente com os
lábios na testa dela. Então em um rompante furioso, se virou para ir para dentro
do palácio interno. Parecendo uma tempestade de areia no deserto, vestido em
fúria, com seus passos largos e rápidos, sumindo rapidamente da vista. Amira
apenas seguia-o com os olhos, preocupada com o que quer que viesse a ter
acontecido e Nuray seguiu o olhar da jovem. Achando agradável ver o elo que
eles tinham.
— Então… — começou Nuray — Onde estão as crianças?
— Oh! Sim — disse Amira, despertando do devaneio — Estão na
carruagem.
Amira foi mancando até a carruagem, enquanto os criados abriram o
caminho e parou diante das crianças às oferecendo a mão. A primeira a sair, foi a
pequena valente, arrancando um sorriso de Amira ao segurar sua mão e chamar
as demais.
Jovens meninas e meninos, muito pequenos. Com seus cinco, seis e até
sete anos encheram os olhos de Nuray que se viu encantada com as crianças.
Uma vez que fazia muito tempo que não via uma. Apressadamente se juntou a
Amira e se apresentou às crianças, mas ao ver que a menina não desgrudava de
Amira, Nuray sorriu e perguntou:
— Pretende adotá-la? — falou baixo Nuray, enquanto caminhavam junto
com as crianças e os criados em direção ao palácio.
A menina estava próxima o suficiente para ouvir e abriu um largo
sorriso, chamando a atenção das duas. Mas surpreendentemente, tão rápido
quando o seu sorriso veio, a pequena olhou para trás e então seu sorriso morreu.
— Não gostaria que eu lhe adotasse? — perguntou Amira.
— Não é que eu não gostaria, mas… por tanto tempo estive com as
outras crianças. Estou em um lugar em que te conheço, mas eles só conhecem a
mim… Não me sentiria bem, em uma vida confortável longe deles.
Amira se lembrou das vezes que apanhou, das chibatadas e das imagens
das meninas encolhidas chorando e como elas se recuperaram rápido, e foram
ingratas, em silêncio, Amira se sentiu amarga. Mas admirava o bom coração da
menina, não queria que aquelas outras crianças se tornassem aquelas que lhe
viraram as costas...
Já sei! Pensou ela de súbito.
— Podemos fazer assim, vocês ficarão aqui no palácio por um tempo no
harém. Podem, Sultana Nuray?— questionou Amira.
— Claro, querida. Isso foi planejado — respondeu tranquilamente.
— Mas... Não quero que sejam forçados a se tornarem escravos ou
servos por falta de opção. Darei a todos a chance que me foi dada. Estudo. Não
preciso de todo o ouro e tantas vestes que tenho. Quero eu mesma custear isso…
— disse Amira parando e olhando para a pequena, se abaixando e ficando da sua
altura — Construirei um lugar onde vocês poderão viver, poderão estudar, e se
tornar servos do palácio se desejarem, mas que se quiserem se tornar
mercadores, viajantes… poderão. Terão que estudar outras línguas, etiqueta,
política, dança, música, modos, se alimentar bem. Além disso, rezar bastante
para ter a certeza que Alá abençoará o caminho de vocês. Acha que você e as
demais crianças podem fazer isso?
— Sim!!! — respondeu ela animada pulando feliz, exatamente como
uma criança deveria ser.
Nuray em silêncio, olhava Amira, abaixada olhando para a menina, uma
futura sultana. Humilde e de coração bom. Nuray via neste momento, um futuro
brilhante e grandioso, que ela gostaria de ver com seus próprios olhos. Por isso
tossiu para chamar alguma atenção e disse:
— Se me permitirem, também quero participar disso. Posso doar mais
ouro, conseguir professores e organizar tudo isso. Em um futuro, não terei mais
muitas funções e encargos aqui no palácio.
Amira se sentiu ansiosa com a perspectiva de ter uma pessoa tão boa,
responsável e com tanta sabedoria para ajudar. Era empolgante ter uma
perspectiva mais sólida de um bom futuro para essas crianças. Entretanto, no
momento em que ela levantou o olhar para a sultana Nuray no intuito de
agradecer empolgada, viu um rosto lamentavelmente familiar.
Said!
Surpresa com a súbita mudança de expressão de Amira, Nuray se virou
para ver o que tinha feito o rosto de sua querida menina perder a cor tão
subitamente e ganhar um brilho de raiva. Por infelicidade, o homem entrou no
palácio antes que Nuray pudesse ver quem era e ela retornou o seu olhar à jovem
Amira para perguntar abertamente:
— O que houve?
— O homem que me criou…
— Ah! Diz sobre essa pessoa? — parecia sem graça — Ele chegou um
tempo depois que vocês "fugiram". E bom, o Khalid mandou chamá-lo, dizendo
que estava muito feliz com você e que pretendia dar uma esposa a Jaffar. Queria
que ele viesse e trouxesse as mulheres disponíveis...
O rosto de Amira perdeu ainda mais a cor se isso era possível.
— Khalid fez o quê?!
A pequena menina ficou surpresa, mas Amira respirou fundo, tentando
conter-se. Virou para a pequena e falou calmamente:
— Pode ficar com a Nuray um pouco? Ela cuidará bem de você assim
como cuida de mim, a tomo como uma mãe querida que Alá me trouxe após ter
perdido a minha… — A menina movimentou a cabeça.
Amira se levantou de um rompante e até mesmo esqueceu sua dor no pé,
ela tinha que encontrar Khalid e saber o que ele estava planejando com essa ideia
absurda. Negando-se a acreditar que o que a Sultana disse era verdade. Khalid
sabia a verdade, ela tinha lhe contato e ele compraria outras como ela?
Por um segundo o pensamento lhe passou pela cabeça. E se ele estivera
mentindo? E se ela não fosse o bastante? Ele já tinha enjoado dela? Mesmo com
todo cuidado que tinha com ela? Eles ainda não consumaram a união, será que
não a via como mulher e apenas como Ayla?
Pensamentos inconstantes e rápidos vinham à mente de Amira,
buscando uma resposta razoável pelo comportamento de Khalid.
Horas antes...
Said, quando chegou ao palácio com suas mulheres, esperou ser muito
bem recebido. Afinal, tinha vendido ao sultão a sua melhor obra prima. Tamanha
a sua perfeição que o falecido sultão se dedicou a salvá-la e o seu herdeiro a
tomou para ele. Mas o jovem sultão parecia ocupado, suas mulheres foram
levadas a um lugar mais confortável do outro lado do palácio enquanto ele ficou
em um aposento à espera do encontro com o homem.
A princípio, disseram que ele e o grão vizir estavam ocupados
resolvendo algumas coisas por isso da demora em recebê-lo. Contudo,
aparentemente um Imã também estava à espera de encontrar o sultão e fora
pedido para ele aguardar na mesma sala que Said. O que instigava Said era o que
o sultão poderia estar fazendo, uma vez que o grande vizir geralmente se
encarregava de fazer.
O Imã foi respeitoso com Said e o cumprimentou, conforme entrava e se
sentava. O Imã era um homem idoso, mas que carregava consigo uma grande
confiança, sem tremer seu corpo ou mostrar fragilidade que os idosos geralmente
traziam consigo, ao mesmo tempo em que portava uma grande tranquilidade.
Eventualmente, como qualquer pessoa de sua idade, acabou puxando
alguma conversa com Said. Falando do dia, do tempo e até mesmo que estava
muito feliz pelo novo sultão, mesmo que por todos ele fosse conhecido como um
grande tirano por eliminar os traidores, maus e corruptos. E bondoso senhor
preocupado com o seu povo a todo custo.
Com as palavras do Imã, Said sentiu o seu sangue gelar em suas veias.
Pois o jovem era diferente de seu pai, o antigo sultão. Onde uma bela mulher
perfeitamente decorada e famosa seria o suficiente. Com a sua sede por justiça,
poderia ele apenas ter o chamado aqui para poder condená-lo à morte?
Questionou mentalmente. Afinal, marcas fazem-se visíveis no corpo de Amira.
No entanto, a fala do imã não passou alheia às preocupações de Said.
— O único lamento é que o sultão se viu apegado a uma única mulher
— confidenciou, lamentando um tanto — Ele deveria ter um grande harém de
mulheres férteis, para poder ter muitos herdeiros. Dentre todas as mulheres, ele
escolheu a “flor do deserto”, no qual ele é devoto. Mas é inegável, ela é muito
querida por aqui, pelos criados, pelo povo e por todos com o seu bom coração.
Said não conseguia assimilar a jovem Amira à uma bondosa mulher.
Não aquela mulher com fogo nos olhos de gelo. Tempestuosa e geniosa, teimosa
e absolutamente orgulhosa. A criança mais forte que um dia Said já viu e que
inclusive o seduziu na sua força contida em seu pequeno corpo. Mas de tudo que
o velho senhor dizia sobre ela, deixava claro que tinha algo de errado naquele
local. Se Khalid era o sultão, apenas poderia ordenar a sua execução. Não
precisaria chamá-lo aqui. A não ser que o que o esperava fosse pior do que a
morte. Em todo caso, Said não se sentia seguro ali.
O homem deu uma desculpa que precisava urinar e chamou um criado
para que pudesse o levar até lá. Despediu-se do Imã, que apenas o cumprimentou
com um sorriso gentil. Said não tinha percebido, mas no instante em que ele se
levantou para sair agitado se fez um brilho satisfeito nos olhos do velho homem.
O Sheik seguiu o criado, que o instruiu, fingiu ouvir até ver a sua
oportunidade de fugir. Em meio às suas andanças, viu que tinham poucos
soldados ao longo do palácio e os que estavam pareciam todos agitados, os
criados falavam rápido e caminhavam para o outro lado do palácio.
— Sua majestade o Sultão e a sua favorita fugiram do palácio... — foi o
grupo de palavras que Said escutou de alguém falando em uma sala.
— Sim, e de todos os momentos, eles foram atacados neste passeio!
Parece que logo retornarão com visitas, foi o que a sultana Nuray disse.
Devemos nos apressar, parece que crianças estão envolvidas.
E nesta curta conversa Said soube que era mentira sobre o sultão estar
ocupado com seus deveres do sultanato. E ele não parecia diferente de Amira, se
ambos fugiram de dentro do palácio, já que aquela garota não era facilmente
contida, sempre fazendo o que queria e desafiando-o arrogantemente.
Said teve certeza de que o seu chamado ao palácio, foi para encontrar a
sua morte. Sentindo a raiva fluir por todo o seu corpo, o anseio de pegar Amira
pelo seu fino pescoço e a enforcar até ver a vida deixar seus belos olhos, fora
imenso. Se ela malditamente mantivesse aquela língua parada e obediente, Said
não teria tantas dores de cabeça. Se ele soubesse que o antigo sultão faleceria tão
logo a chegada dela ao palácio, as coisas seriam diferentes.
Maldição! Pensou Said refletindo para que lado iria, como fugiria e que
teria que abandonar todas as mulheres que trouxera, o que lhe renderia o
suficiente para uma vida confortável. Ao mesmo tempo em que tinha certeza que
antes de fugir, encontraria a oportunidade de fazer aquela que ele tão
rigorosamente criou, pagar.
Conseguiu descobrir o caminho à frente do palácio seguindo os criados e
em dado momento, acabou andando mais do que deveria. Pois assim que estava
caminhando, seus olhos encontraram os de Amira. E ele viu em seu rosto o
espanto se converter em uma latente raiva. E Said voltou a se esconder. Havia
muitas pessoas ali, e ele tinha que pegá-la separada deles. Contudo, conhecendo-
a, sabia que logo ela viria atrás dele.
(...)
Amira rapidamente andava pelo primeiro e segundo aposentos que ela
entrou, passando por alguns guardas remanescentes. Ordenando que queria falar
com o sultão imediatamente e que fossem o informar. Sentindo o calor emanar
por todo o seu corpo, a jovem seguiu andando sem nem sequer olhar para os
lados.
Said estava aqui! E estava vagando pelo palácio confortavelmente!
Como no mundo Khalid permitiria algo do tipo? Pensava Amira rapidamente e
furiosa, com sua cabeça pulsando de dor devido tamanha a raiva. No entanto, em
uma das curvas que ela tomou para ir ao corredor, sentiu a mão de alguém
subitamente a puxando para a penumbra de um canto escondido. Seu coração
refreou suas batidas, seu ar lhe faltou, o sangue gelou e embora estivesse
acostumada com os sustos de Khalid, se fosse ele novamente ela o chutaria entre
as pernas. Porém, quem a tinha puxado não fora Khalid, mas Said!
Amira arfou surpresa, mas se debateu, lutou mesmo que a dor voltasse,
mesmo com os músculos cansados. Olhar Said tão de perto a enchia de uma
energia vinda da raiva e da ira crescente. As mãos do homem a seguravam com
firmeza e força, erguendo-a levemente do chão.
— Said! Maldito! Tire as mãos de mim imediatamente! — exclamou
ela, raivosamente.
— Todos estão ocupados com o seu senhor, o Sultão! Ademais tem as
tais crianças que você trouxe. Parece que continua se preocupando com pessoas
que nunca vão valorizar nada que faça. Mas disto, acha mesmo que alguém vai
reparar o seu desaparecimento em meio a todos os problemas que estão
acontecendo aqui? Fui os ouvidos desse palácio por um curto tempo, e acha
mesmo que alguém ouvirá e virá ao seu socorro?!— disse Said um tanto louco,
sorrindo.
Amira ouviu a lógica em suas palavras e um medo enorme se formou em
suas entranhas em uma bola crescente e esmagadora. Como um animal
encurralado, tentou chutar e lutar com as pernas, no entanto, não tinha
sustentação suficiente para isso. Uma vez que ele a deixou levemente na ponta
dos pés.
Se divertindo como um gato encurralando um rato, Said a olhou
descendo o olhar por seu corpo, notando que ela vestia vestes masculinas e
sorriu achando graça.
— O seu sultão é diferente, vestindo sua concubina de homem. Mas
inesperadamente não ficou menos bonita, só é lamentável que suas curvas todas
estejam escondidas por esses tecidos... — falou lascivamente Said, como sempre
fazendo Amira sentir ânsia e mal estar com as suas palavras asquerosas.
No entanto, o humor cessou quando ele estreitou os olhos raivosamente
para Amira.
— O que você disse ao Sultão, vagabunda?! Parece que não lhe causei
dor suficiente enquanto se tornava quem você é hoje! Devo lhe lembrar, que
quem você é, foi graças a mim? Deveria ter arrancado a sua língua e dizer que
quando a encontrei já estava sem!
Amira estava aterrorizada, mas não conseguiu evitar a ironia. O homem
que por toda a vida dela se achava o dono do mundo, inteligente e intocável, não
era tão seguro de si assim. Perto de Khalid, ele parecia não mais que um
covarde.
Amira, com os lábios trêmulos sorriu, mesmo que a vontade de chorar
fosse igualmente grande.
— Claro, está com medo de Khalid! Este é o seu desespero! Ele é um
homem melhor que o sultão anterior. Se me machucar, ele irá atrás de você…
Deveria ter pensado nisto antes de me vender — disse Amira em um riso
nervoso, um misto de emoções que a fazia sentir-se louca.
— Maldita! Ele não poderá fazer nada comigo, se não descobrir que fui
eu que fiz. Até onde eu percebi parece que vocês recebem ataques… Para
acreditar que foi só mais um e se eu quisesse, inclusive poderia deflorar-te
agora… Amira.
Trêmula, Amira via desejo nos olhos do homem. Desejo carnal e o claro
desejo de matá-la. As emoções que isso provocava eram atormentadoras. A mera
existência deste homem a assustava e enraivecia. Quanto mais ele falava, mais
perto dela ele ficava e ela, num ato desesperado, tomou proveito disso, para lhe
dar uma cabeçada em seu rosto. Atordoando-o, ao ponto de soltá-la.
Amira ficou levemente zonza, mas ainda assim se esforçou para se
manter em pé apoiada na parede. Precisava achar um soldado, achar Khalid e
pedir por ajuda, mas sendo tocada por Said daquela forma ela não poderia ser
vista. Seria mal interpretada.
Ela tinha que fugir para sair do campo de vista de Said e assim que seus
pés tocaram o chão, ela se virou e saiu correndo pelo saguão freneticamente.
Said começou a correr atrás dela e Amira ofegante, viu por um instante uma
entrada que reconheceu por um momento ter passado por ela junto com Khalid.
Virando a sua corrida e indo em direção à ela, Said não estava ferido ou
fadigado, corria mais rapidamente e o desespero de Amira crescia. Ele quase a
alcançou e pegou pelos longos cabelos para derrubá-la, no entanto, o mesmo
pegou poucos dos fios de seus cabelos estourando facilmente.
Assim que estava quase alcançando a passagem secreta localizada atrás
do tapete que estava pendurado, Amira sabia que se estivesse certa, pouco depois
dali havia uma bifurcação e assim ela poderia ganhar algum tempo para fugir
antes que Said soubesse para qual lado ela tinha ido. Mas ela teria que passar
pelo pesado tapete, para poder entrar na porta, precisava de tempo e o este era
curto.
Então ela teve uma ideia, lembrando-se dos senhores da cidade, parou de
correr e se abaixou. Fazendo com que Said tropeçasse sobre ela e fosse de cara
ao chão, machucando-se no processo. Antes que ele levantasse a cabeça, Amira
se esforçou e levantou em um impulso pulando sobre Said e fazendo com que ele
voltasse novamente, com outro golpe ao chão.
No calor do medo e do desespero, o sangue de Amira pulsava rápido.
Sem sentir tanto o impacto do que fazia, ela se sentiu satisfeita por segundos
antes de sair de cima dele e para ir à entrada da passagem. No entanto, o golpe
não foi tão forte quanto ela esperava. Pois quando saiu de cima dele, ele
conseguiu segurar seu tornozelo ferido.
Só com a pressão Amira quase gritou a plenos pulmões, tamanha fora a
dor e o seu reflexo foi simplesmente chutar o rosto do homem para se livrar da
sua mão, golpeando o seu nariz e quebrando-o. Mancando devido ao ferimento,
com o sangue já não tão quente e sem conseguir ignorar a dor, foi em direção ao
tapete puxando-o e abrindo-o para entrar na passagem. Seguindo o breu do lugar,
tocando as paredes, até chegar à bifurcação. Pensando que o homem apenas
seguiria as paredes, sem saber da bifurcação, ela tomou o outro caminho.
Percebendo que ele levava à uma parte alta, subindo degraus. Com a respiração
oscilante, cansada e ofegante.
Amira estava erguendo o pé para subir mais um degrau quando seu pé
fraquejou e ela foi de encontro ao chão fazendo barulho e se machucando ainda
mais. A jovem sentiu suas lágrimas quentes de desespero rolar pela sua face,
pouco antes de voltar a tentar se levantar.
Fugir, ela tinha que fugir. Ele provavelmente sabia onde ela estava
agora.
CAPÍTULO 22
A mira sentia sua coragem como cacos de porcelana espalhados pelo chão.
Sentia-se fraca e machucada, com ódio e com vergonha de sua própria
incapacidade de lutar com o homem que tanto repudiava. Socou o chão,
estressada e cansada, ponderando aceitar a morte lamentável que a esperava.
— Alá... — murmurou ela, num tom baixo.
Pouco antes de um soluço frustrado escapar pelos seus lábios, enquanto
ela se levantava, apoiando com o seu pé bom no chão, retornando a subir os
degraus. Recordou tudo que já viveu, o quanto sobreviveu e que era imperioso
que ela sobrevivesse. Seria vergonhoso morrer de forma tão tosca nas mãos de
Said.
Queria ao menos viver até ver esse homem que a perseguia morto e
sentir-se vingada.
Até Khalid concluir seus planos e expurgar o mal desse lugar.
Ao menos ver aquelas crianças em segurança e…
Dizer que amava Khalid.
Passo ante passo, degrau após degrau, Amira seguiu andando até
encontrar uma pesada porta e a empurrou, com dificuldade, forçando ainda mais
seus músculos já doloridos e esgotados, e então, quando conseguiu abrir a porta,
uma lufada de ar a golpeou. Não era o vento fresco do lado de fora, mas era de
um lugar familiar. No entanto, fatigada como estava, apenas entrou e tentou
fechar a porta atrás de si. Porém, uma mão na porta a impediu que conseguisse
concluir a sua ação.
Said tinha aparecido, enfiando a sua cara feia na parte aberta da porta,
com a sua enorme cicatriz em seu rosto causada por ela. Ele estava tão próximo
de Amira que a surpreendeu.
— Maldição! — exclamou ela, ao se afastar da porta, assustada.
Observou ao redor para tentar fugir, mas o espaço era pequeno, parecia
algum tipo de sacada e existia apenas uma saída: uma escada à sua direita.
Tentou descer, mas o homem não permitiu. Agarrando-a pelos seus
longos cabelos soltos, fez com um solavanco que ela se inclinasse para trás. Ele
a puxou mais para perto de si, aproximou sua boca de sua orelha e disse:
— Acreditou mesmo que poderia fugir de mim? — indagou ele ao
colar seu corpo já excitado no dela, descendo a cabeça ao ombro de Amira e o
cheirando. Deslizou a face lentamente até chegar ao vão entre seu ombro e
pescoço, pousando um beijo ali.
Amira sentiu um arrepio tomar seu corpo de puro asco e nojo, quando
ele inclinou o rosto dela em sua direção, como se fosse tomar-lhe os lábios.
Amira, desesperada por safar-se das garras do homem, lhe deu outra cabeçada no
nariz, e dessa vez, o sangue dele escorreu quase que instantaneamente, fazendo-o
soltá-la, ao mesmo tempo em que exclamava a sua dor.
A garota gritou e viu-se caindo, pois além de soltá-la, ele a empurrou
para longe de si. Por segundos sua cabeça parecia ver a cena lentamente, indo ao
encontro da quina do degrau com o seu rosto, para então rolar pelo resto da
escada até a sua base. Seu coração doía no peito, diante da perspectiva de tal
coisa. No entanto, por sorte, ela conseguiu evitar ao se segurar no corrimão.
Suspirou, mas o seu alívio durou pouco, pois em sequência, ouviu
grunhidos animalescos acompanhados pelo som de correntes sendo arrastadas
pesadamente, que fizeram seu sangue gelar em suas veias.
O tempo pareceu ficar lendo novamente, seu olhar se virou para o lado e
encontrou o do grande felino. Agora desperto, de pé e a olhando diretamente nos
olhos. Ela se viu submetida a um terror sem igual, como se sua vida pudesse ser
perdida em um único movimento. Ele deu um passo em sua direção e as
correntes voltaram a fazer barulho, chamando a sua atenção.
Com seu corpo ainda enrijecido pelo pavor, Amira só se deu conta que
Said tinha se recuperado, ao ponto de voltar a atacá-la, quando sentiu sua mão
tocar o ombro dela, despertando-a do seu torpor e a trazendo a realidade, ainda
que sua primeira reação houvesse sido se impulsionar para trás, a fim de ficar
longe o máximo possível do leão. Ao lançar o seu corpo para trás, porém, ela
acabou se jogando em Said, que sofreu um golpe que não esperava, batendo suas
costas e cabeça na parede atrás deles.
Said estava confuso e desnorteado por causa da pancada. Em seguida,
seus olhos se arregalaram ao se dar conta do leão. Naquele instante, Amira viu
uma chance de sair daquele local, voltando a correr em direção à porta.
Mas o insistente homem, não desistiria tão fácil de sua presa. Said
recuperou-se rapidamente do choque ao ver as correntes presas ao animal,
apressou-se atrás da moça ferida. Ela mal tinha adentrado no breu, e então
bastou um esticar de braços para ele conseguir alcançá-la, agarrando-a pela
roupa.
Amira se debatia, e impaciente Said a puxou em um solavanco, trazendo
o corpo dela contra o seu novamente. Porém, ela não parou de lutar contra ele,
completamente inquieta, fazendo-o desequilibrar-se e encostar-se à sacada que
estava a alguns metros de altura do leão.
— ME SOLTE! BASTARDO, NOJENTO E INFELIZ! DEMÔNIO! —
exclamava a garota.
E ele a soltou, sim, apenas o suficiente para girá-la em um rompante e
colocá-la de frente a ele. Assim que o olhar de Amira encontrou com o do Said,
sua raiva e pavor, tudo o que sentia ao mesmo tempo, fizeram com que ela o
atacasse com as unhas na face. O arranhando, batendo e socando
desesperadamente. Dando vazão aos seus instintos mais primitivos, até mesmo,
chegando ao ponto de abaixar a cabeça para morder a mão do homem.
Said arfou com a dor da mordida da garota. Furioso, ele segurou com
mais firmeza o braço da mesma, torcendo-o e a sacudiu.
— PARE DE LUTAR! — exclamou tão alto que a garota estremeceu —
OU EU VOU REALMENTE TE MOSTRAR O QUE É DOR!
Amira engoliu em seco, mediante o olhar macabro do homem. Contudo,
era nítido no rosto dele, que independente do que ela fizesse a sua intenção era
apenas uma.
— A quem você quer enganar?! — indagou ela, se recuperando do grito
que ele deu. Com a mão livre, o empurrou para longe de si. Fazendo-o se
inclinar no peitoril da sacada, chamando mais a atenção do leão que grunhia
mais alto — Você vai me matar de qualquer forma, o motivo de você estar aqui
foi esse, não é? Seu bastardo nojento!
Amira cuspiu no rosto do homem, o olhando com escárnio. Said em
resposta, a soltou, estapeou com força o seu rosto, fazendo-a inclinar-se para o
lado e a empurrou contra a porta em sequência. Onde ela bateu as costas com
força, arfando e ele impiedosamente foi para cima dela, pegando-a pelo pescoço
e então, rosnou enquanto falava:
— Você continua selvagem, animalesca e com instinto tolo de um
animal acuado. Tentando se fazer de valente diante de alguém maior que você.
Mas, desta vez tem mais confiança do que antes… e acho que é por que tem a
ilusão que será salva por Khalid…
E então o sorriso de Said fora cruel.
— Você vai morrer na ponta da espada de Khalid! — disse Amira com
dificuldade, tentando soltar a mão de Said de seu pescoço, debatendo-se.
— Eu morrer? Até posso… — disse ele se aproximando dela e
murmurou: — Mas antes vou me divertir com você. Além disso, você realmente
acha que ele vai te salvar? Quando seu sultão encontrar seu corpo devorado por
esse leão, ele apenas vai colocar outra no lugar.
As palavras de Said foram mordazes e acertaram Amira como um golpe
forte no rosto. Com esforço, ela parou de tentar tirar a mão de Said do seu
pescoço e ergueu as mãos, se agarrando à porta cheia de ornamentos, sustentou o
seu corpo e o levantou o suficiente para encolher as pernas e chutar com força a
barriga de Said.
Este que a soltou de imediato, enquanto cambaleava para trás. Dessa
vez, tomada pela ira, avançou empurrando-o com força para o peitoril, fazendo
com que ele se inclinasse perigosamente, quase caindo. Apesar disso, por
instinto Said agarrou Amira para não cair, levando-a junto.
Ao mesmo tempo, o leão ainda insistindo em se soltar das correntes,
atiçado de um lado para o outro, rugindo e fazendo força, acabou por afrouxar a
corrente da parede a cada investida. Até que, o animal conseguiu se soltar e de
imediato, foi correndo na direção deles. Embalado e em alta velocidade, para
então saltar e tentar alcançá-los. Por pouco quase os alcançou, quando desferiu
uma patada forte e feroz no peitoril. Os assustando e os desequilibrando.
Said caiu e a puxou, levando-a consigo. Amira, como se previsse o que
iria acontecer e como iriam morrer, apenas fechou os olhos como se pudesse
evitar ver o seu próprio fim. No entanto, por desejo do destino, sua morte não
aconteceria naquele instante, pois uma mão forte a agarrou pela cintura,
surpreendendo-a.
Amira ficou parcialmente caída para fora do peitoril, de cabeça para
baixo, enquanto Said que estava completamente fora se segurava em seu braço.
Seus olhares se encontraram surpresos, antes mesmo dela se dar conta que era
Khalid a segurando pela cintura, impedindo que a outra parte do corpo dela
passasse para o lado de fora do peitoril.
Ela virou seu olhar para cima e viu Khalid.
— Socorro!!! Me salva! — exclamou, com os olhos marejados,
desesperada vendo em Khalid uma chance de sair dali.
Arfante, claramente cansado e com o seu suor gotejando pela sua face.
— Ayla, vou te tirar daí! — gritou Khalid tentando a puxar, mas com
Said segurando o braço dela, era muito pesado.
Ela gritou de dor, pois o seu braço foi deslocado na queda do infeliz que
a arrastou junto.
— Não te soltarei! — insistiu Khalid — Eu estou aqui com você.
Com o leão lá embaixo, pulando tentando alcançá-los, Amira queria
apenas se sentir aliviada, mas não conseguia. Ademais, ela quase estava
perdendo a consciência devido à dor de seu braço, quando viu um punhal na
parte interna da roupa de Khalid, próximo ao seu peito.
Se ao menos pudesse, se conseguisse... Pensou, com o corpo ficando
esmorecido, esticando o braço livre na direção de Khalid, quando o que parecia
ter demorado horas, conseguiu segurar o cabo da adaga e a puxou. Deixou o
peso do seu braço fazer o trabalho, junto com a vontade de sobreviver, quando
ela virou a adaga e deixou o braço cair em direção ao outro onde Said se
segurava.
A adaga perfurou Said, mas também um pouco dela, em sua falha de
precisão. Porém, o objetivo foi concluído, pois Said a soltou. O leão que saltava
tentando pegá-lo, naquele instante conseguiu dar uma patada no homem, com
suas garras enormes. Acelerando o processo da queda do Sheik ao chão. Amira,
ouvindo o baque, junto ao gemido de dor, estremeceu.
Said, ainda com forças, mesmo atordoado e cuspindo sangue, tentou se
levantar, buscando uma saída. Entretanto, o leão não parecia satisfeito. Abaixou-
se próximo ao homem o observando, astuto, com o foco que apenas um felino
consegue fazer com uma presa.
Divertindo-se com o cheiro de medo. Quando percebeu que sua presa
cogitava fugir, pulou em sua direção, acuando Said, pegando em seu ombro,
dando alguns trancos, dilacerando sua carne, revelando ainda mais terror nos
olhos do homem.
Amira não viu mais que isso, pois Khalid a puxou para cima, fazendo
com que ambos caíssem no chão, com ela, sobre ele. O som dos rugidos e gritos
ecoava pelo aposento e Khalid tampou com as mãos os ouvidos de Amira,
abafando os ecos da dor lancinante de Said.
A jovem, ainda impactada com a visão do leão com Said, ficou em
silêncio, sem ouvir claramente os sons do que estava acontecendo, olhando o
teto, se acalmou um pouco embora seu coração ainda batesse loucamente.
Lágrimas quentes rolaram e de seus lábios, saíram palavras fracas, antes
que ela desmaiasse:
— Eu sabia que você viria… meu amor… — murmurou.
Khalid sentiu o corpo de Amira relaxando sobre si e soube que ela tinha
perdido a consciência. Levantou-se com ela desacordada em seus braços
choramingando de dor, mas sem acordar. Infelizmente, ele não tinha outro jeito
de carregá-la. Abaixou sua cabeça e beijou a sua testa murmurando contra a sua
pele:
— Eu vou até mesmo ao inferno por você, minha pequena prometida.
(...)
Khalid olhou rapidamente sobre o peitoril, o leão acabara de atacar com
precisão a jugular do algoz de Amira. Este deu seu último grito de pavor, e o
leão começou a devorar Said.
Khalid se virou voltando para dentro da passagem, agradecendo a Alá
que sua amada estava desacordada e não escutaria e não veria mais aquele
homem, fazendo também uma nota mental, ao mesmo tempo em que andava
rapidamente, para alguém vir fechar esta porta, antes que a distração do leão
chegasse ao fim. Sabia que teria poucas opções do que fazer com o animal após
o mesmo sentir o gosto da carne humana, mas ao mesmo tempo, sentia-se grato.
Pois o animal realizou a vingança merecida que Amira precisava para ter paz em
seu coração.
Com Amira nos braços, assim que passou pelo tapete, Khalid encontrou
alguns de seus servos que ainda estavam procurando Amira e Said, que até então
estavam desaparecidos. Começando, desde aquele instante, a distribuir suas
ordens e chamar o médico com urgência, informando que estava indo
diretamente aos seus aposentos.
Pelo caminho também encontrou uma das mulheres que provavelmente
tinha vindo junto com Said, pois a pequena e delicada com adornos cor de rosa,
assim que viu Amira nos braços de Khalid, o seu rosto perdeu a cor, ignorando
Khalid, apenas vindo em sua direção preocupada com a garota.
— Ayla… — disse ela quase imediatamente, mas se corrigiu o mais
rápido possível — O que aconteceu com a Amira? Me diga! Ela vai ficar bem?
Por que ela está assim?
Os olhos da garota se encheram de lágrimas, olhando Amira. Nem
sequer reconhecendo o seu sultão, apenas preocupada com a garota em seus
braços. Isso foi motivo para que Khalid simpatizasse com a garota, mesmo que
tenha imediatamente percebido que era uma garota sobrevivente da tribo de
Amira.
— Está permitida a nos seguir, acompanhe-nos — disse Khalid, ao
mesmo tempo em que virou para um dos eunucos que estava ali por perto —
Informe às criadas pessoais de Amira para que vão ao nosso encontro.
Após isso Khalid silenciou, apenas apressou ainda mais os passos,
atravessando os corredores, com os criados abrindo as portas pelo caminho até
que ele chegasse aos seus aposentos e pudesse a colocar deitada sobre a sua
cama.
Assim que o fez, ainda com os olhos fechados, Amira arfou de dor. O
médico e sua filha chegaram logo em seguida, assim como Nuray e as criadas
pessoais da jovem. O aposento do Sultão jamais esteve tão cheio, mas isso
tampouco importava naquele momento. Khalid apenas queria que sua prometida
ficasse bem. O que não era diferente de todas as demais pessoas que enchiam o
quarto, afinal, Amira era uma pessoa muito querida por elas.
Após o médico ter as primeiras impressões do que tinha acontecido com
ela após o relato de Khalid, o senhor engoliu em seco e pediu:
— Todos aqui somente atrapalharam tudo que temos que fazer para
tratá-la. Ela ficará bem, logo vocês serão informados — O senhor olhou para
Khalid, já supondo sua reação, mas mesmo assim, insistiu: — Até mesmo o
senhor, meu sultão. Apenas minha filha e alguns poucos criados, por favor.
No entanto, assim como o velho senhor já supunha, o jovem sultão
cruzou os braços o encarando firmemente, como se o desafiasse a tirá-lo de lá. O
velho preocupado e impaciente, não discutiu e apenas suspirou.
— Certo, a vossa majestade fica. Pegue um pano e, por favor, sente-se
ao lado dela na cama — concluiu o médico, enquanto obedientemente Khalid se
pôs em ação.
As criadas pessoais de Amira ficaram assim como algumas que já
trabalhavam antes com o médico. A correria fora sem tamanho, não que fosse de
perigo mortal para a vida da jovem, mas eram muitos ferimentos e devido a eles,
as vestes de Amira foram tiradas e sua pele branca estava coberta de manchas
roxas devido aos machucados. O velho senhor mandou que Khalid colocasse o
pano na boca de Amira e as criadas segurassem-na na cama parada, pois ele teria
que pôr o braço deslocado dela no lugar.
Amira acordou após a dor e voltou a desmaiar em seguida. E o restante,
foi um trabalho em conjunto que até mesmo acabou de forma rápida. O corpo da
jovem foi banhado com panos úmidos. Seus ferimentos foram tratados, o
inchaço em seu pé estava maior e em suas mãos, também precisaram ser
tratadas, pois algumas de suas unhas tinham se quebrado.
Khalid não saiu do seu lado um momento sequer, pouco tempo depois
que o médico partiu, Nuray entrou. Queria saber o que tinha acontecido, mas ela
encontrou apenas um Khalid parcialmente sentado, dando apoio à Amira e com a
cabeça encostada na dela de olhos fechados. Pé ante pé, Nuray se virou para sair
do aposento, mas antes de sair ele disse:
— Contarei o que sei mais tarde, mas tudo que aconteceu de fato, só
quando ela acordar.
CAPÍTULO 23
A mira balbuciou, abrindo e fechando a boca. Mas não saiu nada frente à
pergunta descarada de Khalid. Podia ver nos olhos dele, o brilho, um que
não dava espaço para dúvidas da provocação iminente. O rosto dela,
agora completamente corado, fez com que o homem não conseguisse conter um
ligeiro movimento com a face, formando um sorriso sacana de vitória.
Amira queria se esconder e não mais olhá-lo, mas isso seria o mesmo
que admitir que ele havia acertado, mesmo ambos sabendo que Khalid já tinha a
resposta, não admitiria isso em voz alta, nem para si mesma.
Chateada, Amira bufou e estreitou os olhos. Ele era mal, por vezes
demais, brincava com as reações dela e nem sequer escondia isso. Ademais, o
que mais queria que pensasse? Após beijar tão intimamente o seu pulso e a fitar
com aquele olhar? Resmungava ela em pensamento, enquanto o reprovava com
os olhos.
Acima de tudo, ainda existe orgulho em sua Ayla. Refletiu Khalid e
sabia disso, por isso desmanchou aos poucoso seu sorriso. Claro, foi de
propósito a provocação, ele não perderia a oportunidade, a achava graciosa
quando sem graça. Amira empinou aquele pequeno nariz, fazendo com que ele
tivesse vontade de voltar a mordê-lo.
A jovem, chateada, apertou os lábios antes de voltar a falar:
— Me diga, você se diverte com isso, não?
Khalid sentiu outro sorriso se formar no canto dos seus lábios, mas o
conteve, porém, não antes dela ter reparado e o acusar ainda mais com o olhar.
— Eu? — alfinetou Khalid se fazendo de injustiçado.
Por um segundo, enquanto Amira queria apenas o estapear, para que ele
deixasse de ser cínico, passou pela mente da garota quantas vezes que Khalid
deliberadamente a provocou...
— Khalid, por que você me provoca tanto? — A pergunta escapou pelos
lábios dela, antes que conseguisse se refrear.
— Te provocando? — desta vez gracejando e sorrindo despreocupado.
Khalid levantou-se da cama, sem respondê-la. Devolveu a bacia para a
mesa em passos lentos e felinos, para em seguida retornar com uma cesta de
frutas consigo, sentando-se novamente, calmamente. Durante todo o percurso,
Amira o seguiu com os olhos e impacientemente esperava uma conclusão da sua
fala, mas o homem via a expectativa dela em seus olhos e estava sinceramente se
divertindo em fazer algum mistério. Ele pegou uma uva, a mordeu, comendo
metade dela. Amira, chegando ao fim de sua paciência, ameaçou falar e então,
Khalid simplesmente colocou na boca dela obrigando-a a comer também.
— Uhmm… — soltou uma interjeição enquanto comia a fruta. Tão logo
que terminou, falou vociferando: — Sim, por vezes você está normal e então...
se torna bestial, de maneira que faz meu coração saltar! Seja por medo,
preocupação ou expectativa. Então, do nada, só se afasta… E então, você...
Ela estava realmente reclamando das investidas de charme e das
manipulações dele? Khalid pensou e ficou em silêncio, encarando a garota
irritada, falando e falando, coisas que ela provavelmente morreria de vergonha
mais tarde. Então a imagem dela escondendo o rosto na cama, formou-se em sua
mente e sem conseguir se conter, subitamente jogou a cabeça para trás, em uma
gargalhada gostosa e sonora.
Amira, ofendida com o homem que ria dela, enquanto ela elucidava as
coisas que não gostava, fechou a boca enquanto fazia um arco para baixo,
chateada. Assim, mesmo com as mãos machucadas o bateu, mas se arrependeu
quase imediatamente, puxando de volta contra si a mão dolorida e a cobrindo
com a outra. Observou-o rancorosa, com os olhos marejados pela dor.
Khalid não deveria, mas sim, se divertia até mesmo com a raiva dela,
ademais vê-la impulsiva assim, o deixava aliviado, afinal era sinal que havia
melhorado.
— Viu! Mesmo agora, faz pouco de mim! — reclamou Amira,
fulminando-o.
Khalid pegou outra fruta, ainda com vestígios do riso, com algumas
lágrimas umedecendo seus olhos. Silenciosamente, repetiu todo o processo antes
de colocar na boca dela. E então, finalmente a respondeu:
— A meu ver, não são provocações, Ayla — declarou Khalid, com sua
voz grave, enquanto colocava a cesta ao seu lado da cama, tirando-a de seu colo
para focar toda a sua atenção na garota— Sim, admito, nem tão pesarosamente
quando você gostaria, que por vezes a manipulei. Não mal intencionado, é claro.
Mas para mudar seu foco, para algo mais controlável, como o seu desejo
irrefreável por mim. Assim estaria preocupada demais comigo, para que se
entregasse a tormenta e ao caos que nos cercam: Kelebek, Said… e o resto.
Sua confiança era assombrosa, entre convencido e autoconfiança, Amira
não sabia dizer qual delas mais gritava em Khalid naquele momento. Ela nem
sequer conseguiu dizer mais que um murmúrio de “Tsc... Você não tem
vergonha?” entre indignada e tímida, dado que de fato, ele estava certo. Um
Khalid despreocupado voltou sua atenção às frutas para pegar mais uma e
colocá-la na boca da garota.
— Entenda Ayla, o que você chama de provocação, torna-se por vezes
uma faca de dois gumes, assim como agora pouco. Bastou um pequeno toque,
para te querer completamente. Vejo-me escravo dos desejos que sinto por você…
— E desta vez, a voz dele ficou dois tons mais grave, íntima e sensual.
Amira sentiu sua respiração parar na garganta, com apenas uma
exclamação escapando em um som mesclado que oscilava entre surpresa e
excitação. O som, fez com que o olhar de Khalid pousasse nos lábios dela,
macios e saborosos, umedecidos pelo sumo das frutas. Antes de pensar muito
profundamente sobre, cedeu aos seus instintos e ergueu a mão, para passar o
polegar pelos lábios dela. Capturando o suco com o polegar, um pouco mais que
uma gota e então, levou o dedo à boca onde sorveu o seu doce sabor.
Amira suspirou em expectativa, sendo atingida por uma excitação nem
um pouco velada e ainda menos sutil, sentindo o que nunca antes pensou que
sentiria. Inveja... Inveja do polegar de Khalid. Não conseguindo tirar os olhos
dos lábios dele, estes que sorriam gatunamente para ela, roubando algumas
batidas de seu coração enquanto revelavam lentamente um tipo de sorriso que
mostrava com clareza seus caninos bem definidos.
Ela ergueu os olhos e o viu como se dissesse à ela: Não disse? Não
precisa muito... A garota fugiu do seu olhar, sentindo-se brutalmente tímida, mas
o homem manteve o olhar fixo nela.
— Pare já de me olhar assim! — esbravejou ela, quando o olhou de
soslaio e encontrou o seu olhar fixado em si.
— Estamos conversando, para onde mais eu olharia? — indagou em
contrapartida, fechando a boca e olhando ao redor para enfatizar que estavam
sozinhos.
Amira sabia que estava certo, mas fora pega cobiçando os lábios dele,
descaradamente! Era perturbador e tudo piorava quando o libertino do Khalid
sorria consciente dos desejos dela.
Khalid se ajeitou na cama, ao mesmo tempo em que a cabeça dela estava
em um pandemônio de emoções antagônicas. Aproximou-se à medida que ficou
a poucos centímetros dela, ainda distraída. Tão próximo, que quase podia ouvir
seus pensamentos, levantou a mão direita encaixando a palma em sua face, ao
lado esquerdo da garota. Tão carinhosamente, que ela se sobressaltou e se virou
de frente para ele. O que fez o polegar dele voltar a tocar os lábios dela.
Fascinado pela maciez, Khalid o acariciou e deixou que o seu polegar entrasse
um pouco dentro da boca da garota, tocando gentilmente seus dentes e até
mesmo a ponta de sua língua.
— Adorável… — murmurou ele, mordendo o lábio inferior, para conter
o seu desejo, mas como acreditava que não sofreria sozinho, se inclinou como se
fosse a beijar, ao ponto que ela ergueu um pouco mais de sua face e então virou
o rosto para beijar a bochecha dela, quase ao pé de sua orelha. Amira sentiu seu
corpo todo arrepiar e um gemido escorregou pelos seus lábios.
Khalid se afastou, encontrando o olhar aturdido dela, sua face rosada e a
sua respiração pesada, tão sensual que a resposta vinha diretamente do seu
membro pulsando dolorosamente sob suas vestes. Suspirando, Khalid se
arrependia de provocá-la, pois sempre parecia pior para ele. Era apaixonado por
sua entrega abandonada, e teve que abaixar um pouco a cabeça e fechar os olhos
para tentar tirar as imagens sensuais que se formavam deliberadamente em sua
mente.
Depois de um breve momento, voltou a levantar o olhar, ainda afetado,
intenso e faminto. Este que enviou uma onda de prazer totalmente erótico pela
espinha dela.
— Gosto da sua sinceridade incontida, assim dedicarei igualmente a
minha.
Amira tentou falar, mas com um negar de cabeça dele, ela se calou.
— Temo por você, ficará em risco se a engravidar… Ao mesmo tempo,
cada vez que a vejo, a desejo como uma besta que anseia pela sua presa. Tocar
suas curvas, cada uma delas. Ouvir os seus gemidos, sentir sua pele contra a
minha. Saborear o seu gosto, bebendo do seu prazer, direto da fonte. Me perder
em sensações no seu corpo, enquanto me afundo até o fundo em você e a faço
gritar, pedindo por mais — com a voz carregada de desejo, Khalid falou
diretamente seus pensamentos. Amira arfou, com as imagens formando-se em
sua mente — Entretanto, não quero apenas sua carne. Quero gravar a minha
existência em você, para que mesmo na minha ausência, ninguém tome o meu
lugar na sua mente e coração. Quero te fazer cativa, dos mesmos sentimentos
desenfreados que sinto por você. Eu quero que seu corpo anseie e até mesmo que
sofra do mesmo jeito que o meu. Não sou uma pessoa boa como acredita que
sou, pois acho justo que vivencie da mesma dor que eu.
Amira não tinha palavras para expressar tudo que ela estava sentindo
diante daquelas palavras. Seu ritmo cardíaco zumbia em seus ouvidos. Seu corpo
estava quente, vibrando e pulsando sob a súbita necessidade de tocá-lo. Tomando
como referência, a recordação do prazer que Khalid já havia lhe proporcionado.
Obstinada e apaixonada, por puro instinto e regado ao desejo, Amira se
inclinou e tomou de assalto os lábios macios de Khalid, o surpreendendo, mas
não por muito tempo, pois logo ele se recuperou correspondendo ao beijo. A
garota poderia se sentir insegura, sobre a arte do prazer, mas ainda sim, sabia
muito bem quem queria e sempre quis.
Khalid abriu a boca, para receber a tímida língua travessa dela, que
curiosa explorava a sua. A mão dele, que ainda estava em seu rosto, deslizou até
a nuca entrelaçando seus dedos nos fios sedosos do cabelo dela. E assim, ele
esqueceu-se de todos os motivos pelos quais não deveria ceder mais uma vez a
tentação.
O homem atiçado pelo desejo, a puxou mais para si em um abraço firme,
beijando-a lenta e profundamente, tomando o controle do beijo e deslizando a
língua para dentro da boca da garota, serpenteando deliciosamente, ao mesmo
tempo em que sentia o sabor das frutas que comera a pouco.
Amira gemeu contra a sua boca, e a mesma podia jurar que ouviu Khalid
rugir, assim como um leão fazia, antes de um movimento rápido, no qual o
próprio virou seus corpos e os deitou sobre a cama. Ela exclamou em surpresa e
seus olhos se encontraram, quando ele cobriu o corpo dela com o dele, antes de
se ver afundando o rosto na curva do seu pescoço.
— Desta vez, não conseguirei parar…
— E quem disse que eu quero que você pare? — respondeu
automaticamente com sua sinceridade, vindo antes mesmo do seu raciocínio.
Quando ela se deu conta do que havia verbalizado, apenas se calou subitamente
e ele riu contra a pele dela, o que causou uma leve cócega.
Khalid escutou o riso contido dela e se sentiu o homem mais sortudo do
mundo. Agradecendo por ela ser sua e de mais ninguém. Com ambos vestidos e
os corpos tão colados quanto possível, Amira pôde sentir o calor e toda a
extensão do membro enrijecido de Khalid. Grande, firme, de maneira que a fez
até mesmo tremer com um tanto de receio.
Khalid se moveu para beijar a sua pele, formando uma trilha de beijos e
suaves mordidas, até o colo de seu seio, fazendo-a arfar. Amira sentiu o seu
receio se desfazer, a cada beijo molhado que recebia, arrepios tomavam todo o
seu corpo, afastando o receio e dando lugar a um desejo irrefreável.
No percurso, de seus beijos e carícias, Khalid sentiu o seu membro
pressionar-se mais contra ela, gemeu inquieto e sedento, para sentir mais ondas
de prazer com este contato, levou uma das mãos à perna da garota, a levantou,
para que conseguisse se acomodar melhor entre suas pernas. A necessidade que
o tomava era enlouquecedora, o sexo quente dela contra o dele, perfeitamente
acomodado, o deixou ainda mais faminto.
Deslizou a mão pelo joelho dela, passando pela coxa, até chegar ao seu
traseiro, o apertando com força e matando ao menos vontade de afundar os
dedos na carne macia. Amira arqueou, e deslizou os braços ao redor dele,
abrindo ainda mais suas pernas para sentir a totalidade daquela pressão da sua
excitação contra sua parte mais sensível.
No entanto, em meio às carícias pelas costas fortes dele, ela sentiu um
toque gelado de algo de metal. O que a surpreendeu, refreando-se
instantaneamente. Khalid assim que percebeu que ela se retraiu, saiu de sobre
sua Ayla que murmurou sobre algo gelado, então ele se recordou de sua adaga
que tinha como hábito, mantê-la ali.
Apoiando-se em um dos seus braços, levou a mão livre às suas costas e
tirou uma adaga ainda embainhada. Os olhos dela se abriram muito em surpresa,
como se pudesse ver a mente de Khalid maquinando alguma peripécia, Amira
percebeu o olhar dele entre a adaga e sua roupa.
O que ele estaria tramando? Era a pergunta que Amira se fazia.
— Ayla, segure para mim a bainha? — disse ofertando à ela.
A garota ergueu a mão e segurou à bainha, ele puxou a adaga para fora,
que ressoou seu som característico. Amira sabia que ele iria aprontar, mas o que
exatamente, não conseguia imaginar. Medo e excitação se misturavam como ela
jamais imaginou que poderiam. O rapaz eliminou qualquer uma de suas dúvidas,
quando aproximou a lâmina dela, esse ato fez o estômago de Amira gelar. Com a
ponta da adaga, Khalid fez um pequeno rasgo na fina vestimenta na altura da
barriga de sua prometida. Rasgo este que aprofundou a ponta da lâmina apenas o
suficiente para poder tomar um pouco mais do tecido e o rasgar por completo.
Quando terminou o último pedaço de tecido, o vale dos seios se revelou,
a boca de Khalid salivou e então, ele jogou a adaga para longe, rendendo-se ao
fervor do seu prazer de passar a mão em uma carícia entre os montes recém-
revelados, ato este que fez Amira fazer uma expressão deliciosa de prazer.
— Mesmo aqui, tem manchas roxas… — constatou ele, irritado e ela se
encolheu um pouco, Khalid lamentou logo em seguida. Tentou não pensar muito
sobre e admirou a bela visão dos montes carnudos e voluptuosos de sua amada,
tão lindos como todo o resto dela — Me permite tirar de sua mente essas
lembranças ruins?
Ela se surpreendeu, e por um segundo perguntou-se como Khalid faria
isso. Mas para a sua total surpresa, ele não esperou a sua resposta. No instante
seguinte, desceu a cabeça em direção aos seus seios, pousando beijos molhados e
subindo lentamente até chegar onde estava o resto remanescente do tecido. O
afastou com a ponta do nariz, para revelar a visão das areolas rosadas e
intumescidas, de sua amada.
Amira sentiu a respiração retesar em sua garganta em expectativa,
olhando o que ele estava fazendo, e foi neste momento, que os lábios dele se
abriram sobre os picos, colocando-os dentro do fogo úmido de sua boca. Khalid
sugou e sugou com força, fazendo-a exclamar de prazer, chamando seu nome
com uma voz que quase não parecia a dela. Junto com os movimentos de Khalid
sugando, ela se arqueou instintivamente.
Khalid queria ser cuidadoso, no entanto, não tinha um lugar em sua
amada que ele não tomasse com força: o beijo mais violento, o sugar nos seus
seios que lhe dariam mais algumas marcas. Talvez viesse a se arrepender depois,
talvez ela o odiasse por isso. Mas cego pela luxúria, não poderia ser de outra
forma. Khalid se via no paraíso, com ela em seus braços.
Mas queria sentir o seu sabor e era isso que ele iria fazer, não teria
ninguém que iria o impedir. A mão de Khalid deslizou pela lateral do corpo dela,
vindo do quadril de Ayla até alcançar seu seio ainda coberto, apertando-o sobre o
fino tecido. Massageou o mesmo, apertando e soltando algumas vezes, até que
em dado momento, o bico endurecido ficou entre seus dedos e ele o beliscou
fechando a mão. Um “ai” mesclado ao gemido de Ayla, quase o fez chegar ao
seu clímax, sem nem sequer tirar a roupa.
Khalid levantou os olhos, para admirar a expressão de prazer dela,
soltando o seio então a viu de olhos fechados, com o rosto corado e a boca
entreaberta. Era linda, pecaminosamente sedutora, ele queria ver o fogo de pura
luxúria em seu olhar.
— Ayla… — chamou ele com a voz forte que a fez abrir os olhos
imediatamente — Não feche os olhos, quero que veja tudo que faço com você.
Assim que a Amira abriu os olhos, Khalid viu exatamente o que
buscava. O azul límpido, estava nublado como uma tempestade de fogo e prazer.
Era igualmente clara a sua necessidade, assim como a expectativa que as
palavras de Khalid formaram.
Sob o olhar dela, ele começou a descer sobre o corpo da mesma, usando
as mãos para terminar de rasgar o que faltava da roupa que ela usava. Até
mesmo saiu da cama para terminar de fazê-lo e, uma vez que concluiu sua tarefa,
ficou em pé à beira da cama, atordoado por um breve momento de contemplação
dela belamente exposta para ele. Cada curva delicada do corpo de Amira parecia
ter sido feita com extremo cuidado e tão perfeita para ele. Ele deslizou o olhar do
rosto dela até o monte de pelos negros que cobriam o seu sexo.
Khalid abaixou seu corpo em direção ao dela, ao mesmo tempo em que
levava as mãos às pernas dela, pousando em suas coxas suas palmas grandes e
fortes, forçando levemente que ela as abrisse para ele.
Presumindo o que ele iria fazer, ela arregalou os olhos e então tentou
fechar as pernas, porém, sem êxito. Por segunda opção, ela cobriu com ambas as
mãos o seu sexo. Agitada, perguntou:
— O que você pretende fazer?
— A beijar… Abra as pernas para mim, Ayla — ordenou ele com voz
rouca e firme.
No lugar de responder, Amira se apavorou ainda mais, levantou uma
perna e a usou para empurrar Khalid, ganhando tempo de se virar na cama.
Levantou-se ficando de gatinha, para tentar se afastar dele, no entanto, ele fora
mais rápido, a segurou pelos quadris impedindo-a de se afastar. A manteve
naquela posição constrangedora, totalmente perturbadora, mais exposta para ele
do que antes.
Amira sabia que ele não faria nada que a machucasse, mas tentou ao
menos, se jogar na cama, para ficar menos vulnerável, enquanto se mantivesse
de bruço. Porém, como as mãos fortes dele a seguravam pelos quadris, ao
desapoiar-se de suas mãos, serviu apenas para que seu rosto fosse contra a cama
e seu quadril continuasse erguido.
— Não fuja de mim, Ayla — disse ele achando algum divertimento nela
se atrapalhando em fugir dele — Vou apenas beijá-la onde nunca sonhou que
poderia ser beijada.
— Não faz isso, ai não é lugar... — ordenou Amira, mas Khalid parecia
faminto como um predador, completamente obcecado pelo seu sexo,
silenciando-a de espanto quando aproximou o rosto e tomou o seu sexo com a
boca. Ela arfou, ao sentir a língua quente dele passando pelas suas dobras,
enviando a todo o corpo dela ondas de prazer que nunca antes imaginara. Em
meio a estas sensações, Amira sequer conseguiu formar uma frase coerente —
Não… Oh! Não é... Hm... lugar.
O mel de sua excitação centralizou na parte mais sensível dela. Khalid,
enfeitiçado pela seda úmida, que era a pele do seu sexo, seguiu a atormentando
até que suas reclamações morressem em seus lábios, dando lugar apenas a
gemidos e palavras balbuciadas, incompreensíveis. E então, perversamente se
afastou apenas o suficiente para fitá-la, divertido.
— Tarde demais, já beijei... — em seguida ele soprou de leve a pele
quente, de maneira que a fez arquear e arfar — Quer que eu pare?
Amira virou a cabeça para olhá-lo, em uma forte reprimenda, mas antes
dela proferir quaisquer palavras, ele retornou os beijos em seu sexo. Ele afastou
uma de suas mãos que a segurava, apenas para abrir suas dobras com dois dedos
e poder passar a língua em quase toda a sua extensão, deslizando até onde
alcançava deleitando-se em seu sabor. Intercalou com carícias que fazia ao longo
dela, sem jamais tocar a sua protuberância mais sensível. Levando-a em um
extremo de excitação, mas sem permiti-la chegar ao ápice do seu prazer.
Ela estremecia, conforme a sua necessidade crescia. Sentia-se tão bem,
mas precisava de mais, todas as vezes que ele chegava perto do botão onde mais
se sentia sensível, seu corpo doía em expectativa, para se ver frustrada em
seguida. Suspirando de desaponto, concluiu que mais uma vez Khalid estava
brincando com ela, testando seus limites e vendo as reações.
Amira, não aguentando o fervor que a envolvia, por instinto moveu o
seu quadril contra o rosto do homem que foi ainda mais voraz em seus beijos
ávidos, levando as mãos ao seu traseiro, o apertando, ao mesmo tempo em que o
abria para afundar seu rosto ainda mais ali.
Em resposta ela gemeu, se contorceu, enquanto ele mantinha-se a
beijando tão intensamente que seu sexo parecia pulsar contra a sua língua.
Khalid sabia que ela estava muito perto de chegar ao clímax e quanto mais perto
ela estava, mais selvagem ficava. Khalid tirou o rosto e ela resmungou frustrada.
Mais do que se afastar, Amira percebeu que ele tinha se levantado e que
tinha ficado de pé, fora da cama. Amira estava pronta para brigar, uma vez que
acreditava que Khalid estava passando dos limites com suas brincadeiras,
quando então, o sentiu passando a mão na cintura dela para fazê-la se levantar.
Erguendo apenas a parte do tronco dela, fazendo com que suas costas tocassem o
peito quente e duro dele, mas não tão duro quanto estava seu membro que batia
contra seu traseiro. Parecendo se encaixar perfeitamente e as suas alturas
emparelhando-se.
Ela não compreendia o que ele estava tramando desta vez, enquanto
tentava entender, a mão que estava pousada em sua cintura, deslizou pela sua
barriga, até passar pelo seu monte de vênus, descendo um pouco mais entre suas
pernas até onde ela mais queria ser tocada. Amira arquejou e gemeu em puro
deleite. Khalid começou a acariciá-la lentamente e com a outra mão, deslizou até
chegar ao seu seio e o apertou. O homem ficou ali a estimulando nos dois
pontos, enquanto murmurava ao pé do ouvido dela:
— Tão pecaminosamente linda, minha flor. Abra-se mais para mim —
murmurou ele ao pé do ouvido dela, fazendo-a estremecer sob suas palavras com
seu hálito quente contra a pele.
Khalid apertou com um pouco mais de força seu seio e beliscou a
protuberância sensível dela, quando Ayla jogou a cabeça para trás, apoiando-se
completamente nele, deliciosamente rendida às sensações, ele voltou a falar com
a voz tão rouca que potencializou ainda mais o clímax dela:
— Venha em meus dedos e se desfaça no seu prazer, quero sentir o seu
corpo apertando meus dedos, enquanto os afundo em você — sussurrou ele.
Em seguida, deslizou a mão ainda mais para baixo, escorregando seus
dedos para dentro dela. Suas paredes pressionavam seus dedos, ao mesmo tempo
em que sua deliciosa prometida, começou a tremer chegando ao clímax.
— Oh!!! Khalid! — exclamou ela, enquanto uma poderosa onda de
prazer se alastrava por todo o seu corpo. Desnorteado-a e a relaxando ao mesmo
tempo. Sentia-se imoral e satisfeita.
Antes dos tremores dela se acalmarem, ele a soltou e deu um passo para
trás. Atordoada, ela se sentou na cama e virou o seu olhar para ele, sua visão
estava nublada, mas logo que voltou ao normal, percebeu que ele já tinha tirado
a parte superior das suas vestes e agora estava tirando a parte inferior.
Assim que ele terminou de se despir, e corrigiu sua postura, a olhando
com uma fome tremenda, ela sentiu-se aquecer. Rapidamente, pôde ver seu torso
poderoso, elegante e rigidamente trabalhado por músculos definidos, seu peito
levemente coberto com pelos escuros como os seus cabelos. Amira o olhou
fascinada, queria percorrer seus dedos pelo seu corpo e até mesmo passar a
língua em seu peito, pois se perguntava que gosto ele teria. As cicatrizes, que há
tanto tempo ela não via, mostravam quantas vezes já tinha sobrevivido às lutas
de vida ou morte. Conforme ela desceu o olhar, pela sua barriga, viu surpresa e
chocada a sua masculinidade viril. Excitado, com veias dilatadas apontando
diretamente para ela.
Amira engoliu em seco, pois parecia ainda maior do que ela tinha
sentido. Ele deu o primeiro passo em sua direção e ela encolheu as pernas, como
para se proteger. Com mais cuidado ele deu outro passo e se abaixou levando a
mão ao queixo dela.
— Eu poderia passar uma vida aqui, deixando-a me observar até se
acostumar. Mas não consigo mais, eu preciso estar dentro de você… — Khalid
estava com o rosto vermelho e algumas veias de sua testa estavam bem
definidas, mas Amira não viu mais nada, uma vez que ele reivindicou seus
lábios.
Sua fome era exagerada, atordoando-a de maneira que nem sequer
percebeu o momento em que Khalid inclinou seu corpo, fazendo-a deitar-se e
cobrindo-lhe o corpo com o dele.
O beijo de Khalid era feroz e sensual. Sua boca a possuía com longos
beijos profundos de língua e a surpreendia com mordidas ocasionais, causando
arrepios que respondiam diretamente entre as pernas dela, fazendo-a esquecer
que já havia chegado ao clímax uma vez e o bolo de prazer recomeçar a se fazer
dentro dela. Ele enfiou os dedos em seus cabelos grossos, perto do couro
cabeludo e se apossando de todo controle, segurando sua cabeça com firmeza.
A cada vez que ele se afastava da boca dela, parando o beijo, para
recomeçar. As trocas de olhares eram sensuais, ao ponto de voltarem a se beijar.
Arfavam entre as trocas de carícias, porque ambos se entregaram tanto às
sensações que se esqueciam de respirar. Amira suspirou tremulamente, ao sentir
a pressão íntima dele, dura como rocha. Khalid estremeceu ao contato e
começou a mover quadril, até que ela estivesse selvagem novamente, devido à
fricção.
— Khalid! — exclamou ela, implorando por mais com os olhos.
Khalid ergueu o seu troco e apoiou-se sobre os joelhos. Agarrou os
quadris dela e a posicionou, deslizou suas mãos até a coxa, fez suas pernas
enlaçar sua cintura e posicionou o membro em sua entrada, antes de voltar-se
sobre ela. Ao fazê-lo, deslizou a mão até seu traseiro, para mantê-la naquela
posição.
— Me perdoe, amor. Isso irá doer — disse ele com uma expressão de
quem estava sofrendo. Uma gota de suor do rosto de Khalid escorreu e caiu
sobre o rosto dela. Amira sorriu, levantando os braços, passando-o pelos ombros
fortes de Khalid até chegar ao seu pescoço.
— Se for com você, acho que posso suportar.
Khalid não tinha controle, todo o seu corpo doía pela necessidade e a
aprovação dela, foi o estopim que faltava. Não tinha forças para resistir por mais
tempo, começou a pressionar a ponta do seu pênis contra ela. Ayla estava tão
estreita, mesmo que ele tivesse usado os dedos e tivesse a estimulado, seus
músculos apertados quase não permitiam a sua entrada. Empurrou de novo e
Ayla ofegou de dor.
Ele olhou a sua face e ela estava se fazendo de forte, com o rosto muito
vermelho, olhos brilhantes pelas lágrimas contidas, enquanto, ao mesmo tempo,
mordia os lábios.
— Tenha um pouco de paciência, vai passar… — Khalid consolou-a,
vendo uma lágrima rolar pelo canto do olho — Me perdoe, me perdoe.
Ele se moveu para trás suavemente e então para frente, indo mais fundo.
Para tentar possuí-la em toda sua plenitude, ele a beijou, lentamente, acariciando
o interior de sua boca com a língua, enquanto vagarosamente continuava a forçar
a penetração. Estava tenso sobre ela, lutando com o esforço para ser cuidadoso,
enquanto cada poro do seu instinto urrava para que empurrasse duro e fundo no
calor delicioso que Amira possuía.
E então, de uma forma única, seus músculos cederam e aceitaram a
invasão do seu sultão no seu corpo. Ela gemia de dor, mas também havia algum
prazer remanescente de tudo que havia sido instigado por ele lá longe, em sua
mente e suas sensações. Mas dado o momento, parecia que sua mente estava
paralisada no pensamento de dor.
Khalid, interrompeu o beijo, não conseguindo controlar a sensação
deliciosa que tomou seu corpo. Grunhindo, em meio a um gemido longo de
prazer alucinante. Ao abrir os olhos e olhá-la, ele se sentiu mal, pois ela estava
com o rosto vermelho, paralizado pela dor, com os olhos muito abertos,
petrificada e então encheu o rosto dela de beijos, enquanto mantinha seu quadril
parado, engatado nela, usando toda sua força de vontade, esperando-a se
acostumar ao seu tamanho e a sua entrada.
— Passou, passou, meu amor... — murmurou ele.
— Eu sinto que meu corpo se partiu por dentro… — admitiu ela em
meio a um soluço de choro.
— É só uma sensação momentânea, só dessa vez. Nunca mais vai
sentir... — explicou ele, consolando-a.
— Promete?
Em meio à doçura dela, ele sorriu e pousou um beijo suave na ponta do
nariz vermelho da garota.
— Sim, prometo.
Uma vez que sentiu que Ayla estava começando a relaxar, Khalid
começou a se mover lentamente, saindo para voltar a entrar em seu sexo quente.
Os músculos dela o apertavam, maltratando seu controle. Mas o prazer de estar
dentro de seu interior era indescritível. Aos poucos, começou a se mover mais
rápido, retomou seus lábios entre os seus, mantendo-se controlado e no mesmo
ritmo, até que ela voltasse sentir algum prazer, onde momento depois surgiu em
um gemido, quase um ronronar saindo pelos seus lábios.
Receptiva como era a dor, fora passando, dando lugar a uma ardência
que estava sendo subjugada pela excitação. Ela precisava que tudo acontecesse
mais rápido, conforme sua necessidade crescia, mas a disciplina de Khalid era
absoluta. Ele trabalhou mais para dentro, sem alterar o seu ritmo. Amira
escorregou as mãos aos ombros de Khalid e arqueou o quadril, desejosa. E era
apenas este sinal que ele precisava para aumentar as suas investidas. Amira
gemia, agora completamente enlouquecida, sentindo-se tão preenchida quanto
podia e Khalid não estava diferente, a cada estocada que ia até o mais profundo
dela. Quando então, teve uma liberação violenta tomando-os, simultaneamente,
tremendo com espasmos ferozes do forte clímax que os apoderou.
Khalid, derramando sua semente dentro dela, se sentia com os pés no
paraíso. Ofegante e atordoado. Ele a abraçou, negando-se a separar seus corpos.
Tomando um tempo para recuperar o fôlego.
Enquanto Khalid se recuperava, Amira se viu subitamente emocionada.
Ao perder-se em uma reflexão momentânea. Que a consumação só fora assim,
pois estava com Khalid. Qualquer outro, teria sido apenas dor e nada mais.
— Obrigada, Khalid — murmurou ela contra o vão do pescoço dele.
— Pelo quê?
— Por tudo… Eu que me tornei uma escrava, estava destinada a ser um
adorno. Somente isso, o que penso, sinto ou qualquer coisa, não importaria. Mas
você faz com que tudo seja tão maravilhoso.
Um sentimento de excessiva ternura se estendeu por ele, soltando-a do
seu abraço e saiu cuidadosamente de dentro dela. Ela sentiu falta do calor do
corpo dele e percebeu o vazio que o afastamento deixou em si, sentindo o
liquido viscoso, saindo de seu sexo. Ele saiu da cama e com cuidado pegou um
pano limpo e úmido, a limpou sem qualquer cerimônia. Se vestiu, pegou um
grosso manto em mãos, voltou seu olhar atento à ela e estendeu a mão para
Amira.
— Vamos tomar banho juntos, minha prometida? — Os olhos de Khalid
brilhavam felizes.
Amira recordou-se de quando chegou, do banho que tomou com ele e
como parecia ser em quase outra vida depois de tudo que viveram. Sorriu para
Khalid, arrastando-se para fora da cama, ainda sensível e segurou a sua mão,
assim que se aproximou dele e permitiu que ele a cobrisse com o manto.
Ele pediu um momento e a deixou ali de pé, curiosa, para ir até a porta
do seu aposento. Sibilou ordens para seus guardas do lado de fora e então voltou
para ela. Khalid puxou a manta até a cabeça dela, cobrindo-a inteira sem deixar
nenhuma pele exposta, pegou-a nos braços e se apressou para sair do aposento.
Amira deu risada com todos os cuidados dele e não viu ninguém em
todo o trajeto, com a manta que lhe cobria, ela conseguia ver no máximo o
pescoço de Khalid. Enquanto perguntava-se o que o jovem sultão tinha dito aos
seus homens, entraram no aposento de banho e ela pôde ouvir o barulho da água.
Ele a colocou no chão, com delicadeza, permitindo que ela descobrisse a
cabeça, Amira arfou, podendo respirar o ar fresco. A manta era grossa e pesada,
e era difícil de respirar. Ela olhou o aposento, reconhecendo-o, ele era tão grande
e bonito que não tinha como não se encantar. Na primeira vez, não tinha prestado
atenção, mas era tão bonito que poderia passar horas naquele lugar. O som de
farfalhar chamou sua atenção, tirando os olhos dela da bonita decoração. E
então, viu Khalid se despindo novamente e vindo em sua direção, rápido e com
passos silenciosos, no entanto, o que mais chamava a sua atenção era a sua
masculinidade novamente ereta.
— Por Alá, Khalid! O que está fazendo? Não íamos tomar banho? —
perguntou Amira surpreendida, cobrindo-se com as mãos enquanto o homem
puxava o manto de seu corpo.
— Vamos tomar banho... depois — respondeu com uma calma que
Amira chegou a se perguntar, o porquê fizera uma pergunta dessas. Mas com o
resto da resposta de Khalid, sabia que este sim, era o seu real plano desde o
começo — Além disso, quero olhar a beleza do seu corpo por mais tempo.
E mais uma vez, sobre a manta grossa que uma vez cobriu Amira,
Khalid voltou a reivindicar o corpo dela.
(...)
Depois de tudo, eles tomaram banho. Khalid pegou do lado de fora dos
aposentos, pertences que tinham sido deixados pelas criadas, enquanto eles se
banhavam. Ele refez seus curativos, ajudou Amira a se vestir, e inclusive,
fizeram suas orações de purificação antes de irem ao seu aposento.
Finalmente ela era dele, havia consumado a união. Ela estava feliz, leve
e também muito cansada. As emoções foram tantas, que bocejou logo que se
sentou na cama. Ela olhou para Khalid, vendo alguns cabelos ainda úmidos
colados em sua testa.
— O que foi? — ele perguntou.
— Percebi que seus cabelos estão maiores…
Os cantos da boca de Khalid se levantaram, mas não chegaram a mostrar
seus dentes, enquanto ele se sentava na cama ao lado dela.
— Sabia que você sempre joga olhares para a minha cabeça? —
comentou achando graça — Não foi difícil saber que sentia falta dos meus
cabelos grandes, de quando jovem. Por isso não os cortei mais.
Ela se surpreendeu sobre como ele reparava os pequenos detalhes e
sentiu vergonha de si, por só ter reparado em seus cabelos naquele momento.
Khalid, despreocupado, se deitou e a puxou para deitar em seu peito, ela se
sentia tão amada, que apenas fechou os olhos enquanto pousava a mão sobre o
peito dele sentindo o pulsar do coração do seu amado.
— Eu te amo… — murmurou ela pouco antes de cair no sono
completamente exausta.
— Eu te amo mais… — disse ele baixinho beijando o topo da cabeça
dela.
CAPÍTULO 25
SOL E TORMENTA
O guarda viu que a sua senhora ficaria ali por um tempo, visto que não
lhe faria bem a observar por muito tempo, ainda que fosse uma bela vista,
priorizava a sua vida. Levantou o olhar e ficou olhando ao redor. Porém, o que
ele não contava era sentir a ponta de uma adaga sendo encravada pela sua lateral.
A exclamação de dor veio tão rápido, quanto um braço que passou diante do seu
rosto, descendo o suficiente para travar o seu pescoço, travando os seus
movimentos e forçando-o a se inclinar para trás.
A dor era lancinante devido ao golpe desferido da adaga, mas ele
precisava salvar a vida de sua futura sultana. No ímpeto de adrenalina, fechou a
boca com força e reuniu sua força em um movimento rápido, levou a mão direita
ao braço do seu atacante e a esquerda à cabeça dele, esta que se encontrava logo
atrás da sua. Usou de toda sua força para se inclinar para frente em um rompante
forte, ao ponto de usar-se de alavanca e jogá-lo no chão. Mesmo que o preço
fosse agravar o seu ferimento.
Puxou a sua espada e curvou-se para frente. Pronto para desferir um
golpe no homem. Quando percebeu que ele era o Imã, o mestre religioso do
palácio e, em simultâneo ouviu o grito de sua senhora, levantando assim o olhar
e a vendo sendo arrastada para longe por um homem com as vestes de eunuco.
Infelizmente, isto foi o suficiente para o homem mais velho que não soltara a
adaga e levando-a consigo na queda, se levantar e desferir mais um golpe.
A adaga estava banhada de veneno na sua lâmina, a visão do guarda fora
escurecendo com essa segunda ferida e o seu corpo fraquejando. Ele pôde
escutar os guardas se aproximando assim como escutou do Imã que ele estava
defendendo Amira do traidor.
Eu morrerei como traidor? Pensou com ódio o homem, tendo força o
suficiente para golpear o Imã nas pernas com sua espada.
•••
Amira, que estava sentada na fonte, mal viu como tudo começou.
Apenas escutou a exclamação de dor vindo do seu guarda. Abriu os olhos,
assustada e viu o Ímã sendo jogado contra o chão com uma força violenta. Ela se
levantou assustada e deu um passo à frente, quando ainda estava tentando
entender o que aconteceu, foi surpreendida pela pegada firme de alguém a
puxando para trás. A garota gritou e se debateu, porém, nada disso funcionou. O
homem tapou a sua boca e seguiu a puxando, afastando-a do palácio. A pegada
do homem sobre seu corpo era forte demais, ela sentiu seus olhos encherem de
lágrimas. Amira focou o olhar no guarda como se pedisse ajuda, mas seus olhos
se encontraram por uma fração de segundos antes do homem receber um golpe
vindo do Ímã.
Os olhos do homem se arregalaram, ele fez uma expressão de susto e
assombro que ficaria gravada para sempre na mente dela. Ele deu um passo à
frente, mas ela não conseguiu ver mais nada. Pois o homem que estava a levando
tapou inclusive o seu nariz, a jovem não conseguia respirar e a sua visão foi
escurecendo e quanto mais se debatia parecia que pior e mais difícil ficava.
Eles já estavam ficando distantes, ela sentia seu corpo ficando fraco.
Mas ainda estava consciente, quando escutou o homem murmurando ao pé do
seu ouvido:
— Tenha calma, eu vou te ajudar a fugir, meu pequeno canário. Não te
farei mal como eles fizeram…
A voz dele era gentil, porém para ela não fazia sentido um sequestrador
falar com uma voz tão calma. Entretanto, Amira não conseguiu ouvir mais nada.
Pois de tanto lutar e sem conseguir respirar, sua visão escureceu e seu corpo todo
amoleceu nos braços dele.
Ele não tinha se dado conta de que tapou o nariz e a boca dela, até que a
garota desmaiou em seus braços, o deixando assustado. A pegou nos braços o
mais rápido que pôde e a carregou até o esconderijo onde foi instruído a ir com
ela.
(...)
Algum tempo passara e logo depois do rapaz a colocar na cadeira e
terminar de prendê-la ali como o Ímã instruiu, ela despertou desnorteada. O
rapaz sentiu o ar preencher seus pulmões assim como o alívio que o preencheu.
Como um bom rapaz que na verdade era, ele se abaixou e passou a mão pela
face dela, limpando um pouco de sujeira que tinha se alojado ali.
Amira estava com sua visão turva, sentindo a mão áspera contra seu
rosto e o pó do lugar em que se encontrava a fez espirrar. Ela olhou a pessoa
abaixada ali diante dela e viu olhos tão azuis quanto os seus, que perdiam parte
do seu grande destaque, pois as sardas em sua face tomavam sua atenção
também. Sua barba rala e seus cabelos eram ruivos. Seus traços eram familiares.
E Amira por um segundo perguntou-se com quem ele se parecia.
— Quem é você? — perguntou ela num fio de voz.
— Halis, pequena canária — ele lhe deu um sorriso, um sorriso que
Amira vira em outra pessoa, um sorriso, que ela não se confundiria jamais. Um
sorriso parecido com o de Khalid.
Sua mente que estava lenta veio de volta em um rápido rompante, tudo o
que aconteceu e a sua adrenalina deixou-a agitada. Ela abriu muito os olhos,
tentou se mover, mas suas mãos estavam presas, assim como seus pés.
Assustada, ela deixou o seu olhar vagar pelo aposento em que se encontrava,
tinha poucas entradas de luz do sol, muita sujeira e parecia que há muito tempo
não havia ninguém ali. Muitas redes e cordas por todo lado, além de uma cama
ao seu lado direito que parecia ser o único lugar sem pó.
Ela voltou o seu olhar a Halis, assustada e perguntou:
— Por Alá… O que está acontecendo? Por que você me sequestrou?
— Eu fui ordenado, mas não se preocupe, eu vou libertá-la e salvá-la
mesmo que seja punido por isso — disse ele em um tom bagunçado de emoções,
entre culpa e esperança.
— Quem te mandou me levar? Me solte, por favor. Deixe-me ir! —
pediu, visto que ela não conseguia por algum motivo sentir raiva do rapaz. Mas
aterrorizava o pensamento de quem pudesse aparecer a seguir.
— Eu vou te deixar, mas ele precisa te ver antes que eu possa te ajudar
— lamentou o rapaz — Entenda, você será mais feliz longe daquele lugar. Eu sei
que você quer, sei como gosta da liberdade, posso ver nos seus olhos assim
como quando estava no jardim.
Amira sentiu lágrimas rolarem pela sua face.
— Eu só queria sentar um pouco no jardim, sentindo a brisa perto das
flores. Por quê?! Por que você me sequestrou?! Por que não param com isso?! —
disse num desabafo frustrado que escapou pelos seus lábios. Foram dias de paz,
e quando ela simplesmente foi ao jardim… Amira sentia raiva, frustração e uma
imensa tristeza.
O rapaz ficou sem reação com a súbita explosão da garota.
— Me perdoe! Me perdoe! As pessoas são cruéis naquele lugar, eu sei!
O sultão estava te mantendo presa, eu vim para te libertar. Para salvar todo
mundo da tirania dele! Mas não se preocupe, o Ímã vai resolver tudo! Ele tem
ajudado a minha mãe, eles disseram que falta pouco!
— Como? O Ímã? Sua mãe? O sultão tirano? — aquelas palavras nunca
foram tão estranhas aos ouvidos de Amira. Não fazia sentido, não estava
entendendo.
Halis abriu os olhos ao perceber haver falado demais. Afastou-se de
Amira, ela se debateu na cadeira e o objeto virou com ela no chão, machucando-
a no ombro, braço e mão por causa da sua queda. Ele voltou apressado,
arrependido de ter se afastado dela. Ela era tão frágil e delicada, ele levantou a
cadeira com ela e pegou um pequeno lenço para limpá-la com cuidado.
— Eu não posso falar muito, você ficará em perigo.
— Se você não percebeu, eu já estou em perigo. Um salvador que prende
alguém num lugar assim? Isso parece salvação para você? — indagou ela.
— Não, mas isso é temporário. Acredite em mim… — pediu ele.
Ela viu um rosto que ainda tinha traços infantis, o que a fazia saber que
ele não era um completo adulto embora tivesse força. Ele era uma pessoa boa e
tinha informações. Ele era um inocente em meio a tudo isso, assim como em
dado momento ela também era. Assim como as crianças que estavam agora no
palácio e até mesmo como a criança que perdeu a mãe como o Khalid. A jovem
se sentiu uma péssima pessoa pelo que ela tinha que fazer.
Ela mordeu o lábio e suspirou.
— Eu acredito em você… Na verdade, eu quero acreditar... — sussurrou
ela, nem tão confiante assim da sua mentira — Mas tenho que saber toda a
verdade. Se você não me contar… Não consigo. Fora que meu corpo dói, ainda
não terminei de me recuperar dos meus ferimentos. Diz que se preocupa comigo,
mas não se importa com minhas dores.
Amira usou dos ensinamentos que lhe foram dados, ensinamentos que
neste ponto até hoje ela não usara. O charme feminino usado propositalmente
para sua vantagem. Olhou-o com piedade, mas lhe deu um suave e gentil sorriso
de canto no final, quando ele parecia ter baixa resistência a este olhar em
conjunto de uma mulher com lágrimas nos olhos.
O rapaz engoliu em seco e então se abaixou e afrouxou um pouco suas
amarras. Amira ficou satisfeita, pois conseguiria escapar. Mas antes de fazê-lo,
precisava tirar as informações do rapaz.
— Me diga, o Ímã ajuda a sua mãe? Quem é sua mãe? Não vou contar a
ninguém, prometo — se apressou em dizer, visto que ele estava receoso.
— Não posso dizer… — disse Halis e ela não precisou pensar muito em
quem era sua mãe, os cabelos ruivos falavam por si só. No entanto, insistiu:
— Posso saber quem é seu pai? — perguntou cuidadosa.
— Já falei, não posso… — ela o interrompeu já impaciente. Não poderia
ficar muito tempo ali. Ainda teria que descobrir onde estava para poder voltar ao
palácio.
— Não posso confiar em você… — disse em tom de lamento — Eu vou
o odiar, assim como todos os sequestrados odeiam seus carrascos…
O rapaz olhou para ela e enrijeceu.
— Não sou seu carrasco… Eu te vi por todos esses dias e vi o quanto
você estava ansiando a liberdade… Eu queria te ajudar a fugir e hoje era a
oportunidade — ele suspirou e passou a mão pelos seus cabelos curtos ruivos —
Eu sou filho do falecido sultão Fahir. Minha mãe teve que me manter escondido
e forjar a minha morte para poder me manter seguro, longe dos muros daquele
palácio. Ela disse que a mãe do Khalid foi a culpada por uma doença que se
espalhou por todo o palácio, mas a verdade é que nunca teve doença, ela matou
todos. O próximo alvo dela era minha mãe que era a favorita… Minha mãe foi
obrigada a envenenar ela! Você não entende! As pessoas são ruins! Naquele
lugar as pessoas são horríveis! O Khalid não difere da mãe e diariamente mata
várias pessoas inocentes! Eu mesmo vi os corpos.
O rapaz estava agitado e assustado, falando aquelas coisas absurdas e tão
distorcidas.
— O Ímã me manteve sendo alimentado e cuidado às escondidas. Mas o
Khalid voltou! E sempre trás a desgraça com ele! Você não entende! — disse ele
levando as mãos aos braços de Amira e segurando-os com firmeza — Ele matou
a menina que era prometida para ele! Ela era só uma criança! Ele matou a esposa
dele! Ele é cruel! Ele te mantém presa e te maltrata! Ele logo vai te matar
também! E você é tão frágil e delicada… tão bonita.
Enquanto o rapaz dizia aquilo tudo, Amira jamais se sentiu tão incrédula.
Sua descrença era tamanha que se viu rindo, como uma louca. Tinha pena e
sentia um desespero sem igual, olhando aquele menino. Ela não conseguiria
manter a farsa de dócil e sedutora vítima após escutar tantas coisas ridículas
como aquelas. A base era real, mas tinham tantos papéis invertidos que ela nem
sequer sabia por onde começar.
O rapaz olhava-a aturdido com sua súbita mudança de comportamento.
Era como se ela fosse louca.
— Halis, é esse o seu nome, não é? — perguntou Amira — Kelebek e o
Ímã, são as únicas pessoas que você teve algum contato na sua vida? —
perguntou ela ainda com vestígios do seu riso ensandecido.
Ele não respondeu, apenas a olhou assustado.
— A verdade que você tem consigo está tão deturpada que chega a ser
hilária. Me perdoe pelo riso. Halis, foi a sua mãe que trouxe a doença para o
palácio! Foi ela que fez tudo de ruim no palácio! E se o Ímã está a ajudando, ele
é tão ruim e cruel quanto ela. Você é tão vítima aqui, quanto eu nessa cadeira.
— Eu sou vítima do Khalid! Eu não teria vivido excluído e sozinho aqui,
se não fosse por todas as pessoas ruins do palácio! Eu sei, eu não tenho dúvidas!
Até matar o meu pai ele deve ter matado! Foi logo que ele chegou! Eu tenho
certeza!
Isto Amira não podia negar, visto que ela foi prova ocular de Khalid
matando o próprio pai.
— Você foi enganado a sua vida inteira, Halis — disse ela simplesmente
— Eu estava naquele jardim, feliz. Feliz porque eu não era mais uma escrava.
Feliz, pois encontrei o amor em meio a todas as trevas. Feliz porque o que restou
do meu povo também não seriam mais escravos. E isso tudo foi graças ao
Khalid. Ele me trata com respeito, amor e paciência. É um grande sultão e um
exemplo de líder.
Desta vez foi a vez do rapaz, olhá-la como se ela fosse uma pobre
coitada iludida por toda a vida. O que era estranhamente cômico e irônico.
— Você é louca! — disse ele, voltando a prendê-la com força. Ela
tentou lutar e se negar àquilo, mas embora ele fosse puro, inocente e com uma
visão insana das coisas, sabia fazer bons nós e tinha bastante força.
— A verdade sempre vem! — exclamou Amira, antes de levar um
sobressalto pela porta atrás do rapaz sendo aberta em um rompante.
Seu coração parou, sua língua afiada se calou. O Ímã se revelou através
das luzes que vinham de fora, entrando calmamente no aposento. Mancando,
mas sem parar de andar em sua direção. Controlado, suave e aparentemente
bondoso. No entanto, todos os sentidos e instintos de Amira gritavam ao ponto
de causar-lhe dor física.
Diferente das sensações de medo que ela teve com o Sheik, quando não
confiou nele. Diferente do que sentia com Kelebek. Até mesmo diferente de
quando viu o leão. Terror, puro terror a dominou por inteiro. Amira sentiu o suor
frio brotar em suas têmporas, a cada passo em sua direção que o homem dava.
Sua respiração estava tão pesada que ela já se sentia ofegante.
O rapaz curvou a cabeça em respeito ao Ímã, mas quando olhou de
soslaio o terror implantado na face da jovem, ele se sentiu confuso.
— Amira, a doce flor do deserto. Conhecida como “A bondosa” ou “O
anjo enviado por Alá” — um sorriso perverso se formou nos lábios dele e devido
à pouca iluminação seu rosto revelou-se ainda mais tenebroso para ela —
Rapaz, saia. Deixe-me a sós com ela.
Amira olhou para o menino que a pouco estava enfrentando, como a sua
única salvação. Estava verdadeiramente apavorada, como se fosse a própria
morte diante de si, vinda para levá-la. O rapaz era louco, mas bom no fundo. O
Ímã era apenas mal.
CAPÍTULO 27
O jovem rapaz não quis sair do aposento na primeira ordem do Imã. Não
queria a deixar sozinha, sentia uma necessidade de protegê-la, mas o Imã
voltou a sua atenção para Halis e no seu olhar existia uma reprimenda e
promessa de problemas. Se o rapaz queria ajudá-la a fugir, tinha que esperar o
Imã partir. Ele saiu de cabeça baixa, envergonhado de si, enquanto deixava para
trás a garota sozinha, com o único consolo que o Imã não a mataria.
Sua retirada foi como um soco na boca do estômago de Amira, uma
raiva borbulhou por dentro dela. Abaixou a cabeça, traída e abandonada. Sentia-
se sozinha, desamparada e não sabia o que esperar do Imã. O homem matou seu
guarda, com destreza e facilidade que denunciava o quanto era capaz.
Perguntava-se se ele faria o mesmo com ela.
A simples suposição a aterrorizava.
Ele caminhou até ela com dificuldade, podia ouvir os seus passos
ecoando mais fortes. Perguntava-se se isso era feito do seu guarda, se o fosse, era
muito bem feito. Questionava-se em pensamento se o guarda estava vivo.
Esperava que sim, pois o sentimento de culpa a corroía. Porém, nada disso
importava naquele momento, não quando o Ímã, em seus passos calmos, parou
diante dela e ela pôde ver os seus pés. Perto demais, assustadoramente perto, ao
ponto de sentir o seu cheiro, suor e especiarias usadas em incenso da mesquita.
A jovem engoliu em seco ao mesmo tempo em que escutou o homem
fazer um som como “Tsc...”.
— Levante a cabeça, garota. Deixe-me ver os seus famosos olhos direito
— ordenou a voz sibilando, calma e serenamente, que parecia agora familiar à
ela. Mas Amira não obedeceu, tentando recordar de onde o conhecia.
Mordeu o lábio inferior com tanta força que sabia que tinha se
machucado quando o gosto de ferrugem chegou à sua língua. Odiava-o e temia,
não precisava de muito, ele exalava o mal e, o infortúnio, parecia um prelúdio da
sua chegada.
Amira sentia-se em um assombro tortuoso, quando um pensamento
rápido lhe passou pela cabeça. Essa voz… sibilada. Mortal e controlada! O Imã
era quem estava por detrás de tudo, todo o caos, todo o mal. Ele estava lá no
palácio antes da chegada de Kelebek, e quando toda doença atingiu a família de
Khalid. Ele estava lá na morte de Samia, e quando tudo aconteceu. Era ele o
motivo de tudo, não sabia a profundidade dos seus feitos. Era ele que falava com
Kelebek... Não era Kelebek, ela era exibicionista demais para isso e a
constatação disso fez todo o corpo de Amira gelar.
E neste instante, ela se recordou do eunuco que Khalid lutou e que
desejava matá-la. Ele disse estar fazendo aquilo por algo maior e ela pensara
com Khalid sobre uma facção religiosa, mas jamais pensaram vir do Imã.
Khalid não tinha lhe contado das suspeitas contra o Imã. Amira mal
sabia, mas ela era a chave que Khalid precisava contra o Imã!
— Eu mandei levantar a cabeça, vadia! — exclamou ele no mesmo
momento em que o coração de Amira parou de bater, de puro medo da sua
constatação.
O homem se inclinou sobre ela para pegar seus cabelos e prendê-los com
força entre seus dedos, puxando-os de forma brutal para trás, para ela manter
seu olhar no rosto dele. Ele parecia ter um imenso ódio dela e ela nem sequer
sabia o que havia feito. No entanto, agora ela sabia o que ele fizera. Ainda que
estivesse tomada pelo terror, seus olhos se mantiveram firmes, o observando
com raiva.
O núcleo do mal no palácio.
— Você de fato se parece muito com ela… — disse ele aproximando seu
rosto perigosamente na direção dela e recitou — Acautela-te das mulheres, pois
nenhuma das armadilhas que montei para as criaturas é tão eficiente quanto
elas. Conhece? Foi uma frase dita pelo demônio Iblis. E devo concordar. Se eu
mesmo não tivesse a matado, teria pensado que ela teria retornado dos mortos
em busca de vingança.
Ela quem? Perguntou-se Amira engolindo em seco. Novamente, estava
sendo comparada a alguém, mas quem? Será que ele também veio a conhecer
Aysha? Aysha do sultão Fahir?
— Tenho planos para você, garota. Se tentar fugir daqui, mandarei
decepar seus pés. Se fizer barulho pedindo ajuda, deixei ordens de cortarem a
sua língua. Se levantar estes seus finos dedos contra mim, eu mesmo os
quebrarei — Os olhos de Amira se estreitaram em rancor ao homem e ele
pareceu gostar da audácia dela — E se nenhuma dessas ameaças funcionar
lembre-se que eu posso sempre torcer o pescoço de uma ou duas das suas
preciosas crianças. Pode me obedecer e ficar aqui quieta, sem ou com dor.
Amira estremeceu diante da perspectiva, mas ele não havia terminado.
Levou a mão livre ao rosto dela e apertou-o com mais força que o necessário.
— Te olhar me faz querer arrancar cada uma das pétalas que te fazem tão
bela, corrompendo os homens e levando-os ao pecado — ele parecia
insanamente fascinado, perdido em um tempo que não era o presente. Mas ao se
dar conta de que não estava no passado, seu rosto mudou de expressão — Mas
não tenho tempo para desperdiçar com você.
Ao terminar de falar, ele afastou a sua mão de Amira como se sentisse
repulsa ou nojo. O homem não fazia sentido, atordoada com a ferocidade dele
nas ameaças e, na verdade, que brilhava nos seus olhos, a garota conseguiu
perguntar:
— Por que está fazendo isso? Por que destila seu ódio a mim? Como o
irritei? — A pergunta teve um som pesado no aposento, não conseguindo
esconder o tremor do medo, tampouco da raiva. Ela sentia raiva deste homem
hediondo que a ameaçava tão ferozmente ao mesmo tempo em que tinha um
tremendo pavor mediante a certeza que ele concretizaria suas promessas.
Ele só estava perguntando se eu ia preferir uma morte rápida ou lenta.
Concluiu Amira.
— Como me irritou? Você não o fez, mas por sua causa estou mancando.
Aquele seu guarda foi o responsável — O sujeito a respondeu com uma
sinceridade e calma assombrosa, quase a fazendo se perguntar se havia
enlouquecido.
— E, por que… Por quê me sequestrou? — insistiu ela.
Precisava saber o que fazer e falar para fugir dali, pois parecia que ele
não a mataria, ao menos não naquele momento. Ainda que a tivesse ameaçado,
um minuto mais de vida era uma oportunidade a mais de fugir, mesmo com
todos os riscos.
O Ímã a olhou por um segundo. Amira parecia ter retomado um pouco
mais da sua calma, ela era veloz em se habituar e pensar rápido. Ela não tivera
sorte nas tentativas de morte, de fato, os homens estavam certos. Ela era algo.
Pensou o homem asqueroso. Sempre com uma feição inabalável, seja no seu
sorriso ou na sua dor. Ela lembrava Aysha, seu rosto parecia o de uma boneca
enquanto as suas emoções transpareciam em seus olhos e voz. Por um segundo
ele recordou de sua juventude, da garota cheia de vida que o cativou e o traiu.
Um ódio insano o tomou de assalto novamente, fazendo-o voltar para
perto de Amira de maneira feroz.
— Você sabe qual o destino dos heróis, menina?
Amira não entendeu a pergunta e meneou a cabeça.
— Eles morrem, sacrificando suas vidas por uma causa — Amira
engoliu em seco, com sua visão tremendo de terror mediante à perspectiva do
que ele estava falando. Mas ele não terminou, pois não era sobre ela que estava
falando — Você será a isca para fazermos história. Não é incrível? Você teve
muita sorte até agora, mas a sua sorte acabou. Você ficará aqui, até que o seu
amado herói venha para a morte. E irei trazer a cabeça dele para você, antes de te
matar. Lamentarei sobre os corpos de vocês e farei orações com todo o povo que
os adora, enquanto lhes provo que o domínio militar é frágil e corrupto. Então,
todos virão a mim.
— Você vai ser pego! Alá fará justiça! — cuspiu ela em puro ódio
sentindo as lágrimas rolarem pela sua face.
— Eu? Antes de me encontrarem terão que passar por um problema. Eu
só fiz até hoje uma única coisa com as minhas mãos e a culpa recairá na sultana.
Acredita que alguém chegará a mim? Todos que poderiam me acusar estão
mortos — disse ele achando graça, mas sem concluir o pensamento.
— Penso que você é asqueroso! Manipulando as pessoas. Um fraco,
incapaz de fazer as coisas com as próprias mãos! Penso que… — Amira sabia
que deveria calar a boca, mas o ódio era tamanho que ela não conseguia deixar
de chorar, brigar e exclamar a sua raiva.
O Imã a olhou com fúria e virou sua mão em um forte tapa na cara dela a
fazendo cair com a cadeira e tudo no chão fazendo-a cuspir sangue. Ainda
furioso, ele ameaçou dar um chute nas costelas dela, mas se reprimiu. Retomou
sua razão e respirou fundo.
Agachou-se à altura dela, inclinando a cabeça para o lado com um
sorriso tenebroso e falou com a voz mordaz:
— O fruto da pressa é o arrependimento. Não apresse sua morte, Amira.
No entanto, você tem razão. Não sou tão bom com uma espada, quanto o seu
sultão. Porém, não preciso de nada disso para destruir o seu império. É mais fácil
destruir um império do que o reconstruir. — concluiu ele com um sorriso e se
levantou, limpando a mão nas vestimentas — Agora eu tenho que ir, não posso
ficar longe da mesquita por muito tempo — disse saindo impetuoso do cativeiro
dela.
Assim que o asqueroso Imã partiu, Amira caiu no choro. Movia suas
mãos e os seus pés. Forçando e se machucando, em sua tentativa frustrada de se
soltar. Tinha que fazer algo, tinha que sair dali. O garoto saiu do seu esconderijo
e caminhou até ela. Esta que se sobressaltou com os sons de passos que vinham
de trás dela. Ela virou a cabeça rapidamente, sentindo uma dor muscular se
alastrar pelo seu pescoço, enquanto Halis dava a volta nela.
Tinha o visto sair pela porta, como ele estava surgindo por detrás
dela?! Pensou surpresa.
— Ha...
— Shiii… Não chame atenção. Ele acabou de sair — murmurou o
rapaz.
Amira franziu o cenho para ele, vendo-o agachando-se e soltando-a com
facilidade.
— Por que… — começou ela, mas foi interrompida novamente e estava
começando a ficar irritada:
— Porque eu disse que iria te ajudar a fugir… — começou ele, mas
refreou suas palavras e levantou o olhar para ela pesaroso. Para a total surpresa
de Amira, parecia até um pouco mais maduro. — Eu errei, você estava certa e eu
vou te ajudar. Me perdoe.
Assim que ele terminou de desamarrá-la, colocou-a de pé. Amira ainda
estava atônita olhando-o, quando chegou enfim a uma conclusão de que ele
ouvira a conversa. Ela lamentou pelo garoto e até mesmo sentiu vergonha de si
mesma, pois quando tudo que acreditava desfez diante dela, caiu aos prantos,
desolada. O menino era mais forte do que supunha. Por isso, ela sorriu e levou a
mão dela a dele.
— Você é um bom rapaz.
— Obrigado... — disse desnorteado após o sorriso e a afeição dela,
sendo esta, a primeira vez que recebera algo assim. Halis tossiu, soltou a mão
dela e virou-se ao redor — Bom, temos que ir, tenho que te devolver ao meu
irmão.
O jovem se encaminhou em direção à porta com ela seguindo-o, porém,
sentiu um mau presságio ao se aproximar. O silêncio estava estranho e ele
esticou as mãos para o lado, tomando uma posição defensora, refreando os
passos de Amira. Ela ficou confusa, mas ele levou a mão à boca, fazendo sinal
de silêncio. Em passos controlados para trás, levando-a junto, pouco antes de se
virar, pegou firmemente o braço dela e a guiou rapidamente, até onde ele estava
escondido anteriormente.
Amira, não conseguindo acompanhar os movimentos dele, quase
tropeçou, o rapaz pacientemente seguiu a guiando, mesmo se tropeçasse
novamente, até fazê-la ficar sentada no chão escondida. Uma vez que ele
também se abaixou, levou a mão à boca dela para tapar. Amira afastou a mão
dele, e ficou atenta para escutar o que poderia ser, então ambos esperaram.
Como o esperado, um som forte de porta se abrindo ecoou. Amira tomou
um sobressaltou e ela mesma levou as mãos à boca. Halis gesticulou para ela que
saísse do depósito em que eles se encontravam. Cuidadosamente, após saírem,
ele colocou o barril no lugar, para não chamar atenção que tinha algo fora do
lugar.
Escutaram a cadeira sendo jogada contra uma das paredes e quebrando,
algumas exclamações que eles haviam fugido, em um conjunto com ofensas.
Halis, ainda agachado, caminhou em direção às árvores gesticulando
para ela o seguir logo. Ela obedeceu e quando já estavam alguns bons metros de
distância, olhou para trás e reconheceu o depósito pela construção um pouco
mais à frente. O local em que estava era o galpão abandonado de depósito de
alimentos do velho orfanato.
Ela viu mais que isso, homens armados ao redor do mesmo. Ela se virou
para frente apressada para focar sua atenção no caminho que Halis estava
seguindo. Se ela fosse pela cidade, sabia voltar ao palácio, embora em sua última
experiência, o resultado da sua fuga desenfreada não fora boa.
Este caminho em que Halis a guiava, era desconhecido. O rapaz a
levava em direção ao mar. Uma vez que, passaram por uma grossa vegetação,
deixando vozes exasperadas para trás. Pôde ver claramente a extensão do mar e,
assim como da última vez, parecia haver um despenhadeiro entre o mar e ela.
Halis se virou para ela em um rompante, e o sangue dela gelou, como se
adivinhasse o que teriam que fazer.
Ele percebeu o medo dela e então se virou para ela e segurou em seus
braços.
— Você terá que confiar em mim, estamos indo por um caminho
perigoso entre as rochas. Não vou mentir, é perigoso. Eles sabem que eu conheço
a área, visto que fui criado aqui, mas independente do que, é arriscado. Eu quero
te fazer voltar para o seu lugar, o lugar que eu não tinha direito de tê-la tirado.
Acredite em mim — ele disse firme olhando nos olhos, e ela sentia a verdade
neles. Ademais, não tinham escolha.
— Certo — disse ela após deixar o ar pesado que parecia encher seus
pulmões de receio.
Ele desceu a mão até a dela e a guiou para a beirada. A jovem sentiu o
vento frio do mar batendo contra o seu rosto, o medo a invadiu e ela deu um
passo para trás, por puro instinto e então deu dois passos para frente recuperando
sua coragem ao ouvir as vozes dos homens novamente.
— Vou descer e você siga exatamente os meus passos.
Amira afirmou, mesmo que suas mãos tremessem. O seguiu, passo a
passo. Sentia que o vento que batia contra ela a derrubaria a qualquer momento,
ainda que as rochas sob seus pés fossem grandes o suficiente para acomodar seus
pés e sobrar. Era alto e bastaria uma olhada para baixo ou para o mar, que ela se
sentiria entregue ao medo, por isso, ela colocou sua atenção para onde segurava
e estava pisando.
Eles estavam em um lugar realmente perigoso, muito provavelmente
ninguém os encontrariam ali, já que ficava abaixo da linha de visão. Passo a
passo, eles passaram os próximos metros, abraçados à parede de rochas. E tudo
parecia estar indo bem, até que escutaram o som de plantas sendo cortadas, e
seus passos tiveram que se apressar.
Por sorte, Halis viu logo à frente uma rocha que poderia escondê-los.
Servindo como algo próximo a um telhado, devido sua estranha curvatura.
Cutucou-a e gesticulou com a cabeça para a rocha mais à frente e antes
que Amira viesse a entender, sentiu a mão dele se fechando ao redor do seu
braço, a puxando e pressionando-a contra a parede com seu próprio corpo.
— Eu tinha certeza que os vi vindo por esta direção, senhor — disse uma
voz desconhecida.
— Ainda que eles viessem por aqui, não teriam muitos lugares para ir, e
não estou vendo corpo algum lá embaixo — disse mal-humorado — Anda,
vamos continuar procurando-os. Não temos tempo a perder.
Os sons de seus passos se afastaram, mas ele sibilou ser imperioso que
ficassem um pouco mais de tempo onde estavam por segurança. Faltava pouco
para poder sair deste lugar de perigo para poder caminhar normalmente, pensou
ele.
(...)
Poucos minutos se passaram e ambos puderam respirar mais aliviados,
Halis se afastou da garota, focado demais em salvá-la. Era uma questão de
honra, antes de qualquer outro pensamento.
— Vamos — murmurou.
O caminho ficou estreito, mas logo à frente parecia que as rochas
formavam uma escada, o que aliviou o coração de Amira grandemente. Quando
conseguiram enfim sair da área de risco rochosa, ela pode ver os altos muros do
palácio e seus olhos quase se encheram de lágrimas. Porém, nenhum dos dois
estava em segurança ainda, por este motivo, mantiveram-se em movimento,
andando pela mata. Porém, ela tinha que falar para ele da entrada secreta. Não
precisariam dar a volta, desde que a achassem.
— Halis, eu tenho que te falar… — O chamou, em um tom de voz baixa.
Contudo, a fala dela foi interrompida, quando o rapaz que tinha se virado
para vê-la a puxou com força para frente, a fazendo cair de cara na terra. Uma
lâmina passou na altura da cintura dela, e se ela estivesse de pé poderia, na pior
das hipóteses, quase a partir no meio, mas apenas acabou fazendo um corte
superficial no braço dele.
— Armadilhas… — disse ele levando a mão ao braço, contudo, mal
pôde terminar de falar. Pois a exclamação de um homem não muito distante dali,
chamou a atenção dos dois.
— Achamo-os! Venham!
— Vá à frente, eu vou tentar conter eles. Você precisa voltar para o meu
irmão! — exclamou o rapaz puxando a sua espada.
— Mas e você? — perguntou Amira e quase pôde ver o Khalid com seu
espírito heroico no rapaz, inegavelmente eram irmãos. Amira sentiu seu coração
ficar pequeno em agonia, mas foi no grito dele que ela se virou para partir.
— Vá!!! — exclamou o rapaz antes de parar um golpe de espada de um
dos atacantes.
Ela pôde ver de relance seus atacantes e tentou a todo custo, gravar seus
rostos enquanto corria em direção ao palácio.
Os movimentos de Halis não eram bem feitos, uma vez que seguia seu
instinto como em tudo que precisou fazer para sobreviver. Na verdade, ele teve
um tutor, sim, embora se negasse a falar dele, mas o velho apenas o atacava, e
ele se vira obrigado a se defender. Era um velho desagradável, mas que ensinou
Halis a sobreviver. Sim, era verdade, refletiu, entre um golpe e outro de espada
que defendia. O tutor ensinou quase tudo que sabia, no entanto, não fora forte o
suficiente para evitar a própria morte e abandoná-lo sozinho. E o orfanato que
foi o mais perto de casa que teve, acabou.
O jovem príncipe seguiu vivendo ali isolado, nada parecido com a vida
de um príncipe de fato, foram raras as visitas do Imã e sua mãe. Aprendeu a
ser feliz com as pequenas afeições que recebera, mas dessa vez ele tinha um
propósito importante de fato. E se tinha um momento para colocar em prática os
ensinamentos do seu mestre, era aquele...
Amira não quis o deixar ali, mas ela tinha que levar ao Khalid tudo que
descobriu para acabar com o ser diabólico responsável por tudo. Enquanto o Imã
não fosse morto, nada acabaria.
Odiando-se por deixar o rapaz, que não parecia ser muito mais velho ou
mais novo que ela, sentia que seus olhos arderam pelas lágrimas e sujeira.
Entretanto, independente do que, correu o máximo que pôde, por sorte,
conseguiu desviar de algumas linhas e quando passava perto demais de uma
árvore podia ver as armadilhas. Por isso ela seguiu o caminho todo correndo
próxima à elas. Coisa esta que deu quase errado, quando perto de uma, havia
uma corda na sua raiz e por pouco não pisou nela.
Suspirou de alívio, mas escutou o grito de dor de Halis e um soluço de
choro escapou de sua garganta. Amira quase podia tocar o muro do palácio e
inclusive, por sorte, saiu onde Khalid mostrou o mar para ela. Assim fora fácil
achar a passagem. Ela escutava os passos de pessoas atrás dela, cada vez mais
próximos. Então ela se apressou para tentar passar pela passagem que por sorte,
depois de toda a confusão Khalid não voltara a trancá-la.
Amira se apressou em fechar a passagem logo em seguida e escutou
gritos e vozes agitadas. Entre elas, ouviu o som da voz de Khalid. Arfando de
cansaço e adrenalina, ela correu em sentido ao pátio que provavelmente era de
onde vinham todas as vozes.
Ao avistar os primeiros homens de Khalid em forma, olhando adiante,
Amira gritou com toda a força.
— Khalid!!!
Khalid que estava sobre um cavalo, com uma expressão pálida, apareceu
no campo de visão dela. O rosto dele era de espanto, e quando um sorriso
começou a nascer no rosto dele de felicidade, um grande alívio acometeu-se
sobre a garota.
Ele estava indo em sua direção, porém, na sua visão periférica, vira uma
sombra sobre os muros. Levantou a cabeça e viu a sombra de alguém, escurecido
pela luz do sol, mas que era nítido ver um arco e flecha em suas mãos,
apontando... Para Amira!
O sangue fugiu da face de Khalid e Amira pôde ver sua mudança
drástica de emoções, confusa ela olhou ao redor e voltou a olhá-lo. O tempo
pareceu ficar lento para Khalid, estendendo o seu pavor. Ele bateu os pés com
força no cavalo, para ir mais rápido e empinou o animal antes de saltar dele
sobre Amira.
Um grito explodiu de Khalid, gritando “Não”. Amira congelou de
horror, fechando os olhos enquanto se protegia com os braços. Em segundos, foi
derrubada contra o chão por Khalid. Ele era pesado, e por um momento pareceu
arquear seu corpo ainda mais sobre o dela. Quando ela abriu os olhos, Khalid
estava esparramado, cobrindo o corpo dela com o seu. O jovem sultão arrastou-
se mais para cobri-la melhor, retorcendo o seu corpo para se colocar entre ela e a
fonte do ataque.
Seus braços a envolveram, ele se levantou o suficiente para obrigá-la a
recolher suas pernas e ficar em posição fetal dentro de seus braços. Correu como
conseguia, segurando-a firmemente, para levá-la a um lugar seguro. Estavam na
lateral do palácio, por isso, para encontrar realmente um local seguro ele tivera
que dar a volta. Seu aperto sobre o pequeno corpo de sua amada afrouxava,
devido à fadiga e então Khalid voltava a apertá-la com força. Agarrando-a como
se fosse sua última esperança de vida.
Gritos ecoaram, de agitação e pânico chegavam aos ouvidos de Amira,
e tudo parecia estar lento para ela. Por todos os lados e exclamações dos
soldados. Mesmo em meio a toda desordem, Khalid teve a voz de gritar em um
tom tão furioso que ela jamais pensara ouvir dele:
— Ele está nos muros! Peguem-no imediatamente! E quero ele vivo,
para eu mesmo matá-lo!
Amira não conseguia ver muito, do jeito que ele a segurava. Mas assim
que os pés de Khalid, passaram pelas portas; apenas desabou sobre os joelhos,
gemendo alto, mediante a dor que ele sentia, seu aperto aliviou.
CAPÍTULO 28
DESVENDANDO: A VERDADE
O grito dela ecoou tão forte, que dois dos homens de Khalid se apressaram
para obedecer às suas ordens. Amira levou a mão à cabeça, com a
certeza de que Khadijah era a Kelebek.
Recordou-se com alguma dificuldade, do dia em que a Sultana lhe disse
sua história. A mulher tentou manipulá-la e, infelizmente, quase conseguiu.
Kelebek dissera algo sobre a irmã de seu prometido e que esta irmã estava em
um romance proibido com um homem de outro reino. Se fosse, tinha certeza que
estava falando de Aysha. E se tinha alguma verdade no que ela dissera, talvez,
esta fosse ela. No entanto, não era o próximo rei propriamente dito, embora seu
pai fosse o líder de todo um povo e poderia ser chamado assim, caso tivessem
um reino.
Kelebek sabia que ambas eram parentes, desde o início. Sabia de quem
Amira era filha? Não poderia ter certeza. Mas ela dava indícios e sentia-se tola
por não interpretar melhor as informações que lhe foram dadas. Ademais, Aysha
não se entregou à morte, ela foi levada à morte, pelas mãos do Imã. Por que
disso? Não entendia, ainda.
A jovem sultana Amira, amaldiçoou Kelebek e o Imã, enraivecida.
Encaminhou seu olhar ao seu pai, não como se ele tivesse culpa de algo, afinal o
seu maior erro foi deixar Kelebek livre. A raiva fazia Amira estremecer, e a cada
murmúrio do Imã tentando se soltar da mordaça, a enervava mais. O Imã e
Kelebek, não mereciam o dom da vida que haviam recebido de Alá.
Amira respirava pesadamente, contendo-se, sua fúria parecia concentrar-
se e aumentar a cada segundo de forma exponencial. Contudo, percebeu ter
sobre si, o olhar de seu pai; Haidar e ele portava uma expressão impassível.
Amira o tinha olhado e então se manteve em silêncio, o que o deixou confuso. E
mesmo assim, ela se manteve por segundos da mesma forma, antes de suspirar
pesadamente.
A jovem garota tivera as respostas de suas perguntas. Enquanto ele
parecia perdido em meio ao caos. Deslocado e sem ideia do quanto fazia parte de
tudo. Ele parecia um homem calmo e objetivo, embora pudesse se tornar
impulsivo e perigoso, assim como provou em sua entrada naquele aposento. Será
um traço de líderes? Pensou ela, mas tampouco importava naquele momento.
Devia-lhe respostas e as daria.
— Senhor meu pai, te tomei respostas e não lhe dei uma sequer. Acredito
que o melhor que posso fazer pelo senhor é… — disse Amira levantando o
braço e apontando para a carta esquecida, caída no canto do aposento, dando um
sorriso fraco — lhe permitir a leitura da carta da… Da minha mãe.
Reflexivo tentando compreender o intuito de fazê-lo ler uma carta,
Haidar duvidou se de fato suas perguntas seriam respondidas. Mas por fim, via
nos olhos da garota a ligação inegável com seu povo e assim acatou a instrução
dela. Caminhou até à carta e viu um nome escrito em uma letra bonita: “Ayla”.
Um nome tão parecido com o de sua irmã que além da sua aparência, poderia ser
confundida igualmente pelo nome.
Haidar voltou o seu olhar para Amira, esta que havia voltado sua atenção
ao seu senhor acariciando seus cabelos. E então retornou a sua atenção ao papel
em suas mãos e logo no primeiro parágrafo, se chocou. Ficou perdido em seu
próprio silêncio e recordações, de uma noite que parecia ter sido destinada ao
mais belo amor e a mais terrível desgraça.
(...)
Amira sabia que ele sofreria e que não demoraria a entender o que
acontecera à Safirah. Por isso, tirou seu olhar de seu pai. Dando-lhe alguma
privacidade. Deu atenção a Khalid que já não parecia estar em um sono tão
pesado. Virou-se para o médico e pediu que voltasse a examiná-lo, ansiosa pela
sua melhora.
Enquanto o velho homem se atentava ao seu Sultão, a garota fitava o
rosto de seu amado. Ainda parecia frágil e a garota por um segundo pensou
como seria sua vida se tivessem tido a oportunidade de ficarem juntos
tranquilamente.
Lembrava-se que não tinha muito mais de dez anos, quando o viu pela
primeira vez. E se tudo tivesse dado certo? Se Safirah tivesse tido a oportunidade
de ficar com seu pai?
Ela seria a “menina dos olhos” daquele homem em pé lendo a última
coisa que lhe fora entregue da sua antiga vida? Teria sido mais livre ou teria uma
vida comum?
Todos os envolvidos teriam sofrido menos?
Recordou das demais pessoas que sofreram por todo esse percurso, de
Aysha e o Sultão, o próprio Khalid e a sua mãe Honde… Os irmãos do homem
que amava, a falecida Valide Sultana, a avó dele. Mesmo Halis, que fora
manipulado por toda a sua vida… Enganado por sua própria mãe. Lamentava
tristemente pelo bebê que estava no ventre de Kelebek, este que poderia ter o
mesmo destino de Halis.
Tudo parecia ter sido forjado em caos.
Vidas foram perdidas pela ganância, tamanhas desgraças e infortúnios...
A raiva que Amira sentiu borbulhar dentro dela anteriormente retornou como um
açoite em sua face. Tudo era culpa do Imã… dele e de Kelebek. A frase repetia-
se em sua mente, num eco de fúria. Alimentando a sua ira. E como estopim, o
Imã que se debatia para soltar-se, lamentavelmente conseguiu soltar a mordaça,
que estava em sua boca.
— Me soltem! Isso é um engano! — exclamou ele, irritado. E nem
sequer tinha a hombridade de assumir os seus erros, visto que fora
desmascarado.
O soar da voz do homem, fez com que a jovem sultana recordasse das
suas ameaças e de todo o ódio voltado à ela. Ele era o próprio mal, mas este mal
estava amarrado e jogado contra o chão, nem tão assustador assim. Amira se
levantou e caminhou até o meio do aposento, diminuindo seus passos e permitiu
seu olhar pousar pesadamente sobre ele. Nem sequer conseguia ter o gosto da
satisfação de vê-lo daquela forma.
Era deplorável, com um dos seus olhos inchados, sua boca cortada e um
tanto de sangue o sujando.
— Você não engana mais ninguém… — Amira se abaixou lentamente
para olhar nos seus olhos e disse num tom tão frio que não parecia ser ela
mesma: — Minha pergunta é por que ser tão cruel? Por que chegar tão longe?
Por Alá… você de fato é o pior demônio que já tive o desprazer de encontrar em
minha vida.
Antes que os guardas pudessem fazer algo, o Imã tentou se levantar e
avançar sobre ela, mas num movimento rápido de sorte, antes que ele
conseguisse, Amira gritou e por reflexo de fuga, ela caiu com o traseiro no chão
um pouco mais longe dele. Ele parecia ainda querer ir para cima dela, quando
Amira levantou seus pés e o golpeou, bem no meio da sua face. O golpe fora
certeiro, pois o atordoou fazendo-o cair para o lado oposto ao dela que o fez
cuspir um dente em meio ao sangue.
Os homens que faziam a guarda seguraram-no, para que não tentasse
mais atacar a jovem sultana. Amira se levantou do chão, batendo suas vestes,
com o coração agitado pelo susto e olhou fixamente para o homem contido.
— Imundo... — Amira cuspiu a palavra enraivecida — Desejo que os
ratos devorem suas entranhas, com você estando ainda vivo. Você envenenou
todos deste lugar, seja com suas palavras ou com veneno. Você arquitetou toda a
desgraça que levou a vida das pessoas dentro e fora do palácio, recorrendo ao
veneno de minha família. Usou Kelebek como intermédio de suas ações e
conspirou contra o seu senhor. Não me surpreenderia se você fosse a pessoa que
disparou a flecha contra o Sultão.
O homem sorriu e ela se arrepiou de terror.
— O anjo do povo, desejando o meu mal… Ora, ora... O que pensaria o
seu amado povo? Minha senhora, sou inocente… Acusa-me sem uma prova
sequer. Mas claro que com seu novo cargo, você pode ser uma tirana e apenas
me matar... — O Imã teve a audácia de dizer e então continuou num tom mais
baixo: — Não sou nada, mas se eu puder mostrar a todos o quão podre é essa
dinastia, todos vocês cairão e terá valido a pena.
A expressão de ultraje de Amira fora impagável para o Imã, que o fez
sorrir mais alucinado, mas isso foi um pouco antes da garota avançar sobre ele,
com um olhar tão insano quanto o dele próprio. Embevecida pela ganância de
matá-lo.
— Então, serei uma tirana, mas você não mais existirá neste mundo…
— rosnou ela.
Deleite, esta era a expressão do homem sendo esganado, enquanto
pensava: suas pequenas mãos apertando com força o meu pescoço, pequenas
como as de Aysha. Seus olhos, sua boca, seu olhar… tudo parecia tanto com ela.
Recordou de sua própria mão no pescoço de Aysha e de como era irônico, que
uma garota com a mesma feição tentasse o matar da mesma forma. O Imã
começou a rir histericamente, ao mesmo tempo em que tentavam afastar Amira
dele.
— Vamos, mostre para todos a criatura maligna que você é… — disse
com dificuldade o Imã.
Mas alguém enfim os separou. Mãos fortes afastaram os homens que
estavam próximos dela, pouco antes de envolvê-la em seus braços, puxando-a
para trás. Amira se sobressaltou e ela demorou uns instantes antes de ouvir uma
voz ao pé do seu ouvido e parar de se debater. Khalid.
— Não suje suas mãos… Ayla… Me escute.
Amira sentiu seu corpo enrijecer e virou a cabeça o suficiente para ver o
rosto de Khalid de perfil. Ele parecia abatido e pálido. Sentiu subitamente sua
raiva se esvair, na mesma velocidade em que sua preocupação retornara, girando
nos braços do homem para ficarem frente a frente.
— Khalid! — repreendeu ela — Deveria estar na cama, ainda não está
recuperado o suficiente para se levantar…
— Pequena... — disse ele com a voz grave — Ele está fazendo você se
tornar como ele. Não se deixe manipular.
Amira engoliu em seco e soube ser verdade, sentindo-se ainda mais tola.
Mas quando estava começando a se martirizar, Haidar falou surpreendendo a
ambos.
— Vocês precisam de uma prova? Eu posso conseguir. Ainda sou um
mercenário, mas no caso deste homem talvez não precise recorrer a muitos dos
meus conhecimentos — disse Haidar, e quando Amira seguiu o som da voz, o
viu atrás do Imã o pegando com brusquidão e o colocando de pé.
Ela não viu quando seu pai dera a volta, ou em que momento fora parar
ali, mas via um brilho em seus olhos sérios que a deixava em expectativa do que
seguiria. Haidar desceu o olhar até a bochecha do rosto dela, mancha arroxeada
que antes ele deixara passar despercebido.
Khalid e Amira mantiveram seu olhar fixo nele por alguns segundos em
silêncio, como se apenas nisto fossem ter alguma resposta. Em todo caso,
Haidar, com uma das mãos segurou o Imã de pé que ficava perguntando quem
era ele, como ousava fazer isso e que era para soltá-lo. Contudo, Haidar
ignorava-o.
— Quem lhe causou isso? — indagou apontando para a mancha no
rosto da jovem sultana.
Amira, sem precisar responder em palavras, em um ato involuntário
apenas virou o seu olhar para Imã, lembrando-se do acontecido. Entendendo
tudo muito rapidamente, Haidar fechou a mão e golpeou o Imã com muita força
no rosto, ao ponto de deixá-lo mole. Mas não o deixou ficar desacordado, apenas
muito desnorteado.
— Maldito bastardo! Quem é você?!— perguntou, logo após balançar a
cabeça e ter um pouco mais de foco.
— Eu me chamo Haidar, chefe da tribo Allayl[14]. Mas você deve
conhecer como 'atfal 'iifrit...— disse ele abrindo um lento sorriso enquanto
abaixava a sua cabeça ao ponto de sua boca ficar à altura da orelha do Imã — E
aquela garota ali é minha filha…
O rosto do Imã perdeu a cor, engolindo em seco, pouco antes de ser
arremessado contra uma parede por Haidar. As costas do Imã bateram
fortemente contra a parede próxima dali, ao lado da porta, e então escorregou até
o chão caindo sentado. Ninguém ousou ficar em seu caminho para impedir,
mesmo Amira olhava-o embasbacada com a força que seu pai possuía.
Haidar focou toda a sua atenção no homem amarrado e voltou a colocá-
lo de pé, o apoiando contra a porta. O manteve no lugar com apenas uma mão e
com a outra puxou um pouco da sua espada e passou o polegar sobre a parte não
cortante.
— E sou o chefe da tribo originária do veneno que você usou e para os
seus fins. Mas talvez você não tenha reparado em algo. Este veneno deixa
vestígios de uso, a tinta dos ingredientes mancha a pele... — por fim Haidar
abriu a sua mão mostrando-a manchada.
O sangue fugiu do rosto do Imã, mas não durou muito tempo. Salvo
engano de Amira assistindo aquilo, quando a revelação de um falso pavor se
provou na expressão do Imã modificando-se para fria e cruel, tão e só, como era
de fato a sua verdadeira face. Mesmo com seus punhos amarrados, ele levantou
as mãos mostrando seus dedos, suavemente manchados por onde a flecha
passara.
— Acha que este menino vai expurgar o mal do palácio? Acredita que
me arrependo? — indagou ele satirizando as palavras que um dia Khalid disse,
antes de abaixar a mão — O mal estará lá, mesmo muito tempo depois que eu
me for. O mal estará em você que derruba meu sangue, pois sirvo a Alá. E ele
me fará justiça. Você, “famosa flor do deserto”, suponho que foi muito bem feito
para Halis ter morrido, aquele inútil!
Os próximos minutos poderiam ter acontecido em horas e ainda seria tão
rápido que demoraria a entender o ocorrido.
No momento em que o Imã abriu a boca para falar de Halis. Amira
estremeceu de ódio. Virou-se de frente para ele e tentou se desvencilhar do
abraço de Khalid, este que apertou o braço envolto dela com ainda mais firmeza.
Porém, neste mesmo instante, Kelebek tivera acabado de chegar, acompanhada
dos guardas.
Fora bem a tempo de ouvir as palavras do velho mestre religioso, o
sangue fugiu de sua face e suas pernas fraquejaram, fazendo-a apoiar-se na
porta, enquanto recebera a notícia que seu filho estava morto.
Ofegou, faltou-lhe o ar e a mulher que nunca cometera um grande ato
como mãe, sentiu seu coração dilacerar como se o rasgassem. Ela tivera uma
epifania, em segundos, lembrou-se da última vez que o vira, e ordenou-o para
que não a chamasse “mãe”. Seu filho, aquele pequeno bebê que um dia ela
pegou nos braços, que amamentou e cuidou na sua primeira infância, e que
desejou que se tornasse um homem grandioso, estava morto.
Uma dor excruciante cresceu dentro de si e converteu-se em ódio que a
preencheu de forma descomunal e irracional. Quando se viu com uma força e
destreza nunca sentida anteriormente, mesmo grávida e acima do seu peso, a
mulher conseguira desvencilhar-se das mãos firmes que a seguravam e num
rompante tirou Haidar do caminho, fazendo-o cambalear para trás pela surpresa,
atirando-se em direção ao Imã e o pegou pela roupa com firmeza,
completamente alucinada.
— Você jurou que não fariam mal a ele! Você jurou pela sua vida, seu
bastardo! — gritou Kelebek, sacudindo e batendo o homem violentamente
contra a parede.
— Ele foi um inútil sendo corrompido pela menina. Ele se voltou contra
nós!— exclamou o Imã em retorno.
Kelebek bateu-o com mais força contra a parede extravasando a sua
fúria.
— Ele era meu filho!!! — esbravejou Kelebek, tremendo com lágrimas
molhando sua face.
Ela soltou as vestes do imã para segurar seu rosto e encravar as unhas na
carne macia de suas bochechas, mas se afastou num rompante, apenas para puxar
uma adaga que portava escondida.
Num único ataque, com os homens exclamando para não o fazer ao
fundo, ela encravou-a na altura da clavícula do Imã. Ele, surpreso, abriu muito
os olhos, antes de gritar arfando a sua dor. No primeiro momento, quase
ninguém se recordou do que Haidar havia falado que todos da sua tribo
carregavam armas embebidas em veneno, exceto, o Imã.
E Kelebek conseguiu torcer a adaga, antes que com muita força, o Imã
conseguisse se soltar das amarras, ferindo seus pulsos, para inclinar-se
violentamente para cima dela, com as mãos esticadas para pegar a corrente que
estava no pescoço da sultana. Assim que segurou a corrente e empurrou Kelebek
violentamente, rompendo a corrente e ficando com o antídoto em mãos.
Cambaleante, Kelebek fora para trás e bateu contra uma lamparina
acesa, que se chocou com força contra a parede e o óleo que portava, espirrou,
espalhando-o pelo chão e por toda vestimenta de Kelebek, alguns respingos
acertaram seus membros desnudos que a fizeram levar o olhar para os próprios
braços. A mulher parou por um segundo, tentando compreender o que ocorrera,
quando a sensação da queimadura começou a causar uma terrível dor lancinante,
causando bolhas em sua pele onde os respingos acertaram. Em seguida, a chama
que estava acesa na lamparina, começou a se alastrar subindo pelas suas vestes.
O olhar dela levantou e seus olhos conseguiram por uma fracção de
segundos enxergar do outro lado das chamas, uma pessoa que ela não esperava
voltar a ver. Haidar…
O tempo parecia ter parado para Kelebek naquele momento, lembrando-
se de outra vida, de quando era ainda Khadijah. E então olhou para o homem
com toda a sua mágoa e rancor, como se fosse culpa dele todo o seu sofrimento.
No entanto, independente do seu devaneio, as labaredas das chamas
continuavam a se alastrar e se espalhar por ela e pelos tapetes ao seu redor.
Desespero a tomou e então ela gritou com força exclamando a sua dor, e no
momento que puxou o ar, a fumaça quente lhe queimou as narinas, descendo da
mesma forma até os seus pulmões, queimando-os.
Kelebek tentou ferozmente apagar as chamas, porém, óleo de baleia era
muito difícil de ser apagado e suas vestes alimentavam ainda mais o fogo.
Desesperada até chegar às paredes, tentando inutilmente se afastar das chamas
ao seu redor, pedia socorro aos berros, mas suas pernas começavam a falhar de
dor, fazia muito calor sob os tecidos em chamas, seu peito doía e ela tossia
muito.
Lágrimas rolavam por sua face, no momento que se sentiu curvando para
frente, segurando sua barriga. Parte do seu cabelo e vestes foi completamente
tomada pelas chamas, fazendo da visão, algo terrivelmente horripilante. Parte da
tapeçaria que estava no chão, queimava também.
As pessoas, que olhavam horrorizadas demais para reagirem,
pareceram despertar do seu torpor, devido ao cheiro forte de carne queimada,
óleo e fumaça. Amira arfou, levando a mão à boca para conter o grito. Khalid,
em busca de protegê-la das chamas que se espalhavam por onde escorria o óleo,
a puxou para trás e protegeu o corpo dela com o seu. Conforme tentava dar a
volta no aposento para poder sair dele, levando-a com ele, mas não conseguiram,
pois tudo ocorrera próximo à porta.
Haidar e alguns dos homens tentaram se aproximar para apagar o fogo,
mas as chamas estavam altas. Era inútil. Tosse se espalhou por todos do aposento
devido o ar carregado. O Imã tentou fugir após tomar o antidoto, enquanto todos
estavam atordoados, mas sua fuga fora impedida pelo jovem Halis que chegou
acompanhado de outros rapazes. Seu olhar saiu do Imã e percorreu todo
aposento até chegar à fonte do fogo e reconhecer a sua mãe.
— Mãe!!! — um grito ecoou vindo da porta e Amira reconheceu a voz.
Halis.
O rapaz escandalizado ficara horrorizado com o que vira. Em um
rompante, correu em direção à sua mãe. Mesmo com as chamas ao seu redor e
nela mesma estando altas, ele não se importou com a dor causada pelas
queimaduras. Amira gritou ao fundo chamando-o, mas ele ignorou,
desesperadamente tentando salvá-la. Halis conseguiu por poucos segundos, ver a
face de sua mãe, ver o espanto e o alívio antes de ser puxado para trás, por
Haidar.
— Não se aproxime! — exclamou ela com a voz rouca entre de muita
tosse.
Kelebek reuniu toda a sua força, mesmo que seu corpo inteiro estivesse
dando a sensação de se rasgar a cada movimento e ela saiu apressada do
aposento, fugindo do filho. Para que assim ele não tentasse se jogar entre as
chamas. O garoto independente do que a mãe falara, tentou chegar-lhe, mas
neste ponto ela já estava fora do aposento e se arrastava pelos corredores de
pedra, parecendo a visão do próprio inferno. Deixando os criados que lá estavam
em polvoroso.
— Você também irá queimar, rapaz! — exclamou.
— Mãe! Não, me solte! Mãe! — continuava gritando Halis, o rapaz
chorava, como um menino, com os braços estendidos para sua mãe e uma
expressão de fúria em sua face. Mas Haidar era mais forte, jogando o rapaz que
era relativamente mais fraco que ele para o outro lado.
— É tarde demais para Khadijah — afirmava Haidar para Halis — É
simplesmente… tarde.
O jovem príncipe ruivo debateu-se ferozmente exclamando a dor que
preenchia seu coração, lutando contra Haidar. Sua respiração estava tensa devido
à fumaça, assim o cansaço não demorou a chegar, mas mesmo assim tentou
veemente se desvencilhar das mãos fortes do pai de Amira. No fim, derrotado,
ele caiu de joelhos, chorando a morte de sua mãe e de seu irmão no ventre dela.
Dor o dilacerava, e era compreensível, pois mesmo que sua mãe fosse uma
víbora, ele sempre ansiou o seu afeto e sua atenção. E isso não seria mais
possível de forma alguma. Haidar o soltou, visto que o rapaz desistiu.
O Imã que já havia perdido muito sangue, em conjunto de estar próximo
demais das chamas, tossia e caiu sentado contra o chão. Ofegante, murmurando
fraco por ajuda. Ainda que tivesse tomado o antídoto, a fumaça queimava seu
peito. Do ferimento no ombro feito pela Sultana saia muito sangue e nem sequer
tinha forças para se mover muito, mas mesmo assim tentou se levantar, mas seu
pé vacilou, o que o fez voltar ao chão. Caindo e resmungando a dor que em uma
forte pulsação se espalhou pelo seu corpo.
O som do resmungo do Imã chegou aos ouvidos do Halis, e o rapaz
levantou o olhar em direção ao velho homem. Por um breve segundo, os ferozes
olhos azuis encontraram os negros do religioso. O jovem rapaz se moveu
rapidamente, levantando-se o suficiente para se impulsionar com o pé e puxar
sua espada que estivera outrora em sua cintura, enquanto correu na direção do
Imã. Halis desejava com todas as suas forças, vingar-se pela sua mãe e naquele
momento, tudo o levava àquele homem velho, que por tantas vezes falou de Alá
enquanto conseguia provocar tanto mal.
Ninguém conseguira entrar na frente a tempo, não antes de Halis chegar
ao Ímã e fazer um corte de uma ponta a outra no peito do homem caído ao chão.
Levando-o à morte.
Ofegante, o rapaz não se dera conta que o matara, quando girou a espada
para cravá-la no peito do homem. Então, diante do morto, o rapaz chorou alto,
caindo de joelhos no chão, frustrado, sentindo que sua dor não diminuía com o
feito. Ao mesmo tempo, fora tomado por uma sensação de vazio, sem propósito,
sem família... sem nada. Dado que as duas pessoas que ele amou, estavam
mortas. Deixou a espada cair no chão e olhou suas mãos, antes da sua visão
começar a turvar e sentir que ia desmaiar.
Quantas pessoas eu matei? Quanto sangue havia em suas mãos? Pensou
ele. Já não se diferia do homem que matou e de tantos outros ímpios cruéis.
Toda perspectiva de ter um lugar a qual pertencia, se foi, tudo em um
único dia.
Mas antes do rapaz desmaiar, Khalid soltara Amira e ambos exclamaram
juntos, ao irem em direção ao rapaz. Segurando-o cada um, de um lado,
inclinando o rapaz para trás, para que não fosse com seu rosto no chão. Halis se
surpreendeu ao ver o rosto dos dois.
As duas das pessoas que estariam mortas, se sua mãe e o Imã tivessem
conseguido concluir os seus planos.
O choro do rapaz dessa vez fora silencioso, não sabia a que lugar
pertencer ou que sentimento sentir.
Khalid olhava o rapaz que nem sequer sabia o nome, mas que era sua
clara versão mais jovem, com a diferença que era ruivo e tinha olhos azuis. Os
traços herdados por seu pai eram bem marcantes, assim como os traços de
Kelebek. No entanto, aquele rapaz parecia ainda mais com ele, no dia que
perdera sua própria mãe. Khalid se compadecia do rapaz, queria ele mesmo
matar o Imã, mas visto que seu irmão o matara em justiça de sua mãe, o jovem
sultão se daria por satisfeito.
— Está tudo bem, agora, Halis — quem disse isso fora Amira, ao tocar
o ombro do rapaz com um pouco mais de força do outro lado — Você vai ficar
bem.
Halis observou a moça bonita que cobiçou enquanto ela estava sentada
em uma janela, e sentiu vergonha de si mesmo. Enquanto, Amira, assim como
Khalid, sabia o que o rapaz sentia. O mesmo que ambos sentiram quando se
tornaram órfãos.
— E o que farei agora? — indagou ele sinceramente.
Amira e Khalid se entreolharam e então voltaram a sua atenção ao
rapaz.
— Ficará conosco. Uma família que vai te aceitar e estar com você —
disse Amira com um sorriso doce — Um irmão mais velho que pode ser um
tirano por vezes. Um primo que é mercenário, o meu pai. Uma cunhada/prima,
que sou eu... Todos nós sabemos o peso da dor da perda, da solidão, mas, se nós
nos tornarmos a força um do outro, no final de uma cadeia de tantos
acontecimentos ruins, pode se tornar algo bom.
— Pode mesmo ser algo bom? Mesmo depois disso tudo? — perguntou
o jovem rapaz num fio de voz.
— Sim... — disse Khalid, antes de sorrir um pouco travesso olhando
para Amira — E se algo der errado, voltaremos a expurgar o mal.
Amira sorriu, achando graça de como o discurso dele parecia ter se
transformado em piada. Logo em seguida que eles se resolveram, diversos
criados chegaram com bacias cheias de terra e panos molhados, de modo à
extinguir o fogo e um apoiando o outro, com seus verdadeiros aliados saindo
logo atrás deles dos aposentos, enquanto os criados resolviam toda bagunça
deixada para trás.
E naquele momento em diante a paz imperaria sobre o palácio.
EPÍLOGO
FIM
EXTRA 1
AYSHA
A ysha era filha mais velha da tribo Allayl, era a mais bela de toda a tribo,
mas também a mais prestativa. Por vezes demais, ela fora mandada para
conseguir mantimentos, já que com seu charme as pessoas apenas a
ajudavam de bom grado e em certo dia, no território de Anatólia por acaso ela
encontrou o sultão, caminhando entre o povo, fazendo-se de pobre. Ele possuía
um brinco em sua orelha que provava exatamente o contrário, de ouro e uma joia
brilhante que a fizera rir.
Porém, para a sua infelicidade, ele percebeu o seu sorriso quando seus
olhos se encontraram e o jovem rapaz fora até ela. Ele ficara perseguindo-a pela
comemoração da cidade, jogando seu charme e ela o maltratava com sua
indiferença, pois odiava nobres. Mas em meio à sua insistência, Aysha acabou
rindo de uma de suas provocações. Fahir lhe dera um sorriso gatuno e soubera
que seria vitorioso em conquistar seu coração.
Alheios aos olhares maldosos em suas direções, fora assim que nasceu o
romance entre um jovem homem destinado a um grande futuro e uma garota, de
uma tribo que não era bem vista.
No retorno ao seu povo, parecia que Alá desejava algo mais ao seu
relacionamento proibido. Pois os pais de Aysha decidiram passar alguns meses
parados no mesmo lugar, alegando ser devido à fartura da terra.
Assim, de alguma forma, a cada ida à cidade, ela o encontrava. Nos
momentos mais inesperados e nas horas mais surpreendentes, ela se viu cativa
pela alegria que o homem lhe passava. Além de ser doce, parecia querer fugir
diariamente, na esperança de encontrá-la.
No entanto, em um destes encontros, a informou que não poderia ir vê-la
da próxima vez, pois tinha deveres. E ela entendeu. Realmente se perguntava
como ele tinha tanto tempo livre para ficar atrás dela.
No dia em que não o encontraria e estava pronta para ir comprar os
alimentos, o seu irmão mais novo; o valente e ousado Haidar, pedira para ir
junto, pois queria aventurar-se. A jovem sorriu e concordou, afinal Aysha não
viu motivo para se negar.
Os irmãos compraram metade das coisas na metade do tempo, e ela o viu
encantado olhando ao longe uma garota que se vestia de menino, mas que se
esquecera de cobrir o rosto delicado. Embora não fosse uma pessoa que
demonstrasse abertamente o seu romantismo, disse-lhe que fosse aproveitar um
pouco o evento que estava acontecendo. Que, como sempre, poderia terminar de
comprar os mantimentos sozinha.
Empolgado, jovem e impulsivo, ele a puxou num abraço e acariciou seus
cabelos. Aysha riu, achando graça na alegria dele e o assistiu se afastar.
O que a jovem não sabia é que alguém estava obcecado por ela, desde o
seu primeiro encontro com o sultão. E ao vê-la com outro homem sorrindo
intimamente, o fez sucumbir à ira.
HONDE
Dias antes…
H onde havia sido informada que o seu sultão estava escapando do palácio
por quase todos os dias, o que não seria escondido por muito mais
tempo. Ela sabia que ele nunca a amou, tampouco ela o amara
verdadeiramente. Estavam ligados por algo que os obrigava: seus deveres. Mas
as fugas dele estavam rondando por todo o palácio, e as pessoas passaram a
olhar com pena como se dissessem com seus olhos que logo seria substituída.
Por este motivo, ela se vestira pela primeira vez como homem e o
seguiu, mas se viu encantada com a sensação de liberdade que encontrara fora do
palácio. E esquecera completamente do que fora fazer ali, falando com o povo,
comprando itens dos mais pobres e brincando com as crianças. Ela se sentira tão
feliz, que fez disso um hábito.
(...)
Na visita em que Safirah, a filha da tribo Gün fora a ver, a incentivou a
acompanhá-la. Ainda mais sabendo que o seu sultão não iria sair. Porém, em
dado momento, Honde perdera de vista a jovem garota e ficara desesperada atrás
dela. Fora nesse momento, que de relance viu um rosto familiar, um que assim
como ela não deveria jamais estar entre o povo. O jovem que iria se tornar o
próximo Imã, que estava sendo doutrinado pelo atual.
Perguntando-se por que o rapaz estava gatunamente esgueirando-se para
fora do palácio. E minutos mais tarde, cansada de segui-lo, vira ele parado no
meio do caminho olhando fixamente um casal sorrindo antes de cada um tomar o
seu caminho. Eles tinham os mesmos cabelos negros e vestes. Ponderou Honde.
Mas para o seu espanto total, ela viu o jovem rapaz indo até à mocinha
que fora deixada sozinha e a raptou. Honde não sabia o que pensar, aturdida
demais diante da visão. Pensou em segui-lo, mas seu coração apertava e algo
dentro dela sabia que a morte era o único destino que esperava a menina. Tentou
chamar um dos guardas da cidade, mas quando ele perguntou quem era, já que
nunca a vira antes, ela se viu obrigada a fugir dele.
Honde pensou em Safirah e a procurou por todo evento, para somente no
final dele, quando já estava supondo que Safirah tivera o mesmo destino que a
desconhecida garota, foi que a encontrou. Com um rosto corado e um sorriso
estampado em sua face, completamente apaixonado.
Brigara, mas como poderia desfazer os sonhos de uma jovem com a rara
chance de ser amada? No entanto, Honde nunca mais confiou naquele jovem
Imã.
(...)
Anos depois, quando uma mulher de cabelos vermelhos apareceu
dançando e encantando o seu senhor, ela não tivera que pensar muito sobre isso,
mas dado momento em sua vida, já não importava mais. Não até que fora à
mesquita e escutara por acidente a conversa entre o Imã, a jovem ruiva e um
menino. Ficara horrorizada com as coisas que lhe falavam e então ela saiu em
disparada, antes que pudesse ser vista.
Voltando ao seu aposento, andara de um lado para o outro. Até que o seu
jovem filho se aproximou dela. Ele já estava crescendo, logo teria que ter um
tutor. Então uma ideia viera à sua cabeça, ela pediu que conseguissem um tutor
para seu filho. O único homem em que ela realmente confiava; Jaffar.
Honde tentou descobrir mais coisas, e por vezes conseguira. Descobriu,
por exemplo, que em uma das viagens distantes de Fahir, o sultão, encontrara a
mulher em meio ao deserto que alegava estar abandonada. Divertida sorria
quando o Imã dizia à ela para levar as coisas mais a sério, que não era uma
brincadeira. Honde fora as anotando em pedaços de papéis que carregava até os
colocar em livros conseguidos de outros países nas conquistas do seu Sultão.
Um dia vira algo parecido com um livro, mas sem nada escrito, então
passou todas as informações a ele, e fora atear fogo enquanto seu filho estava
empolgado apressando-se para se encontrar com a prometida nas próximas
semanas. No entanto, por sua infelicidade, fora vista se escondendo no palácio
onde julgou que ninguém iria a ver, na área dos criados próximo à cozinha. Além
de ser vista, fora justamente por quem mais odiava.
O Imã.
Um dos papéis que estavam em sua mão, fora levado pelo vento. Ela
exclamou, mas o papel caiu próximo aos pés do homem que se abaixou e o
pegou. Porém, com a sorte dela, foi apenas uma anotação da desconfiança do
caráter dele e se ele realmente estava rezando pelas pessoas que estavam doentes
pelo palácio.
Ele se fez de inocente, prometendo conseguir conquistar a confiança
dela. E é claro que ela não confiou nele.
E assim como esperado, ela não tardou a ficar doente. Assim como
tantas outras pessoas do palácio que adoeceram, chamavam de praga, mas ela
sabia ter algo o envolvendo. Contudo, tudo que Honde tinha eram notas,
observações e nenhuma prova concreta. Seu filho já tinha partido em viagem e
ao menos isso a tranquilizava. Tentara escrever o máximo que podia em seu
caderno, deixando suas memórias e quando estava sozinha em seus aposentos,
fantasiava com um futuro bom e tão improvável, para no fim esconder atrás de
uma madeira solta de sua cama.
Os dias passavam e não tinha nada que o médico conseguisse fazer, em
certo momento, quando ela sentiu que não viveria por muito mais tempo, pegou
o seu caderno e escreveu na última folha:
“Querido Jaffar,
Não estarei aqui por muito mais tempo e confio em você para cuidar do
meu filho. Tenho alguns segredos escritos aqui, espero que você consiga
continuar o que eu não consegui para que nada de mal aconteça ao meu
pequeno Khalid. Ele é um bom menino, com uma visão bonita da vida. Não o
deixe sofrer muito após a minha partida. Lhe dê um propósito…
Sinto muito… Já pedi tanto a você. Mas meu último pedido é este, cuide
do menino que com amor eu trouxe a este mundo.
Jaffar… tem algo que também não lhe disse. Embora fosse o meu dever,
pelo bem do meu povo, estar onde estou, nunca me permiti dizer a verdade a
ninguém, entretanto, agora já não faz mais diferença, então você pode saber.
Eu sempre amei apenas você, queria que tudo diferisse, mas não poderia
mudar o meu destino. Então, te peço, lembre-se de mim com o mesmo sorriso de
quando éramos pequenos.
Cuide do pequeno pedaço de mim que sobrou e que com o conteúdo
dessas anotações, consiga proteger o meu filho.
Honde.”
Seriamente, ela não sabia como entregaria isso ao Jaffar, mas sentia-se
mais aliviada em ter falado a verdade em algum lugar.
Momentos depois de ela voltar a guardar seu diário, a ave que fazia
sempre companhia a Khalid entrou pela janela e pousou sobre sua cama. Tinha
uma carta de seu filho e a mulher sorriu apressada, pegando-a para ler. Enquanto
ela se deitava na cama novamente, sem deixar de ler a carta, tampouco de sorrir
com o seu conteúdo, seu corpo parecia mais cansado, suas pálpebras mais
pesadas.
Desejava a felicidade ao seu filho, por isso soubera que ele estaria bem.
Mas em seu último pedido, pediu a Alá que o fizesse forte o suficiente. E então,
a sultana partiu.
JAFFAR
C vestes e esperou chegar aos seus aposentos, para que durante a noite
pudesse ler o conteúdo. Mas o que ele não esperava era saber o quanto a mulher
sabia e como ela agiu diante disso.
Ficou chocado com a quantidade de relatos, observações e anotações da
mulher. Pois se ela tivesse um pouco mais de tempo naquela época, teria
conseguido evitar todas as coisas. Jaffar suspirou frustrado, passando a mão na
cabeça e então fora até um canto do seu quarto e pegou o desenho que ele
mesmo fizera dela em um papel velho e desgastado.
O Imã foi o responsável pela sua morte, e uma dor forte no peito o
corroeu. Porém, esperava que a justiça tivesse sido feita, uma vez que o homem
encontrou o seu fim por aquele que ele mesmo criou. Olhou a imagem de Honde
e então voltou ao seu diário, entristecido.
Quando chegou à última página do diário, já era o nascer de um novo
dia.
As luzes do sol iluminaram melhor a frágil chama que ele tinha próximo
à cama e então leu o que mais desejou em toda sua vida. Saber os sentimentos
dela. Seu coração se encheu e transbordou de felicidade, assim como uma
inevitável tristeza. Contudo, ainda que não estivesse presente, ele havia feito o
que ela mandou, porém fora seu filho e a prometida dele que ela adorava mesmo
sem conhecer, os responsáveis pelas provas. Sentia-se feliz, pois se estivesse
viva, teria tanto orgulho do filho que não caberia em si.
KELEBEK – KHADIJAH
F oi sua prometida desde o nascimento, e por isso fora o consolar pela morte
de Aysha. Mas não perdera a oportunidade de alfinetá-lo por ir atrás muito
provavelmente de alguma mulher. E ela acertara em cheio a sua ferida,
então, furioso, Haidar concordou e disse que não se casaria com ninguém mais
senão aquela mulher que ele encontrara. Ela jurara que a mulher pagaria por
tomar o que lhe pertencia e que ele se arrependeria das palavras que dissera.
Sem permitir que ele pudesse viver o seu luto e sem saber como
encontrar a mulher que ele tivera por apenas uma noite, Khadijah o atormentou
diariamente, até que Haidar arquitetou uma forma de fazer seu pai vê-la como de
fato era. Com o seu plano em ação, não muito depois, chamando-o para ver o
comportamento da mulher, longe dos olhos de todos, batendo e falando coisas
absurdas aos criados, que tal mulher não deveria ser a esposa de um líder. Seu
pai ficara de fato irado com ela e desfez o compromisso.
Humilhada pelo fim do compromisso, Khadijah no nascer do novo dia,
não estava mais com seus pais. Ela fugira. E desde então Haidar nunca mais
ouvira falar dela.
(...)
Khadijah havia roubado pertences de ouro de seus pais, pedras com
algum valor e então fugira. Por dias vagou, até encontrar uma tenda muito
elegante em meio à uma noite fria em que ela teve que fugir para não ser pega
por alguns ladrões. Ela sabia pelos guardas que não seria ninguém de poucas
posses, visando conseguir usar do seu charme para conquistar o homem que
possuísse tanto dinheiro, tentou se aproximar, fazendo-se de uma jovem mulher
fraca e abandonada por seu mestre em meio ao deserto. Que apenas queria um
trabalho digno.
Um jovem homem e futuro Imã fora o primeiro a perceber a
aproximação dela, além dos guardas e foram até ela. Ele a olhava com repulsa e
nojo. Mas, uma voz forte e vigorosa, falou logo atrás dele sobre quem poderia
ser que estava se aproximando. Khadijah deu um passo ao lado, para poder ver o
rosto do dono daquela voz, mas o homem diante de si, não permitira. No entanto,
Fahir vira de relance os cabelos ruivos da mulher.
Ordenou que o jovem rapaz saísse da sua frente e seus olhos
encontraram uma bela mulher de curvas sensuais. O sultão não resistia à jovens
mulheres bonitas, mas o que o fez decidir mesmo a aproximação dela foram seus
bonitos olhos que pareciam daquela que tomara seu coração.
Fahir, não sabia que aquilo seria o começo do seu declínio, quando a
pediu para dançar e que a pagaria por isso.
Aquele jovem rapaz e futuro Imã via um sultão fraco, seduzido pela
beleza suja de uma pecadora.
O império não deveria ficar nas mãos de um homem tão fraco! Pensava
ele.
E seu plano fora iniciado naquela noite, enquanto o sultão deflorava a
mulher ruiva momentos depois em sua tenda, ele se convenceu em colocá-lo em
prática.
Mais tarde, enquanto Fahir dormira, ela fez exatamente o que o rapaz
imaginava que iria fazer: roubar o sultão enquanto ele dormia. Ao meio da noite,
a jovem estava saindo da tenda na ponta dos pés, quando ele a interceptou,
tampando a sua boca e murmurou uma proposta a ela:
Ela seria sua ferramenta e ele lhe daria o império, como sultana do seu
senhor. Então poderia fazer o que quisesse com este poder.
(...)
A mulher nunca conseguira se esquecer que fora trocada por uma mulher
desconhecida, crescendo e sendo preparada para tornar-se esposa do líder de sua
tribo. Para no fim ser descartada. E como se o passado voltasse a assombrar,
Kelebek vira na mesa do seu sultão, um desenho de uma menina, uma menina
tão parecida com Aysha, a irmã de Haidar que lhe era assombroso.
Nunca conseguira descobrir quem tivera tomado o coração dele, mas
parecia que a sua traição deixara frutos. Pensou ela.
Honde estava doente há dias, Khalid havia saído para encontrar sua
prometida. A mente de Kelebek estava trabalhando perversamente até conseguir
uma ave para mandar uma mensagem ao seu povo, após longos anos. Pedindo a
alguns aliados remanescentes que acabasse com todas as pessoas da tribo.
Porém, o que ela não contava era que eles seriam gananciosos o suficiente para
manter algumas meninas de modo a vendê-las. E este foi o início da queda dela e
ela nem sequer imaginava.
AGRADECIMENTOS
LINK: https://loja.uiclap.com/titulo/ua11369/
OUTROS LIVROS DA AUTORA
“Algo no seu jeito de ser me faz acreditar que não posso viver sem você.”
Lion sempre viveu seguindo tudo que acreditava ser correto, mas foi afastado de
sua carreira militar, passando a aceitar trabalhos temporários de diversos tipos,
para poder sobreviver. Após reencontrar um velho amigo de infância, não sabia
que sua vida ia virar de pernas para o ar.
Ele então aceita uma proposta que parecia ser a solução dos seus problemas e
que julgou ser moleza, pois ser segurança pessoal não deveria ser um desafio,
exceto se sua cliente for a italiana Jéssica Vincenzo : a linda, rica e mimada filha
do mafioso Andrea Di Rizzo.
Lion se verá em um conflito interno, pois Jéssica é uma mulher que o irrita, mas
também o instiga. Nesta linha tênue entre o ódio e o amor, eles vivem em uma
turbulência de emoções.
Um militar pondo rédeas numa menina rebelde que o leva à loucura e lhe mostra
que mesmo um homem duro como ele, pode ter em uma orgulhosa e desafiadora
menina como o seu ponto mais vulnerável.
O que deveria ser nada além do que mais um evento corriqueiro, mais um baile
beneficente dentre tantos que Safira Rollins organiza, sempre à sombra do
grande e influente homem que seu pai é, torna-se um dia inesquecível na vida da
garota que sempre foi invisível aos olhos de todos.
A loira por muito tempo sentiu que o interesse que despertava restringia-se às
vantagens do luxo que acompanhavam a sua vida. Até que um desconhecido,
bonito e sedutor, faz com que se canse de esperar ser notada por si mesma. Seus
olhos não se cruzam, mas apenas a presença do homem é o suficiente para fazê-
la ansiar receber seu olhar.
Um feiticeiro, é como poderia chamá-lo. Sedutor e evolvente. Uma noite e nada
mais, envolvida com destreza em uma aura de paixão carnal. Ou ao menos é essa
a mentira que Safira decide contar a si mesma.
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[1]
Anatólia, ou península anatoliana, também conhecida como Ásia Menor, denota a protrusão
ocidental da Ásia, que compõe a maior parte da República da Turquia. A região é banhada pelo mar Negro
ao norte, o mar Mediterrâneo ao sul, e do mar Egeu, a oeste.
[2]
A zarabatana (originária da palavra árabe zarabatan) é uma arma que consiste num tubo
originalmente de madeira (caule oco), e hoje de metal ou plástico, pelo qual são soprados pequenos dardos,
setas ou projéteis.
[3]
é uma arma branca corto-perfurante, também dita, tradicionalmente, uma arma de estocada
e de corte. A arma tradicional mulçumana e turca correta seria cimitarra, porém para maior entendimento
fora usado no texto: Sabre. Já que ambas armas são similares.
[4]
substantivo feminino
1. 1.no Império Otomano, empregada escrava a serviço das mulheres num harém.
2. 2.mulher do harém de um sultão, paxá etc.
[5]
Ifrite[1][2] (masculino) (em árabe: ;ﻋﻔﺮﻳﺖromaniz.: Ifrit ; pl. )ﻋﻔﺎرﻳﺖe Ifrita (Ifritah;
feminino), na mitologia árabe, são os gênios maléficos da classe dos djins, são notórios por sua grande força
e astúcia.
[6]
1. governador ou ministro nomeado por soberano de um reino
muçulmano.
[7]
Paxá ou Pasha (turco otomano: ﭘﺎﺷﺎ, paşa; persa: )ﭘﺎﺷﺎé a denominação dada entre os
turcos aos governadores de províncias do Império Otomano dado a generais e governadores dignitários, e
correspondia ao título de "Excelência" usado no Ocidente.
[8]
Eunuco é um homem castrado, que teve os testículos e/ou o pênis removidos. ... No Oriente Médio e na
China, o eunuco era o guarda encarregado de cuidar dos haréns, local da casa reservado às esposas e
odaliscas.
[9]
Durante o Império Otomano, o grão-vizir era a mais alta autoridade
depois do sultão, sendo considerado representante deste e atuando em seu nome.
Estava hierarquicamente acima de outros vizires de menor rango que se reuniam
na Sublime Porta do Palácio de Topkapı, em Istambul.
[10]
é um título muçulmano que designa o sacerdote encarregado de
dirigir as preces na mesquita. Historicamente foi um título dado aos professores
de direito e teologia islâmicas.
[11]
Roupa turca masculina
[12]
Um casamento por procuração é um tipo de matrimônio em que um ou ambos os indivíduos
que estão sendo unidos não está fisicamente presente, geralmente representado em vez por outra pessoa,
nomeada e qualificada. O casamento por procuração era, na verdade, a norma para a realeza na maioria dos
países daquela época. Totalmente legal e válido.
[13]
Filhos de Ifrit - Crianças de Ifrit ( Ifrit: é uma classe de gênios infernais, espíritos abaixo
do nível de anjos e demônios, conhecidos por sua força e astúcia. Um ifrit é uma enorme criatura alada de
fogo, masculino ou feminino.. Tal como acontece com os gênios, um ifrit pode ser um crente ou descrente,
bem ou mal, mas ele é mais frequentemente descrito como um ser perverso e cruel. )
[14]
Tradução livre: “a noite” tribo fictícia.
[15] Tradução livre: o sol, tribo fictícia.