Você está na página 1de 32

Dinis Abrantes Figueiredo

Direito Processual Civil II

Ano letivo de 2022/2023


1. Noção de forma de processo
A forma de processo, tramitação ou rito processual consiste na sequência de atos através
da qual se visa a obtenção da justa composição do litígio.
1.1 Processo comum e processos especiais
De acordo com o artigo 546º, n. 1 CPC, o processo civil segue a forma de processo
comum (processo comum), que se encontra tipificada nos artigos 552º a 626º CPC, ou
a forma de processo especial (processo especial), que consta dos artigos 878º a 1081º
CPC e de legislação avulsa.
Caráter residual da forma de processo comum:
As ações declarativas (de simples apreciação positiva e negativa (10º, n. 3, al. a)
CPC), de condenação (10º, n. 3, al. b) CPC) e constitutivas propriamente ditas,
modificativas e extintivas (10º, n. 3, al. c) CPC)) seguem a forma de processo
comum quando ao caso não corresponda a forma de processo especial, nos termos
do artigo 546º, n. 2, segunda parte CPC. Este artigo consagra o caráter residual da
forma de processo comum em relação à forma de processo especial, na medida em
que as ações declarativas só seguem a forma de processo comum quando não lhes
corresponda a forma de processo especial.
1.2 Forma de processo comum declarativo
Antes da entrada em vigor do CPC de 2013, o processo comum declarativo podia seguir
uma de três formas (ordinária, sumária e sumaríssima) que se distinguiam em função do
valor da causa. Com a entrada em vigor do CPC em 2013, passou a existir uma única
forma de processo para todas as ações declarativas que seguem a forma de processo
comum. Tal encontra-se expressamente previsto no artigo 548º CPC.
1.3 Princípio da adequação formal
Muito embora as formas de processo se encontrarem fixadas no CPC e em legislação
avulsa, o princípio da adequação formal, que se encontra consagrado no artigo 547º
CPC, impõe que o juiz adote a tramitação processual adequada às especificidades da
causa e adapte o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir,
assegurando um processo equitativo. Tal significa que o princípio da adequação formal
permite que o juiz, tendo em consideração as especificidades da causa, se desvie da
forma de processo fixada na lei, superando, desta forma, o princípio da legalidade ou
tipicidade legal das formas processuais.
-» Exemplo 1: O juiz pode antecipar a audição de uma testemunha para uma fase
intermédia do processo em vez de apenas a inquirir na audiência final, tal como a lei o
prevê (604º, n. 3, al. d) CPC).
-» Exemplo 2: O juiz pode admitir um articulado de resposta à réplica fora dos casos
previstos na lei (584º CPC).
-» Exemplo 3: O juiz pode admitir que o perito preste esclarecimentos orais em vez
de apresentar um relatório escrito.
No entanto, o juiz não pode desviar-se da forma de processo fixada na lei e adaptá-la às
especificidades da causa sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre tal se
pronunciarem, de acordo com o princípio do contraditório (3º, n. 3 CPC) – o juiz não
pode tomar decisões sem que as partes sejam ouvidas/informadas – e o princípio da
cooperação (7º, n. 1 CPC) – o juiz e as partes devem cooperar entre si com vista à
obtenção da justa composição do litígio.

2
2. Fase dos articulados
A fase dos articulados, fase em que as partes desempenham um papel importantíssimo
(o juiz, em regra, não intervém), é a primeira fase do processo comum que é composta
pelos articulados (552º a 587º CPC). Os articulados são as peças apresentadas pelas
partes onde estas expõem os fundamentos da ação e da defesa e formulam os pedidos
correspondentes (147º, n. 1 CPC) – a petição inicial, a contestação e a réplica.
2.1 Petição inicial
A petição inicial, que se encontra regulada no artigo 552º e ss. CPC, é o articulado pelo
do qual o autor propõe/apresenta/intenta uma ação (259º, n. 1 CPC, conjugado com o
artigo 144º CPC), formulando a pretensão de tutela jurisdicional que visa obter e
expondo as razões de facto e de direito que a fundamentam. Este articulado é composto
por quatro partes fundamentais, às quais se juntam outras três: endereço (1), cabeçalho
ou intróito (2), narração (3), conclusão (4), indicação do valor da causa (5),
assinatura (6) e requerimentos probatórios (7). Apresentada a petição inicial, tal
impede o decurso do prazo de caducidade de direitos (331º, n. 1 CC).
1) O endereço contém a designação do tribunal e do respetivo juízo onde a ação é
proposta (552º, n. 1, al. a), primeira parte CPC).
2) O cabeçalho ou intróito contém a identificação das partes (552º, n. 1, al. a),
segunda parte CPC) e a indicação da forma de processo (552º, n. 1, al. c) CPC).
3) A narração contém a exposição da fundamentação de facto (causa de pedir) e da
fundamentação de direito (552º, n. 1, al. d) CPC).
→ Fundamentação de facto (causa de pedir): A fundamentação de facto (ou causa
de pedir) é constituída pelos factos concretos, balizados no tempo e no espaço e
juridicamente relevantes, que fundamentam o pedido (a pretensão de tutela
jurisdicional) que o autor visa obter e que deve alegar com vista à procedência da ação.
1. O autor deve alegar todos os factos concretos, juridicamente relevantes, que
preencham a previsão das normas jurídicas que lhe são favoráveis.
-» Exemplo: A invadiu o terreno de B e destrui-lhe árvores de fruto. Neste caso,
pretendendo que A seja condenado a indemnizá-lo, B terá de alegar a verificação de
todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual (483º CC).
2. O autor não tem de alegar todos os factos necessários à procedência da ação, mas
antes um mínimo de factos que fundamentem o seu pedido. A este propósito, importa
estabelecer uma distinção entre factos essenciais (5º, n. 1 CPC) e factos
complementares ou concretizadores (5º, n. 2, al. b) CPC):
- Os factos essenciais são factos que fundamentam o pedido que o autor visa obter e
sem os quais há uma falta da causa de pedir.
- Os factos complementares ou concretizadores são factos necessários à
procedência da ação (pois complementam ou concretizam os factos essenciais) e sem os
quais há uma insuficiência da causa de pedir.
-» Exemplo: A intenta uma ação de divórcio sem consentimento de um dos
cônjuges contra B sem alegar quaisquer das causas previstas no artigo 1781º CC que
devem fundamentar o seu pedido e sem indicar a data da celebração do casamento. Por
um lado, A não alega um facto essencial, faltando a causa de pedir. Por outro lado, A
não alega um facto complementar ou concretizador, sendo a causa de pedir insuficiente.

3
Nota fundamental:
A falta da causa de pedir não se confunde com a insuficiência da causa de pedir:
- A falta da causa de pedir resulta da falta de factos essenciais e é insanável.
Sendo assim, a falta da causa de pedir conduz à ineptidão da petição inicial (186º, n.
2, al. a) CPC) que gera a nulidade de todo o processo (186º, n. 1 CPC) – exceção
dilatória prevista no artigo 577º, al. b) CPC –, impedindo que o tribunal conheça do
mérito da causa e dando lugar à absolvição do réu da instância (576º, n. 2 CPC).
- A insuficiência da causa de pedir resulta da falta de factos complementares ou
concretizadores e é sanável a convite do juiz que profere, para esse efeito, um
despacho de aperfeiçoamento.

→ Fundamentação de direito: A fundamentação de direito é constituída pelas


normas jurídicas que o autor pode indicar para fundamentar a causa de pedir e o pedido.
Apesar de tal não lhe ser imposto, considera-se relevante que o faça, pois a sua
perspetiva jurídica sobre o caso concreto pode divergir das perspetivas jurídicas do réu e
do juiz.
4) A conclusão contém a formulação do pedido (552º, n. 1, al. e) CPC) que se traduz
na pretensão de tutela jurisdicional que o autor visa obter (ex. declaração da
(in)existência de um direito subjetivo em sentido estrito ou de um facto jurídico – ações
de simples apreciação; adoção de determinado comportamento positivo ou negativo –
ações de condenação; constituição, modificação ou extinção de relação jurídica – ações
constitutivas). O pedido pode ser único ou revestir uma das seguintes modalidades:
1. Cumulação de pedidos (555º, n. 1 CPC): Na cumulação de pedidos, o autor formula
vários pedidos e quer que todos eles sejam procedentes. A admissibilidade da
cumulação de pedidos depende da verificação de dois requisitos:
- Inexistência de obstáculos processuais: A cumulação de pedidos é inadmissível
quando aos pedidos correspondam formas de processo diferentes com tramitações
manifestamente incompatíveis (1) ou quando a cumulação ofenda regras de
competência absoluta (2) (37º, n. 1, 2 e 3 CPC).
- Compatibilidade substantiva entre os pedidos: A cumulação de pedidos é
inadmissível quando os pedidos sejam incompatíveis ao nível do Direito substantivo.
-» Exemplo: A intenta uma ação de execução específica de um contrato-promessa
que celebrou com B e formula dois pedidos: Primeiro, requer o cumprimento do
contrato-promessa (830º CC). Segundo, requer a restituição do sinal em dobro (442º
CC). Neste caso, a cumulação de pedidos é substantivamente incompatível, não
podendo A pedir o cumprimento do contrato-promessa (que tem por base a mora) e a
sua resolução (que tem por base o incumprimento definitivo).
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 186º, n. 2, al. c) CPC, a cumulação de pedidos
substantivamente incompatíveis entre si conduz à ineptidão da petição inicial que
gera a nulidade de todo o processo (186º, n. 1 CPC). No entanto, à luz do dever de
boa gestão processual (6º, n. 1 CPC), antes de declarar nulo todo o processo, o juiz
deverá convidar o autor a sanar o vício, podendo, por exemplo, formular os pedidos
de forma subsidiária.

4
2. Pedidos subsidiários (554º CPC): Nos pedidos subsidiários, o autor formula dois
pedidos, sendo que o segundo só será tomado em consideração se o primeiro for
improcedente. A admissibilidade dos pedidos subsidiários depende da inexistência de
obstáculos processuais (37º, n. 1, 2 e 3 CPC), não sendo necessário que os pedidos
sejam substantivamente compatíveis entre si.
-» Exemplo: Naquele exemplo, A poderá intentar uma ação de execução específica
do contrato-promessa que celebrou com B e formular aqueles dois pedidos de forma
subsidiária: Se o primeiro for improcedente, o juiz analisará o segundo.
3. Pedidos genéricos (556º CPC): É admissível formular pedidos genéricos nos casos
previstos no artigo 556º, n. 1 CPC:
a) Quando o objeto mediato da ação seja uma universalidade, seja ela de facto (ex.
biblioteca) ou de direito (ex. estabelecimento comercial).
b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do
facto ilícito (ex. ações de indemnização fundadas em responsabilidade civil
extracontratual).
→ De acordo com o artigo 556º, n. 2 CPC, nestes dois casos, o pedido genérico
concretiza-se através de liquidação.
4. Pedidos alternativos (553º CPC): É admissível formular pedidos alternativos com
relação a direitos que por sua natureza ou origem sejam alternativos (543º CC) ou que
possam resolver-se em alternativa.
-» Exemplo: A celebra um contrato com B, nos termos do qual B se compromete a
entregar a A um automóvel de uma específica marca e cilindrada, não sendo relevante
que seja a gasóleo ou a gasolina. Está-se perante uma obrigação alternativa, uma vez
que o credor (A) tem o poder de exigir do devedor a entrega de um automóvel que
preencha aqueles requisitos (podendo ser um automóvel a gasóleo ou a gasolina, desde
que seja daquela específica marca e cilindrada) e o devedor (B) tem de lhe entregar um
automóvel que preencha esses mesmos requisitos. Imagine-se, todavia, que B não
cumpre nem uma coisa nem a outra. Neste caso, A pode intentar uma ação de
condenação com um pedido alternativo, pedindo que B realize uma daquelas prestações
à qual ficou adstrito com vista à satisfação do seu interesse.
5. Pedido de prestações vincendas (557º CPC): Estando o autor perante numa situação
de iminência da violação de um direito subjetivo em sentido estrito, e à luz do dever de
boa gestão processual (6º, n. 1 CPC), ele pode intentar uma ação de condenação in
futurum. Se a ação for julgada procedente e a sentença de condenação proferida pelo
tribunal não for acatada pelo réu, esta sentença funcionará como título executivo, com
base no qual o autor poderá propor uma ação executiva (703º, n. 1, al. a) CPC).
-» Exemplo 1: A (senhorio) e B (arrendatário) celebraram um contrato de
arrendamento sobre um bem imóvel. Acontece que B não paga as rendas devidas. Neste
caso, A poderá intentar uma ação de condenação in futurum, pedindo que B seja
condenado a pagar tanto as rendas em atraso como aquelas que se vencerem enquanto
subsistir a obrigação (557º, n. 1 CPC).
-» Exemplo 2: A e B celebram um contrato de comodato sobre um bem imóvel, nos
termos do qual B ficaria a gozar do bem em questão até que A necessitasse dele, tendo,
nessa hipótese, B que o restituir. Acontece que A passa a necessitar do bem imóvel e B
não lhe o quer restituir. Neste caso, A pode intentar uma ação de condenação in futurum
da qual, sendo julgada procedente, resultará uma sentença que lhe servirá como título
executivo (557º, n. 2 CPC).

5
5) Indicação do valor da causa (552º, n. 1, al. f) CPC). Na petição inicial, o autor
deve ainda indicar o valor da causa ao qual se atende para determinar a competência do
tribunal, a forma do processo de execução comum e a relação da causa com a alçada do
tribunal, nos termos do artigo 296º, n. 2 CPC.
6) Assinatura da petição inicial. Na petição inicial, o autor deve ainda assiná-la, sob
pena de recusa do seu recebimento pela secretaria, nos termos do artigo 558º, n. 1, al. g)
CPC.
7) Requerimento probatório (552º, n. 6 CPC). No final da petição inicial, o autor
deve ainda indicar os meios de prova (instrumentos através dos quais o juiz apura a
realidade dos factos controvertidos).
Nota fundamental:
Em regra, os meios de prova devem ser requeridos no final da petição inicial. No
entanto, há um meio de prova que pode ser requerido até ao início das alegações
orais na audiência final, nomeadamente as declarações de parte (466º CPC).
→ Atenção: As “declarações de parte” não se confundem com os “depoimentos de
parte” (452º CPC).

2.1.1 Elementos facultativos ou eventuais da petição inicial


1) Requerimento de citação urgente (552º, n. 9 CPC, conjugado com o artigo 561º
CPC). Na petição inicial, o autor pode ainda requerer que a citação seja efetuada com
urgência, desde que se verifique uma das seguintes situações:
- Receio da ausência do réu para parte incerta: Quando o autor receie que o réu irá
ausentar-se para parte incerta, pode requerer que a citação seja efetuada com urgência.
A ausência do réu para parte incerta determina o recurso à citação edital que é
desvantajosa para o autor pelo facto de o prazo perentório de 30 dias para contestar só
começar a correr depois de decorrido o prazo dilatório de 30 dias (245º, n. 3 CPC).
- Decurso iminente do prazo de prescrição: Quando falte menos de cinco dias para o
decurso do prazo de prescrição, pode o autor requerer que a citação seja efetuada com
urgência por forma a que a prescrição seja interrompida (323º, n. 1 CC). Quando falte
mais de cinco dias para o decurso do prazo de prescrição, não tem o autor que requerer
que a citação seja efetuada com urgência, uma vez que, se a citação não for efetuada
dentro de cinco dias após a apresentação da petição inicial por causa não-imputável ao
requerente, se ficciona a interrupção da prescrição logo que decorram esses cinco dias
(323º, n. 2 CC).
2) Designação de agente de execução, funcionário judicial ou mandatário judicial
para efetuar a citação (552º, n. 1, al. g), n. 11 e n. 12 CPC). Na petição inicial, o
autor pode ainda designar o agente de execução (231º, n. 8 CPC) ou o funcionário
judicial (231º, n. 9 CPC) que vai efetuar a citação ou o mandatário judicial responsável
pela sua promoção (237º, n. 2 CPC).
2.1.2 Recusa do recebimento da petição inicial pela secretaria
De acordo com o artigo 558º, n. 2 CPC, a verificação dos fundamentos de recusa do
recebimento da petição inicial elencados no n. 1 é efetuada pelo sistema de informação
de suporte à atividade dos tribunais ou, quando tal não seja tecnicamente possível, pela
secretaria.
→ Benefício concedido ao autor (560º CPC): Quando o autor não tenha constituído
advogado e o recebimento da petição inicial tenha sido recusado pela secretaria com
base na verificação de algum dos fundamentos elencados no artigo 558º, n. 1 CPC, pode
o autor apresentar uma petição inicial “corrigida” no prazo de 10 dias a contar da recusa

6
do recebimento, da distribuição da petição inicial ou da notificação da decisão judicial
que haja confirmado aquela recusa, considerando-se a ação proposta na data em que a
primeira petição inicial foi apresentada em juízo.
Nota fundamental:
Como já foi mencionado, a apresentação da petição inicial impede o decurso do
prazo de caducidade de direitos (331º, n. 1 CC). Sendo assim, quando esteja em
causa um direito sujeito a prazo de caducidade, entende-se que, se o autor lançar
mão deste benefício que lhe é concedido pela lei, tal direito se considera exercido na
data em que foi apresentada a primeira petição inicial.
→ Distribuição (203º, 204º, 207º, 208º e 212º CPC): Sendo o recebimento da petição
inicial aceite pela secretaria, procede-se à sua distribuição. A distribuição é a operação
burocrática judicial, realizada de forma eletrónica, pela qual as petições iniciais são
repartidas, de forma igualitária e aleatória, entre as diversas instâncias e secções
competentes para a causa.
2.1.3 Ineptidão da petição inicial
Casos de ineptidão da petição inicial
De acordo com o artigo 186º, n. 2 CPC, diz-se inepta a petição inicial:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir.
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir.
c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
Possibilidade de sanação
a) A falta do pedido ou da causa de agir é insanável.
-» Exemplo: A intenta uma ação de anulação de um contrato e não indica o vício
com base no qual o dito contrato foi celebrado e não formula nenhum pedido.
A insuficiência da causa de pedir é sanável a convite do juiz que profere, para esse
efeito, um despacho de aperfeiçoamento.
A ininteligibilidade do pedido e da causa de pedir é sanável se o réu arguir a nulidade
decorrente da ineptidão da petição inicial com fundamento neste vício e o juiz, depois
de ouvir o autor, verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial
(186º, n. 3 CPC).
b) A contradição entre a causa de pedir e o pedido é insanável.
-» Exemplo: A alega que celebrou um contrato de arrendamento com B com base em
erro, o que determina a sua invalidade (causa de pedir), e vem pedir o pagamento das
rendas não pagas (pedido). O pedido formulado deveria ter sido a anulação do contrato.
c) A incompatibilidade substantiva entre os pedidos ou entre as causas de agir é
sanável. Neste caso importa estabelecer a seguinte distinção:
- Incompatibilidade substantiva entre os pedidos: Neste caso, o juiz pode, à luz do
dever de boa gestão processual (6º, n. 1 CPC), convidar o autor a indicar o pedido que
pretende ver apreciado ou a formular os pedidos de forma subsidiária.
- Incompatibilidade substantiva entre as causas de pedir: Neste caso, o juiz pode, à
luz do dever de boa gestão processual (6º, n. 1 CPC), convidar o autor a indicar a causa
de pedir que deve fundamentar o pedido formulado.
Nota fundamental:
Se o autor não atuar em conformidade com o convite do juiz, tal conduzirá à
ineptidão da petição inicial e, consequentemente, à nulidade de todo o processo.

7
Regime da ineptidão da petição inicial
A ineptidão da petição inicial (186º, n. 2 CPC) conduz à nulidade de todo o processo
(186º, n. 1 CPC) – exceção dilatória prevista no artigo 577º, al. b) CPC –, impedindo
que o tribunal conheça do mérito da causa e dando lugar à absolvição do réu da
instância (576º, n. 2 CPC), salvo se a nulidade for sanável e sanada. A nulidade
decorrente da ineptidão da petição inicial pode ser conhecida oficiosamente pelo
tribunal (196º CPC) no despacho saneador, se antes o tribunal as não houver apreciado
(no despacho liminar) – se não houver despacho saneador, pode conhecer-se dela até à
sentença final (200º, n. 2 CPC) – ou arguida pelo réu até à contestação ou no próprio
articulado da contestação (198º, n. 1 CPC).
2.2 Intervenção liminar do juiz
Depois de a petição inicial ter sido recebida e distribuída pela secretaria, mas antes de
ser efetuado o ato da citação do réu, o juiz pode intervir liminarmente através do
proferimento de um despacho liminar (590º, n. 1 CPC). Se, todavia, o juiz não
intervier nesta fase liminar (e, portanto, na fase dos articulados), só poderá intervir na
fase intermédia (590º, n. 2 CPC a 598º CPC).
Nota fundamental:
Sistematicamente é criticável que a intervenção liminar do juiz, que ocorre na fase
dos articulados, esteja prevista no artigo 590º CPC que regula os poderes do juiz na
fase intermédia.
→ A este respeito, dever-se-á entender que a fase intermédia vem regulada nos
artigos 590º, n. 2 a 598º CPC, uma vez que o artigo 590º, n. 1 CPC diz respeito à
intervenção liminar do juiz que ocorre ainda na fase dos articulados. No entanto,
nada impede que o juiz adote na fase liminar alguma das funções que estão previstas
unicamente para a fase intermédia (590º, n. 2, 3 e 4 CPC).

A intervenção liminar do juiz tanto pode ocorrer por determinação legal, como por
determinação do juiz.
2.2.1 Intervenção liminar por determinação legal
1. Não tendo o autor designado, na petição inicial, agente de execução ou funcionário
judicial para efetuar a citação ou mandatário judicial responsável pela sua promoção,
compete à secretaria efetuar o ato da citação pessoal do réu, não sendo necessário
despacho liminar para o efeito (562º CPC e 226º, n. 1, primeira parte CPC).
2. No entanto, o ato da citação depende de despacho liminar (226º, n. 4 CPC):
a) Nos casos especialmente previstos na lei (ex. 895º CPC, 931º, n. 2 CPC).
b) Nos procedimentos cautelares e em todos os casos em que incumba ao juiz decidir
da prévia audiência do requerido.
c) Nos casos em que a propositura da ação deva ser anunciada.
→ De acordo com os artigos 240º CPC e 243º CPC, a citação edital implica a
publicação de um anúncio em página informática de acesso público, dependendo,
consequentemente, de despacho liminar.
→ Com base num argumento a contrario, chegar-se-ia à mesma conclusão através
do artigo 226º, n. 1, primeira parte CPC: Se a citação pessoal do réu não depende de
despacho liminar, a citação edital do réu depende de despacho liminar.
d) Quando se trate de citar terceiros chamados a intervir em causa pendente.
e) No processo executivo, nos termos do artigo 726º, n. 6 e 7 CPC.
f) Quando se trate de citação urgente (561º CPC).

8
2.2.2 Intervenção liminar por determinação do juiz
Na falta de determinação legal, o juiz, à luz do dever de boa gestão processual (6º, n. 1
CPC), pode emitir orientações à secretaria para que a petição inicial lhe seja
apresentada/conclusa (157º, n. 2 CPC). Deste modo, o juiz impedirá que o processo
prossiga com vícios que podem ser, desde logo, sanados ou com vícios insanáveis.
2.2.3 Conteúdos do despacho liminar
Quando o juiz intervém liminarmente, seja por determinação legal, seja por
determinação do juiz, ele profere um despacho liminar que pode apresentar três tipos de
conteúdos diferentes:
- Despacho de indeferimento liminar: De acordo com o artigo 590º, n. 1 CPC, nos
casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a
petição inicial é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente (1) ou
ocorram exceções dilatórias insanáveis e de conhecimento oficioso (2):
1) O juiz deve indeferir liminarmente a petição inicial quando o pedido seja
manifestamente improcedente.
-» Exemplo: A intenta uma ação de anulação do casamento com base em vício da
vontade, decorrido o prazo de caducidade de 6 meses. Neste caso, o juiz deve indeferir a
petição inicial, uma vez que a ação caducou. Esta caducidade é de conhecimento
oficioso porque está estabelecida em matéria de direitos indisponíveis (333º, n. 1 CC).
Já a caducidade estabelecida em matéria de direitos disponíveis não é de conhecimento
oficioso, devendo ser invocada por aquele a quem aproveita (333º, n. 2 CC, conjugado
com o artigo 303º CC).
2) O juiz deve indeferir liminarmente a petição inicial quando ocorre uma exceção
dilatória insanável e de conhecimento oficioso, não devendo, deste modo, absolver o réu
da instância1, uma vez que este ainda não foi citado.
Exceções dilatórias insanáveis e de conhecimento oficioso
Incompetência absoluta (internacional, interna em razão da matéria e da hierarquia)
→ 97º, n. 1 CPC, conjugado com o artigo 577º, al. a) CPC
Incompetência relativa (em razão do território e do valor da causa), uma vez
verificados os requisitos
→ 104º CPC, conjugado com o artigo 577º, al. a) CPC
Falta de personalidade judiciária
→ 11º e ss. CPC, conjugado com o artigo 577º, al. c) CPC
Ilegitimidade singular
→ 30º CPC, conjugado com o artigo 577º, al. e) CPC
Falta de interesse em agir
Ineptidão da petição inicial por falta do pedido ou da causa de pedir ou por
contradição entre a causa de pedir e o pedido
→ 186º, n. 2, al. a) e b) CPC, conjugado com o artigo 577º, al. b) CPC
→ Proferido o despacho de indeferimento liminar, a petição é indeferida.

1
A absolvição do réu da instância é uma decisão em que o juiz não conhece do mérito da causa. Logo,
nada obsta a que o autor volte a intentar uma ação desprovida dos vícios que levaram o juiz a absolver o
réu da instância. A absolvição do réu do pedido é uma decisão em que o juiz conhece do mérito da causa.
Logo, o autor não pode voltar a intentar uma ação, pedindo pedido idêntico.

9
- Despacho de aperfeiçoamento: Apesar de não estar expressamente previsto na lei,
tem-se entendido que o juiz, à luz do dever de boa gestão processual (6º, n. 1 CPC),
pode aproveitar a fase liminar para proferir um despacho de aperfeiçoamento,
convidando o autor a corrigir irregularidades (ex. junção de documentos) e exceções
sanáveis e de conhecimento oficioso (insuficiência de causa de pedir, incompatibilidade
substantiva entre os pedidos ou entre as causas de agir (186º, n. 2, al. c) CPC)),
aplicando-se, mutatis mutandis, o artigo 590º, n. 2, 3 e 4 CPC.
→ Proferido o despacho de aperfeiçoamento, de duas uma:
- Se o autor atuar em conformidade com o despacho proferido, a petição prossegue.
- Se o autor não atuar em conformidade com o despacho proferido, a petição é
indeferida.
- Despacho de citação: Se o juiz não indeferir a petição inicial com fundamento na
improcedência manifesta do pedido ou numa exceção dilatória insanável e de
conhecimento oficioso, nem convidar o autor a corrigir irregularidades ou exceções
dilatórias sanáveis e de conhecimento oficioso, é proferido um despacho de citação,
sendo efetuada a citação do réu pela secretaria.
2.3 Citação
De acordo com o artigo 219º, n. 1 CPC, a citação é o ato pelo qual se dá conhecimento
ao(s) réu(s) de que foi proposta contra ele(s) determinada ação e se chama ao processo
para se defender. Também se utiliza o ato da citação para chamar terceiro ao processo.
Nota fundamental:
O CPC regula separadamente a citação de pessoas singulares (225º a 245º CPC) da
citação de pessoas coletivas (246º CPC), embora se aplique, mutatis mutandis, o
regime da citação de pessoas singulares em tudo o que não estiver especialmente
regulado no regime da citação de pessoas coletivas.

2.3.1 Citação de pessoas singulares


De acordo com o artigo 225º, n. 1 CPC, a citação de pessoas singulares pode ser
pessoal ou edital:
- Citação edital: A citação edital tem lugar quando o citando se encontre ausente em
parte incerta (1) ou quando sejam incertas as pessoas a citar (2) (225º, n. 6 CPC).
- Citação pessoal: A citação pessoal pode ser efetuada de várias formas (225º, n. 2 a 5
CPC):
1) Mediante via eletrónica.
2) Mediante via postal através da entrega de carta registada com aviso de receção
que é endereçada para a residência ou local de trabalho do citando (228º, n. 1, primeira
parte CPC). A carta pode ser entregue ao citando (1) ou a qualquer pessoa que se
encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições
de a entregar prontamente ao citando (2) (228º, n. 2 CPC):
1. Citação postal pessoal: Antes da assinatura do aviso de receção, o distribuidor
do serviço postal procede à identificação do citando (228º, n. 3 CPC).
2. Citação postal quase-pessoal (225º, n. 4 CPC): Antes da assinatura do aviso de
receção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do terceiro a quem a
carta seja entregue (228º, n. 3 CPC). Neste caso, cabe ainda ao distribuidor do serviço
postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando (228º, n. 4 CPC)
e de que a não entrega o faz incorrer em responsabilidade (228º, n. 1, segunda parte
CPC).

10
3) Frustrando-se a citação postal, a citação é efetuada mediante contacto pessoal do
agente de execução ou do funcionário judicial (231º, n. 1 a 7 CPC).
Nota fundamental:
Tendo o autor designado, na petição inicial, agente de execução (231º, n. 8 CPC) ou
funcionário judicial para efetuar a citação (231º, n. 9 CPC) ou mandatário judicial
responsável pela promoção da citação (237º CPC), não se recorre à citação postal.
2.3.2 Citação de pessoas coletivas
A citação de pessoa coletiva efetua-se mediante via postal através da entrega de carta
registada com aviso de receção que é endereçada para a sede da citanda inscrita no
Registo Nacional de Pessoas Coletivas (246º, n. 2 CPC). Ainda que for recusada a
assinatura do aviso de receção ou o recebimento da carta por representante legal ou
funcionário da citanda, o ato da citação considera-se efetuada (246º, n. 3 CPC).
2.3.3 Elementos da citação
- Citação edital: De acordo com os artigos 240º CPC e 243º CPC, a citação edital
determinada pela incerteza do lugar em que o citando se encontra (1) ou pela incerteza
das pessoas a citar (2) implica a afixação de um edital na porta da casa da última
residência ou sede que o citando teve no país e a publicação de um anúncio em página
informática de acesso público. Por um lado, o edital especifica um conjunto de dados
mencionados no artigo 241º, n. 1 CPC. Por outro lado, o anúncio reproduz o teor do
edital e menciona o local da respetiva afixação (241º, n. 2 CPC).
- Citação pessoal: De acordo com o artigo 227º CPC, a citação pessoal implica a
remessa ou entrega ao citando do duplicado da petição inicial e da cópia dos
documentos que a acompanhem, comunicando-se-lhe que fica citado para a ação a que o
duplicado se refere e indicando-se o tribunal, juízo e secção por onde corre o processo e
o prazo dentro do qual pode oferecer a defesa (569º, n. 1 CPC, conjugado com o artigo
245º CPC)2, a necessidade de patrocínio judiciário (40º CPC) e as cominações em que
incorre no caso de revelia (566º a 568º CPC).
2.3.4 Falta de citação
De acordo com o artigo 188º, n. 1 CPC, há falta de citação:
a) Quando o ato tenha sido completamente omitido.
b) Quando tenha havido erro de identidade do citado.
c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital.
d) Quando se mostre que foi efetuada depois do falecimento do citando ou da extinção
deste, tratando-se de pessoa coletiva ou sociedade.
e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter
conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável.
A falta de citação gera a nulidade de tudo o que se tenha processado depois da petição
inicial (187º CPC), salvo se o réu intervier no processo sem arguir, de imediato, a falta
da sua citação, considerando-se a nulidade sanada (189º CPC). A nulidade decorrente
da falta de citação pode ser conhecida oficiosamente pelo tribunal (196º CPC) logo que
dela se aperceba, podendo suscitá-la em qualquer estado do processo (200º, n. 1 CPC),
ou arguida pelo réu em qualquer estado do processo (198º, n. 1 CPC).

2
Efetuada a citação, o prazo para contestar (prazo perentório de 30 dias) começa a contar da citação,
salvo se houver lugar a dilação, começando, nesse caso, a correr desde o termo da dilação (prazo dilatório
de 5 dias (citação quase-pessoal) ou de 30 dias (citação edital)).

11
2.3.5 Nulidade da citação
De acordo com o artigo 191º, n. 1 CPC, é nula a citação quando não hajam sido, na sua
realização, observadas as formalidades prescritas na lei (227º CPC, 240º e 243º CPC).
- A nulidade da citação, em regra, não é de conhecimento oficioso, devendo ser arguida
pelo réu no prazo indicado para a contestação (191º, n. 2, primeira parte CPC).
- A nulidade da citação é de conhecimento oficioso quando o vício respeite à citação
edital ou consista na falta de indicação do prazo para a defesa, sendo conhecida pelo
tribunal logo que dela se aperceba, podendo suscitá-la em qualquer estado do processo
(191º, n. 2, segunda parte CPC, conjugado com os artigos 196º e 200º, n 1 CPC).
→ Nos casos em que se indicou um prazo para a defesa superior àquele que a lei
concede, deve a defesa ser admitida dentro daquele prazo (191º, n. 3 CPC).
2.3.6 Efeitos da citação
Tendo o ato da citação do réu sido efetuada, ela produz os seguintes cinco efeitos:
1) Interrupção do prazo de prescrição: O ato da citação interrompe o prazo de prescrição
(323º, n. 1 CC). → veja-se o ponto 2.1.1
2) Constituição do devedor em mora nas obrigações puras: Nas obrigações sem prazo de
cumprimento (obrigações puras), o devedor só fica constituído em mora depois de ter
sido citado (805º, n. 1 CC).
3) Cessação da boa-fé do possuidor: De acordo com o artigo 564º, al. a) CPC, o ato da
citação faz cessar a boa-fé do possuidor (1260º CC).
-» Exemplo: Imagine-se que A intentou uma ação de reivindicação contra B,
possuidor de boa-fé. Neste caso, o ato da citação faz cessar a boa-fé de B, tendo tal
consequências quanto a frutos (1271º CC) e quanto a benfeitorias (1273º e 1275º CC).
4) Relativa estabilização dos elementos essenciais da causa: De acordo com o artigo
564º, al. b) CPC, o ato da citação torna a instância estável quanto aos elementos
essenciais da causa (sujeitos, causa de pedir e pedido), sendo que a lei admite, em
determinadas circunstâncias, modificações a estes elementos, vigorando o princípio da
relativa estabilidade da instância (260º CPC):
- Modificações subjetivas: A instância pode modificar-se quanto às pessoas:
1. em consequência de transmissão, por ato inter vivos, da coisa ou do direito
litigioso (262º, al. a), segunda parte CPC).
-» Exemplo: Imagine-se que A, na pretensa qualidade de exclusivo proprietário,
intenta uma ação de reivindicação do imóvel Y contra B, alegando que este está
indevidamente na posse do bem. Na pendência da causa, B (transmitente) aliena o
imóvel Y a C (adquirente). Neste caso, o adquirente C pode ser admitido a intervir na
causa e assumir a posição processual do transmitente B, ocorrendo uma modificação
subjetiva da instância. Contudo, a lei permite que o transmitente B permaneça na lide
enquanto o adquirente B não for, por meio de habilitação (356º CPC), admitido a
substituí-lo (263º, n. 1 CPC). Nesta hipótese, o transmitente B litiga em seu nome sobre
relação material controvertida alheia, atuando ao abrigo da figura da legitimidade
extraordinária ou substituição processual (30º, n. 3 CPC). Ainda que o adquirente C
não intervenha na causa, a sentença não deixa de produzir efeitos em relação a ele,
exceto no caso de a ação estar sujeita a registo e o adquirente registar a aquisição antes
de feito o registo da ação (263º, n. 3 CPC).
2. em consequência de sucessão mortis causa (262º, al. a), primeira parte CPC).
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação e, na pendência da causa, falece.
Neste caso, o sucessor de A assume a posição processual do falecido por meio de
habilitação (351º, n. 1 CPC), ocorrendo uma modificação subjetiva da instância.
12
3. em virtude dos incidentes da intervenção de terceiros (262º, al. b) CPC). São três
as modalidades de intervenção de terceiros:
→ Intervenção principal: A intervenção principal pode ser espontânea (311º e ss.
CPC) ou provocada (316º e ss. CPC).
- Intervenção principal espontânea: De acordo com o artigo 311º CPC, estando
pendente uma causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal
um terceiro que, em relação ao seu objeto (causa de pedir ou pedido), tiver um interesse
igual ao do autor ou do réu.
- Intervenção principal provocada: A intervenção principal provocada ocorre
essencialmente em duas situações:
1. De acordo com o artigo 316º, n. 1 CPC, ocorrendo preterição de litisconsórcio
necessário (legal, convencional, natural), qualquer das partes pode chamar a juízo
terceiro com legitimidade para intervir na causa.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação contra B, embora esta deva
igualmente ser intentada contra C. Uma vez que ocorre preterição de litisconsórcio
necessário, C pode ser chamado a intervir na causa para regularizar a instância.
2. De acordo com o artigo 316º, n. 2 CPC, nos casos de litisconsórcio voluntário,
pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que não haja
demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos
termos do artigo 39º CPC.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de investigação da paternidade
contra B. No entanto, B contesta que C é o pai biológico. Uma vez que existe dúvida
fundamentada sobre o titular da relação material controvertida, C pode ser chamado a
intervir na causa para assumir o papel de réu subsidiário.
→ Intervenção acessória: A intervenção acessória pode ser espontânea (326º e ss.
CPC) ou provocada (321º e ss. CPC). Em ambas as modalidades, o terceiro
interveniente assume o papel de parte auxiliar da parte principal, ficando a atividade
processual daquela subordinada à vontade desta.
- Intervenção acessória espontânea (assistência): De acordo com o artigo 326º CPC,
estando pendente uma causa entre duas ou mais pessoas, pode intervir nela como
assistente, para auxiliar qualquer das partes, quem tiver interesse jurídico em que a
decisão da causa seja favorável a essa parte.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de resolução de um contrato de
arrendamento celebrado com B. C, subarrendatário, por ter interesse em que a decisão
da causa seja favorável a B (pois se a ação for julgada procedente, o subarrendamento
caduca), pode intervir nela como parte auxiliar de B (parte principal).
- Intervenção acessória provocada: De acordo com o artigo 321º CPC, o réu que
tenha ação de regresso contra terceiro para ser indemnizado do prejuízo que lhe cause a
perda da demanda pode chamá-lo a intervir como auxiliar na defesa, sempre que o
terceiro careça de legitimidade para intervir como parte principal.
-» Exemplo: Imagine-se que B provocou, por descuido, um incêndio no seu
andar. Devido à atuação dos bombeiros, o apartamento de A situado no andar inferior
ficou inundado, tendo sido causados danos aos seus quadros. De seguida, A intentou
uma ação de responsabilidade civil extracontratual contra B. No entanto, B, por ter
celebrado um contrato de seguro multirriscos com a seguradora X, pode chamá-la a
intervir na causa como auxiliar na sua defesa. Se B perder a causa, terá de indemnizar
A, podendo exigir da seguradora X, numa ação de regresso posterior, aquilo que lhe
pagou. Nesta hipótese, a seguradora X fica vinculada aos factos que ficaram apurados
na causa anterior. Só não será esse o caso se a seguradora X conseguir provar má gestão
processual por parte de B.

13
→ Oposição: A oposição pode ser espontânea (333º e ss. CPC) ou provocada (338º
e ss. CPC).
- Oposição espontânea: De acordo com o artigo 333º CPC, estando pendente uma
causa entre duas ou mais pessoas, pode um terceiro intervir nela como opoente para
fazer valer, no confronto de ambas as partes, um direito próprio, total ou parcialmente
incompatível com a pretensão deduzida pelo autor ou pelo reconvinte.
-» Exemplo: Imagine-se que A, na pretensa qualidade de exclusivo proprietário,
intentou uma ação de reivindicação do imóvel Y contra B, alegando que este está
indevidamente na posse do bem. No entanto, C arroga-se proprietário do bem Y. Neste
caso, C pode intervir na causa como opoente, reivindicando o bem em questão.
- Oposição provocada: De acordo com o artigo 338º CPC, quando esteja disposto a
satisfazer a prestação que lhe é exigida mas tenha conhecimento de que um terceiro se
arroga ou pode arrogar-se de direito incompatível com o do autor, pode o réu, dentro do
prazo para contestar, requerer que o terceiro seja citado para deduzir, querendo, a sua
pretensão, desde que aquele demandado proceda simultaneamente à consignação em
depósito da quantia ou coisa devida.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de condenação contra B, pedindo
que este seja condenado na realização de determinada prestação. Neste caso, apesar de
B estar disposto a realizar a prestação que lhe é exigida por A, requere que C, alegado
verdadeiro credor, seja citado, podendo este intervir na causa como opoente.
- Modificações objetivas: A instância pode modificar-se quanto ao objeto (causa de
pedir ou pedido) nos termos dos artigos 264º CPC e 265º CPC:
1. 264º CPC: Havendo acordo das partes, o pedido e a causa de pedir podem ser
alterados ou ampliados em qualquer altura, em primeira ou segunda instância, salvo se a
alteração ou ampliação perturbar inconvenientemente a instrução, discussão e
julgamento da causa.
2. 265º, n. 1 CPC: Na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou
ampliada em consequência de confissão feita pelo réu e aceita pelo autor, devendo a
alteração ou ampliação ser feita no prazo de 10 dias a contar da aceitação.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação destinada a exigir a quantia
entregue a título de antecipação do preço de um bem e B sustenta que recebeu a quantia,
mas a título de mútuo. A poderá alterar a causa de pedir, fundamentando a sua pretensão
de tutela jurisdicional no mútuo.
265º, n. 2 CPC: O autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido (pois, não
prejudica o réu) e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em primeira
instância (ou seja, até à fase da audiência final) se a ampliação for o desenvolvimento
ou a consequência do pedido primitivo.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de reivindicação de bem Y contra
B, pedindo que este restitua o bem em questão. No entanto, A poderá vir a ampliar o
pedido, exigindo igualmente que sejam restituídos os frutos que o bem Y produziu.
5) Inibição de propositura de ação destinada à apreciação da mesma questão jurídica:
De acordo com o artigo 564º, al. c) CPC, o ato da citação inibe o réu de propor contra o
autor ação destinada à apreciação da mesma questão jurídica de forma a evitar que
ocorra a exceção dilatória da litispendência – situação em que estão pendentes duas
ações idênticas quanto aos sujeitos, à causa de pedir e ao pedido – e que sejam tomadas
decisões repetidas ou contraditórias por parte do tribunal.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de reivindicação do bem Y contra B
que é citado. Na pendência desta ação, B intenta uma ação de reivindicação do bem Y
contra A. Neste caso, ocorre a exceção dilatória da litispendência (580º a 582º CPC),

14
uma vez que estão pendentes duas ações destinadas à apreciação da mesma questão
jurídica. A litispendência deve ser arguida na ação para a qual o réu foi citado
posteriormente (segunda ação), impedindo que o tribunal conheça do mérito da causa e
dando lugar à absolvição do réu da instância (577º, al. i) CPC, conjugado com o artigo
576º, n. 2 CPC). Se o juiz não conhecer da litispendência e sendo tomadas duas
decisões contraditórias sobre a mesma questão jurídica, funciona o artigo 625º CPC, de
acordo com o qual se deve cumprir a que passou em julgado em primeiro lugar.
2.4 Revelia
Tendo o ato da citação do réu sido efetuado e tendo ela produzido os seus efeitos, o
prazo para contestar (prazo perentório de 30 dias) começa a contar da citação, salvo se
houver lugar a dilação, começando, nesse caso, a correr desde o termo da dilação (prazo
dilatório de 5 dias (citação quase-pessoal) ou de 30 dias (citação edital) (569º, n. 1
CPC, conjugado com os artigos 139º, n. 1 a 3 CPC, 142º CPC e 245º CPC). No
entanto, se o réu não contestar dentro do prazo legalmente estipulado para o efeito,
verifica-se uma situação de revelia do réu.
2.4.1 Modalidades de revelia
A revelia do réu pode revestir duas modalidades:
- Revelia absoluta: Verifica-se uma situação de revelia absoluta quando o réu não
contesta, nem dá qualquer sinal de si nos autos (não intervém de qualquer modo no
processo). Nestas circunstâncias, o tribunal deve averiguar a regularidade do ato da
citação e ordenar a sua repetição caso encontre irregularidades (566º CPC).
- Revelia relativa: Verifica-se uma situação de revelia relativa quando o réu não
contesta, mas intervém de algum modo no processo. Nestas circunstâncias, o tribunal
tem a certeza de que o ato da citação foi efetuado de forma regular.
2.4.2 Efeitos da revelia
- Revelia operante: Se o réu não contestar, apesar de o ato da citação ter sido efetuado
de forma regular, aplica-se o artigo 567º CPC, falando-se, a este propósito, de uma
revelia operante:
1. 567º, n. 1 CPC: O efeito principal da revelia operante consiste no facto de se
considerarem confessados os factos alegados pelo autor na petição inicial.
2. 567º, n. 2 CPC: Verificando-se uma situação de revelia operante, o juiz deve, à luz
do dever de boa gestão processual (6º, n. 1 CPC), averiguar se a relação processual, no
que diz respeito aos pressupostos processuais de conhecimento oficioso, está
regularmente constituída e, em caso negativo, diligenciar a sanação dos vícios sanáveis
através do proferimento de um despacho de aperfeiçoamento. Só depois de regularizada
a relação processual, os mandatários do autor e do réu têm a possibilidade de, dentro de
um prazo de 10 dias, fazer alegações de direito. Depois destas alegações de direito, o
juiz profere a sentença final cujo conteúdo varia consoante as circunstâncias do caso em
concreto:
- Sentença de procedência do pedido: Caso os factos alegados pelo autor na petição
inicial sejam suficientes para fundamentar o seu pedido, o juiz deve proferir uma
sentença de procedência do pedido.
- Sentença de absolvição do réu do pedido (improcedência do pedido): Caso os
factos alegados pelo autor na petição inicial sejam insuficientes para fundamentar o seu
pedido, o juiz deve proferir uma sentença de absolvição do réu do pedido.
- Sentença de absolvição do réu da instância: Caso o juiz verifique exceções
dilatórias de conhecimento oficioso insanáveis ou sanáveis mas não-sanadas (278º
CPC, 577º CPC, 578º CPC), tais exceções impedem que o juiz conheça do mérito da
causa e dão lugar à absolvição do réu da instância (576º, n. 2 CPC).

15
Nota fundamental:
Durante algum tempo, à luz do dogma da apreciação prioritária dos pressupostos
processuais, o juiz só podia apreciar o mérito da causa se estivessem verificados
todos os pressupostos processuais. Sem embargo, o artigo 278º, n. 3, segunda parte
CPC veio consagrar determinados requisitos que afastam este dogma, permitindo
que o juiz conheça do mérito da causa não obstante não estarem verificados todos os
pressupostos processuais:
1. Deve estar em causa um pressuposto processual cuja função seja a tutela de um
interesse de uma determinada parte (ex. capacidade judiciária, patrocínio judiciário).
2. No momento da apreciação do pressuposto processual, não deve existir nenhum
outro motivo que impeça o juiz de conhecer do mérito da causa.
3. A decisão de mérito deve ser integralmente favorável à parte cujo interesse é
tutelado.
- Revelia inoperante:
Se o réu não contestar, mas não operarem os efeitos normais do artigo 567º CPC, diz-se
que a revelia é inoperante, aplicando-se o artigo 568º CPC:
- al. a): Quando, em caso de pluralidade de réus, um deles contestar, a impugnação dos
factos alegados pelo autor na petição inicial feita por esse réu aproveita aos demais.
Nos casos da alínea a) do artigo 568º CPC, tudo se passa como se o(s) réu(s) revel
(revéis) tivesse(m) contestado.

- al. b), primeira parte: Quando o réu, ou algum dos réus, for incapaz e não contestar,
os factos alegados pelo autor na petição inicial consideram-se controvertidos, sendo
necessário demonstrar a sua verificação através dos meios de prova.
- al. b), segunda parte: Quando o réu, ou algum dos réus, não contestar, mas tenha sido
citado editalmente e não tenha dado qualquer sinal de si nos autos (não interveio de
qualquer modo no processo), o tribunal deve averiguar a regularidade do ato da citação
e ordenar a sua repetição caso encontre irregularidades, correndo novo prazo para
contestar (prazo dilatório de 30 dias, ao qual segue prazo dilatório de 30 dias). Caso
contrário, os factos alegados pelo autor na petição inicial não se consideram
confessados.
- al. c): Quando o réu não contestar e esteja em causa uma ação que verse sobre uma
situação jurídica indisponível (ações cuja constituição ou extinção está subtraída à
vontade das partes (ex. ação de divórcio sem consentimento do outro, ação de anulação
do casamento, ação de investigação da paternidade, ação de impugnação da perfilhação,
etc.)), os factos alegados pelo autor na petição inicial não se consideram confessados.
Nos casos das alíneas b) a c) do artigo 568º CPC, termina a fase dos articulados e o
processo prossegue para a fase intermédia, não se realizando a audiência prévia
(592º, n. 1, al. a) CPC), mas mantendo-se a restante atividade do juiz que pode,
assim, proferir os despachos previstos nos artigos 590º, n. 2 CPC e 593º, n. 2 CPC.

- al. d): Quando o réu não contestar e o autor não tenha junto ao processo documento
escrito que é exigido como forma ou prova de um negócio jurídico alegado na petição
inicial, os factos que só por via desse documento podiam ser demonstrados não se
consideram confessados.
Nos casos da alínea d) do artigo 568º CPC, o juiz deve, à luz do dever de boa gestão
processual (6º, n. 1 CPC), convidar o autor a juntar o documento em falta (590º, n.
2, al. c) CPC).

16
2.5 Contestação-defesa
A contestação, que se encontra regulada nos artigos 569º e ss. CPC, é o articulado pelo
qual o réu responde aos factos alegados pelo autor na petição inicial, podendo a defesa
do réu assumir duas modalidades (571º, n. 1 CPC):
2.5.1 Defesa por impugnação
O réu defende-se por impugnação quando contradiz os factos alegados pelo autor na
petição inicial ou quando afirma que esses factos não podem produzir o efeito jurídico
pretendido pelo autor (571º, n. 2, primeira parte CPC). A defesa por impugnação pode
revestir duas modalidades:
- Defesa por impugnação de facto: A defesa por impugnação de facto desdobra-se
ainda em duas modalidades:
- Defesa por impugnação de facto direta: O réu defende-se por impugnação de facto
direta quando contradiz frontalmente os factos alegados pelo autor na petição inicial.
-» Exemplo: Imagine-se que A alega ter celebrado com B um contrato de compra
e venda e este, na contestação, nega ter celebrado com aquele o dito contrato.
- Defesa por impugnação de facto indireta: O réu defende-se por impugnação de
facto indireta quando admite alguns dos factos alegados pelo autor na petição inicial,
mas alega outros que consubstanciam uma versão factualmente diferente, e portanto
contraditória, daquela apresentada pelo autor.
-» Exemplo: Imagine-se que A alega ter sofrido um acidente de viação porque B
conduzia em excesso de velocidade. B, na contestação, admite que A sofreu um
acidente de viação, mas alega ter sido por causa do mau tempo que estava naquele dia.
Ónus de impugnação dos factos alegados pelo autor na petição inicial:
De acordo com o artigo 574º, n. 1 CPC, sobre o réu recai um ónus de se pronunciar
sobre os factos alegados pelo autor na petição inicial, admitindo a verificação de
alguns, impugnando outros ou declarando que desconhece se determinados factos
são ou não verdadeiros.
- Se os factos forem impugnados pelo réu, consideram-se controvertidos, sendo
necessário demonstrar a sua verificação através dos meios de prova.
- Se os factos não forem impugnados pelo réu, consideram-se admitidos por acordo,
salvo se se verificar um dos seguintes casos:
1. Não se consideram admitidos por acordo os factos não-impugnados que
estiverem em oposição com a contestação considerada no seu conjunto.
2. Não se consideram admitidos por acordo os factos não-impugnados sobre os
quais não seja admissível confissão (354º, al. b) CC).
3. Não se consideram admitidos por acordo os factos não-impugnados que só
podem ser provados por documento escrito (364º CC).
4. Não se consideram admitidos por acordo os factos instrumentais (factos de
natureza probatória cuja demonstração indicia a existência de factos essenciais) não-
impugnados cuja não-verificação tenha sido demonstrada.
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de indemnização fundada em
acidente de viação e alega que a colisão se deveu a excesso de velocidade por parte
de B (facto essencial) e que B deixou um rasto de travagem na estrada (facto
instrumental). B, na contestação, não impugnou a existência do rasto de travagem na
estrada. Neste caso, esse facto instrumental não-impugnado pelo autor será
provisoriamente considerado admitido por acordo. Porém, se o juiz fizer uma
inspeção ao local e verificar que não há sinais visíveis de marcas de pneus no piso, o
facto instrumental alegado pelo autor e não-impugnado pelo réu será considerado
como não-verificado e, por conseguinte, não será considerado admitido por acordo.

17
De acordo com o artigo 574º, n. 3 CPC, se o réu declarar que desconhece se
determinado facto é verdadeiro, a declaração equivale a confissão quando se trate de
facto pessoal ou de que o réu deva ter conhecimento e equivale a impugnação no
caso contrário.
De acordo com o artigo 574º, n. 4 CPC, não é aplicável aos incapazes, ausentes e
incertos, quando representados pelo Ministério Público ou por advogado oficioso, o
ónus de impugnação, nem o preceituado no n. 3 do artigo 574º CC.
- Defesa por impugnação de direito: O réu defende-se por impugnação de direito
quando aceita os factos alegados pelo autor na petição inicial mas afirma que esses
factos não podem produzir o efeito jurídico por ele pretendido.
-» Exemplo: Imagine-se que, no âmbito de uma ação de divórcio sem
consentimento de um dos cônjuges, A fundamenta o seu pedido com base em rutura
definitiva do casamento, tendo de alegar os factos constitutivos que a demonstrem. B,
na contestação, aceita os factos alegados pelo autor, mas afirma que eles não podem
produzir o efeito jurídico pretendido pelo autor por serem insuficientes.
Nota fundamental:
A defesa por impugnação de facto e a defesa por impugnação de direito andam,
por vezes, associadas.
-» Exemplo: A intenta uma ação de restituição contra B, alegando que celebrou
um contrato de mútuo e que B não lhe restituiu a quantia mutuada no prazo fixado.
Na contestação, B alega que a quantia lhe foi entregue, mas a título de doação, pelo
que não tem nenhuma obrigação de restituir. Neste caso, B admite ter celebrado um
contrato com A, mas alega ter sido um contrato de doação (impugnação de facto
indireta), não se podendo retirar dos factos alegados por A na petição inicial o
efeito jurídico pretendido pelo mesmo (impugnação de direito).

2.5.2 Defesa por exceção


O réu defende-se por exceção quando alega factos que obstam à apreciação do mérito da
causa (exceções dilatórias) ou quando alega factos que impedem, modificam ou
extinguem o direito invocado pelo autor (exceções perentórias) (571º, n. 2, segunda
parte CPC). A defesa por exceção pode revestir duas modalidades:
- Defesa por exceção dilatória: O réu defende-se por exceção dilatória quando alega
factos que, em regra, impedem que o tribunal conheça do mérito da causa e, se não
forem sanados, dão lugar à absolvição do réu da instância ou à remessa do processo para
outro tribunal (576º, n. 2 CPC).
1) Exceções dilatórias: Algumas exceções dilatórias encontram-se elencadas no
artigo 577º CPC, sendo que existem outras que não se encontram consagradas nesse
artigo (ex. falta de interesse em agir).
2) Conhecimento das exceções dilatórias: O tribunal deve conhecer oficiosamente
das exceções dilatórias, salvo da incompetência absoluta decorrente da violação de
pacto privativo de jurisdição ou da preterição de tribunal arbitral voluntário e da
incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no artigo 104º CPC
(578º CPC), devendo estas exceções ser invocadas pelo réu.
- Defesa por exceção perentória: O réu defende-se por exceção perentória quando
alega factos que impedem, modificam ou extinguem o direito invocado pelo autor e dão
lugar à absolvição total ou parcial do réu do pedido (576º, n. 3 CPC).
1) Exceções perentórias: Os factos podem ser impeditivos, modificativos ou
extintivos:

18
- Factos impeditivos: Os factos impeditivos são factos anteriores ou contemporâneos
à formação do direito invocado pelo autor que impedem a sua válida constituição.
-» Exemplo: A intenta uma ação de cobrança de dívida fundada num contrato
contra B. B, na contestação, alega que foi coagido a celebrar o contrato.
- Factos modificativos: Os factos modificativos são factos que modificam as
condições em que o direito invocado pelo autor é exercido.
-» Exemplo: A intenta uma ação de cobrança de dívida fundada num contrato
contra B e alega que B está em mora. B, na contestação, alega que A lhe concedeu uma
prorrogação do prazo de cumprimento.
- Factos extintivos: Os factos extintivos são factos que extinguem o direito invocado
pelo autor depois de este se ter validamente constituído.
-» Exemplo: A intenta uma ação de cobrança de dívida contra B. B, na
contestação, alega já ter pagado a dívida.
2) Conhecimento das exceções perentórias: O artigo 579º CPC remete para os
artigos 333º (regula a figura da caducidade) e 303º CC (regula a figura da prescrição).
De acordo com o artigo 333º CC, o tribunal conhece oficiosamente das exceções
perentórias se forem estabelecidas em matéria excluída da disponibilidade das partes. Se
as exceções perentórias forem estabelecidas em matéria não-excluída da disponibilidade
das partes, aplica-se o artigo 303º CC, não podendo o tribunal delas conhecer
oficiosamente.
Ónus de deduzir de forma clara e separada as exceções dilatórias e perentórias:
De acordo com o artigo 572º, al. c) CPC, e em nome da boa-fé processual, sobre o
réu recai um ónus de especificar de forma clara e separada as exceções que alega.
1. Se o réu especificar de forma clara e separada as exceções que alega, sobre o
autor recai um ónus de se pronunciar sobre os factos alegados pelo réu na
contestação, sob pena de aqueles factos se considerarem admitidos por acordo por
falta de impugnação, aplicando-se os artigos 587º, n. 1 CPC e 574º CPC.
2. Se o réu não especificar de forma clara e separada as exceções que alega, o autor
fica desonerado de se pronunciar sobre os factos alegados pelo réu na contestação,
considerando-se tais factos controvertidos.

2.5.3 Princípio da concentração de toda a defesa na contestação


O princípio da concentração de toda a defesa na contestação encontra-se consagrado
no artigo 573º, n. 1, primeira parte CPC, de acordo com o qual, em regra, sobre o réu
recai o ónus de alegar toda a defesa (por impugnação e por exceção) na contestação, sob
pena de ficar precludida a possibilidade de o fazer posteriormente. Este princípio
conhece, todavia, alguns desvios:
1. 573º, n. 1, segunda parte CPC: O réu não tem o ónus de alegar toda a defesa na
contestação quando a lei lhe permite alegar a defesa no prazo para a contestação, mas
fora do articulado da contestação (ex. 121º, n. 2 CPC).
2. 573º, n. 2 CPC: O réu não tem o ónus de alegar toda a defesa na contestação quando
a lei lhe permite alegar a defesa depois do prazo para a contestação, nomeadamente:
- quando o réu alega factos supervenientes, ou seja, factos ocorridos depois do prazo
para a contestação (superveniência objetiva) ou factos que já tenham ocorrido antes do
prazo para a contestação, mas dos quais o réu apenas obteve conhecimento depois do
prazo para a contestação (superveniência subjetiva) (588º, n. 2 CPC).
- quando a lei expressamente admita a alegação de exceções depois do prazo para a
contestação (ex. incompetência absoluta (97º, n. 2 CPC e 98º CPC) e falta de citação
(198º, n. 2 CPC)).
- quando o réu alega exceções que são de conhecimento oficioso (578º e 579º CPC).

19
2.6 Contestação-reconvenção
O réu pode ainda contestar, formulando, de forma separada na contestação, uma
reconvenção onde expõe a fundamentação de facto (causa de pedir) e de direito e
formula o pedido, como se se tratasse de uma petição inicial, contra o autor do pedido
principal e indica o valor do pedido reconvencional (583º CPC). Passam, desta forma, a
existir como que duas ações cruzadas. O autor do pedido reconvencional (réu quanto ao
pedido principal) designa-se por reconvinte e o autor do pedido principal (réu quanto ao
pedido reconvencional), designa-se por reconvindo. Porém, a lei submete a formulação
da reconvenção à observância de determinados requisitos de admissibilidade:
1. Requisito da identidade subjetiva das partes: A reconvenção só é admissível quando
seja formulada contra o autor do pedido principal (266º, n. 1 CPC). Contudo, se o
pedido reconvencional envolver terceiros que possam associar-se ao reconvinte ou ao
reconvindo, pode o réu-reconvinte chamá-los a intervir em regime de litisconsórcio
voluntário ou necessário (266º, n. 4 CPC).
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação de condenação contra B. A é
casado, mas o pedido formulado não exige a presença do seu cônjuge C. No entanto, na
contestação, B formula um pedido reconvencional que exige a presença do cônjuge de
A, sob pena de preterição de litisconsórcio necessário. Neste caso, B terá de chamar C a
intervir na qualidade de litisconsorte necessário.
2. Requisito da compatibilidade das formas de processo: A reconvenção só é admissível
quando ao pedido principal e ao pedido reconvencional não correspondam formas de
processo diferentes com tramitações manifestamente incompatíveis (266º, n. 3 CPC).
3. Requisito da competência absoluta do tribunal: A reconvenção só é admissível
quando respeite as regras de competência absoluta (internacional e interna em razão da
matéria e da hierarquia) do tribunal (93º, n. 1 CPC).
4. Requisito de conexão substantiva entre o pedido principal e o pedido reconvencional:
A reconvenção só é admissível quando exista entre o pedido principal e o pedido
reconvencional alguma das conexões substantivas previstas no artigo 266º, n. 2 CPC:
al. a): A reconvenção só é admissível quando o pedido reconvencional emerge da
causa de pedir ou de factos que servem de fundamento à defesa.
-» Exemplo 1: Imagine-se que A intenta uma ação de cumprimento de um
contrato por não-cumprimento de uma prestação. B, na contestação, pode formular um
pedido reconvencional, pedindo a condenação de A no cumprimento de uma prestação
em falta que resulta do mesmo contrato. Neste caso, o pedido reconvencional emerge da
causa de pedir exposta pelo autor.
-» Exemplo 2: Imagine-se que A intenta uma ação de condenação no
cumprimento de um contrato. B, na contestação, pode formular um pedido
reconvencional, pedindo que o contrato seja anulado por ter sido celebrado sob coação.
Neste caso, o pedido reconvencional emerge da exceção perentória alegada pelo réu.
al. b): A reconvenção só é admissível quando o réu-reconvinte visa tornar efetivo o
direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida.
-» Exemplo: Imagine-se que A (depositante) intenta uma ação de restituição de
coisa depositada contra B (depositário) que teve despesas com a conservação da coisa.
B, na contestação, pode formular um pedido reconvencional, pedindo a condenação de
A no pagamento das despesas que fez com a coisa.
al. c): A reconvenção só é admissível quando o réu-reconvinte pretende o
reconhecimento de um contracrédito, seja para efeitos de compensação de créditos, seja
para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor.

20
-» Exemplo 1: Imagine-se que A, credor de B em 40’000€, intenta uma ação de
cobrança de dívida contra B. B, na contestação, pode formular um pedido
reconvencional, alegando que é credor de A em 40’000€ e pedindo a compensação de
créditos, o que determina a extinção do crédito de A sobre B.
-» Exemplo 2: Imagine-se que A, credor de B em 50’000€, intenta uma ação de
cobrança de dívida contra B. B, na contestação, pode formular um pedido
reconvencional, alegando que é credor de A em 60’000€ e pedindo a condenação de A
no pagamento da diferença (10’000€).
al. d): A reconvenção só é admissível quando o pedido reconvencional se destina a
obter, em benefício do réu-reconvinte, o mesmo efeito jurídico pretendido pelo autor.
-» Exemplo 1: Imagine-se que A intenta uma ação de simples apreciação contra B
relativamente à titularidade do direito sobre o bem X. B, na contestação, pode formular
um pedido reconvencional, pedindo que o tribunal reconheça a sua titularidade do
direito sobre o bem em questão.
-» Exemplo 2: Imagine-se que A intenta uma ação de divórcio sem consentimento
de um dos cônjuges com fundamento na alteração das faculdades mentais. B, na
contestação, pode formular um pedido reconvencional, pedindo a dissolução do
casamento com fundamento na separação de facto.
Nota fundamental:
A contestação-defesa não se confunde com a contestação-reconvenção:
- Quando o réu se defende por impugnação ou por exceção perentória, ele pretende a
improcedência do pedido formulado pelo autor na petição inicial.
- Quando o réu formula uma reconvenção, ele aproveita a circunstância de a ação
estar pendente para nela inserir um pedido substancialmente autónomo, sem ter de
intentar uma ação autónoma para o efeito.
2.7 Réplica
A réplica, que se encontra prevista nos artigos 584º e ss. CPC, é o articulado pelo qual o
autor responde aos factos alegados pelo réu na contestação e que só é admissível:
1) Contestação-reconvenção: Quando o réu tenha formulado um pedido reconvencional,
a réplica funciona como se fosse uma contestação do autor à reconvenção que, por sua
vez, funciona como se fosse uma petição inicial do réu.
2) Ação de simples apreciação negativa: Nas ações de simples apreciação negativa, o
autor pretende que o tribunal declare a inexistência de um direito subjetivo em sentido
estrito ou um facto jurídico, devendo para tal alegar, na petição inicial, os factos
essenciais que demonstrem a inexistência desse direito. O réu, na contestação, deve
alegar os factos constitutivos do direito cuja existência se encontra em litígio. Logo, a
réplica funciona como se fosse uma contestação do autor, podendo defender-se por
impugnação (contradizendo os factos constitutivos alegados pelo réu) ou por exceção
perentória (alegando factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pelo réu).
Nota fundamental:
Pelo simples facto de a réplica funcionar como se fosse uma contestação, o prazo
para a sua apresentação é de 30 dias, a contar daquele em que for ou se considerar
notificada a apresentação da contestação (585º CPC).

Se o réu não tiver formulado uma reconvenção ou não esteja em causa uma ação de
simples apreciação negativa, a lei não prevê a possibilidade de o autor apresentar uma
réplica para responder às exceções dilatórias ou perentórias alegadas pelo réu na
contestação. Sem embargo, em nome do princípio do contraditório (3º, n. 4 CPC), o
autor terá a possibilidade de o fazer na audiência prévia ou, se esta não se realizar, na

21
audiência final. Porém, à luz do dever de boa gestão processual (6º, n. 1 CPC) e ao
abrigo do princípio da adequação formal (547º CPC), tem-se entendido que existem
situações em que não é razoável aguardar pela realização da audiência prévia para
discutir as exceções alegadas pelo réu na contestação, admitindo-se que o autor lhes
responda num articulado inominado.
Ónus de impugnação dos factos alegados pelo réu na contestação:
De acordo com o artigo 572º, al. c) CPC, e em nome da boa-fé processual, sobre o
réu recai um ónus de especificar de forma clara e separada as exceções que alega.
1. Se o réu especificar de forma clara e separada as exceções que alega, sobre o
autor recai um ónus de se pronunciar sobre os factos alegados pelo réu na
contestação, sob pena de aqueles factos se considerarem admitidos por acordo por
falta de impugnação, aplicando-se os artigos 587º, n. 1 CPC e 574º CPC.
2. Se o réu não especificar de forma clara e separada as exceções que alega, o autor
fica desonerado de se pronunciar sobre os factos alegados pelo réu na contestação,
considerando-se aqueles factos controvertidos.

2.8 Factos supervenientes


2.8.1 Perspetiva do autor
Na petição inicial, em regra, o autor alega os factos constitutivos do seu direito. No
entanto, o autor pode alegar factos supervenientes, ou seja, factos ocorridos depois da
apresentação da petição inicial ou da réplica (superveniência objetiva) ou factos que já
tenham ocorrido antes da apresentação da petição inicial ou da réplica, mas dos quais o
autor apenas obteve conhecimento depois da sua apresentação (superveniência
subjetiva). De acordo com o artigo 588º, n. 1 CPC, o autor deve alegar os factos
supervenientes em articulado posterior (ou seja, na réplica, quando seja admitida) ou
em novo articulado (ou seja, num articulado inominado) que deve ser apresentado nos
termos do artigo 588º, n. 3 CPC:
al. a): Na audiência prévia, se esta se realizar.
al. b): Nos 10 dias posteriores à notificação da data designada para a realização da
audiência final quando não se tenha realizado a audiência prévia.
al. c): Na audiência final.
2.8.2 Perspetiva do réu
O princípio da concentração de toda a defesa na contestação encontra-se consagrado
no artigo 573º, n. 1, primeira parte CPC, de acordo com o qual, em regra, sobre o réu
recai o ónus de alegar toda a defesa (por impugnação e por exceção) na contestação, sob
pena de ficar precludida a possibilidade de o fazer posteriormente. Este princípio
conhece, todavia, alguns desvios. Um desses desvios encontra-se previsto no artigo
573º, n. 2 CPC, de acordo com o qual o réu não tem o ónus de alegar toda a defesa na
contestação quando o réu alega factos supervenientes, ou seja, factos ocorridos depois
do prazo para a contestação (superveniência objetiva) ou factos que já tenham ocorrido
antes do prazo para a contestação, mas dos quais o réu apenas obteve conhecimento
depois do prazo para a contestação (superveniência subjetiva) (588º, n. 2 CPC). De
acordo com o artigo 588º, n. 1 CPC, o réu deve alegar os factos supervenientes em
novo articulado (ou seja, num articulado inominado) que deve ser apresentado nos
termos do artigo 588º, n. 3 CPC:
al. a): Na audiência prévia, se esta se realizar.
al. b): Nos 10 dias posteriores à notificação da data designada para a realização da
audiência final quando não se tenha realizado a audiência prévia.
al. c): Na audiência final.

22
3. Fase intermédia
A fase intermédia, fase subsequente aos articulados, fase da gestão ou fase da
audiência prévia, fase em que o juiz desempenha um papel importantíssimo, é a
segunda fase do processo comum (590º, n. 2 a 598º CPC). Se o juiz não tenha
intervindo liminarmente, é na fase intermédia que ele tem pela primeira vez acesso ao
processo e de duas uma:
- Ou põe termo à causa através do proferimento de um despacho saneador (595º CPC)
que determine a absolvição do réu da instância, a absolvição do réu do pedido ou a
procedência do pedido, ocorrendo um julgamento antecipado da lide.
- Ou prepara o processo para as fases seguintes (da audiência final e da sentença).

Nota fundamental:
Sistematicamente é criticável que a intervenção liminar do juiz, que ocorre na fase
dos articulados, esteja prevista no artigo 590º CPC que regula os poderes do juiz na
fase intermédia.
→ A este respeito, dever-se-á entender que a fase intermédia vem regulada nos
artigos 590º, n. 2 a 598º CPC, uma vez que o artigo 590º, n. 1 CPC diz respeito à
intervenção liminar do juiz que ocorre ainda na fase dos articulados. No entanto,
nada impede que o juiz adote na fase liminar alguma das funções que estão previstas
unicamente para a fase intermédia (590º, n. 2, 3 e 4 CPC).

3.1 Despachos do juiz


Na fase intermédia, o juiz pode proferir vários tipos de despachos:
- Despacho pré-saneador
- Tentativa de conciliação
- Despacho saneador
- Despacho de programação da audiência final
- Despacho de adequação e simplificação processuais
- Despacho que identifica o objeto do litígio e enuncia os temas da prova
3.1.1 Despacho pré-saneador
De acordo com o artigo 590º, n. 2 CPC, findos os articulados, o juiz profere, quando
deva ser proferido, despacho pré-saneador destinado a:
- al. a): Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias sanáveis. Isto significa que
o momento adequado para diligenciar a sanação de exceções dilatórias sanáveis é o
despacho pré-saneador, servindo o despacho saneador para averiguar se tais exceções
dilatórias foram efetivamente sanadas.
Nota fundamental:
Se, após a leitura dos articulados, o juiz constatar a existência de uma exceção
dilatória sanável e de uma exceção dilatória insanável, deverá proferir um despacho
saneador que determine a absolvição do réu da instância.

- al. b): Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, seja através da correção de
irregularidades dos articulados, seja através da correção de insuficiências ou
imprecisões na exposição da matéria de facto (590º, n. 3 e 4 CPC)
- al. c): Convidar a parte a juntar documentos com vista a permitir a apreciação de
exceções dilatórias ou o conhecimento, no todo ou em parte, do mérito da causa no
despacho saneador (590º, n. 3 CPC) (ex. procuração em caso de constituição
obrigatória de mandatário, certidão do casamento na ação de divórcio, etc.).

23
3.1.2 Despacho saneador
De acordo com o artigo 595º CPC, o despacho saneador destina-se a:
- al. a): Conhecer das exceções dilatórias e nulidades processuais que hajam sido
suscitadas pelas partes ou que deva apreciar oficiosamente.
- al. b): Conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo
permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos
pedidos deduzidos ou de alguma exceção perentória.

Nota fundamental:
Se, na fase intermédia, o juiz conhecer de exceções dilatórias ou de nulidades
processuais insanáveis ou sanáveis mas não-sanadas ou conhecer de exceções
perentórias e puser termo à causa através do proferimento de um despacho saneador
que determine a absolvição do réu da instância, a absolvição do réu do pedido ou a
procedência do pedido, diz-se que ocorre um julgamento antecipado da lide (a causa
termina antecipadamente, pois se seguisse o curso normal só terminaria na fase da
sentença). A este propósito, há que estabelecer a seguinte distinção:
- Caso julgado formal (595º, n. 3 CPC, conjugado com o artigo 620º CPC): O
despacho saneador que não se pronuncie sobre o mérito da causa, dando lugar à
absolvição do réu da instância, uma vez transitado em julgado (628º CPC), forma
caso julgado formal. Isto significa que a questão não pode voltar a ser discutida
naquele processo e a decisão proferida não vincula outro tribunal numa causa em
que se suscite idêntica questão.
-» Exemplo: Imagine-se que A intentou uma ação de condenação contra B. O
tribunal considerou A parte ilegítima e absolveu B da instância. Neste caso, A pode
intentar uma ação idêntica, sendo o tribunal livre de apreciar a legitimidade
processual de A.
- Caso julgado material (595º, n. 3 CPC, conjugado com o artigo 619º CPC): O
despacho saneador que se pronuncia sobre o mérito da causa, dando lugar à
absolvição do réu do pedido ou à procedência do pedido, uma vez transitada em
julgado (628º CPC), forma caso julgado formal. Isto significa que a questão não
pode voltar a ser discutida naquele, nem noutro processo e a decisão proferida
vincula outro tribunal numa ação em que se suscite idêntica questão, sob pena da
ocorrência da exceção dilatória do caso julgado (577º, al. i) CPC).
-» Exemplo: A intenta ação de cobrança de dívida, tendo B, na contestação,
invocado a prescrição. O tribunal considerou que a dívida prescreveu e absolveu B
do pedido. Neste caso, A não pode intentar uma ação idêntica, sob pena de ocorrer a
exceção dilatória do caso julgado.
3.1.3 Despacho que identifica o objeto do litígio e enuncia os temas da prova
De acordo com o artigo 591º, n. 1, al. f) CPC, conjugado com o artigo 596º CPC, o juiz
pode proferir um despacho que identifica o objeto do litígio e enuncia os temas da prova
(matéria controvertida cuja verificação será necessário demonstrar através dos meios de
prova).
3.2 Alteração do requerimento probatório
Na fase intermédia, o juiz pode proferir um despacho que identifica o objeto do litígio e
enuncia os temas da prova (596º CPC). Através desse despacho, as partes (autor e réu)
ficam cientes da matéria cuja verificação ainda é necessário demonstrar através dos
meios de prova, podendo aperceber-se que não indicaram aqueles que seriam os mais
adequados para esse efeito. Sendo assim, a lei permite-lhes alterar os requerimentos

24
probatórios apresentados nos articulados, ou seja, na petição inicial (552º, n. 6 CPC) e
na contestação (572º, al. d) CPC), respetivamente (598º CPC).

Nota fundamental:
Existem factos que podem considerar-se assentes: os factos confessados (356º, n. 1
CC), os factos documentalmente provados (423º, n. 1 CPC) e os factos admitidos
por acordo (574º, n. 2 CPC e 587º, n. 1 CPC).

3.3 Audiência prévia


3.3.1 Realização da audiência prévia
De acordo com o artigo 591º, n. 1 CPC, a audiência prévia, quando se realize, destina-
se a:
- al. a): Realizar tentativa de conciliação (594º CPC).
- al. b): Facultar às partes, ao abrigo do princípio do contraditório (3º, n. 3 CPC), a
discussão de facto e de direito, nos casos em que ao juiz cumpra apreciar exceções
dilatórias ou quando tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito
da causa (ou seja, no despacho saneador (595º, n. 1, al. b) CPC)).
-» Exemplo: A intenta uma ação contra B. B, na contestação, alega um conjunto de
exceções dilatórias, mas esquece-se de invocar a incompetência absoluta do tribunal.
Sendo esta exceção dilatória de conhecimento oficioso, tal dá lugar à absolvição do réu
da instância. Contudo, de acordo com o princípio do contraditório – para que o juiz não
tome uma decisão sem que as partes sejam informadas/ouvidas –, o juiz convoca uma
audiência prévia para facultar às partes a discussão de facto.
- al. c): Discutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e
suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda
subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate.
- al. d): Proferir despacho saneador (595º CPC).
- al. e): Proferir despacho de adequação e simplificação processuais.
- al. f): Proferir despacho que identifica o objeto do litígio e enuncia os temas da
prova (596º CPC) e decidir as reclamações deduzidas pelas partes.
- al. g): Proferir despacho de programação da audiência final.
3.3.2 Não-realização da audiência prévia
De acordo com o artigo 592º CPC, a audiência prévia não se realiza:
- al. a): Nas ações não-contestadas que tenham prosseguido em obediência ao disposto
nas alíneas b) a d) do artigo 568º CPC (revelia inoperante)
- al. b): Quando, havendo o processo de findar no despacho saneador pela procedência
de exceção dilatória, esta já tenha sido debatida nos articulados.
Apesar de não se realizar a audiência prévia, a restante atividade do juiz mantém-se,
podendo proferir os despachos previstos nos artigos 590º, n. 2 CPC e 593º, n. 2 CPC.
3.3.3 Dispensa da audiência prévia
De acordo com o artigo 593º, n. 1 CPC, nas ações que hajam de prosseguir, o juiz pode
dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins
indicados no artigo 591º, n. 1, als. d), e) e f) CPC. Sendo dispensada a audiência prévia,
nos 20 dias subsequentes ao termo dos articulados, o juiz pode proferir os despachos
elencados no artigo 593º, n. 2 CPC (despacho saneador, despacho de adequação e
simplificação processuais, despacho que identifica o objeto do litígio e enuncia os temas
da prova, despacho de programação da audiência final). Notificadas as partes, se alguma
delas pretender reclamar dos despachos previstos nas alíneas b) a d) daquele número,
pode requerer, no prazo de 10 dias, a realização de audiência prévia (593º, n. 3 CPC).

25
4. Atividade instrutória
A atividade instrutória (410º a 526º CPC) envolve a recolha de elementos necessários
para a prova de matéria controvertida, a sua admissão e a sua produção propriamente
dita perante o tribunal, iniciando-se na fase dos articulados (552º, n. 6 CPC e 572º, al.
d) CPC) e terminando na fase da audiência final (604º CPC). A este propósito, importa
estabelecer a seguinte distinção:
- Prova pré-constituída: As provas pré-constituídas são aquelas que já existem antes
do processo (ex. prova documental).
- Prova constituenda: As provas constituendas são aquelas que se formam no decurso
do processo (ex. depoimento de parte, prova pericial, prova por inspeção judicial, prova
testemunhal).
No que diz respeito à tipicidade de meios de prova, a lei civil e processual portuguesa
preveem vários meios de prova, estando uns regulados no Código Civil e outros no
Código de Processo Civil. No que diz respeito à apreciação do valor de cada um desses
meios de prova, vigora o artigo 607º, n. 5 CPC que consagra o princípio da livre
apreciação da prova, de acordo com o qual, na fase da sentença, o juiz deve conferir a
cada meio de prova o respetivo valor no apuramento da verdade dos factos,
especificando os critérios da experiência e razões lógicas que o levaram a considerar um
facto provado e outro não. O princípio da livre apreciação da prova conhece, todavia,
alguns desvios (prova documental, depoimento de parte que consubstancia confissão,
declarações de parte que consubstanciam confissão).
→ Em caso de dúvida acerca da verificação de determinado facto após a produção de
prova, o juiz deverá recorrer às regras do ónus de prova previstas no Código Civil.
4.1 Meios de prova
Os meios de prova são os instrumentos através dos quais o juiz apura a realidade dos
factos controvertidos:
1) Prova documental (362º a 387º CC e 423º a 451º CPC):
De acordo com o artigo 362º CC, prova documental é a que resulta de documento. Esta
noção oferecida pelo preceito civil é uma noção demasiado ampla, devendo entender-se
que prova documental é a que resulta de documento escrito.
O documento escrito tanto pode ser autêntico, como particular (simples ou autenticado)
(363º CC). Os documentos escritos fazem prova plena de determinados factos (371º
CC, 376º CC e 377º CC), só podendo a sua força probatória ser ilidida mediante a
arguição e prova da falsidade do documento (446º a 449º CPC).
Nota fundamental:
A prova documental tem um valor probatório previsto na lei, sendo uma exceção ao
princípio da livre apreciação da prova (607º, n. 5 CPC).
2) Depoimento de parte (352º a 361º CC e 452º a 465º CPC):
De acordo com o artigo 452º CPC, o juiz, ao abrigo do princípio do inquisitório (411º
CPC), ou qualquer uma das partes, ao abrigo do princípio da cooperação (7º, n. 1
CPC), pode chamar a outra parte a prestar depoimento, informações ou esclarecimentos
sobre determinados factos.
Através do depoimento de parte, poder-se-á chegar à confissão (reconhecimento que a
parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária
(352º CC)). Esta confissão, quando é reduzida a escrito, faz prova plena de

26
determinados factos (358º CC), só podendo a sua força probatória ser ilidida em termos
restritos (359º CC).
Nota fundamental:
O depoimento de parte que consubstancie confissão tem um valor probatório
previsto na lei, sendo uma exceção ao princípio da livre apreciação da prova (607º,
n. 5 CPC). O depoimento de parte que não consubstancie confissão está sujeito a
este princípio.
3) Declarações de parte (466º CPC):
De acordo com o artigo 466º CPC, qualquer uma das partes pode requerer ao tribunal
que seja ouvida sobre factos em que tenha intervindo pessoalmente ou de que tenha
conhecimento direto.
Através das declarações de parte, poder-se-á chegar à confissão (reconhecimento que a
parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária
(352º CC)). Esta confissão, quando é reduzida a escrito, faz prova plena de
determinados factos (358º CC), só podendo a sua força probatória ser ilidida em termos
restritos (359º CC).
Notas fundamentais:
1. Em regra, os meios de prova devem ser requeridos no final da petição inicial. No
entanto, as declarações de parte podem ser requeridas até ao início das alegações
orais na audiência final (466º CPC, conjugado com o artigo 604º, n. 3, al. e) CPC).
2. As declarações de parte que consubstanciem confissão têm um valor probatório
previsto na lei, sendo uma exceção ao princípio da livre apreciação da prova (607º,
n. 5 CPC). As declarações de parte que não consubstanciem confissão estão sujeitas
a este princípio.

4) Prova pericial (388º a 389º CC e 467º a 489º CPC):


De acordo com o artigo 388º CC, a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação
de determinados factos que exigem conhecimentos especiais (técnicos, científicos,
artísticos) que não estão na esfera de competência do juiz ou quando os factos, relativos
a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial. As perícias são requeridas por
qualquer uma das partes ou determinada oficiosamente pelo juiz e é requisitada pelo
tribunal a estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado ou, quando tal não
seja possível ou conveniente, realizada por um único perito, nomeado pelo juiz de entre
pessoas de reconhecida idoneidade e competência na matéria em causa (falando-se de
perícia singular) (467º, n. 1 CPC) ou por mais do que um perito, até ao número de três
(falando-se de perícia colegial) (468º, n. 1 CPC).
O resultado da perícia é chegado ao juiz através de um relatório pericial, no qual o
perito ou os peritos se pronunciam fundamentadamente sobre o respetivo objeto (484º
CPC), sendo que o juiz pode ordenar, ou qualquer uma das partes pode requerer, que os
peritos compareçam na audiência final, a fim de prestarem, sob juramento, os
esclarecimentos que lhes sejam pedidos (486º CPC).
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 389º CC, a força probatória do relatório pericial é fixada
livremente pelo tribunal, estando sujeita ao princípio da livre apreciação da prova
(607º, n. 5 CPC).

27
5) Prova por inspeção judicial (390º a 391º CC e 490º a 493º CPC):
De acordo com o artigo 390º CC, a prova por inspeção judicial tem por fim a perceção
direta de determinados factos pelo tribunal que, sempre que o julgue conveniente, pode,
por sua iniciativa ou por requerimento das partes, inspecionar coisas ou pessoas,
podendo deslocar-se ao local da questão ou mandar proceder à reconstituição dos factos,
quando o entender necessária (490º CPC).
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 391º CPC, a força probatória do resultado da inspeção
judicial é fixada livremente pelo tribunal, estando sujeita ao princípio da livre
apreciação da prova (607º, n. 5 CPC).

6) Verificações não-judiciais qualificadas (494º CPC):


De acordo com o artigo 494º, n. 1 CPC, sempre que seja legalmente admissível a
inspeção judicial, mas o juiz entenda que se não justifica, face à simplicidade da
atividade e à natureza da matéria, a perceção direta de determinados factos pelo
tribunal, pode ser incumbido técnico ou pessoa qualificada de proceder aos atos de
inspeção de coisas ou locais ou de reconstituição de factos e de apresentar o seu
relatório.
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 494º, n. 2 CPC, a força probatória do relatório é fixada
livremente pelo tribunal, estando sujeita ao princípio da livre apreciação da prova
(607º, n. 5 CPC).

7) Prova testemunhal (392º a 396º CC e 495º a 526º CPC):


De acordo com os artigos 495º CPC e 496º CPC, têm capacidade para depor como
testemunhas todos aqueles que tiverem aptidão mental para depor sobre determinados
factos que constituam objeto da prova, estando impedidos de depor como testemunhas
os que na causa possam depor como partes. Em regra, as testemunhas depõem na
audiência final, presencialmente ou através de teleconferência, exceto nos casos
seguintes (500º CPC):
- al. a): Inquirição antecipada.
- al. d): Impossibilidade de comparência no tribunal.
- al. f): Depoimento prestado por escrito.
→ Quando haja contradição entre os depoimentos das testemunhas ou entre eles e o
depoimento de parte acerca de determinado facto, dever-se-á recorrer à acareação (523º
e 524º CPC).
→ Quando uma parte alega qualquer circunstância capaz de abalar a credibilidade do
depoimento de uma testemunha, quer por afetar a razão da ciência invocada pela
testemunha (ex. A parte contra a qual foi produzida a testemunha alega que a
testemunha se encontrava em Paris no dia em que ela afirmou ter presenciado certo
facto em Lisboa), quer por diminuir a fé que ela possa merecer (ex. A parte contra a
qual foi produzida a testemunha tem interesse no litígio, é amigo ou parente da
contraparte, etc.) ocorre a contradita (521º e 522º CPC).

Nota fundamental:
De acordo com o artigo 396º CC, a força probatória do depoimento testemunhal é
fixada livremente pelo tribunal, estando sujeita ao princípio da livre apreciação da
prova (607º, n. 5 CPC).

28
8) Prova por presunção:
De acordo com o artigo 349º CC, presunções são ilações que a lei (presunções legais)
ou o juiz (presunções judiciais) tira de um facto conhecido para firmar um facto
desconhecido.
4.2 Princípios do Direito Probatório
1) Princípio do inquisitório: De acordo com o artigo 411º CPC, incumbe ao juiz
realizar ou ordenar todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa
composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
2) Princípio da aquisição processual: De acordo com o artigo 413º, primeira parte
CPC, no momento da decisão sobre a matéria de facto, o tribunal deve tomar em
consideração todos os meios de prova, sendo indiferente quem os apresentou ou
requereu.
-» Exemplo: Imagine-se que o autor A requereu o depoimento de uma testemunha G.
Ao prestar o seu depoimento, G presta um depoimento totalmente desfavorável a A. Ao
abrigo do princípio da aquisição processual, a partir do momento em que se produziu a
prova, o autor A não pode prescindir do meio de prova requerido.
3) Princípio da audiência contraditória: De acordo com o artigo 415º CPC, não são
admitidas nem produzidas provas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de
ser opostas. Ao abrigo deste princípio, garante-se a cada uma das partes o direito de se
pronunciar sobre as provas apresentadas pela parte contrária.
-» Quanto às provas pré-constituídas, a parte tem a possibilidade de impugnar a
admissibilidade do meio de prova e a sua força probatória.
-» Quando às provas constituendas, a parte é notificada para intervir em todos os atos
de preparação e produção da prova.
Nota fundamental:
O princípio da audiência contraditória é a concretização do princípio do
contraditório (3º, n. 3 CPC) em matéria de prova.

4) Dever de cooperação para a descoberta da verdade: De acordo com o artigo 417º,


n. 1 CPC, todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua
colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado,
submetendo-se às inspeções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando
os atos que forem determinados. Em caso de incumprimento do dever de cooperação
para a descoberta da verdade, aplica-se os seguintes artigos:
- 417º, n. 2, primeira parte CPC: A parte ou os terceiros que se recusam a cumprir
o dever de cooperação para a descoberta da verdade são condenados em multa, sem
prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis (ex. 433º e 434º CPC relativamente
à prova documental; 508º, n. 4 CPC relativamente à prova testemunhal). A parte que
se recusa a cumprir o dever de cooperação para a descoberta da verdade, com dolo ou
negligência grave, é considerada litigante de má-fé, sendo condenada em multa e numa
indemnização à parte contrária, se esta a pedir (542º CPC).
- 417º, n. 2, segunda parte CPC: Quando a parte se recuse a cumprir o dever de
cooperação para a descoberta da verdade, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa
para efeitos probatórios, podendo determinar uma inversão do ónus da prova se a parte-
recusante tiver culposamente tornado impossível a prova do facto (344º, n. 2 CC).
-» Exemplo: Imagine-se que A intenta uma ação contra B, alegando os factos
constitutivos do direito que visa fazer valer. Sobre A recai um ónus da prova desses
factos, sendo que, em caso de dúvida acerca da verificação dos mesmos, o juiz irá

29
proferir uma decisão que lhe será desfavorável. Acontece que B não colabora para a
descoberta da verdade. Neste caso, o juiz pode determinar uma inversão do ónus da
prova que passa a recair sobre B, devendo este provar que os factos constitutivos
alegados por A não se verificam.
De acordo com o artigo 417º, n. 3 CPC, a recusa de cumprir o dever de cooperação para
a descoberta da verdade é, porém, legítima se a obediência a esse princípio importar:
a) Violação da integridade física ou moral das pessoas.
b) Intromissão na vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência ou nas
telecomunicações.
c) Violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado.
Nota fundamental:
O dever de cooperação para a descoberta da verdade é a concretização do princípio
da cooperação (7º, n. 1 CPC) em matéria de prova.

5) Princípio do valor extraprocessual da prova: De acordo com o artigo 421º, n. 1


CPC, os depoimentos, as perícias e as verificações não-judiciais qualificadas
produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados
noutro processo contra a mesma parte. Se, porém, o regime de produção da prova do
primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos,
as perícias e as verificações judiciais não-qualificadas produzidos no primeiro só valem
no segundo como princípio de prova. Isto significa que tais meios de prova não podem
valer por si só para fundamentar a realidade dos factos, tendo de ser corroborados por
outra prova produzida no segundo processo.
6) Antecipação da produção da prova: De acordo com os artigos 419º e 420º CPC,
havendo justo receio de vir a tornar-se impossível ou muito difícil o depoimento de
certas pessoas (depoimento de parte, depoimento testemunhal) ou a verificação de
certos factos por meio de perícia ou inspeção judicial/verificação não-judicial
qualificada, pode o depoimento, a perícia ou a inspeção realizar-se antecipadamente (ou
seja, antes da audiência final) e até antes de ser proposta a ação.

5. Fase da audiência final


A fase da audiência final é a terceira fase do processo comum (599º a 606º CPC) e
decorre perante um único juiz (599º CPC) nos termos do artigo 604º CPC:
1) Na fase da audiência final, o juiz procura conciliar as partes, se a ação não versar
sobre uma situação jurídica indisponível (ação cuja constituição ou extinção está
subtraída à vontade das partes) (604º, n. 2 CPC).
2) Na fase da audiência final, produz-se a prova que ainda não tenha sido produzida.
Assumem enorme relevância o princípio da imediação – o juiz deve ter um contacto
direto e pessoal com as coisas e as pessoas que servem de fonte da prova para que forme
uma convicção fundamentada acerca da realidade dos factos –, o princípio da oralidade
– a prova, em regra, deve ser produzida de forma oral –, o princípio da plenitude da
assistência do juiz – a sentença só pode ser proferida pelo juiz que assistiu aos atos de
instrução e de discussão praticados na audiência final (605º CPC) – e o princípio da
publicidade na audiência final – a audiência, em regra, é pública (606º, n. 1 CPC).
3) Na fase da audiência final, os advogados expõem as conclusões, de facto e de direito,
que tenham extraído da prova produzida, podendo cada advogado replicar uma vez – as
alegações orais (604º, n. 3, al. d) CPC).

30
6. Fase da sentença
A fase da sentença é a última fase do processo comum (607º a 626º CPC). Encerrada a
audiência final, o processo é concluso ao juiz para ser proferida sentença no prazo de 30
dias (607º, n. 1, primeira parte CPC). A sentença é um ato complexo, constituído pelo
relatório (1), pela fundamentação de facto e de direito (2) e pelo dispositivo (3).
1) Relatório: A sentença começa por identificar as partes e o objeto do litígio e por
enunciar as questões que ao tribunal cumpre solucionar (607º, n. 2 CPC e 608º CPC).
De acordo com o artigo 608º, n. 2 CPC, o juiz deve conhecer de todas as questões
suscitadas pelas partes, assim como daquelas que sejam de conhecimento oficioso.
- Excesso de pronúncia: Se o juiz conhecer de questões que não lhe é permitido
conhecer, a sentença é nula por excesso de pronúncia (615º, n. 1, al. d), segunda parte
CPC).
-» Exemplo: Imagine-se que o réu, na contestação, não invocou a prescrição do
direito alegado pelo autor na petição inicial, mas o juiz conheceu dela oficiosamente.
Neste caso, a prescrição é uma exceção perentória que não é de conhecimento oficioso
(303º CC), devendo ter sido invocada pelo réu. Logo, a sentença proferida pelo juiz é
nula por excesso de pronúncia.
- Omissão de pronúncia: Se o juiz não conhecer de questões que devesse conhecer, a
sentença é nula por omissão de pronúncia (615º, n. 1, al. d), primeira parte CPC).
-» Exemplo: Imagine-se que o réu, na contestação, invocou a sua ilegitimidade
processual e o juiz não se pronunciou sobre tal exceção dilatória. Logo, a sentença
proferida pelo juiz é nula por omissão de pronúncia.
- Violação do princípio do pedido: Se o juiz condenar em quantidade superior ou em
objeto diverso do pedido, a sentença é nula por violação do princípio do pedido (609º,
n. 1 CPC, conjugado com o artigo 615º, n. 1, al. e) CPC).

Nota fundamental:
De acordo com o artigo 615º, n. 4 CPC, a nulidade da sentença só pode ser arguida
perante o tribunal que proferiu a sentença se não admitir recurso. Se a sentença
admitir recurso, a nulidade da sentença deve ser arguida no próprio recurso.
2) Fundamentação de facto e de direito: Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz
discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas
jurídicas correspondentes (607º, n. 3, primeira parte CPC).
De acordo com o artigo 607º, n. 4 CPC, na fundamentação de facto, o juiz declara quais
os factos que julga provados e quais os que julga não-provados, analisando criticamente
as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os
demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção. Em caso de dúvida
acerca da verificação de determinado facto após a produção de prova, o juiz deverá
recorrer às regras do ónus de prova previstas no Código Civil:
1. Regra-geral: A prova dos factos constitutivos do direito alegado pelo autor na
petição inicial recai sobre o autor (342º, n. 1 CC). Sendo assim, em caso de dúvida
acerca da verificação desses factos, o juiz decidirá desfavoravelmente ao autor. A prova
dos factos impeditivos, modificativos e extintivos do direito invocado pelo autor na
petição inicial recai sobre o réu (342º, n. 2 CC). Sendo assim, em caso de dúvida acerca
da verificação desses factos, o juiz decidirá desfavoravelmente ao réu.
2. Desvios à regra-geral: A regra-geral conhece dois desvios:
- Nas ações de simples apreciação negativa, o ónus da prova dos factos constitutivos
recai sobre o réu (343º, n. 1 CC). Sendo assim, em caso de dúvida acerca da verificação

31
desses factos, o juiz decidirá desfavoravelmente ao réu.
- Quando a parte tiver culposamente tornado impossível a prova do facto à parte
sobre a qual recai o ónus da prova, inverte-se o ónus da prova, devendo o juiz decidir
desfavoravelmente àquela parte (344º, n. 2 CC).
Depois, o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo,
provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a
matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela
lei ou por regras de experiência.
- Falta de fundamentação de facto/de direito: A falta de fundamentação de facto e/ou de
direito gera a nulidade da sentença (615º, n. 1, al. b) CPC).
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 615º, n. 4 CPC, a nulidade da sentença só pode ser arguida
perante o tribunal que proferiu a sentença se não admitir recurso. Se a sentença
admitir recurso, a nulidade da sentença deve ser arguida no próprio recurso.

3) Dispositivo: Conclui-se pela decisão final (607º, n. 3, segunda parte CPC). A


decisão final deve constituir a consequência lógica das fundamentações de facto e de
direito. Sendo assim, quando os fundamentos de facto e de direito estejam em oposição
com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão
ininteligível, a sentença é nula (615º, n. 1, al. c) CPC).
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 615º, n. 4 CPC, a nulidade da sentença só pode ser arguida
perante o tribunal que proferiu a sentença se não admitir recurso. Se a sentença
admitir recurso, a nulidade da sentença deve ser arguida no próprio recurso.

A propósito do dispositivo, importa estabelecer a seguinte distinção:


- Caso julgado formal (620º CPC): A sentença que não se pronuncia sobre o mérito da
causa, dando lugar à absolvição do réu da instância, uma vez transitada em julgado
(628º CPC), forma caso julgado formal. Isto significa que a questão não pode voltar a
ser discutida naquele processo e a decisão proferida não vincula outro tribunal numa
causa em que se suscite idêntica questão.
- Caso julgado material (619º CPC): A sentença que se pronuncia sobre o mérito da
causa, dando lugar à absolvição do réu do pedido ou à procedência do pedido, uma vez
transitada em julgado (628º CPC), forma caso julgado formal. Isto significa que a
questão não pode voltar a ser discutida naquele, nem noutro processo e a decisão
proferida vincula outro tribunal numa causa em que se suscite idêntica questão, sob
pena da ocorrência da exceção dilatória do caso julgado (577º, al. i) CPC).

32

Você também pode gostar