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ATLS – ATENDIMENTO INICIAL Capítulo

AO POLITRAUMATIZADO 1

importância/prevalência

O QUE VOCÊ PRECISA SABER?

u O atendimento inicial ao politraumatizado é composto pela avaliação de diversos parâmetros da vítima.


O ABCDE e o AMPLA são dois mnemônicos que ajudam a lembrar de todos esses parâmetros e da ordem
correta em que devem ser avaliados.
• A: Permeabilidade das vias aéreas e imobilização da coluna cervical.
• B: Ventilação
• C: Choque
• D: Neurológico (Glasgow, pupilas e déficits)
• E: Exposição – despir o paciente, avaliar e classificar lesões e prevenir hipotermia

• A: Alergias
• M: Medicamentos
• P: Passado médico/prenhez (avaliar antecedentes pessoais e risco de gestação)
• L: Líquidos e alimentos ingeridos recentemente
• A: Ambiente relacionado ao trauma e mecanismo de trauma

u No trauma, não se esqueça de saber as peculiaridades dos atendimentos de crianças. Ainda que os parâ-
metros e a ordem se mantenham, existem algumas diferenças no manejo e na correção de alterações
decorrentes do trauma.

Quando a equipe de atendimento médico finalmente che-


   BASES DA MEDICINA gou ao local, a inexperiência e os distúrbios na abordagem
dos profissionais impressionaram o dr. Styner, deixando
clara a inabilidade do hospital diante de um tratamento
O protocolo ABCDE do trauma, hoje amplamente conhe-
de vítimas de acidentes. A tragédia só não foi maior
cido e tido como uma das principais práticas de primeiros
porque, apesar do tempo de espera, tanto Styner quanto
socorros a vítimas politraumatizadas, nasceu de uma
seus filhos foram salvos. Mas o episódio mudou a vida
tragédia, assim como muitas das descobertas médicas.
do médico para sempre: ele passou a buscar alternativas
O fato ocorreu em 1976, quando o dr. James K. Styner, um para a abordagem do traumatizado. Ficou claro que algo
ortopedista de Nebraska, e sua família sofreram um grave deveria ser feito.
acidente aéreo em seu avião particular. A queda ocorreu
Com um colega de trabalho, o dr. Paul Collicott, Styner
em uma área rural; a violência do impacto foi tamanha,
deu início a um programa de otimização da abordagem ao
que fez com que sua esposa morresse imediatamente e
politraumatizado – o que mais adiante se tornaria o proto-
três de seus quatro filhos sofressem graves ferimentos.
colo ABCDE do trauma, conhecido por nós, cujo objetivo
Sem ninguém por perto e em busca de socorro, Styner principal é reduzir os índices de mortalidade e morbidade
acenou para um carro que passava em uma estrada de vítimas de qualquer tipo de trauma. O American College
próxima e pediu para que seus filhos fossem levados ao of Surgeons editou o protocolo e o publicou como ATLS®.
hospital o mais rápido possível. Infelizmente, assim que Foi o início de uma mudança radical na abordagem ao
chegaram lá, o local estava fechado; o médico e seus filhos politraumatizado e que em pouco tempo passaria a ser
tiveram que esperar mais de dez horas para ser atendidos. adotada por vários países ao redor do mundo.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

Foto do avião pilotado pelo dr. Styner, em 1976. u 5,8 milhões de mortes/ano
u 12% dos gastos mundiais com saúde

Classicamente, a distribuição das mortes no trauma


é trimodal, isto é, a mortalidade ocorre em três
diferentes picos. Quase 50% dos óbitos ocorrem
na cena, logo após o acidente. Para esses casos, o
único tratamento é a prevenção. O segundo pico de
morte ocorre nas primeiras horas após o trauma e
é decorrente de lesões fatais, mas potencialmente
tratáveis, como pneumotórax, hemotórax, lesões
abdominais, hematomas intracranianos etc. Nós,
médicos, conseguimos salvar esses pacientes se
Dr. James K. Styner. agirmos de forma correta e precoce. O terceiro
momento ocorre dias ou meses após o trauma, geral-
mente por sepse e disfunção de múltiplos órgãos.
Com o avanço da Medicina e o melhor atendimento
ao paciente, essa curva tem se modificado e torna-
do-se bimodal. Isso é observado especialmente em
países desenvolvidos, nos quais há um sistema de
trauma bem-organizado. O gráfico abaixo facilita
nosso entendimento:

Figura 1. Note que o segundo pico da curva


trimodal tende a desaparecer. A linha representa
a mortalidade trimodal clássica, enquanto as
barras demonstram dados de 2010 nos EUA.

When I can provide better care in the field with limited


resources than what my children and I received at the
primary care facility 3/4 there, is something wrong with
the system, and the system has to be changed. – James
Styner, 1977.

Trauma, nos países ocidentais, é a terceira maior


causa de morte, perdendo para doenças cardiovas-
culares e cânceres. Quando consideramos apenas
a população menor de 45 anos, ele passa a repre-
sentar a primeira causa de morte. Desse modo,
afeta principalmente a população economicamente
ativa, trazendo consequências socioeconômicas
importantes, seja pelo óbito em si ou pela morbidade
(sequelas definitivas irreversíveis) que pode causar.
u 9 mortes/minuto por trauma ou violência Fonte: Modificado de Gunst.1

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

DICA 1. A – VIA AÉREA E


A sequência de tratamento do ATLS
sempre será a mesma. Primeiro, vamos tra- COLUNA CERVICAL
tar a maior ameaça à vida – por isso, sem-
pre, SEMPRE aplicaremos a sequência AB-
CDE, nessa ordem! Não há exceção. Você Primeiro, cuidamos da via aérea, porque é ela que
já deve estar cansado de escutar sobre o mata mais rapidamente! De nada adianta parar o
ABCDE do trauma, mas vamos reforçar aqui sangramento de ossos longos ou transfundir, se
a importância desse conteúdo. meu paciente está morrendo por hipóxia. Antes
da ausculta pulmonar, FAST, Glasgow ou qualquer
outro procedimento, temos que avaliar e garantir a
Quadro 1. Sequência de atendimento do ATLS.
permeabilidade da via aérea! Não interessa se há
fratura exposta de todos os membros e se o paciente
ATLS: ABCDE do trauma está chocado. O “A” vem antes do “C”. Agora você
A Airways Via aérea e coluna cervical deve estar pensando: “mas o ATLS não mudou para
X-ABCDE?”. A resposta é não! Falaremos sobre isso
B Breathing Ventilação e respiração
no final do capítulo.
C Circulation Circulação
Podemos assumir que pacientes que conseguem
D Disability Avaliação neurológica verbalizar, isto é, conversar, têm uma via aérea pérvia!
Exposição do doente e prevenção
E Exposure
de hipotermia
FLASHCARD
Fonte: Elaborado pelo autor.
Qual a prioridade no atendimento do paciente poli-
traumatizado?
Airways (Via Aérea e Coluna Cervical).
DICA
O atendimento inicial do politrau-
matizado consiste em uma rápida avalia-
É também nesse primeiro momento que precisa-
ção primária com o objetivo de identificar
e tratar imediatamente as situações com
mos garantir a proteção da coluna cervical! Muitos
risco de morte, não devendo ultrapassar 5 pacientes já chegam trazidos pelo resgate com colar
a 10 minutos. cervical em prancha rígida; caso isso não ocorra,
é sua obrigação estabilizar a cervical do paciente
(primeiro, de forma manual), até que alguém coloque
o colar cervical. Não confunda: nesse momento,
FLASHCARD devemos proteger a coluna cervical, mas não a
Qual a sequência de atendimento do paciente poli- avaliar. Não é agora que vamos palpar a coluna,
traumatizado? perguntar para o doente se ele tem dor ou buscar
• A – Via aérea + coluna cervical sinais de trauma raquimedular.
• B – Respiração
• C – Circulação
• D – Neurológico
• E – Exposição e prevenção de hipotermia

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

2. B – VENTILAÇÃO E RESPIRAÇÃO FLASHCARD

Quais as possíveis fontes de sangramento no trauma?


Tórax, abdome, pelve e retroperitônio, ossos longos
A permeabilidade da via aérea, por si só, não garante e chão (meio externo).
ventilação adequada. Uma troca adequada de gases
é necessária para que seja possível a oxigenação Nesse momento, avaliamos o estado hemodinâmico
e a eliminação de dióxido de carbono. Uma boa do nosso paciente (pressão arterial, frequência car-
ventilação exige um funcionamento adequado dos díaca, pulso e perfusão periférica). Após constatado
pulmões, da parede torácica e do diafragma. o choque, temos que:
u Buscar a fonte de sangramento
FLASHCARD
u Parar o sangramento
Quais diagnósticos potencialmente fatais podem ser
feitos e tratados no “B” da sequência?
u Repor o volume perdido
• Pneumotórax hipertensivo
• Lesão de árvore traqueobrônquica A hemorragia externa significativa deve ser tratada
• Hemotórax maciço por compressão manual direta. Os torniquetes são
• Pneumotórax aberto efetivos na exsanguinação em lesões de extremi-
• Tamponamento cardíaco
dades, mas podem causar lesão isquêmica (ficam
reservados para quando a compressão direta não é
O pescoço e o tórax devem ser expostos, a fim eficaz). Não devemos utilizar pinças hemostáticas,
de avaliar veias jugulares, posição da traqueia e pois elas podem causar lesões de nervos ou veias.
movimentos respiratórios. O exame físico do tórax é
essencial nesse momento, com inspeção, ausculta e Quadro 2. Possíveis fontes de sangramento no trauma.
percussão. É nessa etapa que fazemos diagnósticos
Possíveis fontes de sangramento no trauma
potencialmente letais, como pneumotórax hiperten-
sivo, lesão de árvore traqueobrônquica, hemotórax • Tórax
maciço e pneumotórax aberto. Além de fazer esses • Abdome
diagnósticos, devemos tratá-los imediatamente. • Pelve e retroperitônio
• Ossos longos
• “Chão”: meio externo
FLASHCARD
Fonte: Elaborado pelo autor.
Após constatado o choque, temos que:
Buscar a fonte de sangramento, parar o sangramento
e repor o volume perdido.
4. D – AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA

3. C – CIRCULAÇÃO A avaliação neurológica deve ser rápida e direcio-


nada!
u Escala de Coma de Glasgow
A hemorragia é a principal causa de morte pós-
u Pupilas: tamanho e reatividade
-traumática evitável, por isso temos que identificar
rapidamente um potencial sangramento, parar a u Sinais de lateralização (déficits motores, pares-
hemorragia e repor o volume perdido. Lembre-se tesias ou plegias)
sempre de que o principal tipo de choque no trauma
é o choque hemorrágico.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

Tabela 1. Escala de Coma de Glasgow. u Avaliação de reatividade pupilar


Escala de Coma de Glasgow W (2) Ambas as pupilas não reagem ao estímu-
lo de luz.
4 Espontânea
W (1) Uma pupila não reage ao estímulo de luz.
Abertura 3 Estímulo verbal
W (0) Nenhuma pupila fica sem reação ao estí-
Ocular 2 À pressão mulo de luz.
1 Ausente
Por exemplo: se o paciente apresenta um Glasgow
5 Orientado
8 (RM 3, RV 3 e AO 2) e não há reflexo fotomotor
4 Confuso bilateral, iremos subtrair 2 (8 − 2 = 6). Portanto,
Melhor
resposta 3 Palavras ECG-P = 6.
verbal
2 Sons
FLASHCARD
1 Ausente
Cite duas medidas obrigatórias no “E”.
6 Obedece ao comando Exposição completa do paciente e prevenção de hi-
potermia.
5 Localiza a dor
Melhor 4 Não localiza a dor (flexão normal)
resposta
motora 3 Decorticação (flexão anormal)
5. E – EXPOSIÇÃO (PREVENÇÃO
2 Decerebração (extensão anormal)
DE HIPOTERMIA)
1 Ausente

Melhor escore possível: 15 (O4 + V5 + M6)


A etapa final do ABCDE é exposição e aquecimento
Pior escore possível: 3
do ambiente (Exposure e Environment). Devemos
Fonte: Elaborada pelo autor. despir todo o paciente e examiná-lo da cabeça
aos pés, buscando lesões que podem ter passado
despercebidas até o momento.
DICA
A Escala de Coma de Glasgow (ECG)
Devemos rodar o paciente em monobloco, visando
baseia-se na abertura ocular, na resposta
verbal e na resposta motora. buscar lesões em dorso, nádegas e períneo. Lem-
bre-se: sempre temos que garantir a estabilidade
de coluna vertebral.
Em 2018 foi proposta uma atualização da escala de Após exposição completa do paciente e avaliação,
coma de Glasgow, na qual a reatividade pupilar entra devemos prevenir a hipotermia. A temperatura do
no cálculo. Mas tomem cuidado, ela NÃO substituiu ambiente deve ser controlada; o paciente precisa
a escala original e a edição mais recente do ATLS ser protegido com cobertores ou manta térmica.
(10ª edição, 2018) não cita essa nova escala! O pró- Lembre-se: a infusão de fluidos deve ser feita com
prio autor do estudo original escreve no artigo que soro previamente aquecido a 39 graus.
a nova escala (ECG-P: escala de coma de Glasgow Também nessa etapa podemos realizar algumas
pupilar) não deve substituir a escala clássica, mas partes do exame físico ainda não realizadas, além
sim adicionar informações e que ambas deverias de passar sondas.
ser registradas em prontuários!
A ECG-P varia de 1 – 15, pois devemos subtrair da FLASHCARD
escala original conforme os achados da reatividade
Contraindicação absoluta para passagem de SNG?
pupilar.
Fratura de base de crânio.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

Lembre-se: no caso de doentes politraumatizados, A edição mais recente do PHTLS (2018, 9ª edição)
o toque retal e vaginal faz parte do exame físico. introduziu um novo conceito, o X-ABCDE. A 10ª edi-
ção do ATLS (2018) somente menciona o X-ABCDE
Como o toque pode nos ajudar no trauma?
em um dos capítulos apêndices, quando se refere
u Sangramento: possibilidade de lesões de alças. ao ATLS-OE (U.S. Military’s Advanced Trauma Life
u Espículas ósseas: fratura de ossos pélvicos. Support for the Operational Environment). O ATLS-OE
u Tônus do esfíncter: hipotonia pode sugerir trau- é voltado para um ambiente operacional e hostil,
ma raquimedular. Em pacientes chocados, temos como a guerra.
que lembrar do choque neurogênico. Portanto, preste atenção e tome cuidado! A regra
u Altura da próstata (próstata móvel ou alta/cefa- para a prova e para a vida é o ABCDE. A VIA AÉREA
lizada): classicamente, esse achado pode signi- vem ANTES do sangramento na MAIORIA das vezes!
ficar lesão de uretra. Entretanto, a 10ª edição do
Afinal, o que é o X-ABCDE?
ATLS diz que a palpação da próstata não é um
sinal confiável de lesão prostática. u X – EXsanguinante
u A – Via aérea
O toque retal pode ser feito no C (Circulação), pois u B – Respiração
ajuda a diagnosticar possíveis causas de choque;
u C – Circulação
no D (Neurológico), visando avaliar tonalidade do
esfíncter; ou na fase final da avaliação (E). u D – Neurológico
u E – Exposição
A passagem da sonda vesical de demora pode ter
sido feita no C (avaliação da reposição volêmica),
O X refere-se a hemorragias exsanguinantes e MUITO
mas não é errado deixá-la para o E, ou até mesmo
severas, como sangramentos arteriais em jato ou
para a avaliação secundária.
maciços. Nesses casos EXCEPCIONAIS, a contenção
A passagem de sonda gástrica (nasogástrica ou da hemorragia externa grave deve ser realizada antes
orogástrica) também pode ser feita agora, tendo mesmo do manejo das vias aérea. Esse conceito
como objetivo esvaziar o estômago e prevenir a é válido para o atendimento pré-hospitalar e em
aspiração de conteúdo gástrico. cenários hostis.
Não se esqueça: nunca podemos passar sondas por
via nasal em pacientes com suspeita de fratura de
DICA
base de crânio: olhos de guaxinim, sinal de Battle, ATLS é ABCDE! Somente utilize o
rinorreia, otorreia, otorragia, rinorragia. Se fizermos conceito de XABCDE se o autor for muito
claro ao afirmar que há um sangramento
isso, podemos locar a sonda dentro do cérebro!
arterial ativo e incompatível com a vida!

6. X – XABCDE
O controle da hemorragia externa maciça pode ser
feito de duas maneiras:
Na abordagem inicial, deve ser dada ênfase à manu- u Compressão direta
tenção das vias aéreas, à estabilização da coluna u Torniquete (caso o sangramento seja em membros)
cervical, ao controle da hemorragia externa e à
imobilização do paciente para o transporte – neste
último caso, empregando uma prancha longa.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

6.1. TORNIQUETE Figura 2. Exemplo de compressão direta.

É uma ferramenta extremamente útil para sangra-


mentos importantes de membros, mas deve ficar
reservado a casos excecionais e muito graves. Não
há um tempo máximo para a utilização do dispo-
sitivo, mas sabe-se que, quanto maior o tempo de
uso, maior o risco de perda do membro. O torniquete
deve ser específico para tal procedimento, pois
garrotes improvisados dificilmente conseguem
vencer a pressão arterial e cessar o sangramento.

Fonte: American College of Surgeons Committee


on Trauma – Stop The Bleed.3

Figura 3. Utilização correta do torniquete.


(A) Colocação acima da lesão, nunca sobre ela.
(B) Gire o torniquete até a cessação completa do sangramento.
(C) Trave o torniquete.
(D) Anote o horário em que ele foi realizado.

Fonte: American College of Surgeons Committee on Trauma – Stop The Bleed.3

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

A radiografia cervical em perfil tem perdido muito


7. AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA espaço, em razão da maior disponibilidade de tomo-
grafias nos hospitais; contudo o RX cervical ainda
A avaliação secundária sempre deve ser realizada. pode ser muito útil – guarde essa informação!
Consiste em um exame minucioso, da cabeça aos Tenha em mente que nenhum exame ou procedi-
pés. Assim como na exposição, aqui podemos mento diagnóstico pode atrasar a reanimação do
realizar os toques retais ou vaginais e passar as paciente! Exames e procedimentos devem ser rea-
sondas (vesicais ou gástricas). lizados na sala de trauma, com aparelhos portáteis.

7.1. HISTÓRIA AMPLA FLASHCARD

Quais radiografias podem ser feitas no atendimen-


Para finalizar, guarde a regra da história Ampla! to inicial?
Esse mnemônico pode ser bastante útil no dia a dia, RX de tórax no leito (anteroposterior – AP) e Rx de
pelve no leito.
para obter a história do paciente vítima de trauma.

Quadro 3. História AMPLA.


   DIA A DIA MÉDICO
História Ampla

A Alergia XABCDE versus ABCDE. Em grandes centros de trauma,


M Medicamentos o atendimento do paciente politraumatizado é feito em
equipe; de forma ideal, cada médico é responsável por
P Passado médico/prenhez uma das letras do ABCDE – assim, o atendimento acaba
Líquidos e alimentos ingeridos recen- sendo simultâneo, e não sequencial, como na teoria. Se
L você estiver em um hospital menor e for o único médico
temente
do plantão, a sequência ABCDE deverá sempre ser res-
Ambiente relacionado ao trauma/meca- peitada – mas, claro, com bom senso!
A
nismo de trauma
Exemplo: chegou pela porta da emergência um adulto
Fonte: Elaborado pelo autor. gritando de dor e pedindo socorro, pois cortou a mão
com uma serra elétrica; o sangue está jorrando no teto,
direto da artéria radial. Fica óbvio que a prioridade, nesse
7.2. R ADIOGRAFIAS
paciente, é comprimir o ferimento que tem sangramento
arterial ativo (até porque ele está gritando e, portanto, sua
Precisamos solicitar duas radiografias básicas para via aérea está pérvia). Se esse mesmo paciente chegasse
todo paciente vítima de trauma: desacordado, poderíamos perder 5 segundos colocando
uma compressa sobre o sangramento e pedir para que
u RX de tórax no leito (anteroposterior – AP) a enfermeira ou o auxiliar de enfermagem mantivessem
u RX de pelve no leito a compressão local, enquanto avaliamos a via aérea e a
ventilação.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

TRAUMA PEDIÁTRICO

O trauma continua sendo a causa mais comum de Figura 4. Note que o grande occipício faz uma flexão
morte e de incapacitação na infância. passiva da cabeça e bloqueia a via aérea (a). Quando
colocamos um coxim abaixo de todo o torso da criança,
Na infância, a mortalidade por trauma é maior do permitimos o alinhamento e sua abertura (b).
que a mortalidade por todas as demais causas
juntas. A anatomia, a fisiologia e os mecanismos
de trauma causam padrões de lesões diferentes
daqueles causados nos adultos.
As principais causas de trauma na criança são:
u Acidente automobilístico
u Afogamento
u Incêndio
u Homicídio/Maus-tratos
u Queda: crianças pequenas (< de 2 meses) caem
do colo de pessoas. Já crianças acima dessa
idade tendem a cair de móveis.

A prioridade de atendimento continua sendo a


mesma aplicada ao adulto: sequência ABCDE, sem
exceções. Vamos lá.

1. A – VIA AÉREA Fonte: Harless.2

As alterações anatômicas são muito importantes 1.1. GUEDEL (CÂNULA OROFARÍNGEA)


nesse momento: a língua da criança é maior, assim
como suas tonsilas. Sua mandíbula é menor e a via Questão para a prova prática: a introdução da cânula
aérea é mais curta e mais estreita (forma de funil). de Guedel na criança deve ser cautelosa, e com sua
Fica fácil visualizar que sua via aérea tende a ser concavidade voltada para baixo (para a língua), pois
mais difícil, certo? a ponta da cânula pode lesar o palato (o palato duro
da criança ainda é mole!).
O grande occipício leva à flexão passiva da coluna
cervical e, consequentemente, ao fechamento da
via aérea. Para evitar esse cenário, devemos colocar 1.2. INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL (IOT)
um coxim abaixo de todo o torso da criança, pre-
servando o alinhamento neutro da coluna cervical. O risco de intubação seletiva em crianças é maior,
Quanto menor a criança, maior a desproporção pois sua traqueia é mais curta! Além disso, a obs-
entre o tamanho do crânio e a face, e maior o risco trução do tubo traqueal também é mais comum,
de obstrução da via aérea. visto que ele tem um calibre menor.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

A manutenção da via aérea e da ventilação é primor-


FLASHCARD
dial na criança, pois a hipóxia é a principal causa
Quais são as indicações de IOT em crianças?
de parada cardíaca evitável.
Parada cardiocirculatória; falha de manutenção de
via aérea pérvia com outros métodos; choque he- Além disso, a criança apresenta algumas altera-
morrágico, com necessidade de intervenção cirúrgi-
ca; coma; TCE grave.
ções anatômicas importantes. A parede torácica da
criança é mais mole: os ossos, por ainda não serem
completamente calcificados, são mais flexíveis, e
1.3. VIA AÉREA CIRÚRGICA fraturas são mais raras. Isso tem dois impactos
clínicos importantes:
A cricotireoidostomia cirúrgica é contraindicada u Fraturas de costelas indicam força significativa.
em lactentes e crianças (< 12 anos), visto que a u Crianças podem apresentar contusões pulmo-
cartilagem cricoide é o principal pilar da laringe nares graves, mesmo na ausência de fratura de
nessa idade. Em tais casos, devemos realizar cri- costelas.
cotireoidostomia por punção, ou traqueostomia.
Essa é uma das poucas indicações de traqueosto-
mia no trauma. 3. C – CIRCULAÇÃO

Cuidado! Crianças demoram para apresentar taqui-


2. B – VENTILAÇÃO
cardia e hipotensão (são sinais tardios de choque
hipovolêmico). Elas conseguem aguentar, sem gran-
des repercussões, sangramentos e insultos graves,
FLASHCARD por apresentarem uma resposta compensatória
Quando é contraindicada a cricotireoidostomia cirúr- vigorosa. Isso pode ser perigoso, porque elas não
gica em crianças? “avisam” ao médico que vão piorar: a piora é abrupta.
Em lactentes e crianças (< 12 anos), visto que a cartila-
gem cricoide é o principal pilar da laringe nessa idade.
Veja na Tabela 2 os valores normais dos sinais vitais,
pois eles diferem bastante dos adultos.

Tabela 2. Sinais vitais normais de acordo com a idade.

Faixa Etária
Sinal
0 – 12 meses 1 – 2 anos 3 – 5 anos 6 – 12 anos ≥ 13 anos

Frequência
< 160 < 150 < 140 < 120 < 100
Cardíaca (bpm)

Pressão Arterial
> 60 > 70 > 75 > 80 > 90
(mmHg)

Frequência
> 60 < 40 < 35 < 30 < 30
Respiratória (ipm)

Débito Urinário 2 mL/kg 1,5 mL/kg 1 mL/kg 1 mL/kg 0,5 mL/Kg


Fonte: Elaborada pelo autor.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

A reposição volêmica por acesso periférico continua


sendo a primeira opção, com solução isotônica 5. E – EXPOSIÇÃO
(soro fisiológico ou ringer lactato aquecido): 20 mL/
kg em bolus. Se ainda for necessária a reposição Assim como no adulto, a hipotermia é preocupante
volêmica após dois bolus de cristaloide, a transfusão na infância, pois afeta a atividade cardíaca e a
sanguínea está indicada. coagulação.
O acesso intraósseo (em fêmur distal ou tíbia proxi- A criança tem maior superfície corpórea em relação
mal) é uma alternativa a pacientes com impossibi- ao peso, e tem a cabeça maior (proporcionalmente)
lidade de acesso periférico (após duas tentativas). ao resto do corpo. Portanto, ela perde mais calor.
Além disso, tem a pele mais fina e menor isolamento
3.1. TRAUMA ABDOMINAL pelo tecido subcutâneo.

Na infância, ferimentos contusos são mais comuns


do que lesões penetrantes. A parede muscular é
mais mole e mais fina; o fígado e o baço são mais
baixos e não tão protegidos pelo arcabouço costal.
Portanto, não espere fratura de costelas baixas para
suspeitar de lesões desses órgãos.

FLASHCARD

Os ferimentos contusos são mais comuns do que le-


sões penetrantes na infância?
Correto.

4. D – NEUROLÓGICO

A Escala de Coma de Glasgow também pode ser


utilizada para crianças. Entretanto, para menores
de 4 anos, precisamos modificar os critérios da
resposta verbal.

Quadro 4. Escala Verbal Pediátrica (V-Score).

Escala verbal pediátrica (V-Score)

Palavras apropriadas ou riso social. Fixa o


5
olhar e segue com os olhos

4 Choro consolável

3 Irritação, choro persistente e gemente

2 Inquieto e agitado

1 Não responde
Fonte: Elaborado pelo autor.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

Mapa mental. ATLS – atendimento inicial ao politraumatizado

ATLS

Atendimento inicial ao
paciente vítima de trauma

Proteção da
A – Via aérea
coluna cervical

B – Respiração

C – Circulação

D - Neurológico

E – Exposição e
controle da hipotermia

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

REFERÊNCIAS

1. Gunst M, Ghaemmaghami V, Gruszecki A, Urban J, Frankel


H, Shafi S. Changing epidemiology of trauma deaths leads
to a bimodal distribution. Proc (Baylor Univ Med Cent).
2010; 23(4): 349-54.
2. Harless J, Ramaiah R, Bhananker SM. Pediatric airway
management. Int J Crit Ill Inj Sci. 2014; 4(Issue 1): 65-70.
3. American College of Surgeons – American College of
Surgeons. Advanced Trauma Life Support – ATLS. 10. ed.
Chicago: American College of Surgeons; 2018.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1 ⮩ Mortes por traumas hepáticos e esplênicos ocor-


rem no terceiro pico.
(HOSPITAL SÍRIO-LIBANÊS – SP – 2021) Um paciente de
40 anos, vítima de queda de paraquedas, é trans- ⮪ Morte por lesões viscerais associadas a perdas
ferido para o centro de trauma, devido a trauma sanguíneas significativas ocorrem principalmen-
raquimedular. Estável, tem nível sensitivo em T10. te no primeiro pico.
O esfíncter anal é hipotônico. Na palpação da co-
luna vertebral tem muita dor e um hematoma no
Questão 3
nível torácico baixo. A prancha rígida usada para o
transporte deve ser: (UDI HOSPITAL – MA – 2020) A avaliação primária do pa-
ciente politraumatizado deve ser realizada com base
⮦ retirada apenas após resultado da tomografia.
no ABCDE do trauma. Sobre a avaliação primária,
⮧ retirada apenas após a volta do reflexo bulbo- é correto afirmar:
cavernoso.
⮨ prontamente retirada, mantendo-se o paciente ⮦ O “D” é a etapa que abrange a avaliação neuro-
imobilizado e movimentando-se o mínimo pos- lógica, realizada com base na Escala de Coma
sível, sempre em monobloco. de Glasgow, por meio da qual é possível excluir
a hipoglicemia e a intoxicação como causas de
⮩ mantida até esclarecimento do diagnóstico, por
rebaixamento do nível de consciência.
ressonância nuclear magnética.
⮧ O “A” refere-se unicamente à avaliação e ao es-
⮪ mantida até a avaliação e liberação pela neuro-
tabelecimento da patência das vias aéreas, de
cirurgia.
forma que, quando o paciente consegue comu-
nicar-se verbalmente sem dificuldades com o
Questão 2 examinador, pode prontamente passar para o “B”.
⮨ O “B” refere-se à respiração e à ventilação, de
(HOSPITAL SÃO JOSÉ DO AVAÍ – 2017) De acordo com a dis-
forma que a presença de corpo estranho e de
tribuição trimodal das mortes por trauma, é COR-
secreções na cavidade oral deve ser corrigida
RETO afirmar que:
nessa etapa da avaliação primária.
⮦ Só a prevenção é capaz de reduzir significati- ⮩ No “C”, etapa referente à Circulação com Controle
vamente a mortalidade no primeiro pico, já que de Hemorragias, os fluidos devem ser adminis-
poucas vítimas podem ser salvas, devido à gra- trados criteriosamente, já que a ressuscitação
vidade das lesões. agressiva antes do controle do sangramento de-
⮧ Dentre as causas de morte no segundo pico, monstrou aumentar a mortalidade e a morbidade.
encontra-se a apneia por traumas cranianos ou ⮪ No “E”, pode-se lançar mão de aquecimento de
raquimedulares. fluidos e de hemocomponentes em aparelhos de
⮨ O primeiro pico é chamado de “hora ouro” do micro-ondas até a temperatura de 39 °C, com o
atendimento pós-trauma. intuito de evitar hipotermia.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

Questão 4 Questão 5

(FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS – 2017) O (FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA UNICAMP/SP – 2017)
trauma é, atualmente, a principal causa de morte Homem de 22 anos de idade perde o controle da
entre 1-44 anos de idade, desde o início da década motocicleta e colide contra um muro. É levado ao
de 1980. As consequências epidemiológicas variam prontoatendimento por transeuntes. Ao exame físi-
desde óbito até o tratamento médico e hospitalar e co, apresenta: vias aéreas com estridor respiratório,
pacientes evoluindo com incapacidades temporá- sangue em cavidade oral e fratura de mandíbula;
rias ou permanentes. A melhor maneira de se evitar frequência respiratória (FR) de 32 irpm; oximetria
essa morbimortalidade e esse gasto relacionado de pulso (ar ambiente) de 96%; tórax com murmú-
está na prevenção do trauma. A mortalidade no rio vesicular (MV) diminuído à esquerda, enfisema
trauma está diretamente relacionada com o tempo subcutâneo e crepitação no nível do quarto, quinto
e a gravidade da lesão, podendo ser caracterizada e sexto arcos costais; pressão arterial (PA) de 130
por um fenômeno tipicamente trimodal. A esse res- × 80 mmHg; frequência cardíaca (FC) de 120 bpm;
peito, indique a alternativa INCORRETA: abdome e pelve sem alterações; Focused Asses-
ment with Sonography for Trauma (FAST) negativo;
⮦ O primeiro pico de morte abrange os óbitos pra- neurológico – Escala de Coma de Glasgow (ECG) 7
ticamente irreversíveis, ocorrendo segundos ou e pupilas isofotorreagentes. A sequência adequada
minutos depois do trauma, como em TCE grave, das condutas é:
trauma raquimedular alto, afundamento maciço
de tórax e trauma de grandes vasos. ⮦ Cânula de Guedel, colar cervical, toracocentese
de alívio, via aérea definitiva.
⮧ O segundo pico de morte acontece entre mi-
⮧ Colar cervical, suplemento de oxigênio, via aérea
nutos a horas após o trauma, sendo as causas
definitiva, drenagem torácica.
mais comuns a insuficiência respiratória aguda
por obstrução de via aérea, hemo ou pneumo- ⮨ Colar cervical, aspiração da cavidade oral, más-
tórax, TRM com instabilidade cervical e choque cara laríngea, acesso venoso central.
hipovolêmico. ⮩ Aspiração da cavidade oral, acesso venoso, colar
⮨ O terceiro pico de morte ocorre dias até meses cervical, máscara de Venturi.
após o trauma, resultante de complicações e in-
tercorrências, como broncopneumonias, síndro- Questão 6
me da resposta inflamatória sistêmica, doenças
preexistentes agravadas pelo trauma e infecções. (UNICAMP/SP – 2018) Homem, 21a, é levado à Unida-
de de Pronto Atendimento após queda de uma
⮩ O objetivo do ATLS (Advanced Trauma Life Su-
viga de concreto sobre tórax. Exame físico: PA =
port) é centrado em prevenir óbito no segundo
100x70 mmHg, FC = 110 bpm, FR = 36 irpm, oximetria
pico das mortes por trauma; no primeiro pico,
de pulso (sob máscara de O2 15Lmin) = 89%; Tórax:
considerando-se a dificuldade de manter vivo
escoriações, hematomas e crepitação à palpação
um paciente grande traumatizado, pouco pode
à direita, movimento paradoxal, murmúrio vesicular
ser feito.
diminuído em base direita. Radiograma de tórax no
⮪ No método ATLS, pode-se tratar os traumati- leito: opacificação no terço médio e inferior direito
zados por padronização do atendimento, com e fraturas em dois pontos do quinto ao oitavo arcos
avaliação inicial paralela e simultânea aos pro- costais. A HIPÓXIA É CAUSADA POR:
cedimentos de reanimação; porém, o diagnós-
tico definitivo deve ser estabelecido logo no ⮦ Movimento paradoxal pelo retalho móvel.
primeiro momento. ⮧ Contusão pulmonar e dor pelas fraturas.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

⮨ Hipotensão arterial. Questão 9


⮩ Hemotórax à direita.
(GRUPO SANTA CASA DE MISERICÓRDIA – MG – 2020) Tendo
em vista os princípios da padronização do aten-
Questão 7 dimento inicial ao politraumatizado preconizados
pelo Suporte Avançado de Vida no Trauma (ATLS),
(HOSPITAL DE OLHOS DE CONQUISTA/BA – 2017) De acordo assinale a alternativa INCORRETA.
com o ATLS, aponte a alternativa que contém as
lesões potencialmente fatais, que devem ser obri- ⮦ Uma história inicial e detalhada não é essencial
gatoriamente reconhecidas já na avaliação primária. para iniciar a avaliação do paciente com lesões
agudas.
⮦ Pneumotórax, pneumotórax aberto, hemotórax,
⮧ A avaliação primária não deve ser repetida, e
ruptura esofágica e obstrução de via aérea.
deve ser seguida até o final, passando, a seguir,
⮧ Obstrução de via aérea, pneumotórax hiperten- à avaliação secundária.
sivo, pneumotórax aberto, tórax instável, hemo-
⮨ O paciente com maior ameaça à vida deve ser
tórax maciço e tamponamento cardíaco.
atendido primeiro.
⮨ Contusão cardíaca, lesão traqueobrônquica,
⮩ A falta de um diagnóstico definitivo não deve atra-
pneumotórax hipertensivo, pneumotórax aberto
sar a aplicação do tratamento urgente indicado.
e tórax instável.
⮩ Ruptura de aorta, contusão cardíaca, pneumo-
tórax aberto, pneumotórax hipertensivo e obs-
trução de via aérea.

Questão 8

(SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SP – 2020) Um jovem de 18


anos foi vítima de facada no epigástrio. Deu entrada
no centro de trauma hipotenso, com veias disten-
didas no pescoço. A ausculta pulmonar mostrou
murmúrio vesicular presente bilateralmente, ainda
que a ventilação fosse superficial. Sequência mais
apropriada de atendimento e tratamento:

⮦ Acesso venoso central – radiografia de tórax –


FAST (Focused Assessment with Sonography
for Trauma) – tipagem e prova cruzada para
transfusão sanguínea.
⮧ Intubação traqueal – acesso venoso – FAST (Fo-
cused Assessment with Sonography for Trauma)
– toracotomia.
⮨ Intubação traqueal – FAST (Focused Assessment
with Sonography for Trauma) – janela pericárdica.
⮩ Acesso venoso – transfusão sanguínea – peri-
cardiocentese.
⮪ Intubação traqueal – radiografia de tórax – FAST
(Focused Assessment with Sonography for Trau-
ma) – esternotomia mediana.

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

GABARITO E COMENTÁRIOS

Questão 1 dificuldade:  não sentem dor local no sacro e não sabem que
estão tendo necrose de pele e subcutâneo.
Alternativa A: INCORRETA. Já temos o diagnóstico
de lesão medular. O paciente tem déficit sensitivo, ✔ resposta: C
com dor e hematoma em região torácica baixa. A to-
mografia não vai alterar o manejo nesse momento:
Questão 2 dificuldade: 
o paciente deve manter decúbito dorsal horizon-
tal absoluto, com movimentação em monobloco, Comentário: A mortalidade trimodal do trauma é o
quando necessário. conceito de que existem três picos de incidência
Alternativa B: INCORRETA. Não precisamos aguardar de mortalidade decorrente do trauma. O primeiro,
o retorno do reflexo bulbocavernoso para retirar a que ocorre imediatamente após o trauma, deve-se
prancha, até porque ele pode ficar ausente por se- a lesões graves, como ruptura de aorta e lacera-
manas ou meses! Esse reflexo é de grande impor- ções do SNC. O atendimento médico, mesmo que
tância na avaliação dos pacientes com TRM que imediato, não consegue salvar essas vítimas, sendo
apresentam choque medular. O choque medular indicadas medidas de prevenção, com o objetivo de
pode ocorrer imediatamente após o traumatismo evitar que os acidentes aconteçam. Exemplo: lei
da medula espinhal, mesmo que a lesão medular seca, fiscalização de rodovias, medidas para edu-
não seja completa e permanente; nessa situação, o cação no trânsito. A “hora de ouro” é utilizada para
paciente apresenta ausência total da sensibilidade, designar a primeira hora que sucede um episódio de
dos seus movimentos e do reflexo bulbocarvenoso, trauma, e é de fundamental importância para menor
que normalmente está presente. O retorno desse mortalidade no atendimento ao paciente vítima de
reflexo, que pode ser obtido por meio da estimula- trauma. A hora de ouro coincide com o 2º pico de
ção do pênis ou clitóris, provocando contração do mortalidade, geralmente secundário a hemorragias,
esfíncter anal, indica o término do choque medular, pneumotoráx e hemotórax. Já o 3º pico é aquele
permitindo a determinação do déficit neurológico no qual a morte ocorre de dias a semanas, em ge-
após a lesão. ral após complicações intra-hospitalares (sepse,
Alternativa C: CORRETA. A prancha é instrumento de disfunção multiorgânica).
TRANSPORTE, e deve ser retirada tão logo quanto ✔ resposta: A
possível.
Alternativa D: INCORRETA. Assim como foi comenta-
Questão 3 dificuldade: 
do na alternativa A, não precisamos de um exame
de imagem mais fidedigno para retirar a prancha. Comentário: A questão exige o conhecimento das
Alternativa E: INCORRETA. A prancha rígida é fator de etapas da avaliação primária “ABCDE” do ATLS (o
risco importante para úlcera de pressão, especial- que representa cada letra e o que é feito em cada
mente em pacientes com déficits sensitivos, que etapa).

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

Alternativa A: INCORRETA. O “D” é a etapa que abran- O primeiro, que ocorre imediatamente após o trau-
ge a avaliação neurológica (nível de consciência; ma, é devido a lesões graves, como ruptura de aorta
tamanho e reação pupilar). A Escala de Coma de e lacerações do SNC. O atendimento médico, mes-
Glasgow permite avaliar, de forma breve, o nível de mo que imediato, não consegue salvar essas víti-
consciência, tornando possível suspeitar de hipogli- mas, sendo indicadas medidas de prevenção com
cemia e intoxicação como causas de rebaixamento o objetivo de evitar que os acidentes aconteçam.
do nível de consciência. Funciona como uma escala Exemplo: Lei Seca, fiscalização de rodovias, medi-
de “triagem”, e não diagnóstica. das para educação no trânsito. Os outros dois picos
Alternativa B: INCORRETA. O “A” não se refere apenas de incidência são minutos a horas após o evento
à patência das vias aéreas. Enquanto as medidas (hemorragias, pneumotoráx e a também chamada
para estabelecer uma via aérea patente são toma- “hora de ouro” no atendimento) e dias a semanas,
das, deve-se garantir a restrição do movimento da geralmente após complicações intra-hospitalares
coluna. Além disso, se o paciente for capaz de se (sepse, disfunção multiorgânica). Após obter esse
comunicar verbalmente, presume-se que as vias conhecimento, identificamos que as opções A, B,
aéreas não estejam em risco imediato, mas é reco- C e D encontram-se corretas. Já a alternativa E traz
mendada a avaliação repetida da permeabilidade um conceito incorreto, uma vez que o diagnóstico
das vias aéreas. definitivo não é estabelecido no primeiro momen-
to. Pense comigo: Como você vai identificar uma
Alternativa C: INCORRETA. O “B” refere-se à respiração
laceração hepática no pré-hospitalar? Você pode
e à ventilação, quando são identificadas/tratadas
até suspeitar, mas o diagnóstico definitivo só vai
lesões, como pneumotórax hipertensivo, hemotó-
se realizar em um segundo momento.
rax maciço, pneumotórax aberto e lesões traqueais
ou brônquicas. A presença de corpo estranho e de ✔ resposta: E
secreções na cavidade oral relaciona-se com a pa-
tência de vias aéreas; portanto, deve ser corrigida
na 1ª etapa da avaliação primária, o “A”. Questão 5 dificuldade:  
Alternativa D: CORRETA. A hemorragia é uma causa
importante de morte no contexto do trauma. Por Comentário: Paciente vítima de trauma com moto,
isso, na etapa “C” são avaliados pressão arterial, apresenta-se com estridor respiratório, sangue em
perfusão, aspecto da pele e do pulso. A 10ª edição cavidade oral e fratura de mandíbula. Além disso,
do ATLS traz que “Os fluidos são administrados cri- está dispneico, embora não hipoxêmico. À auscul-
teriosamente, pois a ressuscitação agressiva antes ta pulmonar, MV diminuído à esquerda e enfisema
do controle do sangramento demonstrou aumentar subcutâneo, sugerindo pneumotórax. Apresenta-
a mortalidade e a morbidade”. -se hemodinamicamente estável, sem alterações
no FAST de abdome e pelve. Entretanto, o ECG 7
Alternativa E: INCORRETA. No “E”, deve-se expor o pa-
(< ou = 8) sinaliza a necessidade de uma via aérea
ciente e prevenir a hipotermia. Para isso, pode-se
definitiva. Para resolver a questão, deve-se lem-
usar um micro-ondas para aquecer fluidos crista-
brar do protocolo ABCDE do Advanced Trauma
loides, mas ele nunca deve ser usado para aquecer
Life Support (ATLS). De imediato, as alternativas
hemocomponentes.
A e D seriam eliminadas, pois a primeira conduta
✔ resposta: D é inserir o COLAR CERVICAL, para a estabilização
da coluna, além da suplementação de oxigênio (“A”,
dificuldade: 
de airway); esse paciente certamente precisará de
Questão 4
uma VIA AÉREA DEFINITIVA, que, neste caso, deve
Comentário: A mortalidade trimodal do trauma re- ser cirúrgica. Por fim, o seu possível pneumotórax
fere-se ao conceito de que existem três picos de precisará ser drenado, em selo d’água. A máscara
incidência de mortalidade decorrentes do trauma. laríngea deve ser introduzida somente quando não

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Cap. 1

se conseguir intubar o paciente ou quando a ven- uma lesão com risco de morte imediata; agora,
tilação sob máscara for insatisfatória (alternativa é um diagnóstico de lesão potencialmente letal.
C incorreta). Além disso, a lesão de árvore traqueobrônquica
✔ resposta: B agora é um diagnóstico diferencial, com risco de
morte imediata.
✔ resposta: B
Questão 6 dificuldade:  

Comentário: Paciente vítima de trauma torácico Questão 8 dificuldade: 


apresenta-se com hipoxemia. Ao exame do tórax,
nota-se, além de outros comemorativos, a presen- Comentário: Questão fácil, cobrando a abordagem
ça de “MOVIMENTO PARADOXAL”, que nada mais inicial do paciente politraumatizado. Lembre-se:
é do que o colabamento do segmento lesionado a avaliação e o manejo sempre devem seguir a or-
quando o indivíduo inspira, e o abaulamento quando dem do ABCDE.
ele expira. Isso é típico de TÓRAX INSTÁVEL, deter- Alternativa A: INCORRETA. O acesso venoso é um
minado quando temos fraturas de DOIS OU MAIS procedimento para controle hemodinâmico/car-
ARCOS COSTAIS CONSECUTIVOS, sendo que cada diovascular (C), e não é o primeiro passo. Não é
arco está fraturado em no mínimo DOIS PONTOS. preconizada a obtenção de acesso venoso central
Entretanto, lembremos de que o componente que de rotina nos pacientes politraumatizados, sendo
tem MAIOR PESO para levar o indivíduo com tórax a reposição volêmica feita por acesso venoso pe-
instável à insuficiência respiratória NÃO é apenas riférico calibroso.
a respiração paradoxal em si. Certamente, para ter
Alternativa B: CORRETA. A – Vias aéreas: paciente
causado esse estrago, o trauma deve ter sido bas-
instável; apesar de descrição pobre da avaliação de
tante forte, sendo comum acontecer CONTUSÃO
vias aéreas, é candidato à IOT. B – Respiração: sem
PULMONAR. Associado a isso, temos que esse é
alterações específicas. C – Cardiovascular: paciente
um paciente que está sentindo uma intensa DOR
hipotenso; precisa de reposição volêmica (acesso
– e não é para menos que uma analgesia potente
venoso) e busca de foco de sangramento, sendo o
é um dos pilares do tratamento dessa condição.
FAST um ótimo exame diagnóstico.
✔ resposta: B Alternativa C: INCORRETA. A realização de janela pe-
ricárdica após um FAST é redundante, visto que o
dificuldade:  
FAST já permite visualização do saco pericárdico
Questão 7
em busca de tamponamento cardíaco. Lembre-
Comentário: Os traumas a seguir colocam o pacien- -se: a janela é um procedimento diagnóstico, não
te vítima de trauma em risco iminente de morte; terapêutico.
portanto, devem ser diagnosticados e tratados na Alternativa D: INCORRETA. A transfusão sanguínea é
avaliação primária: pneumotórax hipertensivo, pneu- recomendada precocemente, mas, em geral, a re-
motórax aberto, hemotórax maciço, lesão de árvo- posição volêmica sempre é iniciada com cristaloi-
re traqueobrônquica* e tamponamento cardíaco. des. O último ATLS coloca a pericardiocentese em
Existem outros diagnósticos potencialmente letais, segundo plano, reservando-a como procedimento
mas que podem ser tratados tanto na avaliação pri- temporário a pacientes com suspeita de tampona-
mária quanto na secundária: pneumotórax simples, mento cardíaco e iminência de PCR, até a possibi-
hemotórax simples, contusão cardíaca, ruptura lidade de toracocentese.
traumática de aorta, lesão de diafragma, lesão Alternativa E: INCORRETA. O diagnóstico de tampona-
esofágica e tórax instável com contusão pulmonar*. mento cardíaco, nossa principal suspeita, é feito pela
* Essa foi uma grande mudança na mais recente ver- clínica associada ao FAST ou à janela pericárdica,
são do ATLS (10ª edição, 2018). Até então, o tórax com pouco papel da radiografia de tórax. Apesar
instável com contusão pulmonar entrava como de a esternotomia mediana ser trazida pelo ATLS

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ATLS – Atendimento inicial ao politraumatizado Trauma

como uma opção terapêutica, sabemos que é um


procedimento mais demorado e de difícil execução
quando comparado à toracotomia, sendo pouco
utilizado em pacientes politraumatizados instáveis.
✔ resposta: B

Questão 9 dificuldade: 

Comentário: Segundo o ATLS, o tratamento de um


paciente vítima de trauma requer avaliação rápida
das lesões e instituição de medidas terapêuticas de
suporte de vida. Para otimizar esse tempo, é dese-
jável uma abordagem sistematizada, que possa ser
facilmente revista e aplicada. Ela inclui: preparação,
triagem, avaliação primária (ABCDE), reanimação,
necessidade de transferência do doente, avaliação
secundária, reavaliação e monitorização contínuas,
além de tratamento definitivo. Essa avaliação primá-
ria deve ser repetida com frequência, para identifi-
car qualquer alteração do estado clínico do doente
que indique necessidade de intervenção adicional.
Alternativa A: CORRETA. A história detalhada ou a
avaliação secundária só devem ser iniciadas após
a avaliação primária e quando todas as medidas de
estabilização tiverem sido tomadas.
Alternativa B: INCORRETA. Como citado, a avaliação
primária e sua repetição frequente são fundamentais
para o melhor manejo do paciente vítima de trauma.
Alternativa C: CORRETA. Em acidentes com múltiplas
vítimas (porém, não em casos nos quais há vítimas
em massa, excedendo a capacidade hospitalar e
da equipe), aqueles com risco de vida iminente e
os doentes com traumas multissistêmicos devem
ser atendidos primeiro.
Alternativa D: CORRETA. A busca pelo diagnóstico
não deve retardar os cuidados iniciais, a fim de es-
tabilizar o quadro.
✔ resposta: B

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