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MANIFESTO “ ILÚ OBÁ DE MIN”

“Quem faz perguntas, não pode evitar as respostas”


(Provérbio africano)
Nação Ilú Obá De Min

Este manifesto tem como principal objetivo partilhar posicionamentos e reflexões pertinentes e urgentes
relacionadas às questões raciais que estão presentes na sociedade brasileira, e por sua vez no Ilú Obá De Min.
O advogado e ministro dos direitos humanos Sílvio Almeida, em seu livro “O que é racismo estrutural” nos
ensina que o racismo está presente na estrutura social brasileira, herança do permanente passado
escravocrata que custou o sangue, a vida e banzo eterno de nossos ancestrais. Neste sentido, as instituições
possuem papel preponderante no combate ao racismo. O Ilú Obá De Min, enquanto instituição de educação,
arte e cultura negra, posiciona-se ativa e politicamente em sua existência no combate de todo e qualquer tipo
de opressão dentre as quais destaca-se violentamente, o racismo.
Mais que um bloco AFRO de carnaval, somos um Ecossistema de educação, arte e cultura, formadoras de
opinião e uma instituição. Representamos uma ação política antirracista em um espaço onde fortalecemos a
liderança de mulheres negras. Neste sentido, é fundamental e estratégico que este entendimento perpasse
mentes e corações das pessoas integrantes negras e não-negras do bloco.
O 13 de maio de 2023 marcou os 135 anos da abolição da escravidão. Seu legado de desigualdade profunda e
cruel impacta de forma cotidiana e sistemática a população negra do país. Mas há também o legado da
branquitude, que garante todo um sistema de privilégios que, como nos ensina Sueli Carneiro, beneficia toda
pessoa branca, sem exceção. Porém, há a opção destas pessoas não compactuarem com a discriminação e
racismo e implementarem em seu dia a dia ações, de fato, antirracistas.
E temos no Ilú Obá De Min a oportunidade real de desenvolver estas ações, de ousar, desejar e sonhar um
outro país. Citando ainda nossa grande mestra Sueli Carneiro, se o racismo foi historicamente construído, pode
também ser historicamente destruído. E é neste sentido que caminha a nossa escolha de enegrecer o Ilú, de
torná-lo um elemento importante nesta jornada de ocupação e protagonismo dos espaços para as pessoas
negras, ou melhor, em nosso caso, das mulheres negras. Pois é urgente aprimorar nossas estratégias de luta,
nossas capacidades de organização e de enfrentamento. O Ilú Obá de Min tem orgulho em fazer parte deste
processo.
Algumas situações não podem mais ser aceitas dentro do grupo, como o caso de uma mulher branca que,
mesmo há anos participando do bloco, tocando e dançando para os Orixás, as nossas composições que
descrevem a trajetória histórica de luta do povo negro, questionou, insistentemente a presidenta Beth Beli
sobre o seu lugar no bloco Afro Ilú Oba De Min, e fez referência a fala de uma das coordenadoras como a um
berro... Sabemos o quão problemático e danoso é o privilégio da branquitude em detrimento da opressão da
negritude. Cabe aqui também, destacar que esse recurso racista de animalização da voz, e por sua vez do
corpo da mulher negra, e da população negra em geral, vem sendo utilizado há séculos pela sociedade como
estratégia cruel, desde os primórdios da escravidão, para que os nossos corpos fossem racializados e
explorados ao máximo, uma vez que não éramos lidos como humanos. E essa estratégia permanece até os
dias atuais.
Por que a branquitude insiste em sobrepor o seu corpo e presença visando a manutenção de seu privilégio e
visibilidade, nos ensaios e nos cortejos, contrapondo-se desrespeitosamente a tomada de decisões e
definições partilhadas por lideranças pretas, na qual, se constitui as coordenações dos naipes do Ilú Obá de
Min? Reforçamos que tais comportamentos não serão mais aceitos.
O Ilú Obá De Min se posiciona a favor de todas as políticas que visam o protagonismo da mulher negra e da
comunidade negra. Nossa instituição também reforça tolerância zero em resposta a qualquer situação de
racismo, machismo, homofobia, transfobia e qualquer discriminação em nossas atividades ou com qualquer
integrante da entidade.
Levando em consideração tais afirmações e os inadmissíveis casos de racismo de situações que
aconteceram no bloco que demarcam o racismo e os entraves para o seu combate, no qual podemos
destacar, como nos ensinou Cida Bento, o pacto narcísico da branquitude, que ao recusar-se em, de fato,
repensar os seus privilégios, contribuem para a continuidade da discriminação e do racismo e também a
partir de deliberação da diretoria do Ilú Obá De Min, realizada dia 08 de Maio de 2023, ficou decidido que a
partir do carnaval 2025 o grupo será composto apenas por mulheres negras.
A discriminação de gênero e de raça são elementos estruturantes que estão presentes na cultura brasileira
desde sua formação. Uma parte considerável da população é constituída por mulheres negras, que, ao longo
da história, foram silenciadas, exploradas, negligenciadas socialmente e enfrentam problemas semelhantes
até os dias atuais. A sociedade brasileira, assim, estruturou-se em sistemas de opressão e institucionalizou
práticas discriminatórias. As mulheres negras tiveram que, historicamente, lutar, resistir e unir suas dores em
um grande movimento frente a um sistema patriarcal e racista que insiste em invisibilizá-las por meio da
violência física ou negar-lhes direitos fundamentais.
Por isso, o Ilú Obá De Min mais uma vez aqui coloca como necessário que tenhamos sensibilidades e ações
afirmativas para que as realidades brasileiras não sigam reproduzindo um comportamento marcado por
fazeres brancos e masculinos e nos quais as mulheres negras não escapam do campo objeto. Ansiamos por
tempos em que a presença efetiva de mulheres negras em todos os campos da sociedade na condição de
sujeitas e protagonistas seja uma regra e não uma exceção.
Este manifesto também é um chamamento visando o comprometimento de todes, para que possamos
vivenciar a luta e a coragem ancestral, entoada em nossos corpos, vozes e tambores, de Exu a Oxalá, a cada
composição e a cada tema de carnaval.
São Paulo, 29 de Maio de 2023

Diretoria do Ilú Obá De Min

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