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COMENTÁRIOS E LIGAÇÃO COM CONCEITOS TEÓRICOS

A realização do jogo proporcionou observar o desempenho das crianças


em tarefas envolvendo memória e instruções. Os sujeitos tiveram mais
dificuldades (apresentaram número maior de erros) na primeira etapa na qual eles
tinham que recorrer apenas à memória para se lembrar das cores que poderiam
falar ou não. Estava na Zona de Desenvolvimento Real das crianças (elas faziamm
com autonomia), descrever por meio da linguagem o sistema de códigos referente
ao objeto das cores. O desenvolvimento real se refere “a funções mentais da
criança que se estabeleceram como resultado de certos ciclos de desenvolvimento
já completados” (VYGOSTKY, 1991, pg 57).
Em sua linha de pensamento sócio-histórica, Vygotsky vê a linguagem
como um complexo sistema de códigos que designa objetos. Na perspectiva
vygostkiana só há pensamento organizado a partir da linguagem. A linguagem
serve de instrumento de mediação, comunicação pessoal, planejamento (antecipa
ações), generalização e abstração. A linguagem transforma o pensamento em
pensamento verbalizado (KOHL, 1993). O auxílio com cartões e instruções
verbais aproximou a realização daquela tarefa da Zona de Desenvolvimento
Proximal das crianças. Torna-se notável a relação entre aprendizado e
desenvolvimento. “O estado de desenvolvimento mental de uma criança só pode
ser determinado se forem revelados os seus dois níveis: o nível de
desenvolvimento real e a zona de desenvolvimento proximal. O "bom
aprendizado" é somente aquele que se adianta ao desenvolvimento”
(VYGOSTKY, 1991, pg 60)
Os animais tem uma função elementar, mas lhe falta a intencionalidade. O
animal não cria cultura, ao contrário do ser humano que apresenta funções
superiores: lembra, compara, escolhe, seleciona e representa. Essas funções
superiores possibilitam uma aprendizagem mediada.
Vygotski apresenta em seus estudos sobre o desenvolvimento psicológico a importância
das funções psicológicas superiores, das quais faz parte a atenção voluntária e dedica
inúmeras investigações para compreender como ocorre sua evolução nas diferentes
idades, bem como apresenta a mediação necessária para seu desenvolvimento
(NAKAYAMA, Antonia; BOSCOLO, Dulcinéia; NAVARRO, Lisienne. 2016)
Na segunda etapa do jogo, com a apresentação dos cartões é possível
perceber como a criança passa a utilizar os cartões coloridos como mediação para
fornecer as respostas às perguntas do jogo. Ao serem questionadas sobre qual cor
de determinado objeto era comum que as crianças primeiramente olhassem os
cartões como apoio para ver se era uma cor proibida ou não e se já havia sido
utilizada ou não. Na perspectiva vygotskiana, a utilização de marcas como ajudas
mnemônicas faz com que a operação de memória vá além das dimensões
biológicas do sistema nervoso humano, permitindo a incorporação dos estímulos
artificiais e auto-gerados que são os signos (MALUF & MOZZER, 2000).
Isso explica o fato de as crianças terem apresentados mais acertos que na
etapa anterior.
Na terceira etapa, com o apoio simbólico dos cartões e a o apoio da
interação pessoal com o pesquisador, os resultados das crianças foram superiores
em termos de acertos. Elas utilizavam, de fato, os recursos de memória que eram
oferecidos a elas. As crianças, além disso, usavam estratégias delas mesmas como
comparar os cartões que já tinham usado com os que faltavam usar, separar os
cartões das cores proibidas (na segunda e terceira etapa) e, ao perceber, que
estavam recebendo instruções orais de ajuda, faziam perguntas a respeito do que
iriam escolher para evitar o erro. Também se utilizavam de estratégias não
verbais, como parar para pensar antes de responder, falar sozinha (fala
egocêntrica) observando e manipulando os cartões, sussurrar para si mesma as
cores que não poderiam ser ditas ou tapar a boca com a mão ao começar a dizer
uma cor que era proibida.
Vygotsky (1978) propõe que a fala possui uma função planejadora. Ela
pode preceder a ação ou acompanha-la.
De fato, a mediação dos pesquisadores (no caso deste trabalho) se
assemelha à mediação fruto das interações com os pares sociais da criança e suas
interações com outros adultos como pais, familiares e professores no sentido de
promover um desenvolvimento de habilidades comportamentais e cognitivas que
a criança não teria se não houvesse esta mediação. As operações com signo são
básicas em todos os processos psicológicos superiores, conduzindo os humanos a
uma estrutura específica de comportamento, que rompe com o desenvolvimento
biológico criando novas formas de processos psicológicos baseados na cultura
(MALUF & MOZZER, 2000).
Todas as crianças participantes apresentaram melhora de desempenho
quando comparadas consigo mesmas nas três diferentes condições estudadas. A
interação com o adulto se deu de forma produtiva (influenciando nos resultados de
aumento de acertos e diminuição dos erros) nas quatro crianças. Quanto mais
velha a criança (7 a 8 anos) mais efetiva era esta interação no sentindo de
compreender a mediação e precisar menos dela.
“A criança, à medida que se torna mais experiente, adquire um número
cada vez maior de modelos que ela compreende. Esses modelos representam um
esquema cumulativo refinado de todas as ações similares, ao mesmo tempo que
constituem um plano preliminar para vários tipos possíveis de ação a se
realizarem no futuro” (VYGOTSKY,1991, p.21).
No enfoque vygotskiano sobre as operações com signo, as interações com
o adulto são constituintes do comportamento social. A atuação do adulto
pesquisador foi bastante significativa, pois sua ocorrência provocou mudanças na
atividade, parecendo ser responsável pela evolução nas respostas das crianças
(MALUF & MOZZER, 2000)
No estudo Operações com Signos em Crianças de 5 a 7 anos onde também
se utilizou o Jogo das Cores Proibidas, verificou-se que:
As crianças menores pareciam ter mais dificuldade para responder às questões
que se referiam a objetos de cores conhecidas (ausentes do campo visual), em relação às
cores percebidas (de objetos presentes no campo visual). Contudo, também as maiores
mostravam dificuldade suplementar para dizer a cor de objetos ausentes. Assim, as
crianças de seis anos de idade usavam os cartões principalmente como recurso para se
lembrarem das cores conhecidas (MALUF & MOZZER, 2000)
Situação semelhante ocorreu no presente trabalho entre as crianças
participantes mais novas e mais velhas.
BIBLIOGRAFIA

-Leontiev, A. N. (1978). O desenvolvimento do psiquismo. (M.D. Duarte, Trad.).


Lisboa: Livros Horizonte, LDA.

-NAKAYAMA, Antonia; BOSCOLO, Dulcinéia; NAVARRO, Lisienne.


Mediação da Atenção em Grupo de Apoio Educacional. Journal of Researh in
Special Educational Needs, volume 16. Disponível em:
http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/1471-3802.12205/epdf Acesso em:
25/09/2016.

-MALUF, Maria Regina; MOZZER, Geisa Nunes de Souza. Operações com


signos em crianças de 5 a 7 anos. Psic.: Teor. e Pesq., Brasília , v. 16, n. 1, p. 63-
69, Apr. 2000 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S0102-37722000000100009&lng=en&nrm=iso>. access
on 25 Sept. 2016. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-37722000000100009.

-KOHL, Marta. Vygostky-Aprendizado e Desenvolvimento. 5ª Edição. Spcione.


1993.

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