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3. Análise oltafiva
3.1. Limiares olfativos
3.2. A formação dos aromas
3.3. Os aromas varietais
3.4. Os aromas pré-fermentativos
3.5. Os aromas fermentativos
3.6. Os aromas da fermentação alcoólica
3.7. Os aromas da fermentação malolática
3.8. O buquê
3.9. Aromas provenientes do amadurecimento em barricas de carvalho
3.10. Aromas de envelhecimento
3.11. Os aromas das uvas e seus vinhos
3.12. Uvas tintas:
3.13. Uvas brancas:
4. Análise gustativa
4.1. O gosto doce
4.2. O gosto ácido
4.3. Ácidos da uva
4.4. Ácidos produzidos nas fermentações
4.5. O pH do vinho
4.6. O gosto amargo
4.7. O gosto salgado
4.8. Adstringência
4.9. Gás carbônico (CO²)
4.10. O extrato seco
4.11. O sabor
4.12. O equilíbrio do vinho
4.13. Final de boca e persistência
5. O que é terroir?
6. A importância da temperatura dos vinhos
6.1. A temperatura e os aromas
6.2. O vinho na boca e a temperatura
6.3. Temperaturas de serviço recomendadas:
Neste livro, baseado em cursos que ministro sobre o tema há vários anos e o
segundo que escrevo sobre análise sensorial, abordo com maior profundidade
e argumentações técnicas cada item a ser avaliado nos diferentes passos da
degustação. Com o intuito de que seja muito didático e com um índice
detalhado para facilitar a consulta, o livro é destinado a todos os que desejam
aprender ou aprofundar conhecimento, tanto para amadores, como para
estudantes e profissionais da área.
Mario R. Leonardi
O que é análise sensorial?
Análise sensorial é uma disciplina científica que tem entre seus objetivos
evocar, medir, analisar, identificar, descrever, qualificar e interpretar as
características de um produto que são percebidas pelos sentidos da visão,
olfato, gosto, tato e audição. São muitas as normas, os tipos de provas e
metodologias utilizadas na indústria alimentícia com diferentes finalidades,
como a de controlar e determinar a qualidade de um produto, além de avaliar
sua aceitação mercadológica. O propósito desta disciplina é transformar os
dados subjetivos, fornecidos pelas pessoas que realizam os testes, em
resultados objetivos. Segundo a finalidade, são propostos testes específicos,
métodos de avaliação e quantidade de pessoas que realizarão os testes, entre
outros.
Degustar vinhos nem sempre é uma tarefa fácil, tudo depende da finalidade
da prova. Uma simples degustação para ver se gostamos ou não do vinho é
muito diferente de uma degustação para analisar e qualificar a bebida. A
primeira, que podemos chamar de degustação hedonística, tem o simples
propósito de exprimir o prazer do experimentado. Já a segunda tem objetivo
bem diferente, que envolve a descrição de cores, aromas, a expressão do
vinho no paladar, a identificação de atributos, a existência de alguma
alteração ou defeito e, finalmente, a estimação da qualidade, entre outras
avaliações possíveis.
O tempo que um vinho tarda para modificar sua cor, como vemos na imagem,
depende das características de cada produto, o que determina seu ciclo de
vida. Os vinhos destinados para serem consumidos jovens atingem essa cor
em poucos anos. Por outro lado, vinhos com grande potencial de guarda
podem levar décadas.
Em geral, estes não são vinhos de guarda e devem ser consumidos ainda
jovens, mas existem algumas exceções.
2.4. A cor dos brancos
A composição da cor do vinho branco é muito mais simples do que a de um
tinto. As uvas brancas possuem menos quantidade de compostos fenólicos.
Os flavonóis, juntos com outros pigmentos, são responsáveis pela cor
amarela dos vinhos.
Dentro da análise visual, este é um dos aspectos mais importantes, já que nos
oferece indícios sobre o estado de sanidade do produto, um parâmetro de
qualidade. O vinho não deve estar turvo ou velado, nem ter sedimentos se for
jovem, o que indicaria alguma alteração ou defeito. A turbidez pode ser
causada por oxidação, contaminação ou por origem química.
Fazer alguns movimentos giratórios e observar como o vinho flui na taça são
ações que nos dão indícios da leveza ou viscosidade, que depois
constataremos em boca. A viscosidade é de importância na apreciação
gustativa do vinho, tema que será abordado posteriormente.
2.8. Lágrimas ou pernas
Quando giramos o vinho na taça e a parede interna se molha, logo são
formadas umas gotinhas transparentes, que caem e formam o que chamamos
de lágrimas ou pernas. Isso deve-se a fatores físicos que cientistas
denominaram de efeito Marangoni.
Esta fase da degustação pode parecer difícil, sobretudo para aqueles que estão
iniciando. Porém, não se deve pensar que a percepção e a identificação dos
aromas nos vinhos são capacidades que só algumas pessoas possuem. Com
treinamentos e estudos adequados, em pouco tempo é possível identificar
vários tipos de aromas.
Saber de onde provêm ou como se formam nem sempre é uma tarefa fácil.
Atualmente, muitas substâncias responsáveis pela formação de aromas são
conhecidas, como é o caso dos diferentes tipos de álcoois, ácidos, ésteres,
aldeídos, terpenos, tióis, fenóis voláteis, entre outros. Todavia, ainda há
muito o que descobrir, embora a cada ano a ciência nos ajude com diversos
estudos para compreender um pouco mais sobre a composição e o porquê das
características organolépticas de um vinho.
Interpretar de onde provém ou como se formou um aroma de um vinho que
estamos degustando nos ajuda a compreender a vida deste produto. Esses
dados nos dão uma ideia da origem, do tipo de uvas, dos métodos de
elaboração, dos processos de amadurecimento e envelhecimento, assim como
possíveis alterações, entre outras características.
Ácidos graxos
Durante a fermentação alcoólica, vários ácidos são produzidos. Dentre eles,
estão os ácidos graxos, produzidos por leveduras em grandes quantidades e
importantes a nível aromático.
Tióis
As leveduras revelam vários precursores aromáticos, como alguns terpenos e
tióis voláteis. Um bom exemplo, dentre os tióis, são os aromas típicos dos
vinhos provenientes da uva Sauvignon Blanc. Compostos como o 4-
mercapto-4-metil-2-pentanona, produzem aromas de folha de tomate, arruda
e, em grandes quantidades, podem produzir aromas que lembram a urina de
gato. O acetato de 3-mercaptohexanol é responsável pelos aromas de pomelo
(grapefruit) e maracujá, entre outros.
Outros aromas da fermentação alcoólica
Muitas outras substâncias são produzidas nesta etapa da elaboração,
responsáveis por diversos tipos de aromas: os fenóis voláteis, como o
vinilfenol (borracha) e o vinilguaiacol (medicamento, cravo da índia); assim
como compostos sulfurados, aldeídos, cetonas e cetais, lactonas e outros.
3.7. Os aromas da fermentação malolática
Esta fermentação é produzida por bactérias láticas e contribui muito com a
complexidade aromática do vinho. Pode ocorrer naturalmente ou ser induzida
através do acréscimo de bactérias. É realizada nos vinhos tintos e em alguns
brancos, como o chardonnay, e até em vinhos-base para espumantes, como
no caso de algum Champanhe.
Nem todos os vinhos desenvolvem este tipo de aroma, como é o caso dos
vinhos destinados para serem bebidos jovens, os que somente apresentam
aromas varietais e fermentativos. O tempo, neste caso, os deixará decrépitos
e, provavelmente, com alguma contaminação, oxidação ou outra alteração.
É importante saber que cada vinho possui seu ciclo de vida, que pode ser
maior ou menor, segundo características, origem, cepas, safra, composição,
tipo de elaboração, amadurecimento e outros quesitos. Poucos vinhos têm
potencial de guarda para muito tempo, assim como a capacidade de
amadurecer ou envelhecer de forma enriquecedora.
3.9. Aromas provenientes do amadurecimento em
barricas de carvalho
O amadurecimento em barricas é um valor agregado ao vinho. Por outro lado,
não deve ser o protagonista. Os aromas amadeirados não devem apagar os
demais aromas presentes no vinho.
Dentre os aromas que aparecem com maior frequência nos vinhos com
amadurecimento em barricas de carvalho estão:
Malbec
Se destaca pelos aromas de frutos vermelhos, principalmente ameixa, ameixa
seca, passa de uva e geleia. É comum a presença de notas florais, como
violeta, e de especiarias, como pimenta de reino. Aromas mentolados ou de
anis aparecem em vinhos de algumas regiões específicas. Em vinhos mais
envelhecidos, surgem notas de couro, canela, tabaco e chocolate. Alguns
desses aromas ocorrem devido ao amadurecimento em barricas de carvalho.
Merlot
É possível perceber um mix de frutas vermelhas, como framboesa, morangos,
amoras, cereja negra, cassis e ameixa. Também bolo de frutas e figos. Alguns
têm caráter levemente vegetal e notas de menta. É um vinho que pode
adquirir muita complexidade aromática, principalmente aqueles com
amadurecimento em barricas e em garrafa, aparecendo notas de especiarias,
alcaçuz, trufas, chocolate, nozes e outros.
Nebbiolo
Aromas de rosas, violetas e alcatrão estão entre os mais característicos.
Também é fácil encontrar notas de alcaçuz ou anis. Entre os aromas frutados,
estão o de cereja negra e amoras. Em geral, dá origem a vinhos de boa
expressão e complexidade aromática, nos quais também surgem notas de
ervas frescas e secas, trufas, especiarias, além dos formados pelo
amadurecimento em recipientes de carvalho, muito comum em vinhos
elaborados com esta cepa.
Pinot Noir
Muito frutado quando jovem, com destaque aos aromas de cereja. Também
framboesa, groselha, ameixa, frutas em compota e aromas florais, como
violeta. Pode atingir grande complexidade, com notas de caça (animal),
couro, leve terroso, beterraba cozida, cravo e cogumelos, entre tantos outros.
Sangiovese
Possui predominância de frutas vermelhas, como cereja, ameixa, amora,
tomate seco ou assado. Também notas de ervas e especiarias, aromas de chás,
notas terrosas e de violetas. Uma ampla gama de vinhos são produzidos com
esta uva, desde os bem simples até os extremamente complexos.
Syrah
Em geral, apresenta aromas marcantes de frutas vermelhas e negras, com
diversas especiarias, principalmente pimenta do reino e algo de canela. Entre
as frutas, estão a framboesa, a groselha negra e as ameixas. Em vinhos
jovens, é comum achar notas florais como as de violetas e flor de cravo. Com
o envelhecimento, desenvolve notas de couro, chocolate, tabaco, trufas e
alcaçuz entre outros.
Tempranillo
Principalmente frutado quando jovem, desenvolve uma importante
complexidade aromática com o tempo. Muitos têm amadurecimento em
barricas de carvalho. Aromas frutados de amora, morango, ameixa, figo,
frutos secos e passas. Notas de ervas frescas e especiarias, folhas de tabaco,
cedro, couro e coco.
3.13. Uvas brancas:
Chardonnay
Segundo a elaboração, com ou sem passagem por barricas, e a região de
procedência, é possível achar uma grande diversidade de aromas frutados,
florais, vegetais e outros, denominados por alguns degustadores como
minerais. Frutas cítricas como limão, bergamota e toranja. Outras frutas como
maçã verde, pêra, pêssego, melão, abacaxi e manga. Notas florais de
camomila, acácia, tília e madressilva. Frutas secas, avelã, amêndoas e
damasco. Notas de ervas, anis, tostado, manteiga, mel e tantos outros.
Riesling
Em geral, seus vinhos são aromáticos e podem resultar bem complexos, tanto
os vinhos secos como os doces. Muito frutado e floral, apresenta aromas de
lima, maçã verde, pêssego, damasco, jasmim e tília. Com o envelhecimento
em garrafa, é comum que desenvolva notas de petróleo ou querosene. Nos
vinhos doces, é fácil de perceber aromas de frutos secos, amêndoas, passas e
mel.
Sauvignon Blanc
Cepa aromática, com destaque para aromas de frutas cítricas e notas
herbáceas. Maracujá, pomelo, kiwi, lima, arruda, pimentão verde, folha de
tomate, aspargos, grama cortada e flor de sabugueiro, entre outros. Alguns
vinhos mais maduros podem apresentar notas de pêssegos, nectarina, melão e
marmelo.
Semillon
Quando jovem, apresenta aromas principalmente cítricos e frescos,
lembrando limão siciliano. Com mais tempo, desenvolve notas de outras
frutas, como figos, damascos, nectarinas e pêssegos, além de notas herbáceas
e florais, como camomila e madressilva. Alguns vinhos doces atingem grande
complexidade, com aromas de manga, abacaxi, frutos secos, casca de laranja,
tostado, mel, marmelo, caramelo e outros.
Análise gustativa
Provar o vinho em boca requer bastante atenção, uma vez que são muitas as
sensações que percebemos: gostos doce, ácido, amargo e salgado; assim
como outras sensações, incluindo fluidez, volume, temperatura, adstringência
e borbulhas. Tudo isso, somado aos aromas retronasais, formam o sabor.
Esta etapa pode parecer a mais fácil, já que estamos acostumados com esses
sentidos por consumimos, todos os dias, diferentes alimentos e bebidas. Se
fizermos um cálculo de todas as refeições que realizamos em nossa vida, o
resultado pode nos surpreender, mas isso não é suficiente, pois em geral o
fazemos de forma automática e não prestamos atenção a todas as sensações
que percebemos em nossa boca. Portanto, temos que educar nosso paladar,
adquirir conhecimentos teóricos e práticos para provar e avaliar corretamente
o vinho e demais alimentos.
Durante a prova, o gole não deve ser muito grande, nem pequeno demais.
Deve ser em quantidade suficiente para efetuar uma análise correta, dividida
em três etapas: ataque, evolução e final de boca.
Em geral, todo vinho tem algo de açúcar, já que uma pequena quantidade fica
sem fermentar - o que é chamado de açúcar residual. Com 2 ou 3 g/l de
açúcares no vinho, o gosto doce já é detectado por alguns degustadores. A
maioria, no entanto, apenas percebe o gosto doce quando a quantidade de
açúcar é superior a 4 g/l.
Os álcoois contribuem muito com o gosto doce, além de terem sua própria
doçura, intensificam o gosto dos açúcares. Os sabores frutados e florais
também contribuem para a sensação de doçura. Por exemplo, vinhos de
regiões mais quentes, onde têm teor mais alto de álcool, taninos mais macios,
acidez moderada e são muito frutados, nos dão impressão de doçura, mesmo
que sejam tecnicamente secos.
O gosto doce é muito importante nos vinhos, uma vez que forma o equilíbrio
gustativo, um fator de qualidade. Nos vinhos brancos, o gosto doce deve
equilibrar o gosto ácido. Já nos tintos, o doce equilibra a acidez e as
sensações produzidas pelos taninos.
4.2. O gosto ácido
Diversos ácidos orgânicos provenientes da uva e outros produzidos durante
as fermentações formam o gosto ácido dos vinhos, percebido maiormente nas
laterais da nossa língua.
Ácido málico
É o mais abundante no mundo vegetal, presente em folhas e frutas. A
quantidade deste ácido é um dos parâmetros para definir o amadurecimento
da uva.
Ácido cítrico
Presente nas uvas em baixa quantidade, nos vinhos o ácido cítrico tem pouca
ou nenhuma presença, em geral com presença de 0 a 0,5 g/l. Também pode
ser acrescido em alguns vinhos. Em uvas com muita concentração de
açúcares, como as atacadas pela botrytis cinérea, como acontece na região de
Sauternes, na França, existe em maior quantidade. Nos vinhos tintos,
desaparece devido à ação de bactérias láticas (fermentação malolática).
Sensorialmente é fresco, porém em alguns casos pode apresentar leve final
amargo.
4.4. Ácidos produzidos nas fermentações
Ácido succínico
Ácido típico do vinho produzido durante a fermentação alcoólica, que
contribui com o caráter denominado vinoso. É um ácido estável. O vinho
possui de 0,5 g/l a 1,5 g/l. Seu gosto é descrito como uma combinação de
ácido, salgado e amargo.
Ácido lático
É o principal produto da fermentação malolática, gerado por bactérias láticas.
O ácido málico é transformado em ácido lático, que é muito mais suave, o
que produz uma desacidificação do vinho.
Ácido acético
É produzido principalmente pela fermentação alcoólica. Também tem
formação durante a fermentação malolática, bem como durante o
amadurecimento em barricas de carvalho e em outras etapas.
Um simples exercício, como tampar nosso nariz quando temos uma bebida
ou alimento na boca, demonstra bem esse conceito, já que o sabor diminuirá
notavelmente. Quando nosso nariz está congestionado, é comum escutar a
frase “não sinto gosto de nada”. Na realidade, os gostos se percebem, porém
a percepção dos aromas diminui muito. Dessa forma, perde-se grande parte
do sabor de um produto.
4.12. O equilíbrio do vinho
É fundamental que todas as sensações gustativas, aromáticas e outras que
percebemos em um vinho estejam em equilíbrio. Esse aspecto é um dos
principais parâmetros de qualidade de um vinho.
Nos vinhos tintos, temos que prestar muita atenção na relação entre álcool,
acidez e taninos, os principais componentes que determinam o equilíbrio da
bebida. Se o vinho possui graduação alcoólica deficiente, predominarão a
acidez e os taninos, o que faz com que o vinho possa se tornar duro, áspero e
adstringente. Caso contrário, se a acidez e os taninos forem deficientes,
predominará o álcool. Em ambos os casos, teremos desequilíbrio. Já nos
vinhos brancos, o equilíbrio é formado entre substâncias de gosto doce
(álcool e açúcares), e substâncias de gosto ácido.
Várias expressões são utilizadas nesta etapa, como final de boca, retrogosto,
sabor residual e outras. Embora possamos estabelecer diferenças entre elas,
comumente são utilizadas como sinônimos. Nem sempre esta etapa é tão
compreendida, em alguns casos é até ignorada.
Por exemplo, os ésteres responsáveis por muitos aromas frutados são muito
voláteis e, mesmo em baixas temperaturas, como é servido um vinho branco,
continuarão sendo percebidos. Já no caso de aromas com baixo grau de
volatilização, como os de especiarias e outros provenientes do
amadurecimento em barricas de carvalho, diminuem notavelmente em baixas
temperaturas, chegando até serem imperceptíveis.
Um vinho tinto que, em geral, deve ser consumido entre 16°C e 18°C, ficará
alcoólico se for servido a uma temperatura maior, sobretudo se superar os
20°C. Os aromas do vinho também aumentam, porém não tanto como o
álcool, o que os deixará em segundo plano e até imperceptíveis.
Por último, temos os aromas que percebemos por via retronasal, quando
estamos bebendo o vinho. Nesta instância, a temperatura do vinho aumenta.
Por exemplo: um vinho branco servido a 10°C, quando colocado na boca, em
poucos segundos superará os 20°C. Este é um dos fatores que podem fazer
com que existam diferenças nas apreciações dos aromas via nasal direta e
retronasal.
Os taninos são um dos responsáveis por não deixar que vinhos tintos sejam
resfriados em demasia, já que ficam muito ásperos, produzindo sensação de
adstringência e aumentando a acidez. A exceção ocorre para vinhos com
maior quantidade de açúcares, como o vinho do Porto. Estes vinhos podem
ser bebidos em menor temperatura, uma vez que a aspereza dos taninos é
compensada pelo gosto doce.
Vinhos tintos muito leves podem ser bebidos mais frescos, e os rosés ainda
mais gelados que os tintos. Vinhos doces são melhores resfriados, já que
temperaturas mais altas potencializam a doçura e até podem se tornar
enjoativos.
Tudo isso pode parecer muito complicado para quem está se iniciando neste
tema, porém não é difícil. Fazendo simples testes, como degustar um mesmo
vinho em diferentes temperaturas, será suficiente para perceber como a
temperatura influencia organolepticamente o sabor do vinho. É recomendável
utilizar um termômetro para habituar-se com a temperatura dos vinhos. Com
um pouco de experiência, será possível identificar rapidamente se o vinho
está na temperatura certa.
Uma taça de vinho deve ser composta por três partes: bojo, haste e base. O
ideal é que a taça seja de cristal, devido a sua fineza, acabamento e
transparência, ou de vidro fino. Taças com gravuras ou cores podem ser
visualmente bonitas, mas não são adequadas para a degustação, uma vez que
atrapalham diferentes aspectos da leitura visual, como limpidez, brilho e cor
dos vinhos. O bojo deve ter a forma de tulipa, com a parte superior ou borda
menor do que a parte inferior, para compor o que chamamos de câmara de
aromas - se fosse aberta, perderíamos os aromas do vinho, como acontece
quando servimos a bebida em um copo.
Os vinhos tintos, em geral, necessitam de taças maiores, enquanto os brancos
pedem tamanhos intermediários. Isso influencia muito na intensidade e na
qualidade dos aromas. A forma da taça também colabora com a expressão
aromática do vinho e determina a maneira como o vinho é enviado para a
nossa boca.
Um vinho que possui aromas frutados e florais em uma taça, pode ser
percebido alcoólico ou vegetal em outra. Isso acontece quando servimos um
mesmo vinho em duas taças diferentes, uma com bojo mais alto, na qual
predominam os aromas frutados que são mais voláteis ou leves, e outra com
bojo mais baixo, na qual é possível que esses aromas frutados se percam e
percebamos mais os aromas herbáceos, de madeira e álcool, que são menos
voláteis ou pesados.
Taças mais largas fazem com que baixemos a cabeça para beber, enquanto as
mais estreitas nos fazem levantar a cabeça durante a ingestão, o que faz com
que o líquido flua por gravidade. Dessa forma, o vinho se posiciona em partes
distintas da boca para destacar algumas características ou equilibrar o sabor.
É normal que, nos vinhos tintos, com o passar dos anos, apareçam sedimentos
– um sinal natural de envelhecimento que faz parte da vida de um vinho.
Quando o vinho envelhece, as moléculas de antocianinas se oxidam, se
polimerizam e se combinam com taninos e outros fenóis. Por ficarem maiores
e serem menos solúveis, as moléculas se precipitam, formando sedimentos.
Isso faz com que o vinho perca substâncias responsáveis por sua estrutura,
tornando-o frágil. Em alguns vinhos, isso pode indicar que o produto está
chegando ao fim de sua vida.
Ações como a de abrir uma garrafa por 30 minutos ou uma hora antes de
consumi-la para que se oxigene são desnecessárias, já que a oxigenação é
ínfima e não traz benefícios. Para que isso ocorra, a garrafa teria que ser
deixada aberta por muitas horas. Servir o vinho na taça e fazer alguns
movimentos giratórios com a bebida é muito mais eficaz, rápido e suficiente
para obter melhor resultado. Esta ação pode ser realizada com todos os
vinhos, principalmente utilizando taças de maior volume para que ajude na
oxigenação.
Nos vinhos mais antigos, que geralmente têm sedimentos e são colocados no
decanter para separá-los, deve-se ter cuidado com o tempo em que a bebida
permanecerá em contato com ar. Esse tipo de vinho é frágil e a oxigenação
em excesso compromete as características do buquê e as notas de oxidação
podem ser potencializadas. Às vezes, o melhor é servi-lo logo ou nem colocá-
lo em um decanter, simplesmente servi-lo em uma taça, tendo o cuidado para
que os sedimentos fiquem na garrafa. Claro que isso nem sempre é fácil. É
importante lembrar que oxigênio dá vida, porém também pode quitá-la.
Para os vinhos mais envelhecidos, com 15, 20 anos ou mais, ainda com boa
qualidade, mas que possuem bastante sedimentos, precisa-se de muito
cuidado com o tempo de oxigenação para não perder os finos e delicados
aromas formados durante tanto tempo.
Geralmente, numa degustação se faz uma análise visual das borbulhas e uma
apreciação de qualidade. Observa-se tamanho, quantidade, formação dos
cordões de borbulhas, estabilidade, velocidade com que elas sobem e como se
forma a coroa na superfície do vinho contra a parede da taça. Enfim, são
muitas as leituras que podemos realizar.
Não é errado fazer a leitura visual das borbulhas, mas essa leitura é relativa.
Portanto, não devemos fazer uma apreciação de qualidade até realizar a
análise gustativa do espumante. A avaliação deve ser concluída em boca.
9.2. Os aromas
Além das características das uvas utilizadas, a fermentação alcoólica, a
fermentação malolática (opcional) e até o amadurecimento do vinho base em
barricas ou tonéis de carvalho em alguns casos, na produção dos espumantes
uma segunda fermentação alcoólica e um amadurecimento em contato com as
borras (formadas principalmente por leveduras mortas após fermentação) são
realizados, fatos que determinam o perfil aromático do produto.
Por outro lado, quando alguns dos denominados críticos de vinhos, que
escrevem guias e colocam pontuações, dizem que um vinho é excelente, não
quer dizer que você achará o mesmo. Há excelentes profissionais nessa área,
mas, como dito anteriormente, cada degustador tem preferências,
conhecimentos e critérios próprios de avaliação. Nem sempre a sua
apreciação vai coincidir com a dele, portanto você pode, sim, se guiar por
essas recomendações, porém sem tomá-las como verdades absolutas. Talvez,
esses guias fossem muitos melhores se realizados por um painel formado por
vários degustadores, respeitando certos critérios de seleção de produtos,
metodologias da análise sensorial e demais, para a obtenção de melhores
resultados.
11. O que é defeito no vinho?
A aparição de aromas ou gostos que desvirtuam as características de um
vinho são denominados desvios organolépticos ou defeitos. A origem dessas
alterações são várias, podem provir do vinhedo, da elaboração ou do
amadurecimento ou envelhecimento do vinho. Em geral, são produzidas por
contaminação, oxidação ou alteração microbiológica, entre outros aspectos.
Alguns defeitos têm caráter subjetivo, já que podem ser desagradáveis para
alguns e agradáveis para outros, o que gera discussões entre degustadores,
tanto amadores como profissionais. Às vezes, por falta de conhecimento,
alguns aromas são aceitos como sendo atributos quando, na realidade,
indicam que o vinho apresenta alguma alteração.
Alguns exemplos de aromas e compostos que podem surgir são: ovo podre
(H2S ácido sulfídrico), gás de cozinha ou cebola (mercaptano/etanotiol),
borracha (dissulfeto de carbono), queijo (metanotiol) e outros, como
aspargos, borracha queimada, alho, couve-flor, repolho cozido, terroso, batata
e trufa. Os compostos citados também podem ser associados a outros tipos de
aromas.
Esse tipo de contaminação tem sido reduzido nos últimos anos e já não é tão
fácil encontrar vinhos que apresentam o problema. Por outro lado, é preciso
certo treinamento para detectá-la. Alguns degustadores têm demonstrado
dificuldades na percepção e na identificação do defeito.
11.4. Brettanomyces
As leveduras do gênero Brettanomyces/Dekkera ocasionam várias alterações
no vinho. Esses microrganismos podem aparecer no vinhedo, alojarem-se nas
uvas ou surgirem nas vinícolas, em barricas, tonéis ou outros locais. A
higiene é fundamental para evitar a concentração desses microrganismos, que
podem atuar durante os processos de elaboração ou amadurecimento em
barricas ou garrafas.
Como dito anteriormente, esse é um dos defeitos com carácter subjetivo. Para
alguns, a baixa presença de Brett contribui com as complexidades aromáticas
e gustativas do vinho. Para outros, qualquer aparição de Brett é sinônimo de
contaminação ou decomposição, ou seja, forma um vinho com defeito, que
não deveria ser aceito.
12. Glossário de degustação
São muitos os termos utilizados para descrever as sensações percebidas
durante a análise sensorial de vinhos. É muito importante, principalmente
para um profissional, possuir amplo vocabulário para comunicar as
características de um produto.
Amplo: em geral, o termo é utilizado para descrever um vinho que tem uma
ampla gama de aromas (complexidade aromática). Na análise em boca, pode
indicar corpo, um vinho que enche a boca, com muito sabor.
Azedo: vinho com acidez muito elevada. O mesmo que ácido ou acídulo.
Pode ser produto de desequilíbrio, alteração ou defeito.
Cálido: sensação de calor produzida pelo alto teor alcoólico, também pelo
desequilíbrio entre álcool e acidez.
Curto: refere-se ao pouco tempo de persistência do sabor que fica logo após
a ingestão do vinho. A persistência é um parâmetro que indica qualidade.
Espera-se que seja longa e equilibrada. Curto significa que dura só alguns
segundos, portanto não é um atributo.
Decrépito: vinho no fim de sua vida útil, que perdeu todas as suas
características com o tempo. Vinho velho.
Evoluído: vinho maduro, com certo tempo de vida, que desenvolveu matizes
diferentes às de sua juventude.
Leve: ligeiro, com pouco corpo, fácil de beber. Com baixo teor de extrato
seco.
Tânico: com alto teor de taninos não maduros, o que pode gerar
adstringência e certa agressividade no paladar.
HILLS, P. Degustar el vino. El sabor del vino explicado. 1a ed. Buenos Aires:
Albatros, 2005.
PALERMO, J.R. Análise sensorial. Fundamentos e métodos. 1ª ed. Rio de
Janeiro: Editora Atheneu, 2015.