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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

1.
1.1. Um processo penal consiste no fundo numa sequência articulada de atos
visando descobrir se alguém é autor de um crime e eventualmente
condenar essa pessoa se tiver cometido o crime ou absolve-la se não o
tiver cometido. E para isso, o que é que se tem de fazer para descobrir
se determinada pessoa cometeu o crime? Neste caso, havia dois crimes
de homicídio, a policia foi lá e descobriu vestígios biológicos, como ADN,
sangue, pele, ... e esses permitem identificar o ADN da pessoa a quem
esses vestígios biológicos pertencem. Ora bem, se aparecer uma
determinada pessoa suspeita de ter cometido aquele crime, há desde
logo um modo elementar de descobrir se ela efetivamente cometeu o
crime ou não: verificar se ela esteve no local do crime ou não. Se no
local do crime foram encontrados vestígios biológicos com um ADN
exatamente igual, único e irrepetível, ao do suspeito, então temos
99,9%, salvaguardando uma margem ínfima de erro, de que aquela
pessoa esteve no local do crime. Neste caso concreto, o suspeito foi
descoberto pela polícia, mas a policia nada pode fazer no processo penal
sem ser sob direção do ministério público e portanto a polícia informou
o Ministério Público e o Ministério Público ordenou que a pessoa fosse
fazer exames de ADN ao instituto de medicina legal. E a pessoa chegou
lá e com um cotonete tirou vestígios biológicos do fundo da garganta,
queriam lhe fazer uma zaragatoa bocal para lhe tirar o perfil de ADN
através da sua saliva. Ele recusou-se por não haver nenhuma lei a prever
esse exame, tal não é legítimo, está em causa a sua intimidade, o seu
ADN pertence àquilo que lhe é mais próprio, único e irrepetível, não
permite que ninguém lhe venha tirar vestígios biológicos assim sem
mais, recusando-se a prestar consentimento. A polícia ameaçou que se
fosse necessário o faria à força. Força coerciva do Direito, obrigar
alguém pela força física a submeter-se a um determinado exame.
Simplesmente, o arguido disse que não queria violência, não se iria opor
fisicamente a que fosse realizado o exame, mas fez uma declaração
escrita dizendo que era contra a sua vontade a realização do exame e
que só o iria fazer para evitar a violência física. O exame foi realizado

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contra a vontade do arguido, só o realizaria para que não fosse coagido.


No dia seguinte, o arguido, tendo feito o exame nestes termos, requereu
ao juiz de instrução criminal (juiz que controla os atos que se prendam
com direitos fundamentais durante o inquérito judicial, durante a
instrução criminal) que fosse declarada a prova ilegal, por violar direitos
fundamentais. As provas são proibidas em processo penal quando
violam direitos fundamentais como o direito à integridade física, o
direito à privacidade, ... quando violam direitos fundamentais do
arguido. A sermos o juiz de instrução, o que é que decidiríamos? Há um
momento metodológico anterior, que é o de identificar a existência ou
não de direitos fundamentais e isto porque só podemos perguntar se se
justifica a restrição do direito fundamental após a identificação do
direito fundamental. No direito à integridade física, não se incluem
apenas os comportamentos humanos e degradantes, isso é a ofensa à
integridade física mais elementar, que a pessoa não seja submetida a
tratamento desumano e degradante. Aqui, pode-se considerar que o
comportamento não é desumano ou degradante, mas mesmo assim
contende com a integridade física. Seria pelo menos atingido o direito à
integridade física. Na zaragatoa local não há lesão, mas sim uma
ultrapassagem dos limites corporais da pele e dos músculos. O TC tem
uma visão muito exigente do direito à integridade física, com efeito não
é necessário haver lesão para que seja atingida a integridade física das
pessoas, é necessário utilizando uma expressão do professor Costa
Andrade, atual presidente do TC, tem que haver uma ultrapassagem dos
limites corporais da pele e dos músculos. A ideia da defesa da
integridade física do nosso tribunal é muito exigente, há ofensa não
apenas quando haja uma lesão da integridade corporal, mas também
quando haja qualquer tipo de ultrapassagem dos limites corporais da
pele e dos músculos. Não haverá uma ofensa da integridade física
quando se sopra no balão, está-se a expirar ar, há uma afetação da
integridade física quando se faz uma análise de sangue, por exemplo, e
também há nesta situação de fronteira uma ofensa à integridade física
quando se introduz uma zaragatoa local na garganta da pessoa contra a
sua vontade. Nessa medida, parece efetivamente que este exame
contendia com a integridade física. O TC considerou que não estava

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apenas em causa a integridade física, mas também a intimidade da


pessoa, previsto no artigo 26º/1 da Constituição, não está aí muito
explicito o próprio direito à intimidade corporal, mas sim o direito à
reserva da vida privada, aquilo que as pessoas fazem na sua vida, e não
propriamente a intimidade corporal. No entanto, deve-se entender que
se a constituição protege a intimidade da vida das pessoas, por maioria
de razão, protege também a intimidade corporal, direito à intimidade
corporal é um direito implícito ao direito à intimidade da vida privada. O
tribunal invoca o artigo 35º, a ideia deste artigo é a da defesa de dados
pessoais em face da informática. Relacionado com o direito à intimidade
corporal estava o direito à autodeterminação informacional, consagrado
no artigo 26º, nomeadamente o direito ao livre desenvolvimento da
personalidade, que é entendido como uma espécie de cláusula geral
para todos os direitos de liberdade não expressamente previstos na
constituição. Mas a verdade é que se tivermos algum direito de
personalidade mais específico, devemos primeiro recorrer a esse
mesmo: direito à intimidade da vida privada e familiar. Este direito à
intimidade conjugado com a proteção de dados prevista no artigo 35º,
leva a que concluamos que a constituição protege um direito que não
está lá expressamente indicado, mas que de alguma forma resulta da
conjugação destas duas ideias: da ideia que se protege a intimidade da
vida das pessoas e a ideia de que se protege os dados pessoais das
pessoas. A doutrina e a jurisprudência construíram um direito não
expressamente previsto, mas implícito simultaneamente na proteção de
intimidade de vida e direito à proteção de dados pessoais (26º e 35º
Constituição), que é o direito à autodeterminação informacional: poder
que cada pessoa tem de decidir quando é que informações relativas a si
próprio podem ser reveladas por outros. Direito bem atual na sociedade
de comunicação em que vivemos. O direito à não autoincriminação
também está aí previsto, sendo este mais complicado, e o TC
relativamente a este direito recorreu à jurisprudência do TEDH que
entende que existe esse direito, apesar de não estar expressamente
previsto nem na convenção Europeia dos direitos do Homem, nem na
nossa Constituição, porque está implícito na Constituição no artigo 32º
quando fala na garantia de todos os meios de defesa e da presunção de

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inocência, simplesmente o TC neste caso agarrou-se à jurisprudência do


TEDH para determinar o âmbito deste direito, dizendo que esse direito à
não autoincriminação não abrangia o direito a não ser submetido a
provas em processo penal que tenham por objeto a própria pessoa, mas
que se restringe a um direito ao silêncio, direito a não colaborar com o
processo de investigação com o poder punitivo do Estado que o está a
julgar. Constituição material: direitos implícitos que subjazem à
constituição e que surgem de uma interpretação da convenção dos
direitos do homem, apoiámo-nos na letra da Constituição, mas indo para
além dessa letra e interpretando o próprio espírito da Constituição.
1.2. Onde é que podemos encontrar direitos fundamentais?
 Na Constituição, nomeadamente no catálogo de direitos fundamentais
que se encontra previsto nos artigos 24º ao 79º. Há duas grandes
categorias de direitos fundamentais: direitos liberdades e garantias 24º
a 57º, e os direitos económicos, sociais e culturais 58º a 79º. Os direitos
liberdades e garantias beneficiam de uma proteção especial da
Constituição, principalmente contra restrições, que se aplica tanto
quanto aos direitos liberdades e garantias como a qualquer outro direito
fundamental que seja suscetível de ser considerado análogo a um direito
liberdade e garantia.
 Temos também direitos fundamentais dentro da Constituição mas
consagrados fora deste catálogo, que se encontram dispersos ao longo
da lei fundamental. São considerados direitos fundamentais fora do
catálogo.
 Direito à fundamentação dos atos administrativos, direito dos
administrados face à administração: 268º/3 Constituição, direitos e
garantias dos administrados, dever a cargo da administração e do outro
lado o direito fundamental que corresponde aos administrados. Direito
fundamental paradigmático, que não está previsto no catálogo inicial.
Decreto-lei que foi emanado ao abrigo de uma autorização legislativa e
outro que não foi emanado ao abrigo de um autorização legislativa. Há
determinadas matérias que fazem parte da reserva absoluta 164º que só
a AR é que pode legislar e há matérias que fazem parte da reserva
relativa da AR 165º, em princípio só a AR é que pode legislar, mas esta
pode autorizar o GOV a legislar sobre estas matérias, emanando uma lei

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de autorização que fixa o conteúdo do ato legislativo que o GOV poderá


elaborar e ao abrigo desta lei o GOV emana um decreto-lei autorizado,
não legislando de forma originária.
 História do caso: em 77 entrou em vigor um dl que veio estabelecer que
todos os atos legislativos que afetassem direito ou interesse
legitimamente protegido dos administrados teriam de ser
fundamentados. Surge a questão de saber o alcance desta
fundamentação face aos poderes discricionários da administração.
Poder discricionário da administração: poder para tomar decisões com
uma certa margem de apreciação. Há determinados casos em que a lei
segue critérios fixados na lei, e há outros casos em que a lei apenas fixa
a finalidade da atuação e a administração tem uma margem de
discricionariedade, de apreciação, para a administração tomar a decisão
que considerar mais adequada. O governo emanou um 2º DL em 79, que
procura estabelecer o alcance deste dever de fundamentação
relativamente aos atos de exoneração e transferência de funcionários
que tivessem sido nomeados discricionários e que o ato de transferência
ou de exoneração fizesse também parte deste âmbito discricionário.
Nestes casos concretos, o cumprimento do dever de fundamentação
estabelecido no primeiro diploma seria suficientemente cumprido se a
administração invocasse a conveniência do serviço. Apoiando-se neste
segundo DL, que vinha estabelecer uma margem de apreciação da
administração, o Ministro dos Negócios Estrangeiros pratica um ato de
exoneração relativamente a um adido cultural: funcionário diplomático
nomeada para atuar numa área em determinada embaixada, invocando
apenas a conveniência do serviço tal como se encontrava previsto no dl
de 79. Este funcionário impugnou o ato de exoneração nos tribunais
administrativos, invocando que o diploma de 79 era nesta parte
inconstitucional, sendo que tanto o STA como o TC lhe vieram a dar
razão.
 Pode estar em causa o direito fundamental à fundamentação dos
administrados. Na altura em que toda esta situação decorreu, este
direito à fundamentação dos atos administrativos não tinha sido
incorporado na Constituição, que apenas foi inserido durante a primeira
revisão constitucional em 1982. Para efeitos do caso prático, temos de

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nos esquecer de que este direito fundamental está atualmente previsto


este direito autónomo. Apesar de o TC ter apreciado isto em 85 quando
já estava este direito estabelecido na Constituição, ele veio apreciar a
validade de um ato administrativo com base na possível
inconstitucionalidade de um diploma, o que importava era ter em conta
a versão da Constituição contemporânea a esse diploma. O direito à
fundamentação previsto num decreto-lei pode ser considerado um
direito fundamental? Pode um direito fundamental ser considerado
como tal se estiver previsto num decreto-lei? 16º/1 Constituição:
cláusula aberta dos direitos fundamentais, princípio da cláusula aberta
ou princípio da não tipicidade de direitos fundamentais, que estabelece
que para além dos direitos fundamentais consagrados na Constituição,
não se exclui que possam existir direitos fundamentais fora da
Constituição, nas leis e nas regras aplicáveis de direito internacional:
direitos fundamentais materialmente constitucionais ou direitos
fundamentais materiais, porque não são direitos formalmente
constitucionais, não estando formalmente positivados na Constituição.
O que lhes confere dignidade constitucional é o seu conteúdo do próprio
direito. Quando a norma fala em leis está a referir-se a leis da AR, a
outros instrumentos legislativos em geral ou outro significado?
 Lei em sentido amplíssimo: legal ou ilegal é usado como algo conforme
ou desconforme ao Direito, sentido pouco rigoroso do termo.
 Lei em sentido amplo: equivalente a ato ou instrumento legislativo, que
são leis da AR, Decreto lei do Governo e decretos legislativos regionais
das assembleias legislativas das regiões autónomas.
 Lei em sentido restrito: lei equivale a lei em sentido formal da
Assembleia da República.
 Quando a constituição fala em lei nesta norma está a falar em sentido
amplo ou em sentido restrito? Sentido amplo, há um consenso
doutrinário e da jurisprudência constitucional que quando o legislador
fala aqui em lei está a referir-se a atos legislativos. O artigo 165º só se
aplica a direitos liberdades e garantias, daí não ser lei em sentido
restrito.

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 Temos um direito fundamental previsto num decreto-lei autorizado de


77, decreto-lei que veio dizer que todos os atos legislativos têm de ser
fundamentados.
 Se todos os direitos previstos em lei fossem fundamentais, no limite não
precisávamos de ter um catálogo.
 A doutrina e a jurisprudência defendem que os direitos previstos na lei
só adquirem a natureza de direito fundamental se preencherem um
requisito material, também designado por fundamentalidade material.
Jorge Miranda: estabelece um critério simples para saber se é um direito
fundamental ou não. O direito previsto na lei tem de assentar desde
logo de algum modo na constituição, derivando de um de dois princípios
fundamentais estruturante: princípio da dignidade da pessoa humana 1º
e o princípio do Estado de Direito. Todos os direitos pessoais previstos
na Constituição acabam por nos conduzir ao princípio da dignidade da
pessoa humana, direitos de que a pessoa é titular pelo simples facto de
a pessoa ser um ser humano. De acordo com o professor Jorge Miranda,
usando estes dois princípios conseguimos ter um parâmetro material
para saber se o direito é um direito que se assenta na Constituição,
sendo assim fundamental.
 Aplicando estas conceções teóricas, o direito à fundamentação de atos
administrativos previsto no DL de 77 poderia ou não ser considerado
como um direito fundamental autónomo? A única possibilidade seria
aplicar a cláusula aberta do artigo 16º, que é a única maneira de um
direito previsto fora da Constituição adquirir a natureza de um direito
fundamental. O pressuposto formal está cumprido visto estarmos
perante uma lei em sentido amplo: decreto-lei autorizado. E o critério
material? Sim, pois deriva do princípio do Estado de Direito, ideia de
limitação do Estado e da Administração através do Direito e um dos
subprincípios fundamentais subjacentes ao princípio do Estado de
Direito é o princípio da legalidade da administração, que hoje em dia
atendido como um verdadeiro princípio de juridicidade da
administração. A administração está sujeita não apenas à lei mas
também a todo o direito quando atua, e esta sujeição ao Direito é
importante para limitar os poderes de atuação da administração no
âmbito do seu poder discricionário. A administração não é livre de fazer

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o que quer no seu espaço discricionário, porque tem sempre de cumprir


o Direito e os seus princípios. O particular tem o direito a saber quais os
motivos que levaram a administração a praticar o ato mesmo que esse
seja praticado no seu âmbito de discricionariedade, para podermos
recorrer da decisão, é importante que os particulares possam conhecer
os fundamentos do ato para que possam reagir perante o mesmo. Há a
ideia básica de uma garantia dos particulares face à administração. O
direito à fundamentação pode ser considerado um direto autónomo por
via da cláusula aberta do 16º/1, cumprindo o critério formal e o
material.
 Se é o próprio legislador ordinário que cria um direito que acaba por
adquirir a natureza de direito fundamental, depois não pode legislar
sobre este de novo? Os direitos liberdades e garantias previsto no
catalogo bem como os de natureza análoga (direitos económicos, sociais
e culturais, tal como os direitos fundamentais dispersos ao longo da
constituição e os direitos materialmente constitucionais) beneficiam de
um regime especial de proteção 17º Constituição. Temos de saber para
saber se beneficiam desta proteção se considerarmos que este direito
fundamental é também análogo a um direito liberdade e garantia, para
saber se beneficia do regime de restrição previsto no artigo 18º.
Pressupostos: um direito liberdade e garantia só pode ser restringindo
através de uma lei em sentido restrito, lei da AR ou dl autorizado,
reserva relativa. Qualquer restrição a direito liberdade e garantia ou a
direitos análogos a estes só pode ser feito por uma destas duas vias. 2º
pressupostos: tem de obedecer ao princípio da proporcionalidade, tem
que haver um teste de proporcionalidade entre a restrição e o impacto
da medida: exigência de adequação, necessidade e proporcionalidade
em sentido estrito (fins justificarem os meios). Os direitos liberdades e
garantia são direitos de defesa, direitos negativos, exigem uma
abstenção do Estado e de terceiro que afetem os seus direitos. TC:
considera que este direito fundamental à fundamentação é um direito
análogo a um direito liberdade e garantia, se este diploma no seu
preambulo assume que veio criar direito do homem face à
administração, não há duvidas nenhumas que este é um direito análogo
aos direitos liberdades e garantia. Legislador em 77 cria um direito

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fundamental suscetível de ser considerado análogo a um direito


liberdade e garantia. Em 79 restringe o seu âmbito. Um dos requisitos
formais para a restrição de direitos liberdades e garantias era que
apenas podias ser feito por lei da AR ou dl autorizado do GOV, a
restrição foi feita através de um decreto lei que não era autorizado, o
direito foi criado por um dl autorizado mas depois restringindo por um
decreto lei simples do governo, inconstitucuonalidade orgânica.
Podíamos também ter um problema de inconstitucionalidade material,
relativamente ao conteúdo do diploma. Qualquer restrição a um direito
liberdade e garantia ou a um direito análogo, que já vimos que é, tem de
cumprir o princípio da proporcionalidade, sendo que o TC admitiu que
era uma restrição injustificada e desproporcional. Não havendo uma
justificação, como é que sabemos se há proporcionalidade? Só podemos
em bom rigor perceber se é proporcional se conseguirmos perceber qual
é a finalidade da restrição, sendo a medida injustificada então será
forçosamente desproporcional. TC considerada neste caso que há uma
inconstitucionalidade orgânica e também material. Direitos que nem
estão na Constituição podem beneficiar de um regime que alguns
direitos constitucionalmente previstos não beneficiam? Problema em
aberto.
 Outra forma de resolver este caso era a de que o direito à
fundamentação já decorria do direito fundamental do recurso ao
contencioso, direito à impugnação de atos administrativos. O TC
entendeu que mesmo que não se entendesse que o direito à
fundamentação dos atos é um direito autónomo, sempre se teria de
entender que estava implícito, que era um direito fundamental implícito,
mesmo que não fosse autónomo. A importância de o particular ter a
fundamentação dos atos é poder recorrer dele. A dispensa de
fundamentação constitui uma restrição a este direito, quer ele seja
autónomo quer seja implícito, e, portanto, precisava sempre de
preencher aqueles requisitos.
 Há 4 categorias de direitos fundamentais:
 Catálogo;
 Fora do catálogo, mas na Constituição (68º ou 268º/4 Constituição);
 Implícitos, que advêm, de direitos que estão na Constituição

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 Direitos previstos em lei ou regras de direito internacional e que


ganham relevância pela cláusula aberta do artigo 16º/1 Constituição.
1.3. Direito ao esquecimento
- O que é o direito ao esquecimento? Esquecer que tipo de
informação? Informações que estão disponíveis na internet, num
primeiro momento. Estavam em causa informações disponíveis à
Internet, direito ao esquecimento é o direito a que as pessoas têm de
pedir que os seus dados sejam retirados da Internet. Possibilidade de
um cidadão poder exigir ao operador de um motor de busca online
que ocultasse certos dados pessoais dos resultados de pesquisa que
aparecem quando se utiliza um motor de busca.
- Em 1998 um cidadão espanhol tinha dívidas à Segurança social foi
alvo de um arresto de imóveis para garantir o pagamento do valor em
dívida. Foram os bens postos em venda em público e foram
comunicados em anúncios na comunicação social para garantir que os
potenciais compradores tinham acesso que esse bem estava à venda.
A situações foi resolvida e a dívida à segurança social foi paga. Em
2010 este cidadão espanhol formulou uma queixa à agência
espanhola de proteção de dados, pois sempre que alguém pesquisava
pelo nome dele no motor de busca operado pela Google nos
resultados de pesquisa apareciam duas ligações para as páginas de
um jornal espanhol de onde constavam estes anúncios para a venda
de bens. Pedia que o jornal fosse ordenado a eliminar do seu artigo
online estes 2 anúncios com 12 anos de idade, e pediu à agencia que
ordenasse à Google que deixasse de exibir estas duas ligações
enquanto resultado de pesquisa quando alguém pesquisasse o nome
dele.
- A agência espanhola entendeu que relativamente ao jornal não
poderia obriga-lo a apagar as noticias em questão pois continha factos
verídicos, a informação era verdadeira, e o jornal tinha publicado esta
informação de forma legitima, para potenciar esta venda junto dos
potenciais compradores. Em nome da liberdade de imprensa, não
poderia obrigar o jornal a pagar estas informações-

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- Relativamente à Google, era possível ordenar a que a mesma não


exibisse a ligação para estas duas páginas nos resultados de pesquisa
que apareciam quando alguém pesquisava o seu nome no motor de
busca.
- A Google impugnou a decisão nos tribunais espanhóis, o tribunal
espanhol competente formulou um pedido de reenvio judicial para o
TJUE, que visa garantir a efetividade da legislação europeia. O tribunal
tem dúvidas sobre como determinado regulamento deve ser
interpretado, e por isso faz um pedido de reenvio judicial, quem tem
competência para apreciar a validade ou a invalidade da legislação
europeia é o TJUE. O tribunal tamnbem pode reenviar para o TJUE no
caso de um problema de validade da legislação europeia. Estávamos
perante um problema de interpretação, o tribunal queria saber de
que forma é que poderia ser interpretada a diretiva europeia da
proteção de dados e também de que forma é que poderia ser
entendido o artigo 7º e o artigo 8º da Carta de Direitos Fundamentais
da União Europeia.
- Neste reenvio, queria-se saber se à luz do direito europeu uma pessoa
pode exigir ao operador de um motor de busca que elimine da lista de
resultados que aparecem quando se utiliza o motor de busca, certas
páginas da internet que apesar de conterem informações verdadeiras
e informações publicadas de forma legitima, se existe um direito a
que essas informações sejam retiradas do motor de busca, com base
num eventual direito ao esquecimento, direito de uma pessoa
poderem invocar que as mesmas informações verdadeiras e
publicadas de forma legitima, as mesmas já não são pertinentes,
tendo passado um determinado período de tempo.
- O tribunal entendeu que sim determinados verificados pressupostos,
que a pessoa poderia beneficiar do direito ao esquecimento. O
tribunal entendeu que o efeito na ingerência da vida privada de uma
pessoa era muito maior quando estava em causa dados pessoais
divulgados pelo motor de busca do que simplesmente dados pessoais
publicados de forma avulsa em páginas online. O motor de busca não
vai criar novas publicações, remete para páginas de internet.

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- Efeito de amplificação da informação produzida a partir do motor de


busca, assim denominado pelo tribunal: a pesquisa do nome de uma
pessoa no motor de busca permite a quem está a pesquisar a ter um
acesso global de todas as informações sobre essa pessoa. Todas estas
informações espalhadas pela internet e agrupadas pelo motor de
busca permitem a quem pesquisa fazer um perfil mais ou menos
elaborado sobre essa pessoa, dependendo do nível de informação
publicado. O tribunal entendeu que este efeito de amplificação dos
motores de busca era particularmente intenso tendo em conta a
utilização de internet que é feita nos dias de hoje e também dos
próprios motores de busca. O tribunal entendeu que esta obrigação
de retirar conteúdos dos resultados de pesquisa se podia impor aos
motores de busca mesmo que não fosse possível pedir às paginas
concretas que publicaram os anúncios em questão que retirassem os
mesmos, que foi o que aconteceu neste caso. A Google não poderia
tornar visível estas informações nos resultados de pesquisa
produzidos pelo motor de busca. O tribunal entendeu que esta
obrigação de retirar as ligações do motor de busca era independente
face a uma eventual obrigação dos eventuais titulares da pagina em
questão terem de a eliminar.
- A pessoa só pode invocar o direito ao esquecimento se a informação
publicada online quando esta é falsa? As informações podem ser
verdadeiras, como no caso em concreto, o facto de a informação ser
verdadeira não é um impedimento para que se possa afirmar o direito
ao esquecimento.
- É preciso que o titular dos dados pessoais invoque um prejuízo para a
sua pessoa pela informação estar divulgada? O tribunal considera que
não é necessário o prejuízo. Não exige que a noticia seja falsa nem
sequer que a noticia tenha causado um dano à pessoa visada pela
notícia. Este acórdão afirmou um direito ao esquecimento de forma
autónoma, independentemente de ser produzido um dano concreto
ou da noticia não ser verdadeira. O simples facto de a noticia for
publicada e ter corrido um determinado prazo de tempo, pode
legitimar que a pessoa invoque o seu direito a ser esquecida, por via

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de princípio. O direito da pessoa a pedir ao operador do motor de


busca que a deixe esquecer das noticias que já não são pertinentes ou
relevantes por ter decorrido um certo período de tempo.
- O tribunal entendeu que dependia a cada pessoa afetada de fazer um
pedido expresso ao operador do motor de busca, que deve fazer uma
ponderação de direitos e interesses contrapostos. De um lado, temos
o direito da pessoa visada pela notícia, sendo que o TJUE entendeu
que nestes casos deveria ser particularmente relevante o direito à
reserva da vida privada, o pedido de reenvio incidia sobre o artigo 7º
e 8º da Carta dos Direitos Fundamentais, sendo que no 7º estava a
reserva da vida privada. O tribunal entendeu que o motor de busca
deveria sempre ter em conta o direto à reserva da vida privada da
pessoa afetada. O interesse contraposto que deve ser ponderado é o
interesse do público em geral a poder aceder a essa informação.
Interesse económico do operador do motor de busca. Um motor de
busca tem um interesse em espelhar toda a informação disponível na
internet e, portanto, se o motor de busca oculta informação
disponível o sistema do motor de busca deixa de ter eficácia. Temos o
critério que os operadores do motor de busca devem seguir para
ponderar se retiram ou não essa informação da internet.
- De forma auxiliar, o tribunal entendeu que poderiam ponderar fatores
específicos: a natureza do tipo de informação (se era relevante
quando foi publicada e já não o é agora), a sensibilidade dessa
informação para a vida privada da pessoa em causa e o interesse do
publico em geral na disposição dessa informação, que irá depender do
papel desempenhado pela pessoa na sua vida pública.
- O tribunal entendeu que deveria prevalecer o direito ao
esquecimento. No respeito à natureza da informação, a noticia já não
era relevante nos dias de hoje, já tinham passado 16 anos, sendo a
decisão de 2014. No que respeito à sensibilidade da informação para
a vida privada da pessoa afetada, o cidadão tinha um interesse
legítimo a não ter uma lista de dívidas associada ao seu nome. No que
respeita ao eventual interesse do publico a aceder à notícia, os juízes
decidiram que não vislumbravam algum interesse do público a saber,

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mas remeteu a decisão final para o tribunal espanhol para que ele
pudesse avaliar este ultimo ponto.
- O direito ao esquecimento em 2016 veio a ser consagrado de forma
autónoma no artigo 17º do novo regulamento de proteção de dados
da legislação europeia, que irá entrar em vigor em maio de 2018,
tendo revogado a diretiva anterior.
- À luz do direito constitucional português, devemos considerá-lo um
direito fundamental?
- É o direito ao esquecimento um direito consagrado de forma
autónoma no catálogo da Constituição, dos artigos 24º ao 79º? A
última revisão constitucional foi feita em 2005, a constituição está
sem ser revista há 12 anos, sendo que em 2005 o legislador não
teve a preocupação de prever este direito ao esquecimento, que
não está expressamente previsto nem no catálogo nem fora do
mesmo.
- Assim sendo, pode ter o direito ao esquecimento a natureza de um
direito fundamental? Preferencialmente, devemos sempre ir pelos
direitos fundamentais implícitos, quando temos simultaneamente
essa possibilidade e a cláusula aberta do artigo 16º. O direito ao
esquecimento não está expressamente previsto na Constituição.
Na década de 70, o tribunal federal alemão estabeleceu este direito
ao esquecimento relativamente à publicação de noticias, o que é
novo é a aplicabilidade deste direito ao esquecimento
relativamente aos motores de busca. Podemos tentar encaixá-lo
num direito expressamente previsto na Constituição, direito
fundamental implícito. Direito à reserva da vida privada, o que é
este direito à luz do direito civil? Direito especial de personalidade
previsto de forma autónoma no artigo 80º do CC, os direitos de
personalidade estão tutelados na Constituição? Sim, no artigo 26º:
agrupa uma série de direitos de personalidade. Direito à reserva da
intimidade da vida privada e familiar, no 26º/1, do qual retiramos
de que o direito à reserva da vida privada é um direito fundamental
e mais do que isso é um direito de liberdade e garantia. Se
aceitarmos que o direito ao esquecimento é um direito que está

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ainda incluído neste âmbito de garantia do direito à reserva da vida


privada, podemos argumentar que este tem a natureza
fundamental, porque embora não esteja expressamente
consagrado constitucionalmente, é um direito implícito porque
este decorre de um direito expressamente previsto
constitucionalmente, tal como o Tribunal da União Europeia
entendeu.
- Direito ao desenvolvimento da personalidade: o artigo 26º da
Constituição consagra este direito, direito que uma pessoa tem a ir
desenvolvendo os aspetos fundamentais da sua personalidade ao
longo da sua vida, mas o direito especial de personalidade
consagrado no CC? Direito geral de personalidade: 70º CC,
consagra uma cláusula geral, para além dos direitos especiais da
personalidade regulados especialmente no CC, temos uma clausula
geral consagrada no artigo 70º do CC, que abrange uma série de
aspetos gerais relacionados com a personalidade de uma pessoa,
não se esgotam nas vertentes mais especificas do direito geral de
personalidade. Perspetiva dinâmica: desenvolver os elementos
essenciais ao longo da sua vida. Uma pessoa deve ter o direito de ir
contruindo uma vida sem estar presa ao seu passado, temos dois
direitos de personalidade que permitem afirmar como direito
fundamental implícito o direito ao esquecimento.
- Era também possível recorrer à clausula aberta do artigo 16º/1 e
dizer que o direito ao esquecimento é um direito materialmente
constitucional? Pressuposto formal: temos de estar perante um
direito previsto na lei em sentido amplo, que abrange qualquer
instrumento legislativo do ordenamento jurídico português, ou em
regras aplicáveis de direito internacional. Este direito ao
esquecimento está consagrado numa regra aplicável de direito
internacional? Sim, está consagrado num regulamento da União
Europeia. E se não tivesse sido autonomamente previsto neste
regulamento, poder-se-ia invocar a decisão do tribunal de justiça e
dizer que então este direito ao esquecimento está consagrado
numa regra aplicável de direito internacional? A questão não se
coloca porque seria forçado e muito duvidoso que uma decisão

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

judicial se pudesse considerar uma regra aplicável de direito


internacional, porque os tribunais não criam regras, mas sim
aplicam-nas, o TJUE não inventou o direito ao esquecimento, mas
sim interpreta e aplica regras já existentes. Sem regulamento, não
poderíamos recorrer na perspetiva do professor a uma decisão do
tribunal enquanto regra aplicável de direito internacional.
- Critério material: tem de decorrer de um de dois princípios
basilares, o princípio da dignidade da pessoa humana ou do
princípio do Estado de Direito. Os direitos de personalidade são
direitos de que o ser humano beneficia por beneficiar do estatuto
de pessoa, não são mais do que um reflexo pelo facto de o
ordenamento jurídico atribuir ao ser humano o estatuto de pessoa.
A partir do momento em que se constata que decorre de um
direito de personalidade consta-se que está implica da dignidade
da pessoa humana.
- Quando temos estas duas opções devemos sempre optar pela
premiria – direitos fundamentais implícitos – e não pela cláusula
aberta do 16º/1, algo que o TC também o faz. É sempre melhor
fundamentar a existência de um direito por referência direta à
constituição do que fora da mesma. É muito mais forte dizermos
que aquele é um direito fundamental porque está implícito de um
direito expressamente consagrado, do que recorrer à clausula
aberta, o que levanta mais duvidas porque há uma discussão sobre
saber em que medida é que os direitos análogos aos de liberdades
e garantias podem beneficiar do regime dos Direitos liberdades e
garantias.
- Quando limitamos o âmbito de proteção de um direito, tal
depende saber o que é o direito ao esquecimento, esferas da vida
privada que tutela, em que circunstâncias, ... se o direito não está
integrado no sistema de direitos fundamentais já previsto, temos
de limitar os contornos deste direito fundamental dentro desse
sistema. Tal pode gerar um problema de colisão de direitos,
problema inerente sempre que criamos um direito novo, temos de
encontrar o espaço que eles vão ocupar no sistema constitucional.

Mariana Garção 16
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

O direito à reserva da vida privada colide com liberdades


fundamentais previstas na constituição, nomeadamente com a
liberdade de imprensa (38º Constituição), a liberdade de expressão
(37º/1) e liberdade de informação, do público em geral a aceder a
informação. No fundo, o desafio que se coloca é fazer a
concordância prática entre este direito ao esquecimento e estas
liberdades. Podem os políticos e criminosos gozar deste direito ao
esquecimento? Deve prevalecer o direito à reserva da vida privada
do político ou interesse do publico em geral a ser informado sobre
o político? Depende da natureza da informação em questão. Se
utilizarmos os critérios que o TJUE utilizou, um dos critérios era o
de ponderar o papel da pessoa desempenhado na vida pública,
este direito pode prevalecer sobre o direito à reserva da vida
privada. Mas é sempre necessário ter em ponderação a natureza
da informação e também à sensibilidade para a vida da pessoa, o
efeito invasivo que tem para a vida da pessoa em questão.
Dependerá sempre dos circunstancialismos do caso.
- Criminosos: perspetiva da ressocialização. Não podemos aceitar
que alguém depois de cumprir uma pena continue a pagar pelo
crime que cometeu. A lista de pedófilos não está disponível no
motor de busca, mesmo em relação a este crime há especiais
salvaguardas. No fundo, não há uma resposta. O arguido deve ter a
possibilidade para reintegração social após cumprir a pena, desde
logo para não prejudicar a vida futura, mas tem sempre de ser visto
consoante o caso concreto e ponderando os interesses em causa.
1.4. Ensino da religião e moral nas escolas públicas
- 1ª questão: poderá haver ensino de religião e moral numa escola
pública?
- Se calhar há obstáculos no direito positivo que obstam a esta
possibilidade, a nossa Constituição tem uma especial preocupação
em que o Estado seja laico, a Constituição consagra a laicidade do
estado e do ensino. 41º: liberdade de consciência, de religião de
culto. O que é a liberdade de consciência? A pessoa pode ter as
suas próprias ideias e tal não ter uma grande consequência prática

Mariana Garção 17
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

e poder exprimi-la livremente resulta da liberdade de expressão,


assim como a liberdade de religião deve incluir a liberdade de uma
pessoa praticar ou não praticar uma religião, e não apenas
acreditar no que quer, no âmbito do seu pensamento. Será a
liberdade de consciência a liberdade de cada um fazer o que quer?
O sentido mais imediato parece ser este.
- Laicidade do Estado: liberdade de consciência e religião
consagrado no artigo 41º Constituição. Direito mãe que está na
base dos restantes direitos. Em termos históricos foi um pouco
assim. A liberdade de consciência e de religião começa a afirmar-
se com a modernidade, século XVI, a liberdade de consciência e
religião tem um papel fundamental na história dos direitos
fundamentais porque é uma liberdade básica, é quase como se
dentro do catálogo de direito fundamentais encontrássemos esta
liberdade como quase nuclear e por isso é considerada inviolável.
Só há 3 direitos invioláveis por força da nossa constituição: vida,
integridade pessoal e liberdade de consciência e de religião. Há a
ideia de que estes direitos são particularmente fortes e
categóricos.
- Pode o ensino nas escolas públicas ser confessional, i.e., pode o
ensino basear-se numa religião? Não, pelo 43º/3 Constituição. Nas
escolas de matriz religiosa temos um ensino confessional. Este
ensino não é permitido pela nossas Constituição nas escolas
públicas. Em nome da liberdade de consciência e de religião
podem existir escolas com este tipo de ensino, e assim sendo, os
pais optam livremente por se quererem um ensino de matriz
religiosa ou de matriz laica para os filhos.
- Quando se introduz uma disciplina de religião e moral católica
numa escola pública, isto ano será tornar o ensino confessional?
Se a disciplina for obrigatória, o professor António Cortês
considera que tal não viola a não confessionalidade do ensino,
porque haver uma disciplina de religião e moral não tornar o
ensino confessional, o que o torna é haver todo um cariz religioso

Mariana Garção 18
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

que subjaz a todas as disciplinas, mesmo aquelas que não são de


religião de moral.
- António Cortês: uma disciplina de religião e moral obrigatória não
viola a proibição da confessionalidade do ensino público, ter uma
disciplina de religião e moral não torna o ensino confessional. O
professor considera ser inconstitucional, mas não pelo facto de
violar a não confessionalidade do ensino público, mas sim a
liberdade religiosa. Obrigar as pessoas a ter uma disciplina de
religião e moral católica antes de violar a igualdade, viola
claramente a liberdade religiosa, porque há pessoas que não
querem ser católicas e pais que não querem que os filhos tenham
um ensino religioso, se isso fosse estabelecido obrigatoriamente
violaria a liberdade religiosa na sua dimensão negativa. No nosso
caso, não há violação da liberdade religiosa porque a disciplina é
facultativa, as pessoas têm a liberdade de não se inscreverem na
disciplina, não havendo a violação nem do 43º/3 (estabelece a não
confessionalidade do ensino pública) nem do artigo 41º/1 (a
liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável) da
Constituição. Contudo, no próprio ensino da religião há uma
dimensão cultural, as pessoas ao aprenderem religião estão de
alguma forma a assimilar cultura. Será que a nossa Constituição
consagra como direito fundamental algum direito à cultura? Sim,
no artigo 73º consagra o direito à cultura. Os grandes autores da
filosofia ateia como Nietzsche que escreveu o livro de anti religião,
apenas conseguiu negar a religião porque a conhecia muito bem.
A verdadeira liberdade religiosa supõe que as pessoas tenham
conhecimentos que a permitam escolher em consciência. Se a
disciplina impuser elementos de determina religião irá contra a
liberdade religiosa. Se for uma disciplina de religião e moral
católica com um conteúdo fortemente confessional (por exemplo,
obrigar os alunos a fazer o que a igreja católica diz sob pena de
estarem errados, é uma óbvia violação da liberdade religiosa).
- Como é que podemos negar aquilo que não conhecemos?

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- A nossa liberdade individual compreende-se sempre no contexto


de uma determinada comunidade política, sendo que se esta fizer
a opção de ter um modelo não apenas laicista, religião limitar
todos os elementos religiosos, mas apenas laica então uma
perspetiva de laicidade mas não de laicismo seria a mais
adequada. Se a opção da comunidade política nomeadamente
através de lei for de uma comunidade laicista, como o que
acontece em França, exclusão de todos os tipos de elementos
religiosos da esfera pública.
- Levado o argumento de que posso escolher não ter uma disciplina
de religião de moral só porque sim, sem conhecer, ao absurdo,
seria a de dizer que a verdadeira liberdade individual seria dizer
porque e que temos de ter conteúdos históricos? Não quero
saber, portanto esta disciplina deve ser optativa. Para esta
vertente, a verdadeira liberdade seria esta liberdade
existencialista o Sarte defendia de que estamos condenados a ser
livres e de ninguém nos poder impedir de tal.
- António Cortês: a religião influencia fortemente a vida de uma
pessoa. Uma pessoa que é católica ou judia ou islâmica,
dificilmente deixa de condicionar os atos do seu dia a dia nas mais
pequenas coisas pela religião que professa.
- É a religião um fenómeno cultural com uma fortíssima expressão?
Como é que podemos assegurar uma sociedade tolerante, de
verdadeiro diálogo, de abertura ao outro e de reconhecimento do
outro enquanto outro, se não conseguirmos compreender as
pessoas que vivem à nossa volta e que têm uma religião? Temos
que ter também noção daquilo que não conhecemos e o primeiro
princípio filosófico da vida até devia ser este: praticar douta
ignorância, mas conseguimos ser mais tolerantes se conhecermos.
Ex.: islamismo, é muito mais fácil dizer que todos os islâmicos são
terroristas e que devem ser banidos do que compreender que no
islamismo existem muitas confissões diferentes (xiitas e sunitas
nada têm que ver uns com os outros), conhecer um pouco do Al
Corão, saber que há muito em comum com o Cristianismo.

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

Sofistas: seita mística islâmica que defende que Jesus enquanto


profeta tem um valor tao grande como Maomé, e isto já se situa
na fronteira com o Cristianismo, e por isso é que as seitas místicas
das grandes religiões estão muito mais próximas entre si do que as
igrejas. Temos de ser tolerantes em relação ao que não
conhecemos, mas somos capazes de ser mais tolerantes com
aquilo que conhecemos. A tolerância neste sentido mais
abrangente do termo é a abertura ao outro e não apenas o
desconhecimento face ao outro.
- A discussão sobre os direitos fundamentais é em ultima análise
uma questão filosófica, e esta da liberdade de religião é uma
discussão filosófica por excelência.
- Jorge Miranda: defende que esta disciplina viola o princípio da
igualdade porque deveria haver esta opção também para outras
religiões e não apenas para a religião católica, estando sempre
sujeito a um numerus clausus.
- Separação entre as igrejas e o Estado: 41º/4 Constituição, não há aqui
uma mistura? Separação entre as igrejas e o Estado é separação,
quando admitimos o ensino de religião e moral correspondentes a uma
religião a que por sua vez corresponde uma determinada igreja, dentro
do espaço do estado que é a escola pública isto não viola este princípio
da separação entre as igrejas e o Estado? Cerne do conceito de
separação entre as igrejas e o Estado, parece ao professor que
separação não exclui colaboração. As igrejas e o Estado têm de ser
separadas, seria inconcebível que houvesse um conselho religioso
dentro de uma camara municipal ou dentro da escola pública, amas
colaboração, a possibilidade de. Estado disponibilizar um espaço para
que possa haver ensino correspondente a uma determinada religião
parece não ser excluído pela ideia de colaboração. A interpretação do
princípio da separação entre as igrejas e o Estado tem uma opção
filosófica de fundo: opção mais laica ou mais laicista. Na opção laicista,
é absolutamente inadmissível que possa haver qualquer tipo de
mistura entre igrejas e o Estado, é inadmissível que o espaço publico
possa ser ocupado pelo ensino de uma religião, numa opção laica, mas

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

não laicista é admissível que possa haver uma colaboração entre os


poderes religiosos e os poderes estatais, sem que essa colaboração leve
a que uns interferiam no poder dos outros como acontecia se o
Governo pudesse vetar os bispos, o que acontecia durante a primeira
república. Esta possibilidade de se disponibilizar um espaço para o
ensino da religião e moral é apoiado por algum direito social? O direito
à cultura poderia interferir eventualmente na interpretação da
liberdade religiosa, e o direito à cultura é um direito social. 67º/2 c):
está no âmbito dos direitos sociais e, de acordo com o mesmo, o
Estado deve cooperar com os pais na educação dos filhos. Se os pais
pretendem que os filhos tenham um ensino da religião moral e católica,
é a própria religião a dizer que o Estado deve cooperar com os pais na
educação dos filhos. Se os pais pretendem essa educação, é conforme
ao 67º/2 c) que o Estado ajude os pais nessa tarefa, nomeadamente
disponibilizando uma disciplina de religião e moral nas escolas públicas.
Poder-se-á afirmar que se os pais quiserem podem levar à catequese,
mas não é a mesma coisa, exigiria que os pais tivessem de se deslocar
com as dificuldades inerentes à presença no local de trabalho, e é
diferente os filhos não terem de sair da escola, aprenderem na própria
escola sem deslocações dos pais. É uma ajuda que o Estado dá aos pais.
Para além disso, os próprios pais podem pretenderem o ensino da
religião moral e católica, mas não pretenderem por os filhos na
catequese, porque aí sim há uma verdadeira confessionalidade, que os
pais podem não querer.
- O principio da separação entre as igrejas e o Estado deve ser
interpretado à luz do princípio da colaboração com o Estado na
educação dos filhos. Isto é um direito social, e a separação entre
as igrejas e o Estado? É um direito de liberdade.
- Os direitos de liberdade não estão desligados dos direitos sociais.
- Os próprios direitos de liberdade devem ser interpretados à luz
dos direitos sociais. O catálogo de direitos de liberdade e de
direitos sociais é um único catálogo, e os direitos de liberdade não
existem desligados dos direitos sociais. Pode haver relações de
reforço mutuo entre direitos de liberdade e direitos sociais. O

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

direito à cultura e o direito à colaboração do Estado na educação


dos filhos são dois direitos sociais que são importantes para
interpretar o exato sentido da liberdade religiosa e da separação
entre as igrejas e o Estado.
2.
2.1. Crime de lenocínio
- Identificar a questão a resolver: é sempre inconstitucionalidade de uma
norma, neste caso do artigo 170º do CP que pune o crime do lenocínio, o
crime de favorecimento da prática da prostituição.
• 170º do CP: é esta norma cuja constitucionalidade deve ser apreciada.
- Duas soluções possíveis: inconstitucionalidade ou não inconstitucionalidade
do crime do lenocínio. Alternativa binária.
- Argumentos a favor de uma solução e argumentos a favor da solução
alternativa: argumentos a favor da inconstitucionalidade e argumentos a
favor da não inconstitucionalidade.
• Argumentos a favor da inconstitucionalidade: ir à Constituição e ver se há
algum direito que possa eventualmente estar a ser violado. Artigo 41º e
artigo 47º Constituição. A questão suscitada é se não haveria violação
dessas normas.
 Artigo 41º: está em causa a liberdade de consciência, pois esta questão
é independente de uma questão religiosa. A Constituição afirma o
princípio da inviolabilidade da liberdade de consciência.
 Artigo 47º: liberdade de profissão e de género de trabalho.
 Quem defende a não criminalização do lenocínio no fundo o que diz é
que por razoes de saúde pública e por razoes de salvaguarda da saúde
das mulheres que se prostituem, é melhor que façam isso em casas de
prostituição, pretendem que seja organizado para que não haja
prostituição avulsa. Poder-se-ia dizer que o interesse coletivo seria um
interesse de saúde pública de criar melhores condições para aquelas
mulheres, mas não há nenhum interesse que se oponha a esta
institucionalização da prostituição.
 Não há o crime de prostituição, uma coisa é uma pessoa decidir usar o
seu corpo na sua liberdade, outra coisa é outras pessoas provocarem e
beneficiarem desse mesmo facto. Pode-se dizer que isto é uma mistura

Mariana Garção 23
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

entre direito e moral, estamos a fazer uma censura moral sobre estas
pessoas que se aproveitam da prostituição de outrem.
 Figueiredo Dias: a dignidade da pessoa humana não é um bem jurídico,
não há bem jurídico por detrás da criminalização do lenocínio, e de
acordo com o princípio constitucional do bem jurídico só é válido
estabelecer uma criminalização para proteger um determinado bem
jurídico concreto. A dignidade da pessoa humana é um princípio
jurídico que engloba todo o sistema, mas não é um bem jurídico
determinado que implique a criminalização.
 Poderíamos afirmar que isto está abrangido pela liberdade de
consciência e da liberdade de profissão, as pessoas se quiserem
poderem-se prostituir.
 Não há nada que leva a querer que a prostituição não possa ser um
trabalho nem uma profissão, pode é haver outras razões que nos levam
a concluir que deve haver limites a esse trabalho, mas à Partida devem
estar incluídos na liberdade de profissão e de trabalho.
 Um homem ou uma mulher prostituir-se pode considerar-se abrangido
pela liberdade de profissão ou na liberdade de consciência? Na
liberdade de profissão parece poder encaixar-se, o professor não vê
porque não, a menos que consigamos encontrar um interesse coletivo
que justifique por termo a isso.
 Liberdade de consciência: se a liberdade de consciência fosse a
liberdade de fazer o que quer uma pessoa podia cometer qualquer
crime e depois invocar a liberdade de consciência. “Matei porque
acredito que posso dispor da vida dos outros”. Liberdade de
consciência: liberdade da pessoa fazer aquilo que tende correto, sendo
certo que pode haver diferentes opiniões sobre aquilo que é ou não é
correto. é o direito à autonomia ética. cada um fazer o que tende
eticamente correto ou aceitável. António Cortês: pode-se ainda
concluir eventualmente ainda a prostituição dentro da liberdade de
consciência entendida desta forma, entendida desta forma de se poder
fazer aquilo que se entende eticamente correto ou aceitável, não é
indefensável que a liberdade de dispor do corpo, inclusivamente
sexualmente, por dinheiro, que isso seja defendido. Por exemplo, numa
posição utilitarista, esta posição seria claramente aceitável, o

Mariana Garção 24
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

utilitarismo diz que a grande objetivo da ética é a maximização da


felicidade das pessoas, se há alguém que recorre à prostituição por
gosto ou por querer ganhar dinheiro, ambas ficavam mais felizes com
essa solução. É possível incluir isto ainda dentro da liberdade de
consciência, simplesmente esta tem de se entender. Se a prostituição
for em plena autonomia do homem ou da mulher que se prostitui,
pode porventura haver uma maximização da felicidade, se o homem ou
a mulher que se prostitui porque precisa de dinheiro para a droga,
comer ou sobreviver, o professor não tem dúvida de que a prostituição
não construi para a felicidade dessas pessoas, é um ato suicidário.
• Argumentos a favor da não inconstitucionalidade:
 Artigo 47º: pode-se invocar a expressão “salvas as restrições impostas
pelo interesse coletivo”, contudo esta é muito vaga e indeterminada,
como é que vamos saber se há algum interesse coletivo em causa? Há
algum interesse coletivo em proibir a prostituição?
 O que está em causa no lenocínio é este incitamento por parte de
terceiros, e esta organização, da prostituição.
 Do ponto de vista estritamente jurídico pode-se levantar a questão de
que o sistema dos direitos fundamentais tem um princípio básico, que
é o da dignidade da pessoa humana, que postula, exige que, de acordo
com a fórmula de Dürig, quando a pessoa é degradada à condição de
mero objeto, de mero meio, de medida fungível quando no fundo é
instrumentalizada e não é tida como um fim em si. Que a pessoa se
auto instrumentalize pode ser uma questão moral, mas que outras
pessoas se aproveitem da instrumentação da pessoa parece já poder
ser uma questão jurídica. Se estiver tudo na esfera de liberdade da
pessoa então será uma questão moral, mas no quadro do Direito,
quando a pessoa entra em relação com outra, é um problema jurídico.
Dignidade da pessoa humana: a pessoa é objeto de prostituição não
será punida, mas quem se aproveita da condição dessa pessoa será
punido.
 Nos sistemas penais tradicionais, a moralidade pública era um bem
jurídico, havia um crime de atentado ao pudor e por aí fora. Hoje em
dia, o acento tónico não está na moralidade pública, mas sim na
autodeterminação sexual, esta é um bem jurídico.

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

 Na esmagadora maioria dos casos na vida social a pessoa entra nessa


vida pelas circunstâncias. Não há verdadeira liberdade, o sistema tem
legitimidade para punir o aproveitamento da fragilidade das pessoas.
- Solução de direito: a que tiver mais razões a seu favor do que razões contra.
• Há bastante discordância na doutrina sobre a solução a dar ao problema.
• Tribunal Constitucional: entendeu que o incitamento à prostituição
poderia ser criminalizado.
• Professor Figueiredo Dias: entende como não constitucionalmente válida
a criminalização.

2.2. Saber se este despacho normativo que proíbe esta atividade é ou não
inconstitucional.
- Outra coisa são os fundamentos invocáveis para solucionar o caso no
sentido da inconstitucionalidade, ou, por outro lado, no sentido da não
inconstitucionalidade.
- Primeira coisa a saber qual é a norma objeto de fiscalização da
constitucionalidade.
- A seguir, temos de ver que direitos ou princípios é que podem estar a ser
violados: liberdade de exercício da profissão que também especifica a
liberdade de escolha do género de trabalho 47º/1 Constituição. O anão não
poderia invocar o direito ao trabalho previsto no artigo 58º? Porque não é
um direito de liberdade e garantia, não é um direito que a Constituição
consagre expressamente como um direito diretamente aplicável, é um
direito social com um sentido essencialmente programático. No entanto,
hoje, a doutrina defende cada vez mais que há uma tendencial equiparação
dos direitos sociais aos direitos, liberdades e garantias, não choca,
portanto, que se invocasse com a consciência de que o direito ao trabalho é
apenas um direito social, é um objetivo a prosseguir pelo Estado, e não um
direito diretamente exigível pelas pessoas, é um objetivo político e
programático para a ação do Estado. O que é diretamente exigível em
Tribunal é a liberdade que a pessoa tem de exercer a profissão que quiser e
de escolher o género de trabalho que quer.
- Poderíamos recorrer à formula de Dürig: a dignidade humana é degradada
quando uma pessoa é utilizada como mero objeto, como mero instur,ento e

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

coisa fungível, sendo que aqui está claramente a ser utilizada como um
mero instrumento de arremesso.
- Se a liberdade de escolha de profissão for verdadeira, se não estiver o anão
a ser pressionado ou compelido a isso, essa liberdade de escolha de
profissão deve ser garantia. António Cortês: temos de ter em conta não
apenas a liberdade de escolha da profissão, mas também a dignidade das
pessoas, e de acordo com a fórmula de Dürig, tendo em conta a dignidade
da pessoa humana, postula que as pessoas não sejam utilizadas como mero
objeto ou meras coisas fungíveis. Para o professor é difícil de conceber uma
situação em que uma pessoa esteja a ser mais instrumentalizada do que
neste caso.
- Há muitas situações em que o Direito sanciona quem se aproveita da
instrumentalização de outras pessoas, mas não sanciona a própria as
pessoas instrumentalizadas, é como por exemplo o auxilio a suicídio, o
suicídio não é punido por razoes de compaixão, mas a pessoa que põe ali a
pistola ao lado é punida porque não respeita a vida do outro, é punida não
com pena de homicídio, mas auxilio ao suicídio, o que resulta numa pena
muito inferior.
- Mas imaginando que o dinheiro daquele jogo é todo para o anão, não é a
dignidade da pessoa humana deixá-la fazer o que ela quer? O anão é
adulto, faz o que quiser, se quiser ser lançado por 15€. Faz isto sentido?
- É legitima uma lei que limite esta liberdade de profissão? Se não houver lei
nenhuma, se não houver este despacho normativo a proibir isto, esta
prática é uma prática lícita ou não? Se não houver uma regra ou principio a
proibir, em princípio poder-se-ia dizer que é lícita. Podia-se dizer que havia
a dignidade da pessoa humana, mas este princípio só por si não é
suficientemente denso para só por si implicar a proibição de uma prática.
Tem que haver uma norma mais especifica que venha concretizar este
princípio proibindo esta prática.
- Não haveria problema algum no lançamento do anão se não houvesse
nenhuma norma a proibi-la de forma expressa.
- É esta norma legítima e constitucional? É o poder que tem que se justificar
em face da liberdade e não a liberdade em face do poder. Será que o poder
público que proíbe esta prática tem justificação suficiente para a proibir, ou

Mariana Garção 27
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

não? Aqui entra o princípio da dignidade da pessoa humana. O poder


justifica essa proibição com base na ideia de que aquela prática põe em
causa a dignidade das pessoas. Podemos perguntar se é legitimo o poder
público proteger a dignidade das pessoas para além das liberdades
individuais dessas mesmas pessoas, i.e., será que há como que uma
dimensão objetiva do princípio da dignidade humana que extravase a
própria liberdade das pessoas? Não há dúvida de que uma das exigências
da dignidade da pessoa humana é a de que a liberdade das pessoas seja
respeitada, a pessoa só tratada como fim em si mesmo quando a sua
liberdade é respeitada.
- Em todos os direitos fundamentais salvaguarda-se que as pessoas não
sejam instrumentalizadas em nome de fins exteriores – à segurança pública,
interesse público, por interesses das empresas, por interesses da economia,
por interesses dos outros – em todos os direitos fundamentais, de alguma
forma, está em causa as pessoas serem titulares de uma posição fixa de fins
em si, sem estarem ao abrigo de uma qualquer instrumentalização.
- Neste caso, parece que se joga com todo o sistema de direitos
fundamentais.
- A questão está em saber se o poder público tem legitimidade para olhar
para uma prática destas e entender que põe em causa a dignidade das
pessoas, proibindo a mesma, porque o anão entende que tal não põe em
causa a sua dignidade, e as pessoas que o lançam também não, tal como
não o pensam as pessoas que o organizam.
- A pessoa é responsável pela sua liberdade ou é também responsável que a
imagem que projeta de si mesma e das pessoas que lhe são semelhantes.
Aquele jogo está a passar uma mensagem de que os anões servem para ser
lançados num jogo, de que podem ser objetos de arremesso. Quem se opôs
a esta prática foram outros anões, por considerarem degradante por se
estar a pôr em causa a sua dignidade enquanto anões. Não é por serem
mais pequenos que devem ser objetos de arremesso em jogos. A liberdade
de alguém pertence apenas a ela própria ou tem de ser exercida em face
dos outros e desde logo em face dos outros que lhes são semelhantes.
- O anão não tem que ele próprio ser responsável pela imagem que a
sociedade pode projetar dos anões como objeto de arremesso, mas não

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Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

terá a sociedade em geral o dever de preservar a imagem de certas pessoas


proibindo certos comportamentos que no entender dessa sociedade passa
a imagem de que as pessoas podem ser instrumentalizadas.
- Há efeitos simbólicos muito ténues, a pessoa é capaz de dissociar a imagem
de anão daquele saco de batatas e perceber que é apenas um jogo, mas
não terá a sociedade um direito de tentar evitar aqueles efeitos ténues?
- No caso do lenocínio, o que estava em causa era a disponibilidade da
intimidade da pessoa que na esmagadora maioria dos casos é feita por
força das circunstâncias.
- Neste caso, não está em causa uma dimensão tão estritamente pessoal da
pessoa como é a sua intimidade, e porque vemos que os anões claramente
querem aquele trabalho. Não há propriamente a circunstância de esperem
compelidos pelas circunstâncias, não está visível de uma forma tão patente.
- O caso fica ainda mais difícil se nos focarmos não na discoteca que promove
isto, porque aí António Cortês tem poucas dúvidas de que o poder público
possa limitar jogos que possam decorrer na distocíaca, tal como limita jogos
perigosos ou pouco educativos – discotecas ou jogos de computador
quando se impõem um limite de idades, forma de proteger as pessoas em
face de determinados efeitos simbólicos, pois o ambiente da discoteca e
dos jogos de computador não é completamente inócuo na forma como se
modela a sua psicologia.
- É diferente no caso em que o anão se disponibiliza para ser lançado, esta
prática foi proibida nas discotecas, em locais públicos e, de facto, não é a
mesma coisa uma pessoa deixar-se instrumentalizar, ou haver terceiros que
a instrumentalizam. Quando se está a proibir este lançamento do anão, não
se está a proibir o anão de se instrumentalizar, o acento tónico é outro,
está-se a proibir as pessoas de utilizarem o anão como saco de batatas, o
Direito não se importa com a liberdade individual de pessoas por si em si,
importa-se sim quando está em causa a relação com terceiros.
- No lançamento do anoa, não há apenas o anão, mas também as pessoas
que o utilizam como saco de batatas, e esta restrição visa restringir as
pessoas que o atirem como são de batatas, que já não têm, nenhum título
jurídico ou direito fundamental a atirarem os anões, não há um direito
fundamental a divertirem-se, há um direito fundamental aos tempos livres

Mariana Garção 29
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

dos trabalhadores, as pessoas divertirem-se está incluído na liberdade geral


de ação que decorre do desenvolvimento da personalidade, mas pode-se
perguntar se se considera que o lançamento de anões contribui para o
desenvolvimento da personalidade das pessoas, sendo que a resposta é
negativa. Não tendo estas pessoas um titulo jurídico, o poder pode limitar a
sua liberdade em nome da salvaguarda da imagem das pessoas, assim
como o regulamento relativo à comunicação social pode limitar que
aparecessem determinadas imagens no Big Brother ou na Casa dos
Segredos, ninguém proíbe o que as pessoas fazerem o que fazem na casa,
outra coisa é as pessoas fazem em público e com difusão da imagem. A
imagem que se projeta das pessoas tem efeitos simbólicos, projeta-se na
forma com as pessoas se veem umas às outras, e o poder tem como
legitimidade em nome do poder público – poder de salvaguarda de uma
determinada imagem que se projeta das pessoas – direito a restringir ou
limitar a sua atividade. Opinião de Cortês, contudo este caso é muito dúbio.
- O professor não acha indefensável que se diga que aqui deve prevalecer a
liberdade de escolha privada. Não foi isso que decidiram nem o Conselho
de Estado Francês nem a Comissão de direitos humanos das nações unidos,
admitiriam que o Estado francês tinha legitimidade para restringir esta
prática, mas é muito difícil.
- Tema da dignidade da pessoa humana, pode a dignidade da pessoa humana
ser salvaguardada mesmo contra a liberdade individual de uma pessoa?
António Cortês não exclui que possa haver situações limite como esta em
que isso possa acontecer, mas apenas e só em situações limite.

2.3. Pena fixa prevista na lei.


- Crime de pesca em época de defeso, período durante o qual as atividades
de pesca e caça se encontram condicionadas ou proibidas, período que
varia consoante a altura em questão e em função da espécie.
- Estes dois sujeitos foram apanhados a pescar em plena época de defeso, o
grande problema que temos é o problema das penas fixas.
- Tínhamos uma norma penal que estabelecida circunstâncias agravantes da
pena aplicável ao caso concreto e uma delas era o facto de a pesca decorrer
durante a noite e se se agravasse uma das circunstâncias agravantes o juiz

Mariana Garção 30
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

teria necessariamente de aplicar a pena máxima prevista na lei, aplicar uma


pena correspondente ao limite máximo da pena previsto na lei, sem poder
atender às circunstâncias especificas de cada caso concreto. Até que ponto
é que estas penas fixas taxativamente fixadas na lei são compatíveis com o
princípio da culpa no direito penal.
- Problema dos fins das penas:
• Teorias absolutas: a pena é vista como um instrumento de retribuição,
teorias retributivas. A pena é vista como justa paga que a sociedade dá
ao agente com o mal que ele provocou com a prática do crime.
Corresponde ao princípio do talião: olho por olho, dente por dente. Ideia
subjacente a estas teorias retributivas. O mal que o agente provocou à
sociedade com a prática do crime vai ser o mal que a sociedade vai
provocar ao agente.
 Não fundamentam a aplicação de penas no sistema penal português,
não se baseando numa função retributiva.
 Estas teorias tiveram o mérito muito importante: princípio da culpa, a
culpa é um juízo feito pela sociedade relativamente ao agente pela
prática de um facto, sendo um juízo de censura que é feito pela
comunidade em relação ao gente pela prática de um facto, de um
crime, juízo de censura que a sociedade faz por o agente não se ter
sabido comportar de acordo com o direito.
 Fundam exclusivamente a aplicação de uma pena quanto ao juízo de
censura feito ao agente. Quanto mais censurável seja o facto por ele
cometido, mais pesada será a pena correspondente.
• Teorias relativas: a pena não é vista como a justa paga que a soceidade
dá ao agente, mas como um mal que lhe é infligido para prosseguir
determinadas finalidades: como a prevenção, a pena é vista como um
instrumento para a prevenção de crimes futuros.
 Prevenção geral: destinatários, visa dirigir-se à sociedade como um
todo.
o Prevenção geral positiva: a pena visa a reparação da paz jurídica da
comunidade, aplica-se uma pena para reforçar a aplicabilidade de
uma norma que foi violada com a prática do criem.
o Prevenção geral negativa: a pena visa a intimidação da comunidade
em geral, que vê o que acontece quando se pratica um crime.

Mariana Garção 31
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

 Prevenção especial: visa dirigir-se ao agente que praticou o crime.


o Prevenção especial positiva: pena é vista como um instrumento de
ressocialização e reintegração do agente na sociedade.
o Prevenção especial negativa: a pena é vista como um instrumento de
neutralização do agente, que não irá praticar crimes fora da prisão,
estando encarcerado.
 Atualmente, são a prevenção geral positiva e prevenção especial
positiva, são, pelo artigo 40º/1 do Código Penal, as visadas nos dias de
hoje pelo ordenamento jurídico português.
 Estas teorias preventivas foram também alvo de críticas acentuadas ao
longo dos tempos, pois levam à instrumentalização do criminoso,
porque a partir do momento que se aplica uma pena a uma pessoa o
priva da sociedade para prosseguir finalidades que lhe são exteriores,
corremos o risco de estar a transformar o agente num objeto, num
instrumento, no fundo de contrariar o famoso princípio da
humanidade formulado por Kant: o ser humano é um fim em si
mesmo, uma pessoa nunca pode ser usada como um meio para atingir
um fim, se justificarmos apenas através destas teorias preventivas
corremos o risco de estar a instrumentalizar o criminoso, aplicamos a
pena para prosseguir a paz jurídica e não temos em conta a pessoa em
concreto do criminoso.
• Para obviar a estas críticas, conjugam-se estas duas teorias com o
princípio da culpa, que é uma herança das teorias retributivas, que vem
moderar as finalidades preventivas que residem à aplicação de uma
sanção pois visa evitar que ao agente possa ser instrumentalizado para
satisfazer as exigências do estabelecimento da paz jurídica da
comunidade, paz essa que foi abalada pela prática do crime.
- Apesar de não punirmos o agente para fazê-lo pagar pelo crime que
praticou, a culpa tem um papel fundamental no nosso sistema
sancionatório:
• Desde logo, é um pressuposto para aplicação de cada pena, não há pena
sem culpa,
• Função de limite na aplicação de qualquer pena, não podem ser
aplicadas penas que ultrapassem a culpa do agente, se a culpa é um

Mariana Garção 32
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

limite inultrapassável as finalidades preventivas das penas nunca o


podem transpor (40º/2).
- O exercício da determinação da medida da pena está intimamente ligado à
teoria da função da pena que é adotada 72º/1 Código Penal.
- Figueiredo Dias: tentou encontrar uma fórmula qualquer matemática para
obrigar o juiz a ter em conta todas as exigências: prevenção geral positiva,
prevenção especial positiva e culpa como limite.
- Quando uma pena está taxativamente fixada na lei, em que o legislador diz
ao facto x o juiz tem de aplicar a pena y, o juiz não tem a possibilidade de
atender a este exercício.
- No caso real, o juiz recusou-se a aplicar a pena máxima, por entender que
esta norma era inconstitucional.
- Para efeitos de simplificação, vamos pressupor que o juiz se limitou a
cumprir a lei que o mandava aplicar a pena máxima.
- Não há nenhum artigo que preveja autonomamente na Constituição o
princípio da culpa, mas significa isso que não tem dignidade constitucional?
Podemos tentar afirmar que é um princípio implícito, tentar encaixá-lo
noutro princípio constitucional previsto.
• Princípio da dignidade da pessoa humana, sendo que tal é afirmado tanto
pela doutrina tanto pela jurisprudência constitucional. Pretende-se evitar
ao afirmar o princípio da culpa que a pessoa seja instrumentalizada em
função das exigências da prevenção que se exigem no caso concreto. Não
poder ser usado como um simples objeto para satisfazer exigências da
sociedade, temos de ter em conta o grau de dignidade que a pessoa
merece, tendo em conta as suas motivações e agentes.
• Há quem entenda que o princípio da culpa está implícito no princípio da
proporcionalidade, porque a partir do momento em que se exige que a
pena não pode exceder a medida da culpa estamos a estabelece uma
relação de proporcionalidade entre a pena concreta que vai ser aplicada
ao agente e a medida da sua culpa.
• Principio da culpa visa limitar o poder do Estado: princípio do Estado de
Direito, o Estado está limitado por princípios jurídicos e um deles é o da
culpa do agente.

Mariana Garção 33
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Principio da igualdade: quando o acórdão fala em princípio da igualdade


não o utiliza para justificar a culpa mas sim devido ao facto de que o
princípio da igualdade exige um tratamento igual de iguais situações e um
tratamento diferenciado de situações diferentes, se tivermos uma pena
taxativamente fixada na lei para todos os casos até podemos afirmar que
tratamos igual o que é igual porque toda a gente que preencha a norma
ser-lhe-á aplicada aquela pena, mas não vamos conseguir diferenciar as
situações no caso concreto.
- A ideia das penas fixas foi um Código muito popular no Código de 1986,
tendo vigorando até 1982, data em que entrou em vigor o novo Código
Penal que sofreu uma alteração muito grande em 95, sendo que há quem
entenda que este sofreu uma alteração tao grande que é um novo Código
Penal.
- Mesmo depois da entrada em vigor desde Código Penal não se revoga toda
a legislação avulsa que existia e que previa penas fixas, tal como o decreto-
lei em causa.
- A previsão das penas fixas coaduna-se com estes princípios de direito
penal?
- O TC entendeu que esta norma não era inconstitucional, porque entendeu
que se tinha de definir de forma rigorosa o que eram penas fixas. Entendeu
que se poderia utilizar num sentido mais rígido da expressão, no qual a
pena fixa corresponde a uma pena prevista na lei que o juiz está obrigado a
aplicar o montante exato previsto na lei. Penas fixas em sentido moderado:
a pena está prevista na lei de forma taxativa, mas o juiz pode lançar mão de
outros mecanismos previstos na lei para adequar a pena ao caso concreto.
• Mecanismo da atenuação especial da pena (72º CP): cláusula geral que
permite que o juiz em certos casos especiais possa adequar ligeiramente
a medida penal prevista na lei tendo em conta circunstâncias anteriores,
posteriores ou contemporâneas à prática do crime, que diminuam de
forma acentuada a ilicitude do facto e a culpa.
• Mecanismos da dispensa da pena (74º CP): o juiz pode decidir
responsabilizar alguém pela prática do crime e decidir não aplicar
qualquer pena, mecanismo excecional que só pode ser aplicado quando a

Mariana Garção 34
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

gravidade do crime e a culpa do agente sejam diminutas, e o dano seja


reparado.
• O TC veio dizer que neste caso concreto esta pena fixa prevista na lei era
de natureza moderada, porque o juiz poderia lançar mão de mecanismos
gerais previstos no CP para atenuar a oena ou excluir a mesma e fazer
uma adequação da pena ao caso concreto.
- Professor: esta decisão não fez sentido, tendo sido já revista pelo TC, tendo
posteriormente retirado esta norma do ordenamento jurídico. Esta decisão
é de 91 e em 2001 o TC foi chamado a apreciar a norma e teve uma
orientação completamente diferente, a importância do princípio da culpa
veio a ser acentuada no nosso ordenamento jurídico. A partir do momento
em que a pena está fixada taxativamente pelo legislador, o juiz não pode
adequá-la às exigências da prevenção geral positiva e especial positiva, nem
à medida da culpa, o que é alarmante. Estes senhores tinham pescado 3
peixes, o nível de censura tem de ser tido em conta. Quem tivesse pescado
durante o dia 500 peixes iria ser condenado por uma pena inferior à de
alguém que tivesse pescado 3 peixes durante a noite.
- Importância do princípio da dignidade da pessoa humana na construção do
direito penal e dos seus princípios basilares. Este princípio da culpabilidade
tem dignidade constitucional, com base no princípio da dignidade da
pessoa humana e com base nisso afirmarmos a inconstitucionalidade de
normas que violam este princípio.
- O princípio da dignidade da pessoa humana foi importante também para
fundamentar o princípio da subsidiariedade do direito penal, que não está
expressamente previsto na Constituição, sendo que inicialmente a doutrina
constitucional afirmou a dignidade Constitucional deste princípio no
princípio da dignidade da pessoa humana, decorrendo hoje em dia já não
da dignidade, mas sim da proporcionalidade.
- O princípio da humanidade também decorre do princípio da dignidade da
pessoa humana, como no caso de Macau, em que se recusou extraditar um
cidadão macaense por receio fundado de que ele corresse perigos.

2.3 Procriação medicamente assistida

Mariana Garção 35
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Forma assistida de procriação através de técnicas médicas, nomeadamente


através de inseminação artificial e fertilização in vitro. O que as distingue é
o local onde ocorre a inseminação do embrião, na inseminação artificial há
a inserção de espermatozoides no corpo da mulher, na fertilização in vitro
são recolhidos espermatozoides do homem e óvulos da mulher, sendo que
a fertilização ocorre fora do corpo da mulher.
- Quais são as finalidades que podem ser obtidas com recurso a técnicas de
PMAs? Em que casos é que um casal pode recorrer a estas? Casos de
infertilidade, foi para estes casos que a PMA nasceu e continua a ser para
estes casos que a PMA continua a ser pensada. É um método subsidiário de
procriação, apenas é possível à partida quando os casais não conseguem
procriar de forma natural, através de relações sexuais entre homem e
mulher.
- É possível utilizar PMA’s para outros casos? Sim, como tratamentos de
doenças graves, mas antes desses ainda há outra finalidade: prevenir
doenças do embrião, pode ser utilizada por casais férteis para diminuir o
risco de o embrião padecer de doenças graves. Através da combinação de
fertilização in vitro de outra técnica de PMA: DPT, diagnostico pré-natal.
São retirados óvulos e espermatozoides que são em laboratório unidos e
posteriormente colocados no útero da mulher, vários embriões. Quando
exista o risco de um embrião vir a padecer de uma doença grave ou
infeciosa, os casais podem recorrer às PMAs para prevenir essa doença.
Antes de o embrião ser implantado, é feito o DPT, PICOLO. No caso de ter a
doença, o mesmo não é implantado e acaba por ser destruído: primeiro
problema, coloca o problema dos embriões sedentários, no momento em
que estamos a escolher entre embriões doentes e saudáveis, temos o
problema de saber o que fazer com os doentes, ora podendo-se considerar
que o embrião ´é uma forma possível de vida humana, destrui-lo pode
levantar problemas éticas. A PMA com esta finalidade tem vindo a ser
aceite porque é uma técnica meritória que visa evitar o problema essencial:
evita-se que um embrião seja implantado no útero, e evita-se que
posteriormente a mulher escolha abortar. Nessa medida, consegue-se
antecipar todos esses problemas, só se implantam os embriões saudáveis e

Mariana Garção 36
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

que se evita que num momento posterior a estante decida interromper a


gravidez, o que é muito mais polémico.
- 4º/2 da lei das PMAs, tratamento de doenças graves, não do embrião, mas
utilizar a procriação medicamente assistida para evitar a doença grave de
um terceiro que já existe, de um futuro irmão que vem a nascer. Esta
possibilidade está prevista no 7º/3 da Lei da PMAs.
- Finalidades proibidas artigo 7º: clonagem, melhorar determinadas
características não medicas do nascituro, cor de olhos, cabelo, ... mas o
número 3 do artigo 7º vêm estabelecer duas exceções: uma delas é o caso
em que se utiliza PMAs para tratamento de doença de terceiro, através da
utilização de técnicas que permitam garantir que o embrião tenha um
grupo HLA compatível com esse terceiro que padece da doença grave. HLA:
complexo genético que modifica o sistema imunitário, é o tipo de genes
considerados estranhos pelo nosso sistema imunitário. Sistema de
compatibilidade, é fundamental para vários efeitos, dentre eles o
transplante de órgãos e de tecidos, nomeadamente para evitar o risco de
rejeição de órgãos. A partir do momento em que um órgão ou tecido tem
um sistema HLA incompatível, a pessoa que as vai receber vai combater
aquelas células, o que se traduz numa rejeição dos órgãos ou tecidos
transplantados.
- O que é que acontecia antes desta possibilidade ser aceite? Casal tinha um
filho com uma doença genética grave e esse filho precisa de um transplante
de órgãos ou tecidos, medula óssea, caso contrário correrá o risco de
morrer. EM desespero de causa, tendo em conta a dificuldade em assegurar
a compatibilidade entre dadores, e essa probabilidade aumenta
significativamente quando estejam em causa irmãos, os casais decidiam ter
filhos e desejavam que esse fosse saudável e que tivesse um grupo HLA
compatível com o do irmão, para que quando nascesse pudesse doar
órgãos ou tecidos e salvar a sua vida. A probabilidade de isto acontecer é
altamente reduzida.
- A medicina evoluiu, e é possível que casais que tenham um novo filho e que
não entregue exclusivamente à sorte ou ao divino esta possibilidade de o
filho ser saudável e de ser compatível com o irmão, é possível que para
além de escolher embriões saudáveis e não saudáveis, ver de entre os

Mariana Garção 37
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

saudáveis quais têm um grupo HLA compatível com a terceira pessoa que
precisa do transplante – irmão. Assegura-se, deste modo, que a criança que
vem a nascer cumpre os requisitos e pode atuar como dador do seu irmão.
Não estamos a atuar no interesse do embrião, mas sim do terceiro, utiliza-
se uma técnica de PMA para conceber uma criança que vem ao mundo com
uma função determinada de salvar o irmão, criar um dador.
- Bebé-medicamento: é cumprida em muitos casos à nascença por este
irmão.
- Estamos perante um caso em que a criança nasce, e ao longo da sua vida é
chamada para fazer novas doações e salvar a vida do irmão ao longo da sua
vida.
- Desde 2016, esta técnica é legal em Portugal. Em 2015 foi feito o primeiro
pedido para utilizar esta técnica, o filho tinha leucemia, tendo a autorização
sido concebida.
- Esta técnica tem o mérito inegável de salvar a pessoa que esta a morrer,
mas é polémica porque corremos o risco de instrumentalizar a vida humana
apenas para criar futuros dadores.
- 4ª finalidade: 4º/3 da Lei da PMA, permite-se a gestação de substituição,
mulher funciona como barriga de aluguer para gestar a criança de outro
casal. Também se alargam s beneficiários de PMAs, permite-se que
qualquer mulher solteira pode recorrer a estas técnicas, o que veio
revolucionar todo o regime subjacente às PMAs. Isto levanta muitos
problemas, foi alargada e não se pode dizer que continua a ser um processo
subsidiário de reprodução humana.
- TC é chamado em 2009 para apreciar o artigo 7º/3 da Lei das PMAs para a
finalidade de tratar as doenças de terceiro. Foi chamado a apreciar se esta
disposição era compatível com a dignidade da pessoa humana e com
possíveis direitos fundamentais do embrião.
- O TC afirma que só são titulares de direitos fundamentais as pessoas que
existem, que tenham existido, antes disso não é titular de direitos
fundamentais. Estamos perante um embrião não nascido, não podendo
falar de direitos fundamentais, do direito à vida do embrião.

Mariana Garção 38
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Contudo, o TC também desenvolve a jurisprudência relativamente aos


casos de interrupção voluntária da gravidez, a chamada proteção da vida
intrauterina. Critério das 10 semanas era o critério que podia ser utilizado
para se delimitar o inicio da proteção da vida intrauterina.
- O TC entendeu que não poderíamos invocar a proteção da vida
intrauterina, porque o embrião está em laboratório, ainda não foram
implementados no útero materno, a proteção da vida intrauterina só se
aplica à vida no útero materno.
- O TC entendeu que a função utilitarista de escolher embriões com base
num grupo HLA, podendo pôr em causa a dignidade da pessoa humana,
porque o embrião é passível de consubstanciar a existência da dignidade da
pessoa humana, tendo-se fundado neste princípio da dignidade da pessoa
humana e 67º/2 e): norma aditada à Constituição, obrigando o legislador a
regular a PMA, tendo estabelecendo um limite à AR no âmbito desta
regulamentação: devia ser regulada em termos que salvaguardem a
dignidade da pessoa humana. Não é admissível à luz da Constituição
qualquer forma de PMA, porque só serão aceites as formas de PMA que
respeitem o princípio da dignidade da pessoa humana. A dignidade da
pessoa humana é inultrapassável quando estamos a falar na medida da
culpa e da aplicação da pena, e também da regulamentação das PMAs.
- O TC entendeu que não violava o princípio da dignidade da pessoa humana,
pois este poderia ser contraposto ao direito à saúde de terceiro que está
doente. A procriação de um bebe medicamente poderia ser admissível
porque decorria do direito à saúde na sua vertente positiva, decorria de um
dever do Estado de assegurar a prevenção de doenças. PICOLO.
- O TC notou numa nota final, respondedo a uma crítica, de que não estava
demonstrado que a utilização desta técnica acartasse por si só riscos ou
perigos do desenvolvimento harmonioso da criança que viesse a nascer. A
maior pate dos críticos dizem que a criança poderá sentir que só nasceu
como um objeto para salvar a vida do irmão, os pais não a quiseram por
aquilo que ela é, mas sim pelos seus órgãos, nunca vindo a ter um
desenvolvimento harmonioso e, nessa medida esta solução não poderia ser
admissível. O TC afirmou que isto era apenas uma suposição, não estando

Mariana Garção 39
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

demonstrado que tal pudesse vir a acontecer. O TC defendeu que não


podíamos invocar suposições para invalidar uma solução legal.

3.
3.1.
3.2. Quem é que pode em condições normais pedir a fiscalização preventiva
da Constitucionalidade?
- Antigamente eram os ministros da republica, agora são os representantes
da república que eram os defensores dos interesses nacionais em face das
regiões autónomas, e o seu pode principal era um poder de veto dos
decretos legislativos regionais ou do envio para o TC desses decretos. Mas
relativamente aos decretos nacionais, quem é que pode pedir a fiscalização
preventiva da constitucionalidade? As leis orgânicas têm de ser aprovadas
por uma maioria qualificada e que incidem sobre matéria específicas, a lei
sobre a organização e formulação do TC são leis orgânicas.
- 166º/2: só algumas matérias de reserva de competência absoluta da AR
revestem a forma da lei orgânica, é uma possibilidade excecional, as
matérias de reserva relativa nem podem revestir essa forma. Retira-se daí,
a contrato, que a fiscalização preventiva da constitucionalidade só pode ser
pedida por quem tem o poder de promulgar atos administrativos: leis e
decretos leis é o Presidente da República, no caso de decretos legislativos
regionais é o representante da republica, nomeado pelo presidente da
república.
- Um processo destes entra no Tribunal e quem é que é notificado para
responder ao requerimento do Presidente da República?
- Neste caso, era um decreto da assembleia da república, quem é que vai ser
notificado para responder ao requerimento do Presidente da República? O
órgão autor da norma, expressão tecnicamente correta. Antes da
promulgação, a lei é inexistente, daí não se dizer quem legisla sobre a
matéria. O órgão autor da norma é a Assembleia da República, os órgãos
são notificados na pessoa do seu presidente, os órgãos do Estado são
notificados na pessoa do seu presidente, tal como os órgãos
administrativos, entre outros.

Mariana Garção 40
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- A resposta do órgão autor da norma que é uma espécie de contestação,


vamos ter duas posições diferentes: qual é a mais acertada? A do
presidente que entende que a norma do artigo 112º do decreto que altera
o código do trabalho que entende que é inconstitucional, ou a posição do
órgão autor da norma que entenderá que esse mesmo artigo 112º do
decreto que alterará o código do trabalho não é inconstitucional?
- Objeto de apreciação da constitucionalidade ou objeto da fiscalização da
constitucionalidade: é o artigo 112º do decreto 265/10 da Assembleia da
República, que pretende alterar o Código de Trabalho.
- É esta norma inconstitucional?
- Contrato de trabalho: acordo de vontades mediante o qual alguém se
obriga a uma prestação de trabalho, sob a direção de outrem e a outra
parte se obriga correlativamente a um pagamento de uma remuneração.
- Quando é que termina a vigência do contrato de trabalho? Só é possível
fazer os contratos a termo em situações excecionais. Na prática, o que
acontece é que se fazem contratos a termo em fraude à lei em quaisquer
situações em que a entidade patronal pretende e eventualmente pondera
despedir o trabalhador num prazo de 6 meses ou de um ano, mas em
princípio a regra é a de que o contrato de trabalho é a tempo
indeterminado, o que garante ao trabalhador segurança e estabilidade,
porque ele sabe que se a entidade patronal o quiser despedir, terá de ter
uma justa causa, não vai poder despedir sem fundamento nenhum, apenas
porque lhe apetece, vai ter que ter uma justa causa e vai ter que pagar
uma indemnização. Isto dá segurança, confiança e estabilidade ao
trabalhador, não está a trabalhar sempre na iminência de ser despedido,
porque a entidade patronal para o despedir e trocar com outro trabalhador
eventualmente vai ter custos, e em ultima análise vai ter que ter um bom
motivo para o fazer, ou porque o trabalhador não se adaptou às suas
funções, ou porque não cumpriu os seus deveres.
- O nosso sistema prevê que em circunstâncias excecionais, em situações em
que há necessidades transitórias na empresa – ex.: uma trabalhadora foi de
licença de maternidade e é preciso substitui-la durante 6 meses ou porque
a empresa teve uma encomenda tremenda e precisa de alterar a sua
produção durante uns 6 meses – é preciso fazer um trabalho a termo. Esse

Mariana Garção 41
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

contrato tinha a duração mínima de 6 meses, caso contrário a empresa terá


de jogar com os trabalhadores que tem. Nesse contrato a termo, o
trabalhador tem garantias de segurança, sabe que o contrato irá terminar a
sua vigência ao fim de 6 meses ou 1 ano, ele sabe que durante esse período
a entidade patronal não o poderá despedir sem justa causa e que no final
ele terá direito a uma indemnização. Apesar de tudo, há alguma segurança,
durante aquele período o trabalhador tem o emprego assegurado. Este
contrato a termo poder-se-ia dizer que poe em causa a segurança do
trabalhador, daí só ser admitido em situações excecionais, em que falte um
trabalhador à empresa ou quando há um aumento brutal da produção, só é
admitido um contrato a termo quando há necessidades excecionais da
empresa, caso contrário o contrato é a termo indeterminado, e o
trabalhador só será despedido se não cumprir os seus deveres enquanto
trabalhador ou se não se adaptou às suas funções.
- A lei estipula nestes casos de contratos a termo indeterminado em que
pode haver um período experimental, em que quando o trabalhador entra
não fica logo com as garantias de segurança do emprego típicas do contrato
a tempo indeterminado. Entra à experiência, para a entidade patronal ver
se o trabalhador tem ou não competências para exercer a função para a
qual é contratado, período experimental.
- Para uma lei ser válida, basta não ser contrária à Constituição, respeita-se a
margem de conformação do legislador. Será esta norma contrária ou não
contrária à Constituição?
- Porquê é que está no artigo 53º da Constituição uma menção expressa aos
despedimentos por motivos políticos ou ideológicos? Por uma razão
histórica, pois durante o estado novo era muito comum uma pessoa ser
despedida por ser comunista, depois da revolução de 74 houve uma série
de despedimentos por as pessoas serem de direito.
- O grande princípio do artigo 53º é o de que não é possível o despedimento
por mera vontade do empregador. Tem sempre que haver uma justa causa,
houve em dia as justas causas típicas dos despedimentos são ou a
inadequação do trabalhador ao posto de trabalho ou a falta de
cumprimento dos deveres próprios do trabalhador, também havendo uma
terceira opção relativa aos despedimentos coletivos.

Mariana Garção 42
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Durante o período experimental, ao contrário do que está no artigo 53º da


Constituição, o trabalhador pode ser dispensado por mera vontade do
empregador. Esta norma que prevê um período experimental de 180 dias é
uma restrição à segurança no trabalho, artigo 53º da Constituição. Essa
restrição é possível o não é possível? É inconstitucional ou não é
inconstitucional? A decisão do tribunal é a de que é inconstitucional.
- É possível restringir direitos fundamentais. Não basta concluir que
determinada norma restringe um direito fundamental para que a restrição
seja inconstitucional, é preciso aferir da legitimidade da restrição.
- Considera-se que as restrições que estão expressamente previstas na
Constituição quando haja ou um direito previsto na Constituição que
legitima essa restrição ou quando haja um interesse que decorra ainda da
Constituição, ainda que não esteja expressamente previsto. A expressão do
“estar expressamente previso” é preciso ser entendida com grande
habilidade. É necessário que o direito ou interesse que legitima a restrição
esteja legalmente previsto na Constituição ou então que se deduza por
interpretação dessa mesma Constituição.
- Neste caso, até temos um direito expressamente previsto na Constituição.
Temos o direito à segurança no emprego e temos uma norma que prevê um
período experimental durante o qual os trabalhadores podem ser
despedidos sem justa causa, para essa restrição seja possível é preciso que
seja feita em nome de outro direito ou interesse constitucionalmente
protegido: direito à livre iniciativa económica e privada 61º Constituição. A
livre iniciativa económica e privada tem de ter em conta o interesse geral,
tem que ter em conta os interesses dos cidadãos, e esta liberdade
compreende a liberdade de criar empresas e a liberdade de organizar os
recursos de produção das empresas. Obviamente, os trabalhadores são o
fator de produção da empresa. A organização dos recursos humanos ainda
se inclui dentro da liberdade de empresa.
- As restrições têm que ser autorizadas pela Constituição, legitimadas por um
direito previsto e devem restringir-se por uma lei com caráter geral e
abstrato, tendo de ser proporcionais. Esta restrição é ou não proporcional?
Para sabermos isso, temos de fazer três testes: adequação, necessidade e
proporcionalidade me sentido estrito.

Mariana Garção 43
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Será esta restrição adequada? É o fim legitimo? Será o fim adequado ao


interesse ou direito que a restrição visa adequar? A pergunta é: será que
este período experimental é uma medida adequada a conseguir esse fim
ou não? A existência do período experimental de 180 dias é uma medida
adequada a conseguir esse fim, que o empregador possa averiguar da
competência do trabalhador para que assim possa organizar devidamente
a sua empresa? Temos de ver se a medida é eficaz para atingir o fim.
PICOLO. Na generalidade dos casos, uma vez eleito um fim legitimo, a
medida é eficaz para atingir esse fim, este teste passa-se quase sempre.
Ex.: A fim de aferir a competência ou não competência do trabalhador,
lhe é perguntado se ele tem ou não filhos. Ter ou não filhos em nada se
relaciona com a competência dessa pessoa no local de trabalho. Quando
a medida não é adequada, é arbitrária. Tem algo de absurdo. A medida
neste caso é adequada para atingir os fins que visa.
- É necessária? A medida anterior parecia funcionar bem, os 90 dias à luz
da lei anterior parecia funcionar bem, período mais curto. Para o
empregador conseguir aferir da competência do trabalhador e desse
modo conseguir organizar a empresa de um modo mais eficaz possível.
Temos de perguntar se há alternativas menos onerosas? Sim, a prova é a
de que havia uma lei anterior que previa uma alternativa menos onerosa,
previa apenas 90 dias. Esses 90 dias permitiam aferir de uma forma
suficiente se o trabalhador era adequado ou não para as funções para que
era contratado. Não é necessária esta restrição. Não sendo necessária,
não é proporcional e se não é proporcional é inconstitucional por violação
do direto à segurança no emprego. O princípio da proporcionalidade não
se aplica sozinho, é sempre uma restrição a um determinado direito:
segurança no emprego, há uma violação, neste caso, no direito à
segurança no emprego consagrado no artigo 53º conjugado com o
princípio da proporcionalidade decorrente do artigo 18º/2.
- Proporcionalidade em sentido estrito: não se analisa porque chumbou no
teste anterior.

3.3. Restrição aos direitos fundamentais.

Mariana Garção 44
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- O regime é o mesmo para todos os direitos fundamentais ou varia


consoante a natureza do direito fundamental em causa?
- Não temos um regime uniforme, temos um regime para os direitos
liberdades e garantias e um regime para os direitos sociai.
- Regime geral dos direitos fundamentais: regime comum aplicável a todos os
direitos fundamentais independentemente da sua natureza, cabem todas as
ormas e princípio aplicáveis aos direitos fundamentais indepndentemten da
categoria em que se inserem – princºípio da igualdade e princípio
universalidade.
- Regime específico dos direietos sociais, económicos e culturais,
- Regime específico dos direitos liberdades e garantias, só se aplicam aos
direitos liberdade s e garantias, apesar de em certos casos ser possível
estender este regime aos outros direitos fundamentais – 17º Constituição,
direitos fudamntesais de natureza análoga, este regime especiifico apenas
se aplica em rpincipio aos direitos liberdades e garantias consagrados dno
catlogo, mas com base no artigo 17º podemos ter uma extensão deste
regiem a direitos fundamentais de natureza análoga. Os direiso liberdades e
garantias têm um regime especiail para a sua limitação ou restrição, o
legislador não é livre de restringir estes direitos como bem entende, tem de
obedecer a um regime existente e garantístico previsto no artigo 18º.
- 18º/2:
• A restrição tem de ser feita através de lei, pelo 18º/2, este termo a lei
aqui usado é usado em sentido restrito, conjungfado com o 165º/1 b), só
é possível dois tipos de instrumentos legislativos para restringir direitos
fundamentais, decreto lei do governo autorizado do governo ou lei da AR.
• 2º requisito: só pode restringir os direitos liberdades e garantias os casos
expressamente previstos na Constituição, tem de haver um fundamento
na constituição, decorrência do princípoio do estado de direito. Como é
que sabemos se a restrição de um direito liberdade e garantia encontra o
seu fundamento na constituição?
 Interpretação mais literal: casos expressamente previstos na
constituição, o primeiro tipo de restrições previstas na cosntituução
são aquelas expressamente consagradas numa nroamconstitutcional,
nestes casos não há duvida nennuma que a própria cosntituiççao

Mariana Garção 45
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

permite que seja feita uma restrição a um direito liberdade e garantia.


Jorge Miranda:
o Fala por um lado em restrições que constam de normas
imediatamente exequíveis, a restrição é feita diretamente por ma
norma da constituição não sendo necessária nenhuma internveção
posterior do legislador para restringir o direito liberdade e garantia.
Ex.: artigo 51º consagra a liberdade de associeção e a constituição de
poderes políticos, mas o numero 4 deste artigo estabelece uma
restrição expressa: não podem constituir-se partidos políticos com
âmbitos regisional, a própria constituição restringe diretamente este
direito liberdade e garantia. O legislador não tem aqui que fazer uma
lei ordinária para restringir esse direito liberdade e garantia porque
essa resrrição é feita diretamente pela constituição.
o Jorge Miranda fala de restrições que cosntam de normas que não
são diretamente exequíveis, a cosntituilçao limita-se a prever a
possibilidade de restringir esse direito libredade e garantia mas
remete para o legislador – AR ou Gov autorizado – a possibilidade de
restringir esse direito liberdade e garantia, como o artigo 34º/1:
direito fundamental à inviolabilidade das telecomunicações, como
corolário deste direito fundamental o numero 4 vem proibir
qualquer forma de ingerência das autoridades publicas das
telecomunicações efetuadas pelos cidadãos. A parte final desta
nroma vem prever uma autorizaão constituicoonal experdsa para a
restrição deste direito fundamental, temos uma norma da
constituição eu não restringe diretamente esse direito fundamental,
mas remete para a lei a possibilidade de tal ser feito. Se não
houvesse esta possibilidade, poderíamos discutir a legitimidade de as
autoridades publicas ingerir na vida privada dos cidadãos. As normas
do CPP que preveem a utilização de escutas telefónicas constituem
uma restrição feita ao direito fundamental à inviolabilidade das
telecomunicações, sendo uma restrição feita ao abrigo de uma
autorização expressa que é dada pela Constituição.
 Jorge Miranda: restrições implicitamente previstas na Constituição, não
são expressamente previstas na mesma, mas simplesmente
poderíamos retirar ainda dos princípios e das normas da Constituição a

Mariana Garção 46
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

necessidade de se restringir esse direito, em determinados casos


podemos ter de restringir o direito liberdade e garantia como forma de
garantir outros direitos fundamentais previstos na constituição ou
interesses constitucionalmente vinculados 270º Constituição: constitui
a possibilidade de o legislador restringir direitos liberdades e garantias
dos militares e das forças de segurança. Esta norma, relativamente às
forças de segurança, o Constituição prevê expressamente que o
legislador pode prever uma restrição ao direito à greve. A norma não
diz nada relativamente aos militares, significa isso que uma lei que
restrinja o direito à greve por parte dos militares seria inconstitucional
por a Constituição não prever expressamente? Evidentemente que não,
poderia levantar até uma questão de principio de igualdade, por se
estabelecer relativamente aos policias e não para os militares, porque o
principio de base é o mesmo – segurança do Estado. A doutrina tem
vindo a entender que o interesse constitucionalmente tutelado
aquando desta restrição expressamente prevista para as forças de
segurança, também se verifica no caso dos militares. Encontra-se
implicitamente autorizada porque esta restrição se justifica para
salvaguardar interesses constitucionalmente tutelados. Esta questão é
de concorrência prática direitos fundamentais e interesses
constitucionalmente tutelados que podem colidir no caso concreto.
o Se seguíssemos uma teoria formalista de apenas poder restringir
direitos liberdades e garantias quando a constituição expressamente
o permitisse, teríamos sempre de estra a rever a constituição.
o Quando o legislador constituinte fez as normas constitucionais era
impossível que ele pudesse prever todos os possíveis conflitos entre
direitos fundamentais.
o Serve para podermos fazer uma interpretação atualista da
Constituição.
o Este requisito do 18º/2 “nos casos expressamente previstos na
Constituição” tem sido objeto não de uma interpretação literal, mas
flexível. Quando o legislador constituinte fala nestes casos está a
exigir que a restrição tenha de alguma forma um fundamento
constitucional.

Mariana Garção 47
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

o Proporcionalidade: critério mais amplo do que o utlizado se fala em


restrições expressamente previstos. Estes casos expressamente
previstos na Constituição não devem ser objeto de uma
interpretação rígida.
• Temos então 2 grandes tipos de restrições: aquelas previstas
expressamente na Constituição e aquelas que estão implicitamente
previstas.

Resolução do caso:
- Processo de fiscalização preventiva da Constitucionalidade, que se
contrapõe à sucessiva. Fiscalização preventiva: tem lugar relativamente a
normas que ainda não entraram em vigor no ordenamento jurídico.
- A AR envia as leis para o PR, que pode promulgar, ou pode usar o veto
político, mas também se tiver dúvidas acerca da constitucionalidade de um
diploma pode requerer ao TC preventivamente a constitucionalidade desse
diploma. Ou o TC diz que aquilo não tem problemas de constitucionalidade,
e aí o PR ou promulga ou usa o veto político, ou o TC diz que é
inconstitucionalidade e o PR usa o veto da inconstitucionalidade.
- Neste caso concreto, o PR tinha duvidas acerca da constitucionalidade e
enviou para o TC.
- Serviços de informação e segurança são os nossos serviços secretos (como a
CIA), PICOLO.
- Apenas uma parte do artigo 68º/2 que levantava dúvidas de
constitucionalidade. Este diploma vinha permitir aos espiões dos serviços
secretos o acesso aos meta dados, termo tecnicamente impreciso, o termo
técnico são dados de trafego de informações, os meta dados os dados sobre
dados de comunicação. Não é o acesso ao conteúdo das comunicações,
nunca esteve em aberto que os serviços secretos viessem a ouvir as
comunicações das pessoas, mas apenas a dados eventuais PICOLO, dados de
tráfego: com quem a pessoa falou, quanto tempo, a que horas, e dados de
localização: permitem que dessem uma indicação sobre a localização
geográfica das pessoas quando efetuaram as comunicações, apenas
informações instrumentais.

Mariana Garção 48
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Permitia este acesso em caso de crimes de terrorismo, espionagem, ... ets


autorização tinha de ser concedida por uma autorização de controlo prévio,
constituída por 3 juízes do STJ que ao abrigo desta comissão autorizavam o
acesso aos serviços secretos destes dados ou informações.
- Questão de saber se estes meta dados eram suscetíveis de serem inseridos
no âmbito do conceito de telecomunicações previsto no artigo 34º da
Constituição, que consagra o direito fundamental à inviolabilidade das
comunicações.
- É esta restrição compatível com o regime previsto na Constituição para que
a restrição possa ter lugar?
- Os meta dados estavam inseridos no âmbito de proteção de inviolabilidade
de telecomunicações? O legislador quando fez esta norma estava a pensar
em proibir as ingerências no conteúdo das telecomunicações, e não tanto
nos dados instrumentais.
- Assumindo que eles estavam inseridos no âmbito da tutela deste artigo,
temos de averiguar se esta restrição é feita no âmbito do artigo 34º/4 parte
final, que apenas autoriza a restrição a estes direitos no âmbito do processo
penal.
- Esta posição não gera polémica, não havia duvida nenhuma que os meta
dados estavam também protegidos por este direito fundamental.
Interpretação atualista do direito constituição, quando o legislador
constituinte fez a norma não estava a pensar tanto nestes meta dados mas
nos dados de conteúdo, no teor das conversas, mas nos dias de hoje ter sei.
Ia de entender que estes meta dados também beneficiavam desta proteção,
porque ao aceder a este tipo de informações as autoridades poderão
ingerir-se na vida privada das pessoas, delineando um perfil sobre essas
pessoas.
- Esta restrição é feita em conformidade com autorização constitucional para
a sua restrição prevista no 34º/4 a qual apenas parece apenas permitir
restrições no domínio do processo penal? Grande problema desta temática,
a de perceber o sentido desta parte final do 34º/4. Quando a constituição
diz “salvos os casos previstos na lei em matéria de lei criminal”, está a
constituição apenas a indicar um possível caso em que a restrição pode ter

Mariana Garção 49
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

lugar – processo penal – mas não exclui outras restrições que sejam
necessárias em face de outros interesses ou direitos, ou está apenas a criar a
exceção para o caso do processo penal? O TC entendeu que à luz desta
norma só é admissível restringir o direito ao sigilo do direito das
telecomunicações em matéria de processo penal e em mais nenhum
domínio. O tribunal entendeu que o legislador constitucional que fez esta
norma fez uma ponderação expressa entre o sigilo das telecomunicações e
as finalidades no âmbito do direito penal, interesses de justiça, segurança, ...
não seriam admitidas outas restrições para salvaguardar outras restrições
que não estas.
- O tribunal entendeu que havia a regra do sigilo das comunicações que
comportava apenas uma exceção: em matéria de processo penal.
- Partindo desta ideia, o tribunal passou a apreciar a constitucionalidade
deste diploma, vendo se esta possibilidade de acesso a meta dados cumpria
o regime previsto no 34º/4 parte final, o tribunal entendeu que não
cumpria:
• O que os serviços de informações fazem não é uma investigação dentro
do processo penal. O processo penal apenas tem início quando se tem
noticia da prática de um crime que já ocorreu, apenas se inicia num
momento posterior à prática de um crime. Aqui temos um momento
anterior à prática de um crime, já que os serviços de informações visam
prevenir crimes no futuro, nomeadamente atividades terroristas, surge
antes do processo penal.
• Para alem de não ser um processo penal, não é um processo judicial,
porque a autoridade a quem incumbia aceder a autorização é uma
autoridade administrativa, entidade de controlo prévio, e não judicial, e,
portanto, o legislador cria um sistema diverso do previsto para as escutas
telefónicas em que é necessário de uma autorização de um tribunal. Para
alem de não estarmos dentro de um processo penal, o regime nem
sequer essa parecido com o do tribunal, apesar de ter juízes esta
comissão, eles estão a atuar no seu âmbito pessoal e não judiciário, os
juízes só exercem as funções judiciais no tribunal.
• Não havia garantias análogas às que existem no processo penal quando
esta em causa a interceção de comunicações O regime não era preciso
suficiente para salvaguardar os interesses dos cidadãos.

Mariana Garção 50
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Com base nestes 3 argumentos: fora de um processo penal, fora de um


processo judicial e sem garantias análogas à de um processo penal, não
está cumprida a parte final do 34º/4, não estando cumprida então a
restrição era inconstitucional.
- O Presidente da Republica vetou por inconstitucionalidade do diploma.
- O ano passado, no verão de 2017, a AR aprovou uma segunda versão deste
diploma, destinada a superar os problemas de inconstitucionalidade: o
processo passou a ser inteiramente judicial, é o próprio STJ que autoriza, e
por outro lado, passou a ser bastante garantístico e próximo do processo
penal relativamente aos aspetos apontados na versão anterior. Sem inserir
este procedimento no âmbito do processo penal, algo que o legislador
nunca via conseguir fazer pela natureza das coisas, estamos sempre numa
fase prévia a qualquer processo penal, o legislador criou um procedimento o
mais próximo possível do processo penal e encaixá-lo na parte final do
34º/3. O PR promulgou e este diploma está em vigor.
- Um conjunto de deputados pediu a fiscalização sucessiva da
constitucionalidade, neste momento está a ser discutido este diploma no
Tribunal Constitucional. O grande problema é o de que a norma
constitucional fala em processo penal. PICOLO. Maneira fácil de resolver o
problema: proceder a uma revisão constitucional, que quando a norma foi
feita a pensar em meta-dados. PICOLO.
- Formas possíveis de resolver:
• A que o TC disse: autorização constitucional expressa, estar a ir além disto
é fazer tábua rasa do que a Constituição diz, caminho perigoso. Entender
que há uma regra e há uma exceção especifica que é taxativa.
• Restrições implícitas: poderíamos à primeira vista ir por aqui, pela
segurança coletiva que é um interesse constitucionalmente relevante e
tutelado, e também o princípio à vida. Para prevenir atentados
terroristas, teríamos de admitir essa possibilidade. Teríamos de admitir
esta possibilidade, é a forma como está feita a norma do 34º/4, a norma
está redigida de uma forma restritiva e taxativa. Parece ser uma exceção
clara, uma delimitação do único caso em que é admissível uma restrição,
não estamos apenas perante uma restrição constitucional expressa, mas
sim perante uma restrição constitucional expressa que é em si mesma

Mariana Garção 51
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Declaração de voto da Conselheira Maria Lúcia Amaral: este requisito de


restrições expressas, não pode ser entendido de uma forma tao estrita.
Em casos como estes, o que o legislador constituinte fez foi antecipar a
possível ocorrência de conflitos futuros entre o direito ao sigilo das
informações e os interesses do processo penal. Tendo em conta que estes
interesses contrapostos também se verificam neste caso de prevenção de
criminalidade, a conselheira entendeu que poeríamos por maioria de
razão inserir aqui esta atividade do SIS, se permitimos o acesso a escutas
telefónica que tem a ver com o conteúdo das informações, então também
deveríamos admitir o menos grave que é o acesso a meta dados, dados
instrumentais e não de conteúdo.

3.4. Objeto de apreciação da constitucionalidade: norma 1817º/1 CC, prevê


o prazo de caducidade para as ações de investigação de paternidade.
- 10 anos após a maioridade, pode-se propor uma ação até aso 28 anos. A
norma é de 2009, como é que apareceu esta norma no CC? Antes havia um
prazo de investigação de 2 anos após a maioridade, o TC acabou em 2006
por considerar com força obrigatória geral que esse prazo era
inconstitucional por ser curto. E na sequência disso, o legislador alargou o
prazo para 10 anos. Mas, entretanto, os tribunais como tinha sido
declarado inconstitucional o prazo, os tribunais comuns começaram a julgar
os casos considerando que não havia prazo para a investigação da
paternidade.
- Esta norma legislativa veio pretender, no fundo, repor o equilíbrio
determinando que pode haver um prazo, mas o de 2 anos era curto e
estabelece um prazo mais alargado de 10 anos. Será conforme à
Constituição ou não este prazo de 10 anos?
- Argumentos no sentido da inconstitucionalidade do prazo: metade dos
juízes acharam que era inconstitucional. Quando a Constituição consagra
um determinado direito, não devemos ter em conta apenas as
concretizações literais desse direito e a epigrafe desses artigos, temos de
ter em conta o bem jurídico fundamental desse direito. O artigo 36º tutela
a família enquanto a família elemento fundamental numa pessoa, e o artigo
26º tutela, entre outros, o direito à identidade pessoal, direito que cada

Mariana Garção 52
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

pessoa tem a ser reconhecido com as suas características próprias e


individualizadas incluindo-se o núcleo fundamental de relações que a
pessoa estabelece com outras que por qualquer razão lhe são próximas,
seja por um vínculo biológico, seja por um vinculo social. Parece que não
podemos admitir um prazo de investigação da paternidade, porque em
ultima analise esse prazo de investigação da paternidade veda o pleno
estabelecimento da identidade pessoal integrando o conhecimento das
origens biológicas da pessoa, conhecimento da progenitura, e por outro
lado veda também que a pessoa estabeleça vínculos familiares com pessoas
que por laços de sangue deveriam fazer parte da sua família. O direito à
família é importante também para garantir que a pessoa tem um apoio
necessário, particularmente importante durante a infância e a juventude. O
que é que interessa ter um apoio necessário aos 28 anos? O interesse no
estabelecimento dos vínculos de paternidade cessa aos 28 anos, medida
convencional em que a pessoa atingiu um estatuto de maturidade, ou não?
Ideia de que o interesse a conhecer o pai, o que é inerente ao direito à
identidade pessoal e o direito à família se mantém durante toda a vida. Este
interesse mantém-se ao longo de toda a vida, e que as razões que possam
levar a estabelecer prazos de caducidade não são suficientes para
preponderar sobre este interesse fundamental a conhecer o pai. Só se pode
investigar a paternidade se não houver nenhum vínculo de paternidade
pré-estabelecido, quem investiga a paternidade não tem pai. Há situações
em que por vezes se impugna primeiro a paternidade, por exemplo alguém
viveu sempre com um determinado pai, de repente descobre que ele não é
o pai, pode haver uma impugnação da paternidade – António Cortês,
moralmente reprovável, mas juridicamente possível. O direito à família
inclui o direito a ter um pai e uma mãe. Fará isto parte da identidade
pessoal das pessoas? Integra o direito fundamental à identidade pessoal?
Porque razão é que os pais não podem reivindicar que também faz parte da
sua identidade pessoal o facto de serem pais de alguém? A identidade
pessoal é a identidade de pessoas, que são seres em relação. Não nos
caracterizamos apenas por aquilo que isoladamente somos, mas também
pelo conjunto de relações que estabelecemos. Esta existência de um pai é
uma referência fundamental na vida de uma pessoa, hoje a tendência é
cada vez mais para reconhecer que isso não cessa com o passar do tempo,

Mariana Garção 53
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

mesmo após a maturidade as pessoas têm interesse, isso é constitutivo da


sua identidade pessoal e do seu direito à família em conhecer os seus pais.
E, portanto, tudo deporia no sentido de não haver prazo para a investigação
da paternidade. Hoje podemos saber com quase certeza absoluta através
de testes de ADN quem é o nosso progenitor. É esta conjugação entre o
facto da paternidade ser relevante ao longo da vida toda com a certeza
científica dos testes de AND nos proporcionam que levam a que 6 dos 13
juízes do TC tenham entendido que o prazo para a investigação da
paternidade é inconstitucional.
- A posição maioritária foi no sentido de admitir o prazo, o que é que é o
prazo do ponto de vista da dogmática dos direitos fundamentais? É uma
restrição ao direito à identidade pessoal e ao direito à família. Será que esta
restrição se justifica? Que interesses ou valores é que podem justificar esta
restrição. Interesse e a segurança nas relações jurídicas. A restrição tem
que se prever na Constituição de acordo com o artigo 18º. Está isto previsto
na Constituição? Não está estabelecido autonomamente em parte alguma
da Constituição. No entanto, a segurança jurídica é algo que pertence à
própria ideia de Direito. E a Constituição é precisamente a expressão
democrática de uma determinada ideia de direito, não há ideia de direito
sem segurança jurídica, considera-se que o estado de direito é aquele que
obedece não apenas à lei, mas também às exigências elementares da ideia
de direito, nomeadamente a justiça e a segurança. Só muito remotamente
é que a segurança jurídica aparece prevista, mas o TC considerou que este
podia ser um interesse relevante, nem sequer as pessoas que votaram
vencido contestaram isso. O interesse na segurança jurídica é
constitucionalmente protegido porque é um valor fundamental do Estado
de direito que a Constituição expressamente consagra no artigo 2º.
- Os votos de vencido disseram que a segurança não era suficiente para
prevalecer sobre a identidade pessoal e sobre o direito à família das
pessoas. Alguma incerteza faz parte necessariamente do direito, e,
portanto, a segurança não seria suficiente. Qual é que foi a grande chave de
solução deste caso? Princípio da proporcionalidade, quem defende que não
deve haver prazos dá menor relevância ao princípio da proporcionalidade
do que quem defende que deve haver. Considera que a grande regra é a de
que as restrições devem ser o mais estritas possível, e não de que as

Mariana Garção 54
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

restrições são apenas um resultado do processo de ponderação por força


do princípio da proporcionalidade, há uma versão mais absolutista destes
direitos, e uma versão mais relacional do exercício destes direitos. Venceu a
versão mais relacional do direito, no entender de António Cortês foi a
decisão correta.
- Segurança jurídica: o pretenso pai nem nunca conheceu aquele filho. Se o
pai tivesse interesse a ser encontrado perfilhava o filho. Só há ação de
investigação da paternidade se a pessoa não quiser reconhecer
voluntariamente o filho, fazendo apenas um ato notarial ou no registo civil
de perfilhação daquela pessoa.
- O TC utiliza um argumento retirado da jurisprudência do TEDH, que aceitou
a existência de prazos, considerou que não era uma exigência do direito à
privacidade e à família consagrado na CEDH a imprescritibilidade do direito
à investigação da paternidade. Poderíamos acrescentar o seguinte: o facto
de os testes de ADN darem 99,9% de certeza, não pode ser um argumento
decisivo em direito, porque no direito não se trata apenas de questões
científicas, temos de saber qual é a relevância jurídica de um determinado
facto científico. Aquele vínculo é biológico, não estando associado
eventualmente a nenhum vínculo social prévio, temos de ponderar o direito
à identidade pessoal e o direito à família do pretenso pai, que de repente
pode ver toda a sua vida pessoal e familiar posta em jogo pelo
aparecimento de um filho já totalmente fora daquilo que é o período
normal de educação e de apoio que os pais dão aos filhos.

3.1.
- Direitos liberdades e garantias beneficiam de um regime especial para a sua
restrição pelo artigo 18º/2 e 3.
- Conjugando este artigo com um outro, temos a exigência de lei formal. 2º
requisito: casos previstos na constituição. Esta formulação deve ser
entendida de forma ampla – ou está expressamente prevista ou lançamos
mão das figuras das restrições implícitas. Restrição proporcional: deve
limitar-se ao necessário para salvaguardar os interesses legalmente
protegidos. 3 testes que têm de ser feitos quando discutimos a questão da
proporcionalidade da restrição: adequação – relação meio fim –,

Mariana Garção 55
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

necessidade – entre os meios possíveis deve escolher o menos oneroso – e


proporcionalidade em sentido estrito – vantagens dos fins face às
desvantagens do meio. Caráter geral e abstrato: 4º requisito. O caráter
geral tem um âmbito subjetivo, estamo-nos a referir às pessoas, deve ser
passível de ser aplicada a um número indeterminado ou indeterminável de
sujeitos, não podemos ter uma norma a dirigir-se a uma pessoa específica,
a abstração significa que a norma tem que ser aplicável a um número
indeterminado de situações, não seria admissível uma norma que se
aplicasse a uma situação especifica, é uma exigência do princípio da
igualdade.
- Não pode ter efeito retroativo: produzir efeitos face a situações passadas.
- Último requisito: nem diminuir a extensão ou o alcance do conteúdo
essencial dos preceitos constitucionais, pode ser utilizado como uma
salvaguarda de um direito, liberdade e garantia. Quando é que coloca em
causa o essencial? Quando a norma não se limita a restringir o direito
liberdade e garantia, mas sim a aniquilá-lo. Visa evitar que qualquer
restrição toque neste núcleo essencial do direito, liberdade e garantia. O
próprio legislador constituinte não pode fazê-lo, por serem uma matéria de
limite material à revisão constitucional.
- Requisitos que qualquer norma que estabeleça uma restrição a um direito
liberdade e garantia tem de respeitar.
- Exigência de lei formal: o 18º/2 e 3 usa o termo lei. Está a referir-se a que
tipo de ato legislativo? Em sentido restrito, a lei da AR e decreto lei
autorizado. O termo lei é usado num sentido ainda mais restrito do que
aquele geralmente utilizado para lei. Como é que sabemos se é um decreto
lei autorizado? 165º/1 b), remissão do artigo 18º para o 165º/1 b). Este é o
regime geral para restringir um direito liberdade e garantia. Há direitos
liberdade e garantias específicos que nem é admissível que a AR autorize o
Governo? 164º f): direito à cidadania, a regulação deste direito, liberdade e
garantia, a forma como se adquire, perde e como se pode voltar a adquirir,
tem de ser feita obrigatoriamente por lei da AR, nem é possível que a AR
preveja a possibilidade de o Governo legislar, e 164º/1 h): constituição de
partidos políticos, direito liberdade e garantia e a sua regulamentação tem
de ser feita por lei da AR. Porque é que a administração não pode emitir

Mariana Garção 56
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

regulamentos restritivos de direitos, liberdades e garantias. É na AR que


estão os representantes, mas há um fundamento ainda mais específico do
estado de direito democrático – o princípio da legalidade da administração,
integra o subprincípio da reserva de lei. Há determinadas matérias que são
de tal maneira importantes que só podem ser reguladas por lei.
Decorrência do princípio do estado de direito democrático. O Governo
apenas só pode restringir direitos, liberdades e garantias por decreto lei
autorizado. Serão admissíveis regulamentos que tenham um impacto
restritivo de direitos, liberdades e garantias se os mesmos apenas
concretizarem uma restrição já prevista. Os direitos liberdades e garantias
não podem por caso algum ser restringidos originariamente por
regulamentos administrativos, já estamos num caso de abuso de poder
executivo. O regulamento não pode estabelecer restrições que não estejam
previstas em lei ou DL originário e mesmo existindo restrições previstas em
lei ou DL autorizado o regulamento não pode ir mais além das previstas.
- Está aqui algum direito fundamental posto em causa? Liberdade de escolha
de profissão 47º, direito fundamental que é posto em causa.
- Direito fundamental dentro do catálogo, que vai do artigo 24º ao 49º,
temos ainda de fazer um terceiro passo: os direitos fundamentais dentro do
catálogo são direitos, liberdades e garantias ou direitos económicos sociais
e culturais. Critério formal que usamos aqui, se estamos a falar de direitos
dentro do catálogo entre o artigo 24º e 57º é um direito, liberdade e
garantia.
- Artigo 47º: liberdade de escolha de profissão, implica não apenas a escolha,
mas também uma liberdade de exercício. Este direito não é estático, é
dinâmico, vai atingindo níveis diferentes de realização ao longo do tempo.
Liberdade de obtenção das habilitações necessárias ao exercício da
profissão, segundo: ingresso na profissão, entrar na profissão, terceiro
elemento: exercício da profissão, é cronológico, e quarto momento:
progresso na carreira profissional, estando verificados os 4 níveis de
realização desta liberdade.
- Neste caso prático, qual é que poderia ser o nível de concretização que
poderia estar em causa? Ingresso na profissão, problema de uma possível
restrição deste direito fundamental a ingressar na profissão.

Mariana Garção 57
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Ordem dos advogados: no plano do direito administrativo, o que é a ordem


dos advogados? Uma associação pública, que integra a administração
autónoma. Profissões tao relevantes para a sociedade que não podem ser
exercidas de qualquer forma, esse controlo poderia ser exercido pelo
Estado, mas numa logica de administração cada vez mais descentralizada o
Estado entende que a melhor forma de exercer este controlo é atribui lo
aos próprios profissionais, o Estado está a ceder os poderes públicos a essa
mesma ordem para que esta prossiga um interesse publico: garantir que
seja prosseguida de forma adequada.
- É necessário que uma pessoa se encontre inscrita nestas ordens para
exercer a profissão, código deontológico desta ordem e fica sujeita a
poderes disciplinares em caso de incumprimento.
- Se a existência de ordens profissionais constitui uma restrição a este direito
fundamental tem de preencher os requisitos do 18º. Tem de ser autorizada
pela Constituição, quer expressamente quer de forma implícita. A
constituição autoriza a existência destas ordens profissionais? Não de
forma expressa, mas podemos enquadrar esta restrição para controlar a
atividade de certas profissões em alguma norma da Constituição? 47º/1:
“salvo ...”, a quem é que cabe zelar de que a profissão é exercida de acordo
com o interesse coletivo? Tem de caber ao Estado, mas ele pode conferir
esta competência a ordens profissionais. O legislador dá-lhe poderes e
habilita-a a assegurar a defesa dos interesses públicos para o exercício
dessa profissão. Porque é que no caso da advocacia temos uma ordem
profissional, porque é que uma pessoa para exercer a profissão de
advogado tê, de se inscrever numa ordem profissional? Há aqui interesses
públicos de grande relevo, porque o advogado é uma condição da boa
administração da justiça, do acesso ao Direito por parte dos cidadãos e é
também uma condição do exercício do direito à tutela jurisdicional efetiva.
A maior parte dos cidadãos não têm conhecimentos para defender os seus
interesses de forma satisfatória, no âmbito de um processo penal uma
pessoa, sem advogado, não consegue defender-se de forma adequada
perante o poder publico. O advogado é um garante da tutela dos direitos
dos cidadãos. 32º: garantias do processo criminal, no número 3 diz-se que
todos têm direito a ter um advogado, ninguém pode ser privado dessa

Mariana Garção 58
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

defesa e em certos casos é mesmo exigido que a pessoa tenha um


advogado para que o processo possa continuar.
- Até onde é que a ordem profissional pode ir no que se relaciona com a
liberdade de escolha e de exercício da profissão?
- Com a entrada em curso do processo de Bolonha, a ordem dos advogados
por via do seu bastonário veio afirmar que se estava a massificar o acesso à
advocacia, que não tinham capacidades técnicas e que não iriam ter lugar
no mercado.
- No seguimento, passou a haver uma barreira técnica para se aceder ao
estágio, esta alteração criou uma grande polémica e um grupo de
deputados decidiu pedir ao TC para fiscalizar a constitucionalidade desta
norma. No fundo, o que os requerentes invocavam era que ao estabelecer
um exame de acesso à advocacia a ordem dos advogados estavam a
restringir o direito a aceder a uma profissão, só podendo esta restrição ser
feita nos termos de uma lei ou dl autorizado de acordo com o 165º/1 b), e
como tal esse regulamento administrativo seria inconstitucional.
- Ordem dos advogados: a restrição em questão constava de uma lei que era
o estatuto da ordem dos advogados. A ordem dos advogados invocou que o
regulamento administrativo que estabelece este exame estava apenas a
concretizar aquela lei, e o exame em si nunca poderia ser visto do ponto de
vista material como uma restrição a essa liberdade, porque qualquer
pessoa poderia fazer esse exame, e passando passaria ao estágio. Na ótica
da ordem, este exame pretendia verificar as capacidades dos candidatos e
assegurar que apenas aqueles que apresentassem as capacidades devidas
ingressavam na profissão, para tutelar os direitos dos cidadãos.
- TC: inconstitucional, a introdução deste exame era uma restrição originária
feita à liberdade de profissão, restrição que não estava prevista em lado
nenhum no estatuto dos advogados, na lei que este regulamento se
baseava. O problema é que este regulamento veio restringir de forma
originária um direito, liberdade e garantia. Se um regulamento se limitasse
a concretizar o estatuto, não haveria problema, mas o TC entendeu que do
estatuto não havia qualquer obrigação de existir um exame prévio.
- Uma coisa seria a lei prever que havia um exame prévio, e depois o
regulamento dizer quais as disciplinas, ..., mas não foi o caso, tendo em

Mariana Garção 59
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

conta que a liberdade de escolha da profissão tem estes vários níveis de


concretização.
- A ordem tem poderes publico para garantir o acesso à atividade, mas serve
para servir interesses públicos. Se fosse conferida à ordem profissional a
possibilidade de regular as condições de acesos à profissão, então
corríamos um risco de corporativismo, com este tipo de medida está-se
apenas a salvaguardar os interesses da classe, da ordem dos advogados, e é
para isso que servem os sindicatos. A reserva de lei tem uma importância
essencial quando está em causa este direito liberdade e garantia porque
visa subtrair do âmbito ed atuação das ordens profissionais a
regulamentação das condições de acesso à profissão.
- Veio uma lei estabelecer um regime geral, estabelecendo um exame de
aferição, só é possível um exame final, em consonância com este regime
geral o estatuto dos advogados revisto em 2015 passou a prever apenas um
único exame final do estágio de advocacia.

4.3. A imagem e a voz eram captadas durante 24 horas durante todo o tempo
do programa.
- O artigo 79º do CC só é possível porque existe previamente uma questão
constitucional de direitos fundamentais. O direito à imagem, antes de estar
previsto no CC, em termos de prioridade lógica, está previsto na
Constituição. Artigo 26º, direito de cada pessoa se apresentar em privado e
publicamente com a imagem que mais lhe aprouver está previsto desde
logo no artigo 26º. Este direito à imagem é um direito fundamental, parece
que é também um direito inalienável. Mas será assim? Os direitos
fundamentais são inalienáveis, são indisponíveis?
- Há um contrato entre Antonieta e a cadeia televisiva, temos de ver a
relevância dos direitos fundamentais ao nível dos contratos. A questão que
se pode levantar é se este contrato é contrário ou não aos bons costumes,
porque a sê-lo será nulo nos termos do 280º do CC. Para sabermos se um
contrato é ou não contrário aos bons costumes temos um parâmetro jus-
fundamental, o de saber se ele viola direitos fundamentais ou se os
restringe de forma desproporcional. Para sabermos isso nesse caso temos
de saber se é possível dispor em alguma medida do direito fundamental, o

Mariana Garção 60
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

que constitui uma forma de autorrestrição do âmbito de proteção do


direito fundamental relativamente a si própria. É isto legítimo ou válido?
- A pessoa obriga-se a deixar ser filmada mediante o pagamento de 5 000€
semanais.
- À partida, podemos dizer que temos dois grandes tipos de bens: a
generalidade dos bons correspondentes aos direitos fundamentais que são
por princípio indisponíveis – exemplo, direito à vida, com a exceção desta
questão agora da eutanásia com doença terminal e sofrimento
insuportável, não posso dispor do meu direito a votar nem da minha
integridade física –, mas há pelo menos dois tipos de direitos que são
disponíveis: são os direitos correspondentes a bens comunicacionais, tais
como o direito à palavra, imagem, à privacidade, são bens cujo
aproveitamento depende em grande medida da vontade da pessoa os
partilhar ou não, a minha intimidade, à partida, não tem um valor por si e
em si independentemente da minha vontade de a partilhar, a mesma coisa
a minha palavra ou imagem, são bens comunicacionais cujo valor está
intrinsecamente dependente da vontade do seu titular os partilhar ou não,
e os bens patrimoniais, que salvo algumas exceções e formas de disposição,
por princípio são disponíveis, eu posso doar a minha propriedade, posso
legar, deixar em herança, vender inter vivos, ..., estes bens em princípio são
disponíveis. Este direito à imagem é o exemplo de um bem comunicacional,
que se relaciona com a nossa participação na comunidade de comunicação,
por princípio é disponível. Haverá aqui um limite? Ela autossuspende
durante um determinado tempo que é o do programa, não abdica
totalmente do seu direito à imagem.
- A noção de bons costumes é uma noção que deve ser utilizada de forma
cuidada no direto, porque o direito não é a moral. Os bons costumes não
devem ser apenas a moral dominante. Não é pelo facto de haver um
conjunto de pessoas que preferiam que essas imagens não existissem, que
elas não deveriam existir. Ser contrário aos bons costumes seria quanto,
muito entrar já no campo da dignidade humana. A própria disponibilidade
não pode ir ao ponto de filmar pessoas a dormir com outras ou filmá-las na
casa de banho. Supondo que o contrato não tinha qualquer cláusula a
salvaguardar estas situações. Isto entra no domínio da dignidade humana?

Mariana Garção 61
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Depende do conceito de dignidade humana. Se virmos a dignidade humana


como uma espécie de dignidade de semi-anjos, que não têm corpo,
certamente que isto viola a dignidade humana. Ela deve poder permitir que
filmem tudo ou não?
- O contrato não pode ter um objeto indeterminado, tem que ter um objeto
determinado, mas não é realizável estar a fazer essa disposição caso a caso,
apenas deixar passar as imagens que a pessoa autoriza.
- A ideia de conteúdo essencial dos direitos também tem a ver com o limite
da dignidade da pessoa humana, entra-se no conteúdo essencial do direito
quando se atinge o núcleo da dignidade humana e esse núcleo é atingido
quando a pessoa é tratada como mero objeto. Não está a pessoa a ser
tratada como um objeto numa situação em que dispõe da sua imagem?
Uma modelo que vai apresentar uma passagem de modelos, está ali para
ser fotografada para ser objeto de fotografias.
- A pessoa permite que a empresa televisiva a filme durante 24 horas por dia,
é este contrato válido?
- A ideia que hoje tem preponderado é a de que não é possível dispor
definitivamente de um direito, mas é possível dispor totalmente de um
direito durante um período limitado de tempo. No entanto, se calhar há os
tais mínimos olímpicos, o mínimo de dignidade que tem de ser sempre
salvaguardada, que tem a ver com o facto de as pessoas não serem
publicamente humilhadas, mas não há muitos mais limites do que isto. A
pessoa está no programa, permite o visionamento 24 horas por dia, se
durante esse programa sabe que está a ser gravado 24 horas por dia
resolve dormir com outrem isso é uma opção livre dela, ela é responsável
por aquilo que faz, ela sabe que dispôs da sua imagem durante aquele
período, se não quer expor a sua imagem não se comporte daquela forma.
- O direito à imagem é disponível a menos que haja uma objetivação da
pessoa de tal forma grave que isso atinja o próprio conteúdo essencial da
dignidade da pessoa humana, mas isso são situações totalmente limite,
situações de humilhação desnecessária da pessoa. Isso admite que em
termos de apreciação do contrato se levante a questão de saber se todas as
imagens foram ou não passadas, mas isso não importa para a questão da
disponibilidade dos direitos fundamentais.

Mariana Garção 62
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Ela pode livremente dispor deste direito, a única coisa a que a empresa está
vinculada é à tal não objetivação grave com conteúdo de humilhação
gratuita da pessoa, a empresa apenas estará vinculada a este conteúdo
essencial do princípio da dignidade da pessoa humana. A empresa terá
ainda que respeitar o direito à imagem no sentido de a apresentação
concreta da imagem não descontextualizar e não distorcer a imagem que a
pessoa transmite ao longo do dia, fazendo cortes cirúrgicos de forma a dar
uma imagem não verdadeira ou falsa da realidade, do modo como a pessoa
se apresentou no programa.
- Ela ficou chateada com as imagens que foram apresentadas, e resolve sair
do programa. Pode fazê-lo?
- Há uma norma legal que é o artigo 81º do CC que de alguma forma
enquadra esta questão de direitos fundamentais, no qual se fala em ordem
pública, simplesmente esta tem de ser apreciada em termos de direitos
fundamentais, não é um conceito vago. Aplicando ao nosso caso, para
sabermos se é contrária ou não aos princípios da ordem pública, temos de
saber se atenta contra direitos fundamentais ou não. Em princípio,
tratando.se de direitos comunicacionais não atenta contra a ordem pública
a não ser que se trate de uma objetivação da pessoa que leve a uma
violação do princípio da dignidade da pessoa humana. A pessoa pode
limitar os seus direitos de personalidade, mas ao contrário do que sucede
no contrato normal em que ela está vinculada àquilo que disse no contrato,
ela pode revogar a todo o tempo aquilo que deu no seu consentimento.
Pode por a todo o termo fim ao contrato, algo que não acontece nos
contratos normais. Mas, pelo 81º CC, fica obrigada a indemnizar os
prejuízos das expectativas que se criaram. É possível fazer um contrato
sobre direitos de personalidade, que são direitos fundamentais, dispondo
deles, desde que isso não seja contrário à ordem publica, mas também é
possível por termo a toda a altura a esse mesmo contrato, sob de possível
indemnização.
- Temos de ponderar por um lado, a proteção forte dos direitos de
personalidade, e, por outro lado, a proteção dos interesses que se possam
contrapor a essa proteção forte dos direitos de personalidade. Dar tutela
aos direitos de personalidade ao permitir que o consentimento relativo à

Mariana Garção 63
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limitação dos direitos de personalidade possa ser revogado a todo o tempo,


ao contrário do que sucede num contrato normal, mas, por outro lado, em
nome da proteção da confiança e em nome do pactum sunt servanda,
estabelece um dever de indemnizar no caso de se revogar esse
consentimento. Antonieta teria que indemnizar.
- E a empresa, que fez as imagens que Antonieta não gostou e pôs em causa
a sua imagem? Só se tem de indemnizar se houver uma atuação ilícita e
culposa que cause um dano. A atuação ilícita pode ser a distorção da
imagem, nesse caso a empresa teria de indemnizar, que ponha em causa a
integridade da imagem da pessoa. Caso a empresa apenas tenha como
sucederá na grande maioria dos casos apresentado as imagens, não terá de
indemnizar.
- Relativamente ao fotógrafo que lhe tira uma fotografia com um drone,
estaria em causa o direto à imagem e o direito à privacidade. Normalmente,
relativiza-se o direito à privacidade no caso das figuras públicas, sendo ela
uma modelo e atriz que aparecem vulgarmente em revistas, a pergunta é se
as figuras públicas têm o mesmo direito à imagem e à privacidade que a
generalidade das pessoas? Se ela aparecer numa festa, evento público,
podem por princípio tirar-lhe fotografias mesmo sem o seu consentimento,
ao contrário do que acontece com a generalidade das pessoas, mas estas
pessoas não perdem por isso o seu direito à intimidade ou privacidade. Ela,
neste caso, estava no seu domínio de privacidade, atinge-se aqui não
apenas o direito à imagem, mas muito especialmente o direito à
privacidade, o de Antonieta não dispôs do seu direito à privacidade, aquela
fotografia é ilícita, caso seja publicada o paparazzo pode ter que
indemnizar. Antonieta, antes que as fotografias sejam publicadas, quer
evitá-lo, para proteger os seus direitos de personalidade. O que é que ela
pode fazer para protegê-los? É muito mais grave que a imagem seja
publicada nos jornais e internet do que ser tirada uma fotografia apenas
acessível a uma pessoa. O que ela pretende é evitar que se agrave a
violação do seu direito à privacidade. O seu direito já foi violado, mas ela
pretende evitar uma forma muito mais grave que é a publicação. Ela pode
pedir uma providência cautelar, e pedirá isso nos tribunais civis de comarca,
um tribunal comum. Portanto, está aqui um ótimo exemplo de como os
direitos fundamentais podem ser protegidos nos tribunais comuns através

Mariana Garção 64
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

dos meios judiciais comuns como as providências cautelares. O nosso


sistema jurídico admite meios de evitar a violação de direitos, poderia
também aqui propor-se uma ação apenas de reconhecimento do direito,
isto é, pedia-se a um tribunal que reconhecesse o seu direito à privacidade
e os jornais quando publicassem aquela fotografia já saberiam à partida que
estariam a fazer algo de ilícito e que consequentemente teriam de
indemnizar. Simplesmente, esta ação para reconhecimento do direito não
tem uma dimensão executiva, ter-se-ia que pedir uma providência cautelar
para pedir o suporte digital das fotografias e o pagamento imediato de
todas as fotografias.

4.
1. Prevaricador: pessoa que não respeita uma determinada obrigação legal,
empresas prevaricadoras são pessoas que não respeitam uma obrigação
legal. Só poderiam exercer funções de segurança privada as empresas
determinadas.
- Temos um primeiro problema, saber se o DL é ou não inconstituicional por
restringir direitos, liberdades e garantias sem cumprir os requisitos previstos
na lei.
- Outro problema: problema central, saber como é que a AP deve proceder
quando é chamada a aplicar uma lei e a mesma suspeita que a mesma possa
ser inconstitucional por violar direitos, liberdades e garantias. Porque é que
isto é um problema? Regime específico para os direitos, liberdades e
garantias, um dos aspetos é que este regime beneficiava de um regime
especial em matéria de restrições, mas há mais aspetos ao regime de
direitos, liberdades e garantias previsto no artigo 18º.
• Um dos aspetos do regime específico de direitos, liberdades e garantias,
consiste no facto de eles vincularem as entidades publicas e as privadas,
previsto no 18º/1 2ª parte, que estabelece duas características:
aplicabilidade direta, valem sem lei, o simples facto de estarem na
constituição faz com que sejam diretamente aplicáveis em situações
concretas, e eles valem contra a lei.
• A lei que os contrarie vai ser declarada incosntitucional, segunda grande
ideia da aplicabilidade direta.

Mariana Garção 65
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Todas as entidades públicas, incluem-se tanto as entidades que exercem


poder legislativo, judicial e executivo, estão vinculados pelos direitos,
liberdades e garantias, têm de conformar a sua atuação de forma a
assegurar que não violam estes direitos fundamentais.
- Problema muito específico, saber o que é que a administração deve fazer
quando tem uma lei que a manda fazer uma determinada coisa, praticar
uma conduta, mas que entende que a aplicação dessa lei irá violar direitos,
liberdades e garantias dos cidadãos, suspeita de que a lei é inconstitucional.
- Para apreciar esta questão, temos de fazer dois tipos de exercícios:
• Ver se temos razoes ou não para entendermos que este diploma é
inconstitucional.
• Entendendo que sim, pode a AP pode invocar essa inconstitucionalidade,
que ainda não foi declarada pelo tribunal, para não aplicar a lei.
- Primeiro passo: ver se estamos perante um direito fundamental ou não.
• Temos uma lei que proibia pessoas que tivessem antecedentes criminais
ou não tivesse a nacionalidade portuguesa de exercer profissões no
âmbito da segurança nacional.
• Direito fundamental de acesso à profissão 47º, liberdade de profissão.
Classificar o direito, ver que tipo de direito é, direito fundamental dentro
do catálogo e enquanto tal, previsto entre os 24º a 57º, é um direito,
liberdade e garantia. Temos de fazer estes passos todos. Saber se
opodemos aplicar a este direito o regime específico dos direitos
liberdades e garantias.
• Ao assumir que é o direito, liberdade e garantia a configuração deste
diploma constitui uma restrição a este direito, está a estabelecer
condições que barram a entrada na profissão a determinadas pessoas,
está a restringir a liberdade de profissão na sua vertente da liberdade de
ingresso.
• Temos de ver se esta restrição cumpre os requisitos do artigo 18º/2 e 3
para a restrição de um direito, liberdade e garantia.
∆ Pressuposto formal: qualquer restrição, tem de ser feita ou por uma lei
ou por um decreto lei autorizado, 18º/3 conjugado com o 165º/1 b).
◊ Estamos perante um DL simples, DL normal, se for autorizado tem de
dizer expressamente, estamos perante um DL comum, não

Mariana Garção 66
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

cumprindo o requisito formal, problema de inconstitucionalidade


porque a restrição é feita pelo Governo sem intervenção da AR, é
uma inconstitucionalidade orgânica, tem que ver com o órgão que
emana a lei.
◊ Basta que não se verifique um requisito para que a norma que
consagra esta solução seja inconstitucional.
∆ Pressupostos materiais: imaginando que estávamos perante um DL
autorizado.
◊ Autorização da constituição para a restrição: pessoas de
nacionalidade portuguesa: é compatível com o 18º/3 da
Constituição? O legislador pode restringir o acesso a profissões
dependendo da nacionalidade das pessoas? Só os cidadãos
portugueses é que são titulares dos direitos fundamentais na
Constituição? Não, 12º: princípio da universalidade, não distingue
entre cidadãos portuguese e estrangeiros, e no 15º vem
complementar o alcance deste princípio da universalidade para
estrangeiros, apátridas ou cidadãos portugueses. 15º/1: princípio da
equiparação, os cidadãos estrangeiros que se encontram ou residam
em Portugal, à partida, estão sujeitos aos mesmos direitos e deveres
dos cidadãos portugueses.
* Mas o número 2 exceciona alguns direitos e deveres. A
constituição de alguma forma legitima o legislador a efetuar
restrições ao princípio da equiparação, o segundo requisito do
18º/2 até poderíamos considerar que estava de certa forma
preenchido, autorização da constituição para a restrição.
◊ Princípio da proporcionalidade: temos de comparar a restrição à
finalidade que ela prossegue. Não se consegue perceber qual a
finalidade que esta restrição prossegue. Há casos em que faz sentido
que só sejam os cidadãos portugueses a desempenhar – serviço
militar –, mas falha o pressuposto material da proporcionalidade
porque esta restrição à liberdade de ingresso na profissão não se
percebe qual é a finalidade a prosseguir, porque nada obsta a que
cidadãos estrageiros desempenhem funções de segurança privada.
- E a cláusula referente aos antecedentes criminais? 30º/4: princípio da
proibição dos efeitos automáticos das penas.

Mariana Garção 67
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Este princípio traduz que uma pena envolve a restrição de direitos


fundamentais. Contudo, esta pena só pode fazer essa restrição, a
aplicação de uma pena não pode ter como efeito automático que se
restrinjam ou se retirem direitos fundamentais civis, profissionais ou
políticos.
• Neste caso concreto, estaríamos a retirar direitos profissionais, o simples
facto que uma pessoa tivesse sido condenada a uma pena faria com que
essa pessoa não se pudesse candidatar a uma profissão.
• Claro que o legislador pode barrar a entrada a certas profissões quando
uma pessoa tenha cometido algum crime, mas não pode ter esta
formulação tão ampla.
• Tem vindo a ser admitido e feito pelo legislador que ao invés de dizer que
só pode aceder à profissão quem não tenha antecedentes criminais, o
legislador apenas invoca os crimes concretos que faz sentido que obstem
ao acesso à profissão. Ex.: alguém que foi condenado por pedofilia, faz
sentido que não possa aceder à profissão de educador de infância.
Contudo isto não basta, porque estaríamos ainda perante um efeito
automático. O legislador tem vindo a estabelecer requisitos adicionais,
hoje em dia diz-se que não pode exercer a profissão a pessoa condenada
por crimes x ou y exceto se for demonstrada a reabilitação, ou então
quando a AP considere tendo em conta algum fator – como o tempo
decorrido – não se justifica que se impeça a pessoa de exercer a
profissão, não estamos perante um efeito automático. A norma tem de
ser criteriosa, não podendo ser o efeito automático. PICOLO.
- Segunda questão: se a AP chegar à mesma conclusão que nos, se entender
que o diploma é inconstitucional, pode a AP recusar-se a aplicar este DL, ou
se a AP se encontra obrigada a não aplicar a lei ao caso concreto? Problema
muito debatido na doutrina.
• Princípios previstos no 266º/2 da Constituição, que se contrapõem. Por
um lado, o princípio da legalidade da administração, estão subordinados
à lei, e por outro lado o princípio da constitucionalidade, estão
subordinados à constituição.
∆ Legalidade: a AP, no exercício da sua atividade, é obrigada a executar
as leis que emanam do poder legislativo. O legislador determina o
interesse público que a AP deve prosseguir, e a AP não tem uma

Mariana Garção 68
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

margem de apreciação, deve sempre seguir esse interesse publico. A


AP, em regra, tem de seguir a lei, que também vem previsto no artigo
3º do CPA.
∆ Constitucionalidade: a AP está também sujeita à Constituição quando
atua.
∆ Quando a lei obriga a AP a comportar-se de uma maneira – manda a AP
praticar uma determinada conduta, aplicar uma sanção administrativa
a quem desrespeite os pressupostos previstos na lei, exigência do
princípio da legalidade tem de aplicar a todos por igual – mas por outro
lado, havendo suspeitas de que a lei é inconstitucional, não dará à AP a
faculdade o princípio da constitucionalidade de invocar que não
cumpre a lei, de modo a cumprir a constituição.
∆ Princípio que decorre da razão pela qual entendemos que este DL é
inconstitucional: inconstitucionalidade por violação de direitos,
liberdades e garantias, assim sendo há um segundo princípio que
podemos invocar aqui como fundamento de que a AP não deve aplicar
a lei – princípio da vinculação das entidades públicas aos direitos,
liberdades e garantias. Podemos invocar que isto faz com que a AP
deva evitar e encontra-se eventualmente obrigada a evitar aplicar leis
quando suspeita que estas violam direitos, liberdades e garantias.
∆ A AP deve aplicar a lei?
◊ Posição clássica tradicional: a AP tem sempre de seguir a lei em
qualquer caso, mesmo que a AP suspeite que a norma é
inconstitucional porque viola direitos liberdades e garantias, tem de
cumprir a lei por causa do princípio da legalidade, mas também por
causa do princípio de separação de poderes e o princípio da
segurança jurídica.
* Não cabe ao poder executivo da AP fiscalizar a constitucionalidade
de leis, isso é uma matéria reservada ao poder judicial, ao TC ou a
qualquer outro tribunal português 204º Constituição. Os tribunais
têm um dever de não aplicar normas que considerem
inconstitucionais.
* Para a AP não temos uma regra com este teor, poderíamos dizer
que a AP não pode praticar atos que violem a constituição. De
acordo com a posição tradicional esta omissão é intencional, pelo

Mariana Garção 69
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

princípio da separação de poderes. A AP teria de fazer um juízo


acerca da inconstitucionalidade da norma, que cabe apenas aos
tribunais.
* PICOLO.
* Teria a AP o poder legislativo, pelo Governo, o poder executivo e o
poder judicial, o que não é concebível.
* A AP está sujeita à lei, não é livre de assumir se aplica ou não à lei.
Seria perigoso admitir que a AP se poderia desvincular da lei,
invocando a sua inconstitucionalidade.
* Se apenas funcionários de topo pudessem fazer este juízo, este
perigo não era tao evidente, mas ainda assim estar-se-ia a atribuir
à AP esta possibilidade de apreciar a constitucionalidade.
* Princípio da segurança jurídica: se admitíssemos que a AP apenas
poderia cumprir as leis quando entendesse que não eram
inconstitucionais, o particular deixar de poder prever qual seria o
comportamento da AP.
* Enquanto a lei estiver em vigor, a AP tem de a aplicar.
◊ Rui Medeiros: entende que a AP se deve recusar a aplicar normas
que considerem inconstitucionais, incoa o principio da
constitucionalidade da AP entendendo que não faz sentido que a AP
aplique uma determinada lei quando tenha quase a certeza que esse
atoa administrativo que realizou seja declarado nulo pelo Tribunal,
porque os atos administrativos que violem a Constituição são nulos.
◊ Vieira de Andrade: entendimento mais moderado, entende que
temos de distinguir o fundamento da inconstitucionalidade tem de
estar em causa a violação de direitos liberdades e garantias, e o
segundo pressupostos é que essa violação seja particularmente
evidente, não basta uma simples suspeita de que essa lei possa
eventualmente violar direitos liberdades e garantias que a AP não
tenha duvidas de que essa lei é inconstitucional.
* Direitos liberdades e garantias: princípio da aplicabilidade direta e
o princípio da vinculação das entidades públicas 18º/1. Porque se
dizemos que os direitos liberdades e garantias valem contra a lei,
uma lie que os viola a AP não deve ser obrigada a aplicar essa lei –
aplicabilidade direta. Se a administração se encontra obrigada a

Mariana Garção 70
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

atuar de forma a respeitar sempre direitos liberdades e garantias,


se entendem que violam direitos liberdade e garantias não deve
aplicar essa lei – vinculação.
* Não basta uma suspeita, tem de ser evidente para que se possa
verificar uma quebra do
◊ Jorge Miranda: aceita a posição clássica, em regra entende que a AP
tem sempre de aplicar a lei mesmo que entenda que é
inconstitucional por violação de direitos liberdades e garantias.
Invoca os argumentos da posição clássica: legalidade, segurança
jurídica e separação de poderes.
* Quando esteja em causa uma possível violação de um direito
fundamentalíssimo 19º/6 que nem em estado sítio podem ser
suspensos, tendo em conta a importância que a constituição
confere a estes direitos, a AP poderá legitimamente não cumprir a
lei.
* Quando estão em causa duas normas, previstas no mesmo
diploma ou não, e a norma do primeiro diploma é julgada
inconstitucional pelo TC com força obrigatória geral e desaparece,
mas temos uma norma num segundo diploma que tem um teor
quase igual à da primeira. Se tem um teor idêntico, não tendo sido
declarada inconstitucional, os argumentos que o tribunal utilizou
para declarar a primeira inconstitucional, podem ser utilizados
nesta segunda norma. Porque a AP não vai estar a fazer um juízo
de apreciação de constitucionalidade, mas sim a remeter para o
juízo efetuado pelo TC. A AP não faz um juízo autónomo.
• Posição clássica: o inspetor do trabalho deve aplicar.
• Rui Medeiros: não deve aplicar.
• Vieira de Andrade: não deve aplicar.
∆ Está em causa uma violação de um direito liberdade e garantia.
∆ Está em causa uma violação evidente? É discutível, estando perante
uma inconstitucionalidade orgânica estamos perante uma
inconstitucionalidade evidente, sendo um direito liberdade e garantia
regulado num DL, mesmo que entendêssemos que não era bem uma
restrição, pelo 165º/1 b) qualquer forma de regulamentação de um
direito liberdade e garantia está na reserva relativa da AR.

Mariana Garção 71
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Jorge Miranda:
∆ Regra é que devemos aplicar, temos de ver se se verifica alguma das
exceções que ele enuncia.
∆ A liberdade de escolha de profissão não está prevista no catálogo de
direitos fundamentalíssimos no 19º/6.
∆ A segunda é discutível, o TC tem uma jurisprudência de considerar
inconstitucionais normas que violem o princípio dos efeitos
automáticos das penas. Podemos invocar que o TC tem vindo a
considerar outras normas semelhantes a esta como inconstitucionais, e
a AP pode remeter para a fundamentação do TC para essas demais
normas e não aplicar a lei.
- Como é que as empresas e os trabalhadores podem reagir, sendo aplicada
esta coima?
• 21º Constituição: direito à resistência, não usam da força, mas o direito
de resistência neste caso implicaria não pagar voluntariamente a coima,
poderiam esperar que a AP os viesse a executar judicialmente, ou então
podem antecipar-se e impugnar o ato administrativo do tribunal
mediante um processo administrativo, indo dar à inconstitucionalidade
da norma legal. Caberia ao Tribunal de 1ª instância apreciar se a norma é
ou não inconstitucional, decidindo que era então não teriam de pagar a
coima.

5.
6. Testamento vital
2.
- Através deste documento, pode ser feito por qualquer pessoa desde que
maior de idade e incapaz, em que manifeste de forma antecipada a sua
vontade quanto a um assunto muito especifico: o de determinar quais os
cuidados médicos que deseja ou não receber caso um dia no futuro exista
necessidade de existir uma intervenção médica quanto à prestação desses
cuidados e a pessoa não se encontre capaz nesse momento de demonstrar
o seu consentimento quanto a esse assunto – coma, por exemplo.

Mariana Garção 72
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- Para assegurar que essa pessoa pode assegurar o seu consentimento prévio
existe esta ideia do testamento vital, que tem algumas similitudes com a
figura do testamento civil.
- No civil, a pessoa demonstra de forma antecipada o que quer que aconteça
com o seu património antes de morrer, no testamento vital a pessoa decide
quais os cuidados médicos que quer receber caso um dia no futuro tenha
de ser tomada uma decisão com essa natureza, documento a priori, antes
de ocorrer uma decisão em concreto que implica essa decisão.
- O testamento vital é atualmente legal e possível em Portugal? Sim, desde
que estão preenchidos os pressupostos estabelecidos no diploma.
- Eutanásia: vem do grego antigo, que significa boa morte, significa a
possibilidade de antecipar a morte de alguém, pedido para morrer. Os
ordenamentos jurídicos que permitem esta prática em casos de doença
terminal de uma pessoa, que sabe que é uma questão de tempo até
morrer, e a pessoa pede para que tenham o comportamento ativo de a
matar, feita através de uma injeção letal. Pedido de antecipação da própria
morte, o que em Portugal ainda não é permitido,
- Coisa bem distinta do testamento vital, em que a pessoa apenas diz de
forma antecipada quais os cuidados médicos que deseja e não deseje
receber. Nos ordenamentos jurídicos em que a eutanásia é proibida, o
testamento vital nunca pode permitir a eutanásia. A própria lei do
testamento vital tem um artigo que diz que se o pedido concretizar um
auxílio ao suicídio, é como se não estivesse escrito.
- Nos ordenamentos jurídicos em que a eutanásia é legal, Bélgica, Suíça,
Holanda e Canadá, já é possível que uma pessoa peça, por via de
testamento vital, que lhe seja aplicada a eutanásia.
- Quais são os pedidos que podem ser feitos? Ortotanásia, algo permitido no
ordenamento jurídico português. Diferença entre ortotanásia e eutanásia:
na ortotanásia está em causa um pedido não de antecipação da morte, mas
sim que a morte venha quando deve vir, recusar tratamentos que estão a
prolongar a vida e que na sua falta vão fazer com que o doente vai morrer,
e desligar a máquina. Na eutanásia, estamos perante um comportamento
ativo dos médicos, os médicos ativamente matam a pessoa, e na

Mariana Garção 73
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ortotanásia estamos perante um comportamento omissivo dos médicos,


para que a pessoa morra quando esse momento chegue sem que haja uma
intervenção humana. Isto é possível pedir em Portugal através do
testamento vital.
- Alínea b): situações em que segundo os médicos já não existe esperança,
caso concreto de um bebé que vai morrer e as máquinas estão apenas a
prolongar um desfecho inevitável. Tratamentos que visam evitar uma
morte inevitável é a distanásia, significa má morte, prolongar a vida
humana para além do conjeturável. Os médicos, deontologicamente, estão
proibidos de praticar distanásia, mas pode haver casos em que os médicos
querem desligar as máquinas porque entendem que não há esperança, e os
pais não concordam, caso discutido em Inglaterra. Embora a distanásia seja
proibida pela ordem dos médicos, pelo testamento vital a pessoa pode
pedir que não sejam praticados estes atos.
- Cuidados paliativos: ao contrário dos restantes, não têm uma implicação
direta com o processo de morte do doente, tentar minimizar ao máximo o
sofrimento a dor do paciente devido à doença que ele tem. Que ele viva de
forma mais digna e menos onerosa possível enquanto estiver vivo.
- Isto são apenas alguns dos pedidos que podem ser feitos, tendo em conta
que esta é uma escolha pessoal de cada um, o legislador desde 2012 admite
que a pessoa possa decidir sobre estas decisões, de modo a evitar que no
futuro seja a família que toma essa decisão, tomando a própria pessoa de
forma consciente a sua decisão. Só é admissível para casos permitidos no
ordenamento jurídico português, não é permitida para casos proibidos
como o da eutanásia.
- Pressupostos: quem pode fazer testamento vital e em que condições: artigo
4º da mesma lei, 3º pressuposto do consentimento livre e esclarecido que
se verificava este problema do nosso caso prático. A ordem dos médicos
queixa-se do quê? O facto de a lei não exigir como condição obrigatória de
que a pessoa tenha uma consulta medica antes de elaborar o testamento
vital faz com que não se possa assegurar com segurança suficiente de que o
seu consentimento é livre, consciente e esclarecido. A pessoa ao tomar a
sua decisão só estará ciente do que está a fazer se for aconselhada por um
médico antes de o fazer.

Mariana Garção 74
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Nessa medida, fizeram uma queixa ao provedor de justiça, alegando a


inconstitucionalidade desta norma na parte em que não requer este
aconselhamento médico prévio. O provedor de justiça é uma das entidades
que tem legitimidade para requerer ao TC 281º/2 d) da Constituição para
fiscalizar as normas que se encontram no ordenamento jurídico.
- O TC aprecia este pedido de fiscalização.
- Problema de inconstitucionalidade que se podia levantar: a ordem dos
médicos dizia que a falta deste aconselhamento não permitia este
consentimento livre, mas estes pressupostos estão na lei e não na
Constituição. Esta omissão do legislador em não prever o aconselhamento é
uma inconstitucionalidade por violação de que princípio constitucional?
Princípio da proibição do défice de proteção de um direito fundamental:
parte do pressuposto de que o Estado tem um dever positivo, implica uma
ação, de proteção dos direitos fundamentais. Este principio parte também
da ideia de que ao conferir proteção a um direito fundamental, o Estado
está obrigado a assegurar um mínimo de tutela e proteção a esse direito, de
forma a que o mesmo não fique desprotegido ou vulnerável face a
violações de terceiros ou mesmo do seu próprio titular, próprio titular do
direito fundamental que o coloca em perigo. Quando a proteção conferida
pelo estado fica abaixo deste limite mínimo imposto para assegurar o
mínimo de tutela ao direito, podemos estar perante uma possível violação
deste princípio de mínimo proteção.
- Este princípio não está expressamente previsto na constituição, mas tem
vindo a ser afirmado tanto pela jurisprudência como pela doutrina
constitucional a partir do princípio do Estado de direito democrático 2º
Constituição. Só faz sentido este entendimento se olharmos ao princípio de
Estado direito entendido em sentido material e não meramente formal, que
foi o sentido originário deste princípio.
- Princípio do Estado de Direito em sentido formal: entendimento originário,
o Estado era visto como um inimigo da sociedade, na sequencia da
revolução Francesa, tentativa de limitar o poder soberano do Estado face
aos direitos fundamentais dos cidadãos. O Estado era um inimigo da
sociedade e por isso dever-se-ia abster ao máximo de praticar atos que
lesassem direitos fundamentais. Dever de abstenção, omissão, ele deveria

Mariana Garção 75
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não atuar de forma a colocar em causa direitos fundamentais. O dever do


Estado era cumprido se o mesmo não infringisse direitos fundamentais.
Com a passagem de um Estado de direito formal a um estado de direito
material, e a ultrapassagem da desconfiança, o mesmo deixou de ser visto
como um inimigo da sociedade mas sim como uma entidade fundamental
para assegurar a efetividade deste tipo de direito, entendeu-se que o
mesmo não poderia ter apenas uma conduta omissiva de abstenção
relativamente aos direitos fundamentais, para se passar a afirmar que o
mesmo deveria ter uma conduta ativa de proteção, no sentido de proteger
direitos fundamentais, conceção de estado de direito que temos hoje,
entidade que tem de proteger os direitos fundamentais através de
legislação adequada que os proteja. Vertente que se acentuou com a
passagem para o Estado Social. Deveres positivos de proteger direitos
fundamentais e não apenas deveres negativos de não agredir esses direitos.
- Re-compreensão do princípio da proporcionalidade: quando este principio
foi afirmado, no quadro do Estado de direito formal, tinha a ideia
subjacente do estado como inimigo, o mesmo traduzia-se essencialmente
no principio da proibição do excesso, presente no 18º/2. A partir do
momento em que entendemos que o Estado tem deveres positivos, o
principio ad proporcionalidade foi movido para também analisar se o
mínimo de proteção conferida a um direito fundamental tem a suficiente
eficácia para permitir a garantia desse direito.
- Uma violação do princípio da proibição do excesso implica uma
desproporcionalidade positiva, estabelece um limite máximo que o estado
não pode ultrapassar quando protege um direito fundamental, o princípio
da proibição do excesso estabelece um limite mínimo que o Estado não
pode descurar quando tutela um direito fundamental,
desproporcionalidade negativa.
- Acórdão 75/2010 TC sobre um tema muito fraturante, algo que era
proibido e passou a ser permitido em 2007 e fiscalizado em 2010: aborto. O
TC entende que só uma pessoa nascida é titular de direitos fundamentais,
mas o embrião já implantado no útero beneficia da chamada vida
intrauterina, sendo um embrião suscetível de gerar vida no futuro,
apoiando-se no princípio da dignidade da pessoa humana, o tribunal

Mariana Garção 76
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entendeu que havia um valor titulado da vida intrauterina. Houve quem


entendesse que a vida intrauterina não era suficientemente protegida pelo
legislador, porque o Estado estava a colocar-se num papel neutro face à
vida intrauterina e se estava a abster de a proteger. O TC decidiu esta
questão e etendeu que não havia uma violação da proibição do défice. O TC
partiu de uma posição muito restritiva relativamente ao tipo de
interpretação que pode fazer quando está em causa este princípio. PICOLO.
Em nome do princípio da separação de poderes, o legislador tinha um
espaço para tomar esta decisão, e o TC só poderia intervir em caso de
manifesto erro de apreciação por parte do legislador detetado com base
em critérios de evidência. O TC veio a moderar esta posição em acórdãos
sequentes. O TC entendeu que o legislador não tinha incorrido em um erro
manifesto de apreciação quando estava em causa a interrupção voluntária
da gravidez, porque o legislador não o tinha feito de forma irrestrita.
Primeiro consagrou um critério temporal, proteção da vida intrauterina
para lá das 10 semanas, e o legislador tinha imposto como condição que a
mesma fosse a uma consulta médica, de forma a ficar plenamente
esclarecida sobre as consequências deste ato, e também benefícios sociais
que a mesma pode beneficiar caso queira prosseguir com a gestação até ao
fim. Esta era uma consulta meramente informativa, confere isto uma
proteção suficiente à vida intrauterina ou seria necessário que a consulta
fosse dissuasiva?
- António Abrantes: seria importante haver a consulta, porque temos na
Convenção de Oviedo, convenção internacional de que Portugal faz parte,
visa proteger os direitos do Homem relativamente à medicina e biomédica,
que qualquer intervenção médica haja um consentimento esclarecido de
uma pessoa, o regime português entra em contrariedade com o regime da
convenção, argumento favorável a defendermos a necessidade da consulta
obrigatória. Para qualquer intervenção médico cirúrgica, é necessário um
consentimento esclarecido daquele que é alvo da intervenção, temos de
assinar um termo de consentimento em que temos um profissional para
nos esclarecer. Para o caso das manifestações de vontade, é previsto este
consentimento esclarecido, mas nada na lei garante que essa pessoa
efetivamente saiba o que está a fazer. Estamos perante questões tão
complicadas, expressão de vontade anterior a pessoa não sabe o que vai

Mariana Garção 77
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acontecer no futuro, termos médicos complicados, uma consulta médica


seria importante para assegurar que a pessoa está a formular um
testamento vital antecipando todas as consequências das suas decisões. O
legislador deveria ter feito tudo para assegurar que o consentimento da
pessoa que faz o testamento vital é o mais esclarecido possível. O legislador
não levou suficientemente a sério o seu dever de garantir e proteger a vida
e a integridade física da pessoa que faz o testamento vital para garantir que
os pressupostos que ele exige se verifiquem na prática, este nível de
proteção ficou abaixo de um liminar mínimo de proteção desse direito, e
assim sendo, há uma violação do principio de proibição do défice.

7.
3. Qual é a norma objeto da apreciação da constitucionalidade? Normas para
efeitos de fiscalização da constitucionalidade, podem ser três coisas:
- Preceito ou artigo legal;
- Uma parte de um preceito ou artigo legal;
- Uma interpretação normativa: artigo quando interpretado num
determinado sentido na medida em que se aplica a determinado tipo de
situações ou não.
- Neste caso concreto, a norma objeto de fiscalização da constitucionalidade
é verdadeiramente uma interpretação normativa do 101º do DL 244/98 na
medida em que permite a expulsão de cidadãos estrangeiros que tenham a
seu cargo filhos de menores portugueses, o 101º não fala em parte alguma
de se ter ou deixar de ter filhos de menores portugueses a cargo, por e
simplesmente permite-se a expulsão de cidadãos estrangeiros.
- Uma coisa diferente do objeto de apreciação da constitucionalidade são os
seus parâmetros, que são as disposições constitucionais ou os princípios
consignados na Constituição.
- 204º e 207º Constituição: indicação clara do que é o objeto e o que são os
parâmetros de apreciação da constitucionalidade. 204º: está em causa, na
apreciação da constitucionalidade, a não aplicação de normas, sendo certo
que o tribunal tem estendido de tal forma este conceito de norma, que
abrange não apenas os artigos legais e parte desses artigos, mas também a
interpretação normativa desses artigos legais. Ou aquilo que está

Mariana Garção 78
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

expressamente na constituição, ou o que está implicitamente – “interesses


nela consignados”. O objeto de apreciação da constitucionalidade são
normas infraconstitucionais.
- O artigo 101º, tal como está no caso, é inconstitucional ou não é
inconstitucional? O artigo 101º estabelece uma pena acessória de expulsão.
- O artigo 101º não viola nenhum direito liberdade e garantia, um
estrangeiro é condenado por um crime de furto e este artigo permite que
ele seja expulso do país. Será isto uma violação do artigo 13º da
Constituição? Discrimina-se em função do território de origem? Isto apenas
permite a expulsão de estrangeiros. O artigo 13º determina que é uma
violação do princípio da igualdade a discriminação com base no território
de origem.
- A constituição permite essa diferenciação expressamente no artigo 33º/1,
que diz que os cidadãos portugueses não podem ser expulsos do território
nacional, a contrario os cidadãos estrangeiros podem. Este artigo é muito
claro a reservar o direito a não ser expulso do território nacional aos
cidadãos portugueses. Este artigo é uma exceção ao princípio da
equiparação do artigo 15º. A grande regra é a de que um cidadão
estrangeiro, não é qualquer cidadão estrangeiro, que resida ou se encontre
me Portugal, ainda que possa haver diferenças entre residir – tendo mais
direitos – ou se encontra ocasionalmente em Portugal, goza dos mesmos
direitos que um cidadão português. A nossa Constituição é uma
Constituição generosa do ponto de vista dos direitos fundamentais, isto
vem da tradição universalista portuguesa, já desde o tempo dos
descobrimentos.
- Os direitos que estão na Constituição, tiveram a inspiração em quê? Da
Declaração Universal dos Direitos do Homem. Toda a inspiração do nosso
catálogo de direitos fundamentais é universalista, estes direitos em
princípio valem para qualquer pessoa, não significa que não possa haver
restrições devidamente justificadas em razão da nacionalidade, mas o
princípio não é esse. 33º: exceção ao princípio da universalidade. Esta
exceção justifica-se ou não? Alternativa mais onerosa do que a expulsão:
prisão. Este artigo pare do princípio de que a expulsão do território nacional
é mais grave do que uma pena de prisão, uma pessoa existe e vive numa

Mariana Garção 79
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

determinada comunidade, tem os amigos, família, fala a sua língua, tem


maior capacidade de arranjar trabalho e é nessa comunidade que se realiza.
Compreensão da pessoa como alguém que se insere numa especifica
comunidade.
- Quanto aos estrangeiros já não têm esse grau de inserção comunitária que
têm os portugueses, e, portanto, admite-se a pena de expulsão se eles
puserem em perigo bens jurídicos tão importantes que a sua violação
ponha em causa a segurança nacional.
- Este artigo não seira inconstitucional. Dificuldade adicional: este
estrangeiro tem filhos portugueses.
- Se o estrangeiro for expulsão, os filhos, como são menores a cargo, terão
de ir com o pai e acabam por indiretamente ser expulsos
involuntariamente. A pena de expulsão aplica-se, normativamente, ao pai,
mas na prática como os filhos são dependentes do pai tem que ir com ele e
sofrem, portanto, a pena de expulsão. Poderíamos dizer que o 33º/1 proíbe
literalmente que sejam expulsos do território nacional os cidadãos
portugueses, mas proíbe analogicamente que se chegue a uma situação em
que, embora o cidadão português, não seja sujeito a uma pena de expulsão,
na prática tenha que sair do território nacional se quiser sobreviver
juntamente com as pessoas com quem vive a cargo. Ir ao espírito do artigo
33º - os cidadãos portugueses não podem ser expulsos, nem por lhes ser
aplicada uma pena de expulsão, nem por ser aplicada uma pena de
expulsão às pessoas que o sustentam e que portanto tenham de sair do
país – mais do que à sua letra.
- António Cortês, em jeito de provocação: e se o cidadão for o homem, esses
filhos têm uma mãe, podem cá ficar com ela, ou com os avos, ou tia,
ninguém os está a obrigar a sair do território nacional, eles não estão a ser
expulsos do mesmo.
- 36º/6: grande regra de que os filhos não podem ser separados dos pais,
princípio inerente ao direito a família, que não é apenas o direito a ter em
abstrato uma família, mas também um direito a viver em proximidade com
os pais e os pais a viverem em proximidade com os filhos. Contudo, se os
pais os maltratam ou não cumprem as suas responsabilidades parentais,

Mariana Garção 80
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

caso em que é possível retirar o poder paternal a essas pessoas, situações


extremas em que uma pessoa não consegue efetivamente cuidar dos filhos.
- Garantia do 36º/2 VERIFICAR: garantia das condições de que as pessoas
precisam para se realizarem e se desenvolverem enquanto pessoas. Esta
relação familiar mais estreita de todas entre filhos e pais por princípio não
pode ser posta em causa. Só se houver um atentado tao grave a outros
direitos fundamentais que justifique proteger a criança em nome do seu
superior interesse.
- O artigo 61º não pode ser invocado por ser um direito económico e social,
norma mais programática. Hoje em dia está em crise a ideia de que os
direitos económicos e socias são direitos meramente programáticos, e isso
pode ter interesse para interpretar e talvez mesmo restringir direitos
fundamentais. Atualmente invocam-se os direitos socias como sendo quase
direitamente aplicáveis.
- 36º/6: direito liberdade e garantia muito direta, diz claramente que os pais
não podem ser separados dos filhos e vice-versa e isto é muito mais forte
do que invocar um mero direito à família do 67º, proteção do direito
familiar mais estreito de todos, relação parental.
- O artigo 67º apenas reforça a ideia de que o artigo 36º/6 explicando que a
família é fundamental no desenvolvimento da personalidade de cada uma
das pessoas que integra e na realização dessas mesmas pessoas.
- Porque é que este artigo é inconstitucional?
- A nossa Constituição não se importa apenas com a aplicação de normas
abstratas. Como qualquer lei, ela interessa-se que na prática ela realize o
espírito que ela incorpora. O que é que acontece, na prática, se for aplicada
uma pena de expulsão a este estrangeiro? Ou violamos a norma que proíbe
a expulsão de cidadãos portugueses, ou de violar a norma que proíbe a
separação de pais e de filhos.
- A ser muito lógico e pouco prático, aplicando-se separadamente as duas
normas, dir-se-ia que não há violação do 33º porque quem está a ser
expulsos é o estrangeiro e não os menores. Não se viola também o 36º/6
porque os menores podem ir com os pais.

Mariana Garção 81
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- Se formos práticos, tal como tem que ser a aplicação do Direito,


constatamos que da realidade económica e social, a vida daqueles menores
depende económica e socialmente dos pais, o que significa que, tendo em
conta este facto, não podemos chegar a uma situação prática em que ou os
filhos sejam indiretamente expulsos do território nacional, ou sejam
separados dos pais. Não se trata da aplicação literal ou subsuntiva na
constituição, mas sim de atender ao espírito da constituição como um todo.
A constituição não quer nem que os filhos sejam separados dos pais, nem
que os cidadãos portugueses tenham de sair do território nacional por força
do cometimento de um crime.

8.
3. Rendimento social de inserção
- Qual é a norma cuja inconstitucionalidade se está a apreciar? 4º/1 do
Decreto da AR que pretender alterar o rendimento social instituído
estabelecendo o rendimento mínimo social de inserção.
- Este artigo altera a idade mínima de atribuição do subsídio, que antes era
de 18 anos, podia ser concedida a qualquer cidadão maior de idade, e com
esta lei passa só a ser concedido a qualquer cidadão com mais de 25 anos.
- Qual é o grande princípio tradicional em matéria de direitos sociais? Grande
princípio que de alguma forma hoje em dia rejeitamos para dizer que ele
não é automo relativamente a outros dois princípios? Proibição do
retrocesso social, atingido um determinado nível de proteção do estado
social, concretizado um determinado direito social, não é possível alterar
essa lei para pior, nem muito menos revoga-la. Isto era o grande princípio
em matéria de direitos sociais. Pressupunha-se que a sociedade estava
numa constante marcha para melhor.
- A ideia que aparecia muito claramente na jurisprudência do TC e na
Constituição anotada de Gomes Canotilho e Vital Moreira a ideia era a de
que quando há um direito social estabelecido na Constituição, o legislador
fica só por isso investido numa obrigação positiva de concretizar esse
direito social de forma a dar-lhe efetividade. Portanto, se a Constituição
prevê o direito à segurança social o legislador fica obrigado a fazer uma lei
de bases da segurança social prevendo as prestações que a segurança social

Mariana Garção 82
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

dá e a forma de calculo de cada uma dessas prestações. Uma vez feita a lei
da segurança social, o legislador fica investido numa obrigação negativa de
se abster, de revogar essa lie ou de a alterar para pior, suprimindo, assim, o
direito social já concretizado na lei.
- No acórdão, ainda se invoca este princípio? Não, pois dizem que este
principio não é aceitável por limitar a liberdade de conformação do
legislador democraticamente eleito, limita a livre conformação do
legislador. Se aceitarmos este principio, uma vez feita uma lei a concretizar
um determinado direito social, já não é possível fazer uma nova lei a
eliminar o direito social tal como está concretizado nessa lei. Cristaliza e
rigidifica este subsídio impedindo o legislador atual de eliminar, por
exemplo, uma determinada comparticipação de cuidados médicos.
- Porque é que o acórdão, apesar de vir dizer que o princípio hoje já não é
aceitável, discute esse princípio? O princípio da proteção da confiança não
espera nenhuma expectativa legitima de que as leis não possam ser
alteradas para o futuro, o que ele garante são as situações já concretizadas
no passado. Não podemos ter a expectativa de vir um dia, daqui a trinta
anos, a receber a reforma nos exatos termos que estão hoje na lei, a menos
que vigorasse a proibição do retrocesso social.
- Este acórdão faz a aplicação de uma forma claríssima dos parâmetros.
Tradicionalmente, tratavam-se os problemas de direitos sociais à luz do
princípio do retrocesso social.
- Hoje em dia, fala-se no princípio do não retorno da concretização que é
especificado através de 3 subprincípios que têm de ser autonomizados:
• Princípio da proteção da confiança: criada uma determinada expectativa
legítima pelo Estado de existência de um direito social só é possível
alterar esse direito social para pior ou eliminá-lo se houver um interesse
público suficientemente forte que o justifique. Tem que se demonstrar
que essa alteração é fundamental do ponto de vista da sustentabilidade
do direito social. Altera-se a lei da segurança social demonstrando que se
não for feita essa alteração o sistema não será sustentável a prazo,
entrar em falência, não será possível pagar pensões a ninguém. Quando
se fazem estas alterações, respeitam-se as situações já consolidadas,
respeita-se o princípio da confiança. Neste caso, não havia violação do

Mariana Garção 83
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

princípio da confiança, o Tribunal eliminou logo esta questão dizendo


que esta lei não afetava o princípio da confiança, porque a própria lei
tinha uma disposição onde se dizia que os subsídios que já estavam a ser
concedidos continuariam a sê-lo, a lei só se palica a situações novas, não
afeta situações já consolidadas no passado.
• Princípio da igualdade: saber se a distinção em função da idade tem
fundamento razoável ou não, se é razoável estabelecer esta barreira de
25 anos ou não, para efeitos de concessão deste subsídio da segurança
social. Quando não há quaisquer outros meios de subsistência, a pessoa
não tem salário, não tem emprego, já não tem direito ao subsidio de
desemprego que apenas se recebe durante 1 ano após a cessação do
vinculo laboral e não tem quaisquer outros rendimentos, atribui-se este
rendimento mínimo garantido. Ideia de não deixar os jovens
conformados com a falta de emprego, ficarem agarrados apenas àquilo
que os centros de emprego lhes oferecem em termos de procura, devem
fazer pela vida. Até aos 25 anos, mesmo que os filhos já não estudem,
será mais normal que eles vivam sobre a dependência económica dos
pais, tios, .... É importante não lhes dar subsídio nessa idade para que
eles não se acomodem. Se eles estavam muito autónomos, mas já não
têm emprego, então eles devem voltar para casa dos tios, avós, .... Este
rendimento mínimo garantido, se eles ainda estiverem dependentes dos
pais fiscalmente então não se aplica. O acórdão aborda esta questão da
igualdade e no fim claramente não toma posição. Ele sabve quais as
razoes que depõem a favor de uma eventual não violação do principio da
igualdade, que pretendem justificar essa diferença – jovens até aos 25
anos estando dependentes face a pais, avos, tios, ... – o problema coloca-
se nas situações em que eles querem viver autonomamente porque são
maiores de idade, mas já não têm nem emprego nem subsidio de
desemprego. António Cortês: parece-lhe razoável esta diferenciação em
razão da idade. É diferente obrigar uma pessoa de 25 anos a viver na
dependência económica de outras do que uma pessoa com menos de 25
anos, que é a idade em que ainda se considera jovem. O TC não tomou
posição, porque não é politicamente correto dizer que maiores de idade
devem viver na dependência da família. Não sendo clara a violação do
princípio da igualdade, não resolveu a questão por este meio.

Mariana Garção 84
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Princípio do mínimo de existência ou princípio da aplicabilidade direta do


conteúdo mínimo dos direitos sociais, sendo que este último é mais
amplo do que o primeiro. O TC foi por via do direito a um mínimo de
existência condigna inerente à dignidade da pessoa humana. O direito ao
rendimento social de inserção existe sempre que outra pessoa já não
tenha outros meios de subsistência, se não houver nenhuma obrigação
de alimentos por parte de um familiar, por exemolo, não havendo então
tem direito ao rendimento mínimo garantido. O tribubal baseou-se no
princípio da dignidade da pessoa humana e no dirieto ao mínimo de
existência condigna, que se deduz do artigo 1º da constituição, porque
tratar as pessoas com dignidade não é apenas respeitar os seus direitos
de personalidade, mas também garantir-lhes um mínimo de direitos
materiais que assegurem a satisfação de necessidades básicas, garantir-
lhes um mínimo de existência, subsistência material condigna. Não é
verdade que o TC tenha fundado a sua decisão apenas e exclusivamente
ao direito ao mínimo de existência fundado na dignidade da pessoa
humana. O princípio da dignidade da pessoa humana aparece mais como
um reforço de fundamentação, do que a própria fundamentação das
decisões. No artigo 63º/3 temos uma fundamentação muito mais
concreta. O que é que consagra o 63º/1? Em termos gerais, o direito à
segurança social como um todo, que é o direito da pessoa a ser apoiada
pelo Estado em situações de vulnerabilidade, tais como a velhice,
doença, invalidez, ... e o 63º/3 concretiza esse direito à segurança social.
É defensável que essa norma, na parte em que estabelece que todos os
cidadãos têm direito a apoio da segurança social em situações de falta de
subsistência define o conteúdo mínimo do direito à segurança social,
sendo que este conteúdo mínimo de acordo com a posição de Vieira de
Andrade ou de Jorge Miranda é diretamente aplicável, não se trata
apenas de uma norma programática. Deve existir um direito a um
rendimento mínimo ou a uma prestação equivalente por parte da
segurança social. Já quanto ao conteúdo concreto da prestação não
decorre desta norma, mas a existência desse apoio decorre da norma
constitucional.
• O TC acabou por dizer que a norma era inconstitucional por violação do
direito à segurança social estabelecido no 63º/1 e 3 conjugado com o

Mariana Garção 85
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

direito ao mínimo de existência resultando do principio da dignidade da


pessoa humana do artigo 1º da Constituição, acabou por reforçar assim.

4. Vale o princípio da igualdade da mesma maneira comodo que vale nas


relações publicas?
- O caso começa com a contratação de uma guia turística pela AP.
- No instituto público, há instituições públicas que promovem, o turismo,
porque traz receitas que têm benefícios económicos.
- A diferenciação em razão da ideia seria arbitrária porque não teria
fundamento material suficiente.
- Explicar o interesse cultural, recreativo, artístico ou mesmo natural dos
locais visitados, e também que provavelmente estabeleça uma boa relação
de empatia com as pessoas que acompanha.
- Esta distinção em função da idade seria arbitrária, mas onde é que o 13º/2
fala da distinção em função da idade. Está no 13º/2 a idade? Este artigo
13º/2 é meramente exemplificativo, porque tem de ser lido em conjugação
com o número 1, é como se o número 1 tivesse a cláusula geral e o número
2 tivesse os exemplos padrão. O número 1 diz que não pode haver
diferenciações arbitrárias, o número 2 vem dar exemplos de situações em
que as diferenciações se presumem arbitrárias. A idade não está no número
2, mas não significa que não seja uma discriminação arbitrária.
- Para ser boa guia turística não basta o dinamismo próprio da juventude, é
preciso também ter experiência, conhecimentos, e isso não depende da
idade, pode ser uma pessoa com mais ou menos de 25 anos. Parece
arbitrária.
- Se la estivesse “menos de 65 anos”, aí já seria admissível que esta
diferenciação em razão da idade não era arbitrária. 65 anos é a idade da
reforma, presume-se que as pessoas a partir dos 65 anos já não têm a
mesma capacidade profissional que antes dos 65 anos. É a própria lei que
distingue, para efeitos profissionais, as pessoas com mais e com menos de
65 anos.
- Pede-se que ela domine línguas estrageiras, parece que não pode haver
discriminação em função das línguas que eles falem.

Mariana Garção 86
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- É duvidoso que haja aqui uma discriminação em função da língua, porque


quando o artigo 13º/2 fala desta discriminação em função da língua está a
pensar em discriminação em função da língua mãe, não está a pensar em
discriminar as pessoas em função do maior ou menos conhecimento de
línguas estrangeiras. Não é arbitrário, pelo contrário, é justificado que para
efeitos do exercício do trabalho de guia turístico se conheça bem línguas
estrangeiras porque isso permite realizar melhor o trabalho, essa
diferenciação não é arbitrária, é justificada.
- Raparigas solteiras: saber se querer apenas raparigas é arbitrário ou não e
por outro lado querer pessoas solteiras é arbitrário ou não. Qual é a
mensagem do artigo 13º? Quando o 13º/2 nos diz que ninguém pode ser
beneficiado ou prejudicado em função do sexo, no fundo o que é que isto
quer dizer? É uma presunção, a constituição presume à partida que
qualquer diferenciação em função do sexo não é justificada. Nesta parte, de
querer apenas raparigas e não rapazes, ao nível da AP isto é absolutamente
inadmissível, violação clara do princípio da igualdade, certamente este
concurso publico seria violador do princípio da igualdade de modo a ser
anulado.
- Solteiras: arbitrária, pois este artigo 13º é reforçado também pelo artigo
36º/1: a origem deste artigo relaciona-se com algo que acontecia no Estado
Novo, e que se relacionava com determinadas proibições de casamento ou
determinados impedimentos para exercício de uma profissão em função do
casamento. Ou a pessoa escolhia ser enfermeira ou ser casada. Razão desta
lei: dizer que as enfermeiras precisam de disponibilidade para os doentes,
não podem cuidar da família e dos doentes, e para garantir que as
enfermeiras teriam plena disponibilidade de tempo elas não podem casar.
A nossa Constituição quis garantir que todos tivessem liberdade para casar
sem serem por isso prejudicados, nomeadamente em vista d o exercício da
profissão. Até pela história do direito a contrair casamento do artigo 36º
verificamos que claramente a nossa Constituição quer excluir quaisquer
discriminações em função do casamento. Nada garante à partida que
alguém por ser casada tem mais ou menos disponibilidade, quanto muito
pelo facto de ter filhos. Ser casada ou não é absolutamente arbitrário.

Mariana Garção 87
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VER AULA DE PICOLO 04/05/18 !

PICOLO 11/05/18
Fiscalização da constitucionalidade
- A ideia foi mesmo só a de atrasar um pouco a justiça.
- O problema a esta num segundo tipo de casos em que o recurso tem
fundamento e razão de ser porque tem alguns efeitos. Pode acontecer que
a pessoa tenha toda a razoado, mas como o recurso está mal feito, o
tribunal nada pode fazer.
- Os recursos não são fáceis de fazer, é complicado mesmo para quem
trabalha no Tribunal Constitucional, e, por outro lado, geralmente, as
faculdades de direito não apontam no ensino da forma de fundamentais
destes processos.
- Rem que parte da Constituição é que estes processos estão previstos?
Quarta e última parte, uma relativa à garantia e outra relativamente à
revisão da Constituição, a fiscalização da constitucionalidade é uma forma
de garantia da Constituição, de assegurar que as normas da Constituição
são verificadas + 69º a 85º da Lei do TC.
- Há dois diferentes processos de fiscalização da constitucionalidade:
fiscalização concreta e fiscalização abstrata. Tanto a abstrata como a
concreta incidem sobre normas especificas.
- Fiscalização abstrata: a apreciação sobre a possível inconstitucionalidade de
uma norma é feita em abstrato, independentemente da aplicação dessa
norma num caso concreto num determinado processo judiciário.
• Fiscalização abstrata sucessiva: casos em mais comuns em que a norma
está em vigor, e a produzir efeitos e certa entidade com legitimidade
pede ao TC que aprecie a norma.
• Preventiva: é feita antes de uma norma entrar em vigor. Em regra, é o PR
que tem legitimidade para fazer este tipo de pedidos ao TC. Quando um
tratado internacional ou uma lei é enviado para promulgação, pode
enviar o diploma para o TC antes de os promulgar. Se entender que tem
uma norma ou várias normas inconstitucionais, o PR usa o veto por
inconstitucionalidade e devolve o diploma ao órgão do qual emanou. O
instrumento normativo em que a norma se insere não entrou em vigor.

Mariana Garção 88
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Por omissão: mais raro, discute-se uma omissão legislativa, i.e., o facto de
o legislador não ter emanado uma determinada norma fundamental para
cumprir um determinado princípio, uma determinada norma
constitucional. Ou então a mesma pode ser insuficiente para cumprir uma
determinada coordenada constitucional.
- Fiscalização concreta: a apreciação é feita em concreto, a propósito da
aplicação de uma norma a um caso concreto num processo judicial. Três
características essenciais do processo.
• Processos de fiscalização normativa: incide sobre normas, muitas vezes
este é o grande problema dos recursos, discutir-se a inconstitucionalidade
de atos que não são normas. No nosso ordenamento jurídico apenas
podem ser apreciadas a inconstitucionalidade de normas gerais e
abstratas.
∆ Não pode ser suscitada a inconstitucionalidade de atos administrativos,
pode ser impugnada a inconstitucionalidade, mas a mesma deve ser
feita nos tribunais administrativos. Também não pode ser sindicada a
inconstitucionalidade de decisões judiciais.
∆ Este recurso tem inicio num tribunal relativamente à possível
inconstitucionalidade ou não de uma norma, mas o juízo de apreciação
incide apenas sobre o problema da constitucionalidade da norma, que
é discutida neste processo, e não sobre a decisão concreta nesse
tribunal.
• Processo de fiscalização difusa: fiscalização difusa porque o controlo para
a fiscalização não está concentrado no TC, qualquer tribunal pode fazer
fiscalização concreta. Podem também apreciar se uma norma é ou não
inconstitucional nos processos em que são chamados a julgar.
∆ Na fiscalização abstrata, o controlo está concentrado no TC
∆ Na fiscalização concreta, dá-se o inverso. O TC apenas se pronuncia
eventualmente numa segunda fase quando haja recurso do tribunal
ordinário. Em França, só o Conselho Constitucional francês é que pode
fazer esta decisão, se um tribunal tem duvidas tem de suspender a
instância e remeter a questão para o TC.
∆ Isto é uma verdadeira obrigação dos tribunais, que decorre do 204º da
Constituição. Esta norma insere-se numa parte da Constituição que
regula o funcionamento dos tribunais e determina que os tribunais têm

Mariana Garção 89
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uma obrigação expressa de não aplicar normas quando tenham duvidas


acerca da sua constitucionalidade. Daqui decorre que quando um
tribunal é chamado a apreciar um processo e tem duvidas quanto a
constitucionalidade, não pode aplicá-la ao caso concreto, uma vez
levantado o prolema o juiz tem que emitir uma decisão sobre esta
questão e portanto ou entende que a norma é inconstitucional e ano a
aplica ao processo ou entende que a norma não é inconstitucional e
aplica-a ao processo, este juízo depende uma apreciação da
constitucionalidade e esta apreciação que determina a fiscalização
concreta dos tribunais ordinários.
• Processos de fiscalização incidental: incidente da instância, a questão da
inconstitucionalidade surge sempre a propósito de uma outra questão,
que é a questão principal que está a ser discutida nesse processo. O
problema da inconstitucionalidade da norma apenas pode ser invocado
na medida em que essa norma seja relevante para a resolução da questão
de fundo, o problema da inconstitucionalidade é um incidente, é algo que
surge a propósito da questão que estava a ser discutida. A propósito da
questão de fundo surge a questão da inconstitucionalidade, é um
incidente da instância. A norma sobre a qual incide o juízo de
inconstitucionalidade, tem de ser uma norma que seja relevante para o
caso concreto. Este conceito da relevância é discutido, saber quando é
que uma norma é ou não relevante para o caso, e o Tribunal tem dito que
a norma é relevante para o caso concreto quando é suscetível de ser
aplicada como ratio decidendi, como fundamento para a decisão, não
pode ser apenas uma norma acessória que é invocada durante o
processo, mas não é relevante para a resolução do caso.

Fases da fiscalização
- O processo nasce sempre num tribunal que não é o TC: tribunal ordinário
204º Constituição, quando nasce a questão o tribunal tem que decidir e
pode preferir uma de duas decisões:
• Decisão positiva de acolhimento da inconstitucionalidade: julga a norma
como inconstitucional e não a aplica ao caso concreto. Em sede de
fiscalização concreta, mesmo que a norma seja considera
inconstitucional, ela não desaparece do ordenamento jurídico, o único

Mariana Garção 90
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efeito desta decisão é a desaplicação ao caso concreto, e é assim mesmo


que a decisão pela inconstitucionalidade seja proferida pelo TC.
∆ Só quando o TC em sede de fiscalização concreta julga a norma
inconstitucional é que se dá origem a um processo de fiscalização
abstrata para que a norma seja extinta do ordenamento jurídico.
∆ Em sede de fiscalização concreta, não se utiliza o termo declarar a
norma como inconstitucional, tal apenas se diz em sede de fiscalização
abstrata, pelo TC, sendo esta norma em sede de fiscalização abstrata
extinta do ordenamento jurídico.
∆ Em sede de fiscalização concreta, a norma é julgada inconstitucional,
porque está a ser aplicada ao caso concreto, quer pelo TC quer pelos
tribunais ordinários.
• Decisão negativa de rejeição da inconstitucionalidade: tribunal entende
que a norma não é inconstitucional e, portanto, aplica-a ao caso
concreto.
- Fase que não ocorre sempre: fase eventual, mas a ocorrer ocorre o TC
apenas é chamado a pronunciar-se quando exista um recurso, obrigatório
ou não, da decisão proferida pelo tribunal ordinário neste domínio.
• 280º/1 Constituição: há recuso para o tribunal constitucional. Na aliena
a), decisões PICOLO. Na aliena b), quando o tribunal entende que a
norma não é inconstitucional e a aplique, esta decisão negativa também
pode ser impugnada e haver recurso para o TC. há alguns casos em que
pode haver recurso direto para o TC e noutros casos tem de haver
exaustão de recurso. Quando o tribunal entende que a norma é
inconstitucional, torna-se premente que o TC se pronuncie acerca da
inconstitucionalidade da norma, sendo mais fácil então o recurso.
Quando o tribunal ordinário não entende que a norma é
inconstitucionalidade, a legitimidade para recorrer é mais limitada e tem
de haver exaustão de recursos.
• 72º Lei do TC: MP ou pessoas que tenham legitimidade, em regra são as
partes no processo, sendo que os parâmetros dessa legitimidade variam
consoante a inconstitucionalidade que foi proferida.
• 76º Lei do TC: o tribunal ordinário profere uma decisão a parte recorre,
mas não diretamente para o TC, compete ao tribunal apreciar a
admissibilidade do recurso. Se este tribunal entender que se verificam

Mariana Garção 91
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todos os tramites para que o TC se tenha que pronunciar profere um


despacho de autorização do recurso. Sempre que entenda que o recurso
não é admissível, profere um despacho de rejeição de recurso, que pode
ser sempre impugnado nos termos do 77º desta lei.
• PICOLO
• 78º-A: é feita uma apreciação prévia sobre a viabilidade desse recurso, o
juiz delator faz este exame preliminar, prévio, e caso entenda que a
decisão não deve ser conhecida, quer porque não se qualificarem os
pressupostos, quer por ser simples por já haver decisões acerca disto
quer porque VER OUTRA HIPOTESE DA NORMA, então o juiz emite uma
decisão sumária de não conhecimento.

9.
4.
- Decisão proferida em primeira instância que condenou o arguido, que não
se conformou e recorreu para o tribunal da relação invocando a
inconstitucionalidade do 127º do CPP.
- 127º: princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador. Como
regra geral, o juiz pode apreciar livremente a prova produzida, salvo
algumas exceções, e para formar a sua convicção sobre os factos tende em
conta o que foi produzido.
- Este arguido foi condenado com base na prova indireta, que abrange a
prova por presunções judiciais. É quando o juiz parte de determinados
factos dados como provados, através de meios de prova admissíveis, para
dar também como provados determinados factos desconhecidos. Presume
que os factos desconhecidos foram cometidos como indício dos factos
comprovados. Os factos estão numa relação tal entre eles que se um foi
provado torna-se presumível que outro também foi cometido.
- Ao permitir que o juiz possa, indiretamente, fazer estas presunções
judiciais, o arguido invoca a inconstitucionalidade da norma que permite ao
juiz inferir várias ilações, partindo dos factos para dar outros factos
desconhecidos como provados, mesmo que fosse possível poder enunciar a
probabilidade de haver outros factos possíveis como provados, que fossem

Mariana Garção 92
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benéficos para o arguido. Ele invoca a possibilidade interpretativa deixada


em aberto por esta norma.
- O juiz fazer presunções judiciais desta maneira, partir de uns factos dando
como provados outros mesmo sendo possível ir para a decisão contrária,
favorável ao arguido.
- O tribunal da relação não lhe dá razão e afirma que apenas permite ao
julgados fazer inferências logicas.
- O arguido não se conformou e recorreu para o TC, que não lhe deu razão,
com base em 2 argumentos fundamentais: duas ideias que decorrem das 3
características:
• O que estava em causa não era um problema de inconstitucionalidade de
uma norma, o que estava a ser atacado era a própria decisão judicial que
o tinha condenado, o arguido não estava a recorrer de uma norma, mas
sim de uma decisão concreta, estava em causa a vertente normativa
deste tipo de processos.
∆ O recorrente não estava a invocar a inconstitucionalidade do 127º, ma
estava a inventar uma norma, ficção normativa do 127º para recorrer
para o TC.
∆ O princípio do 127º autoriza o juiz a fazer a prova por presunções. Ele
não estava a invocar a inconstitucionalidade de o artigo poder ser
interpretado para permitir a prova por presunções. Ele estava a dizer
que este artigo ao permitir a prova por presunções, também permitia
ao juiz dar como provados factos desconhecidos ao juiz quando
poderia dar como provados partindo do mesmo sítio factos benéficos
ao arguido.
∆ Ele está a recorrer da aplicação concreta que o tribunal fez e não de
um problema colocado pelo 127º.
∆ Como o TC não pode invocar a inconstitucionalidade de decisões,
tentam criar uma ficção normativa com base numa determinada
interpretação dada à norma para que o TC possa apreciar essa
questão.
∆ O TC entendeu que não tinha competência para conhecer o recurso.
∆ Falta de dimensão normativa.

Mariana Garção 93
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• A interpretação desta norma que o recorrente invocava não tinha sido


aplicada pelo Tribunal da relação como ratio decidendi, como critério da
decisão.
∆ O Tribunal da Relação quando entendeu que a norma não era
inconstitucional, mas por uma interpretação diferente da invocada
pelo recorrente.
∆ Não sendo a mesma, a interpretação não era a ratio decidendi e,
portanto, o TC não tinha competência para conhecer o recurso.
∆ Falta de coincidência entre a interpretação dada pelo tribunal da
relação e a interpretação invocada para o TC pelo requerente.

2. Penhora do salário mínimo


- Decisão do tribunal da relação de lisboa que julgou uma norma
inconstitucional e não a aplicou ao caso concreto, o MP recorreu.
- 3 características essenciais do processo: normativo (incidem apenas sobre
normas, tem de estar em causa a inconstitucionalidade de uma norma e
não da decisão juidical em si) difuso (qualquer tribunal pode fazer a
apreciação) incidental (o problema da inconstitucionalidade é colocado a
propósito de outro problema colocado no caso concreto.
- Primeira fase: tribunais ordinários, primeira instância, relação ou mesmo o
STJ. Segunda fase: fase eventual que decorre no TC, só acontece se for feito
um recurso da decisão do tribunal ordinário para o TC.
- 204º: não pode aplicar normas inconstitucionais aos casos que é chamado a
julgar.
- Pode tomar a decisão positiva de acolhimento da inconstitucionalidade, ele
diz que a norma é inconstitucional. Julgando-a deste modo não a aplica ao
caso concreto. Pode ter o entendimento contrário de uma decisão negativa,
entende que a norma não é inconstitucional e como tal aplica ao caso
concreto. A decisão é passível de recurso ao TC, dando origem à segunda
fase dos processos 280º/1 a) e b), recursos mais frequentes. 280º/1 a):
decisões positivas dos tribunais ordinários, a decisão de não aplicação é
suscetível de recurso para o TC. 280º/1 b): decisão negativa. Remissão do
280º/1 para o 70º/1 da Lei do TC.

Mariana Garção 94
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- Temos uma decisão positiva do TR Lisboa afirmando a inconstitucionalidade


da norma e desta decisão é interposto recurso pelo MP para o TC, sendo
que o MP nem era parte porque este era um processo executivo, que se
destina a garantir que é cumprido o direito de crédito do credor por parte
do devedor. Foi o MP que interpôs recurso do Tribunal da Relação para o
TC, pode ele fazer este recurso mesmo não sendo parte do processo? Qual
é a norma que dá legitimidade para o MP para recorrer? 62º da Lei do TC
regula a legitimidade para recorrer para o TC, para dar inicio à segunda fase
dos processos de fiscalização concreta.
- Podem recorrer para o TC o MP, mesmo não sendo parte do processo, e,
em regra, as partes do processo.
- O recurso feito pelo MP é obrigatório, 280º/3 constituição. Quando esteja
em causa uma decisão positiva, o MP não só pode recorrer como é
obrigado a recorrer para o TC desde que a norma conste de um dos
instrumentos normativos lá estabelecidos.
- Ato legislativo: lei, decreto lei e decreto legislativo registional, ou então um
decreto regulamentar que já não é legislativo.
- Dimensão do princípio do Estado de Direito de presunção da
constitucionalidade das leis e dos atos com valor equivalente. No âmbito de
um Estado de direito, presume-se que as leis emanadas por um órgão
legislativo estão cofnormes à constituição, o que faz com que as pessoas
aceitem a vinculatividade da lei.
- Se um tribunal entender que uma norma emanada de um destes órgãos
legislativos, acaba com esta presunção, sendo urgente que o TC diga se ele
tem ou não razão.
- Duas conclusões quanto à decisão positiva:
• Decisão positiva pode recorrer tanto o MP como as partes
• Quando a norma é considerada inconstitucional, é um dos previstos no
280º/3 Constituição + 72º/3 lei do TC, o recurso é obrigatório por parte
do MP.
- Decisões negativas: o tribunal diz que a norma não é inconstitucional, os
recursos são mais restritivos, só podem ser interpostos pela parte que
suscitou a questão da inconstitucionalidade nesse processo. Legitimidade

Mariana Garção 95
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

aplica-se a regra especial prevista no 72º/2 da Lei do TC e 280º/4


Constituição. O MP só pode recorrer se for parte do processo e se for ele a
suscitar o problema de inconstitucionalidade.
• Se o tribunal disse que a norma não era inconstitucional, mantém-se a
presunção de constitucionalidade e não é tao urgente que o TC se
pronuncie acerca desta questão e evitar o expediente dilatório.
• Exceção: 280º/5 Constituição, obrigatório o recurso do MP, porque em
sede de fiscalização concreta mesmo que o TC diga que a norma é
inconstitucional ela não desparece do ordenamento jurídico, ela continua
em vigor e o efeito da decisão é a sua desaplicação ao caso concreto.
Está em causa a prevalência das decisões do TC sobre as decisões dos
demais Tribunais em matéria de constitucionalidade é crucial este
recurso para que o TC se pronuncie.
- Quantos juízes é que o TC tem? 13 juízes. Está divido em 3 diferentes
secções, não especializadas, com competências generalizadas, não estando
diferenciadas relativamente à área do Direito. Cada uma das secções tem 5
juízes. Dois juízes – o presidente e o vice-presidente do TC – surgem
repetidos em duas secções.
- Ao contrário do que acontece nos processos de fiscalização abstrata
julgados em plenários pelos 13 juízes, os processos de fiscalização concreta
são julgados nas secções, em regra só por 5 juízes.
- O processo é atribuído arbitrariamente por uma das 3 secções.
- Em 1989 foi revista a lei do TC, e foi aditado o 78º-A (VERIFICAR). O
processo dá entrada no TC, é distribuído a um dos juízes de uma das secção
que é o relator que deve analisar se deve ser conhecido o seu mérito e o
seu conhecido. Ele pode entender que o processo não deve continuar, 78º-
A/1 que emite uma decisão sumária de não conhecimento do recurso:
quando não estiverem reunidos os processos processuais, ou quando a
questão a decidir for simples, a própria norma dá dois exemplos: quando já
existir uma jurisprudência consolidada no TC sobre essa norma, também
podem entender que o recurso é infundado, sendo apenas um expediente
dilatório e que não faz qualquer sentido.
- No caso, o juiz relator disse que o MP recorreu diretamente do tribunal da
relação para o TC, quando poderia ainda ter recorrido para o STJ. Pode uma

Mariana Garção 96
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

parte recorrer diretamente para o TC da decisão de um tribunal ordinário


que desaplica a norma, ou tem de seguir uma via de exaustão de recursos?
70º/2: regra de exaustão de recursos apenas para as decisões negativas, só
fala dos recursos previstos na alínea b) e não da alínea a). Quando esteja
em causa uma decisão negativa tem de haver exaustão de recursos, quando
esteja em causa uma decisão positiva não é obrigatória esta exaustão de
recursos, as partes podem tomar a escolha que melhor entenderem.
Quando o recurso seja obrigatório para o MP 280º/3 constituição, este tem
de ser direto para o TC, não pode optar, pela urgência que o TC se
pronuncie sobre esta questão o MP só surge aqui como via de garante da
constitucionalidade da norma, não é uma parte qualquer.
- Neste caso, estamos perante um caso de recurso obrigatório para o TC, o
MP é obrigado a recorrer do tribunal da relação para o TC, mesmo que
fosse da 1ª instância ele teria de recorrer.
- O juiz relator diz que não se trata de uma verdadeira questão normativa. É
raro, que a norma seja invocada em si mesmo considerada, e tal é
problemático para averiguar o preenchimento desta vertente normativa.
- A norma não é invocada em abstrato, mas da interpretação que lhe é dada
no caso concreto. Quando estamos a discutir dimensões interpretativas da
norma, é difícil saber se estamos ainda no âmbito normativo da norma ou
da própria decisão que o tribunal tomou.
- Esta norma falava da impenhorabilidade de salários, estabelecia um limite
para a penhora de salários. Só poderia dizer a contrario 1/3 do salário
auferido pelo executado.
- Mesmo dentro do 1/3, de acordo com a 2ª norma, é possível que o juiz
reduza para 1/6 este limite mínimo quando as condições económicas do
executado o justifiquem.
- A aplicação desta norma ao caso concreto fez com que fosse penhorado ao
executado uma parte do salário tendo ele ficado com um valor inferior ao
do salário mínimo para viver. Foi invocada a violação do princípio da
dignidade da pessoa humana.

Mariana Garção 97
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

- As normas invocadas nada falam em salário mínimo, não autorizam


expressamente que o salário possa ser penhorado até a um limite inferior
ao salário mínimo,
- Esta um recurso como estes a atacar constitucionalidade destas normas ou
a atacar a decisão judicial, não tendo o juiz utilizado o número 2 do artigo
que lhe permitia diminuir para 1/6.
- A possibilidade de serem penhorados os salários por forma a que possa
alguém viver com menos do que o salário mínimo, insere-se dentro do
artigo 824º pois parece ser normativo porque a norma ao proibir que sejam
penhorados 1/3 do salário sem estabelecer o limite mínimo então deixa-se
em aberto a possibilidade de a pessoa ficar sem o suficiente para viver. E
ainda que as normas confiram ao juiz o poder de reduzir este limite de
impenhorabilidade, é uma mera faculdade.
- 738º/3 CPC: hoje em dia, não podem ser penhorados 3 de salários mínimos
nacionais e a norma permite que alguém viva com menos do que um salário
mínimo para viver.
- Parece que é um problema normativo.
- O juiz relator não tem razão no que diz porque este é ainda um problema
normativo, é um problema da noma que não tendo um limite mínimo
taxativo permite que se viole a dignidade da pessoa humana por não se lhe
possibilitar o mínimo de vivência condigna.
- O TC também afirmou isto no acórdão 96/2004.
- Ratio decidendi: consequência da característica da incidentalidade. O
problema da constitucionalidade só tem relevância na medida em que seja
pertinente para a resolução do caso concreto. Fundamento da decisão, a
norma tem de ter sido aplicada ou desaplicada como fundamento
determinante da decisão, não podendo ter apenas uma importância lateral.
O fundamento da decisão do tribunal da relação de acordo com o juiz
relator era apenas o 824º/1 a) que permite a penhora de salários, qualquer
que seja o seu valor. Não há coincidência entre a decisão do tribunal
recorrido e o recurso que é feito para o TC? O enunciado diz que a decisão
do TRL recusou a aplicação tanto do número 1 como do número 2 do 824º,
ambas as normas fazem parte da ratio decidendi do tribunal da relação, não

Mariana Garção 98
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

é verdade que se diga que a ratio decidendi era apenas o numero 1 desta
norma, não é correta a interpretação que o juiz relator invoca.
- O problema de inconstitucionalidade suscitado no processo e que leva a
uma decisão do tribunal ordinário, tem de ser o mesmo invocado pelo
recurso. A norma tem de ser a mesma e a interpretação invocada pelo
tribunal ordinário tem de ser a mesma objeto de recurso.
- 78º-A lei do TC: que é que constitui a conferência? 78º-A/3: o Presidente ou
o Vice-Presidente, consoante a secção em questão, quantos juízes
compõem? 3 juízes na conferencia 78º-A/3, Presidente ou Vice-presidente,
Relator e outro juiz da respetiva secção.
- Esta decisão não foi decidida pela conferencia, no caso, tendo sido
necessário reunir todos os juízes. Para que possa ser decidida pela
conferencia, é necessário que os 3 juízes estejam de acordo, basta que um
não concorde para que seja necessário reunir a secção 78º/4 Lei do TC.
- É mais comum haver um acórdão da conferência para dar continuidade à
reclamação, pois para decidir contra a reclamação é necessário que o
relator mude a sua posição, o que à partida, não acontecerá. Consoante
seja a secção ou a conferência a decidir, as possibilidades em aberto são as
mesmas quando estava em causa o processo preliminar da decisão sumária.
- Se a conferencia entenderem que não há razão para a reclamação, o
processo acaba aí, não se seguindo para a fase de alegações.
- Ou o processo prossegue e aplica-se o número 5.
- Neste caso, 3 juízes estavam de acordo, tendo sido proferido um acórdão.
- Quais são os efeitos de uma decisão do TC?
• 80º Lei do TC : caso julgado nesse processo, definitiva quanto ao
problema da inconstitucionalidade, nesse processo só, e a questão não
pode voltar a ser discutida. Efeitos limitados ao caso concreto, só se
produzem nesse processo concreto, continuando a norma em vigor no
ordenamento jurídico.
• Só quando o TC emita 3 decisões no sentido da inconstitucionalidade em
sede de fiscalização concreta, é dado inicio um processo de fiscalização
abstrata para que a norma seja extinta do ordenamento jurídico.

Mariana Garção 99
Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional – Práticas

• Se o TC mudar o sentido da decisão do Tribunal ordinário, aplica-se o


80º/2 da Lei do TC. O tribunal dá provimento ao discurso, mesmo que só
parcialmente. Se o TC disser que é inconstitucional, volta para o tribunal
ordinário que não pode aplicar a norma, e se disser que não é
inconstitucional, volta para o tribunal ordinário sendo este obrigado a
aplicar a norma.
• TC mantém a decisão 80º/4, tendo havido exaustão de recursos, a
decisão transita em julgado. Recurso direto para o TC: a decisão do TC dá
apenas inicio à contagem dos prazos para os recursos que ainda são
permitidos. Não se faz caso julgado quanto ao processo concreto, cabe
recurso para o STJ, neste caso, ou para a relação, dependendo de ontem
partiu o primeiro recurso, mas não quanto à questão de
constitucionalidade.
- Num primeiro acórdão de 96/2004, o TC diz que a norma é inconstitucional
e esta é desaplicada ao caso concreto, mas continua em vigor e assim pode
acontecer que seja aplicada num processo mais tarde e que a questão seja
discutida novamente e o TC afirme em sentido concreto tal como se passou
neste caso em 2006. Como é que isto é possível? O processo quando vai
pela primeira vez pode ir para a secção 1 que tem 5 juiz e quando volta uns
anos após pode ir para a secção 3 que tem outros 5 juízes, os juízes não
mudaram do TC, mas foram juízes distintos a apreciar a questão. Nestes
casos, é obrigatório um recurso para o plenário do TC 79º-D. Por forma a
manter a coerência da jurisprudência do TC, tem de haver um recurso para
o plenário, exceção à regra de que os processos de fiscalização concreta
têm lugar nas secções.
- 79º-A: outra exceção à regra, o Presidente do TC pode logo no primeiro
momento suscitar a intervenção do plenário para que ele decida, por forma
a evitar decisões divergentes das secções.

Mariana Garção 100

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