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NOTA IMPORTANTE: a presente versão destina-se única e exclusivamente a uso pessoal dos
alunos de “Gestão de Conflitos e Negociação” da Licenciatura em Gestão de Recursos Humanos do
ISCTE-IUL.
CAPÍTULO 8
NEGOCIAR
Eduardo Simões
NOTA IMPORTANTE: a presente versão destina-se única e exclusivamente a uso pessoal dos alunos de “Gestão de Conflitos e Negociação” da Licenciatura em Gestão de Recursos
Humanos do ISCTE-IUL
NEGOCIAR 2
Objectivos
Pretende-se que no final da leitura deste capítulo, o leitor, ou a leitora seja capaz de:
Compreender a importância da negociação na vida quotidiana, em particular nas
organizações
Conhecer os elementos essenciais de uma negociação e a sua dinâmica
Conhecer os fundamentos e as práticas das escolhas estratégicas e tácticas nas
negociações
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COMPREENDER A COMPETÊNCIA
Dificilmente passamos um dia sem negociar. Na família, negociamos para decidir quem vai levar
as crianças à escola, que programas de televisão queremos ver, como vão ser as férias. Com os
amigos, negociamos para escolher o restaurante a que vamos jantar.
Apesar da palavra «negociação» nos remeter quase automaticamente para o mundo das
empresas ou para a esfera diplomática, a negociação perpassa quotidianamente a vida das
pessoas. Por vezes, apenas se regateia, usando um modo de negociação simples à volta de um
preço no mercado, por exemplo. Noutras ocasiões, a negociação segue um processo mais formal,
com etapas e objectivos explícitos, como no caso de um divórcio mediado por advogados ou numa
negociação de contratação colectiva. Nas organizações, negoceia-se para vender e comprar,
colegas negoceiam a atribuição de tarefas e a distribuição de recursos num projecto, responsáveis
de equipa negoceiam objectivos a atingir.
Para quê negociar? Negoceia-se para conseguir algo que só a colaboração de, pelo menos,
duas partes pode permitir ou para resolver uma disputa entre elas. A negociação é uma das opções
(geralmente, a mais frutuosa) para a resolução de conflitos. Ainda que isto nem sempre seja claro
para as partes em oposição. Precisamente, uma das razões pelas quais uma negociação pode
falhar é o facto das pessoas não se darem conta de que estão em condições de negociar. Assim,
escolhem outras opções (imposição, ruptura, discussão anárquica) que desperdiçam o potencial
criativo da negociação. A negociação com método de resolução de conflitos relativos a crenças ou
opiniões é enquadrada noutro ponto deste volume (ver capítulo 7) pelo que, neste capítulo
abordamos a negociação enquanto «processo de tomada de decisão interpessoal no qual duas ou
mais pessoas chegam a acordo quanto a maneira de distribuir recursos escassos»
1
, p. 2. Isto é, embora os princípios fundamentais da negociação sejam aplicáveis num leque
amplo de situações e contextos, focamos essencialmente negociações mais comuns no contexto
organizacional como sejam as que decorrem da relação entre gestores de diferentes organizações,
as que ocorrem nas equipas de projectos ou ainda nas áreas das compras e da acção comercial em
geral.
Muitas pessoas encaram a negociação como uma espécie de luta em que se mede a força de
cada uma das partes ou ainda como uma batalha de vontades cujo resultado seria favorável ao mais
persistente dos intervenientes. Na verdade, o pano de fundo de qualquer negociação é o
reconhecimento implícito das partes de que precisam uma da outra e que, nesse sentido, estão
ligadas por uma relação de interdependência dado que as acções de uma afectam os resultados da
outra e vice-versa. Por exemplo, um gestor depende do seu colaborador o qual possui competências
especializadas necessárias aos objectivos da organização. Mas o colaborador depende igualmente
do gestor na medida em este garante as suas condições de trabalho. As relações de interdependên-
cia estão associadas à conjugação de objectivos: o comprador precisa do vendedor para atingir os
seus objectivos, mas como conceber um vendedor sem compradores? Numa equipa de projecto, os
objectivos individuais de cada membro só podem ser concretizados se os dos outros elementos
também o forem.
A estrutura das relações de interdependência afecta o tipo de comportamentos prováveis durante
a negociação. Por exemplo, se uma parte depende em maior grau da outra é provável que esta
procure usar essa dependência relativa como suporte para forçar a aceitação das suas propostas.
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Elementos da negociação
Cada negociação é um caso, nenhuma é exactamente igual a outra, quer no que respeita à
natureza dos recursos em jogo, quer na forma como se desenrola. Todavia, de entre essa
diversidade emergem alguns elementos que caracterizam de forma universal as situações de
negociação.
Os actores da negociação são designados partes e incluem indivíduos actuando em nome
próprio ou representando um grupo de pessoas com interesses comuns. Sobretudo em contexto
organizacional, os negociadores actuam em nome de outrem a quem têm de prestar contas. Neste
caso, pode dizer-se que estes constituintes, ainda que não estejam fisicamente presentes, são par-
tes negociais e por vezes fundamentais para o desenrolar da negociação.
Os itens negociais referem-se aos recursos que são objecto da negociação. Por exemplo, numa
negociação comercial os assuntos a tratar incluem geralmente o preço unitário, método e prazo de
pagamento, prazo de entrega, apoios promocionais, entre outros. Numa negociação laboral são
abordados aspectos como níveis salariais, regalias sociais, perfil de funções ou tarefas,
remuneração complementar por objectivos, etc. Para cada item existem diferentes alternativas de
escolha. Por exemplo, numa negociação comercial, no item «prazo de pagamento» podem existir
alternativas que vão de 15 a 90 dias.
Persiste em muitos negociadores a crença de que abordar um pequeno número de assuntos e
de alternativas ajuda a simplificar o desenrolar da negociação. Na verdade, passa-se o contrário:
quanto maior o número de itens negociais e mais amplo o leque de alternativas mais os
negociadores podem construir diferentes soluções de propostas assentes em diversas combinações
de valores.
À mesa de negociações, as pessoas tendem a exprimir mais facilmente as suas posições do que
os seus interesses2. As posições são as exigências explícitas relativas a um determinado assunto
(«quero um prazo de pagamento de 90 dias»), enquanto que os interesses se referem a
necessidades subjacentes às posições ainda que não sejam publicamente expressas («tenho
dificuldades de tesouraria e falta de liquidez» ou «realizei um investimento importante, preciso de
recompor a tesouraria»). Os interesses constituem a verdadeira «medida da negociação»3. Uma
negociação que se restringe a esgrimir posições dificilmente será compensadora para ambas as
partes. Dado que os interesses podem geralmente ser satisfeitos com propostas que representam
diferentes posições, um ponto-chave da negociação eficaz é conseguir que as partes conheçam e
discutam as necessidades e critérios de decisão que subjazem às posições.
O processo da negociação refere-se à forma como decorre a negociação. Inclui as incidências e
as formas de interacção verbal e não-verbal entre as partes, bem como o modo como as variáveis
da situação (antecedentes históricos da relação, relação de poder, etc.) afectam a relação entre as
partes. São igualmente elementos do processo o padrão e o grau de concessões de cada
interlocutor, as estratégias seguidas, a sequência de apresentação de propostas e os argumentos
utilizados para as apoiar. Um aspecto que ultimamente tem vindo a ganhar relevância é o meio de
comunicação utilizado pelos negociadores. Com a crescente popularidade dos meios de
comunicação à distância possibilitados pelas novas tecnologias, nomeadamente o e-mail e a
videoconferência, as escolhas dos negociadores a este respeito podem afectar, às vezes sig-
nificativamente como veremos adiante, o desenrolar da interacção entre eles.
O modo como os negociadores conduziram a negociação, combinado com a estrutura da
situação negocial, desemboca num resultado. Se este se traduz num acordo, a sua análise permite
verificar se o desempenho das partes optimizou a partilha de recursos ou, como muitas vezes
acontece, se o acordo não esgotou as possibilidades de combinação colaborativa potencial da
estrutura de itens e alternativas negociais. No caso de o resultado ser um impasse, a ruptura daí
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decorrente pode ser ultrapassada, em muitos casos, com a intervenção de uma terceira parte que
julga e impõe um novo acordo segundo regras aceites por todos (arbitragem) ou que negoceia com
ambas as partes em busca de um acordo alternativo (mediação).
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No Quadro 8.1, estão resumidas as principais características que distinguem os dois tipos de
negociação. Todavia, na maioria das situações quotidianas de negociação nas organizações,
dificilmente se pode falar de negociações puramente distributivas ou integrativas, mas antes de uma
maior ou menor predominância de elementos integrativos ou distributivos. Isto significa que, embora
a estrutura da negociação influencie o leque de soluções de acordo possíveis, são as escolhas dos
negociadores que determinam, em última instância, a forma como vai decorrer a interacção negocial
e esta irá, por sua vez, favorecer ou não a maximização dos ganhos conjuntos.
Preparação da negociação
Um mito popular sustenta que os bons negociadores se apoiam na intuição e na capacidade de
improviso. Por outro lado, muitos negociadores profissionais invocam a extensão da sua experiência
para justificarem a ausência de qualquer planeamento das negociações em que participam. Todavia,
a pesquisa mostra que negociadores experientes e negociadores novatos se assemelham nos erros
de julgamento sistemáticos que conduzem a resultados medíocres14. A acumulação de experiência
faz aumentar a confiança dos negociadores mas esta não garante a melhoria dos seus julgamentos
sobre os processos negociais. Sem feedback adequado sobre os seus resultados e processos de
actuação, o negociador dificilmente tira partido da experiência. A crença de que a experiência
melhora o desempenho negocial é, contudo, persistente porque se baseia tendencialmente nas
memórias selectivas dos sucessos, ignorando os insucessos.
A realidade é que uma das fases cruciais da negociação ocorre antes dos negociadores se
encontrarem. Apesar de negligenciada por muitos negociadores, a preparação sistemática é um
contributo essencial para a eficácia das negociações.
O processo de preparação é parte integrante da estratégia escolhida para abordar a negociação.
Por estratégia entende-se o plano global de objectivos negociais e sequências de acção previstas
para os atingir15. Nestas sequências de acções prospectivas incluem-
-se as tácticas. Apesar de serem frequentemente confundidas na literatura prescritiva, estratégias e
tácticas são processos diversos ainda que contíguos e interrelacionados. Enquanto a estratégia se
refere a um padrão global e relativamente estável de acções planeadas (o «plano da batalha»), as
tácticas constituem acções específicas imediatas e pontuais que contribuem para a implementação
da estratégia. Por exemplo, uma estratégia distributiva, esboçada com vista a garantir a maior parte
do «bolo» negocial, implica o uso de tácticas contundentes que incluem ameaças, propostas iniciais
exigentes e, em alguns casos, a simulação de ultimatos. Ao invés, uma estratégia desenhada para
garantir a continuidade de uma relação pessoal positiva com a outra parte apela a tácticas
apropriadas a esse fim como sejam a escuta activa e o uso de perguntas abertas para criar um
clima de confiança indispensável à concretização do objectivo estratégico.
O primeiro passo da preparação é a definição dos assuntos a abordar. Esta é uma etapa simples
mas, como vimos antes, de grande importância para garantir um número elevado de possíveis
configurações de alternativas de acordo. Usualmente, existem dois ou três assuntos centrais e
outros itens que, antes da negociação, aparecem como secundários. Por exemplo, nas negociações
comerciais o preço e o prazo de pagamento constituem quase sempre assuntos incontornáveis. A
forma de faseamento do pagamento, a existência de bónus versus quantidades são exemplos de
outros itens a considerar neste tipo de negociação.
Após a identificação dos assuntos pertinentes, é necessário determinar prioridades o que, na
prática, corresponde a esclarecer quais são os itens mais ou menos importantes e como se
relacionam entre si.
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Como vimos antes, as posições expressam o que o negociador quer e os interesses reflectem as
razões pelas quais o quer. O passo seguinte na preparação consiste precisamente em definir os
interesses subjacentes aos assuntos a tratar e às posições que serão apresentadas à mesa da
negociação. Por exemplo, numa negociação de projecto, a posição a apresentar relativamente ao
prazo é de 10 meses para a conclusão. O interesse subjacente refere-se à justificação desta
posição como, por exemplo, «tirar partido dos recursos humanos necessários cuja disponibilidade é
incerta». O esclarecimento dos interesses é particularmente importante para explorar o potencial
integrativo da negociação. Por exemplo, neste caso, facilmente se entende que em caso de acordo
no que se refere à garantia da disponibilidade efectiva dos recursos necessários, o prazo exigido
pode ser alterado.
Neste exemplo, o interesse é substantivo, isto é, relaciona-se directamente com os itens
negociais. Porém, os interesses subjacentes às posições podem incluir princípios e valores relativos
ao modo como se pretende que a negociação decorra ou à relação com a outra parte16.
Uma vez determinados os assuntos negociais e os interesses subjacentes, o negociador precisa
de estabelecer os seus alvos e limites. Os primeiros referem-se ao que o negociador considera
como objectivo realisticamente desejável, enquanto o limite, também designado ponto de
resistência, define o ponto a partir do qual se julga mais adequado romper a negociação do que
continuar. Note-se que, existindo um conjunto de itens pertinentes, para cada um deles é possível e
desejável criar alternativas. Por exemplo, para uma parte vendedora, o preço pode ser decomposto
em valores decrescentes, o faseamento do pagamento pode ser dividido em combinações de
percentagens. Deste modo, itens negociais e alternativas constituem uma matriz em que os
assuntos estão dispostos nas colunas e as alternativas nas linhas (Quadro 8.2)
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mento de aceitabilidade dos valores das propostas e contrapropostas durante a interacção negocial.
A pesquisa sobre tomada de decisão17 mostrou com muita clareza que, em contexto de incerteza, a
emergência de uma âncora, isto é, um valor (número, prazo, etc.), mesmo que aleatório, provoca
nos decisores a tendência para julgarem as alternativas ajustando as suas decisões por referência a
esse valor. Na negociação, particularmente em ambiente de incerteza informativa, a parte que
apresenta a primeira proposta tende a ser favorecida já que a outra tende a ajustar-se ao valor
inicialmente proposto. Esta hipótese foi confirmada em estudos experimentais18 que indicaram
também que a parte que apresenta a proposta de abertura tende a apresentar superioridade no
ganho relativo (diferença entre ganhos obtidos pelas partes no acordo final).
Obter e analisar informação sobre a outra parte constitui uma etapa difícil de cumprir mas com
elevada importância. Sugere-se19: que para obter um quadro completo de informação sobre o
oponente é desejável procurar informação nas áreas seguintes
Objectivos.
Interesses e necessidades.
Alternativas.
Reputação, estilo de negociação.
Grau de autoridade para fechar o acordo.
Prováveis estratégias e tácticas.
As fontes de informação às quais o negociador pode recorrer para obter esta informação variam
com o contexto e vão da busca documental ao contacto com elementos da rede social da outra
parte, passando por inferências acerca de negociações passadas.
Finalmente, concluída a parte mais substancial da preparação, o negociador deverá ponderar um
plano de contingência para o caso da negociação decorrer de forma adversa no que toca aos
resultados esperados. Esta alternativa é denominada MAPAN20, o acrónimo para «Melhor
Alternativa Para um Acordo Negociado» e define um ponto a partir do qual o negociador está
preparado para abandonar a negociação. Na prática, encontrar a MAPAN para uma dada
negociação consiste em definir, previamente, uma alternativa aos termos e valor do acordo que se
espera obter21. Note-se que esta alternativa não deverá ser retórica ou uma mera fantasia inspirada
por desejos. Pelo contrário, a MAPAN deverá traduzir-se numa alternativa realista e desenvolvida
antes de iniciar a negociação. Prever verdadeiras alternativas para o caso de não ser possível um
acordo satisfatório implica seguir a regra genérica proposta por Max Bazerman e Margaret Neale22
e que aconselha o negociador a identificar opções, evitando «apaixonar-se» pelo objecto da
negociação seja este, por exemplo, uma casa específica ou um equipamento determinado. De facto,
muitos negociadores parecem ignorar que «o objectivo da negociação não é chegar a qualquer
acordo, mas atingir um acordo que seja melhor … do que o que se obteria sem ele»23.
Estabelecer a MAPAN permite determinar com maior segurança o ponto de resistência ou limite:
qualquer acordo que represente mais valor do que o proporcionado pela MAPAN será sempre
melhor do que o impasse ou a ruptura. Ao invés, se uma proposta próxima da MAPAN é rejeitada,
qualquer concessão ulterior será então inaceitável. Por exemplo, enquanto comprador, o negociador
que efectua uma análise cuidada da alternativa está em condições de fixar com precisão o máximo
que está disposto a pagar antes de ponderar uma eventual ruptura.
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ordem relacional com formas de actuação racionais. Embora o seu uso não se restrinja a situações
em que as partes possuem uma expectativa de relação cooperativa, uma relação de confiança
(rapport) entre as partes constitui um requisito quase indispensável para permitir a partilha de
informação a qual favorece a exactidão dos julgamentos dos negociadores, um ingrediente
fundamental para alcançar acordos integrativos24.
Quando não existe uma base saliente para a confiança é necessário construi-la através de
alguns passos aparentemente simples mas com um impacte positivo na relação entre os
negociadores.
Em primeiro lugar, se as partes acreditam que negociar lhes traz mais benefícios do que manter
a competição entre elas ou do que trabalharem separadamente, um passo favorável ao
estabelecimento de rapport é o acordo prévio, ainda que genérico, acerca de objectivos. Estes
podem ser comuns, quando as pessoas concordam com o objectivo e beneficiam de igual forma da
sua concretização, partilhados, se possuem o mesmo objectivo mas beneficiam de forma
diferenciada e, por último, conjuntos, quando possuem objectivos e benefícios diferentes mas
susceptíveis de serem combinados numa solução mutuamente favorável29. Este acordo prévio sobre
objectivos pode ser reforçado por uma focalização no futuro comum.
Alguns mecanismos socio-emocionais ajudam implicitamente a construir ou a reforçar uma
relação de confiança. Por exemplo, quando os negociadores se percepcionam como semelhantes,
ou partilham uma identidade social comum, procuram agir de forma mais cooperativa e têm mais
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solução negocial optimizada no que respeita ao ganho conjunto. Actualmente, assume-se que os
próprios negociadores podem desempenhar este papel sem o apoio de terceiros39. Na verdade, o
facto de já existir um acordo prévio faz com que os negociadores possam abordar serenamente as
formas de melhorar a solução já encontrada, trocando abertamente informação sobre as suas
preferências, sem receios de eventuais perdas já que, em caso de insucesso nesta tarefa, possuem
a garantia de retornarem ao acordo já conseguido. Pode, por isso, dizer-se que o acordo inicial
constitui uma nova MAPAN para ambos os negociadores.
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Como se depreende das proposições anteriores, as tácticas para concretizar a influência sobre o
ponto de resistência da outra parte assentam em manobras destinadas a alterar a percepção do
valor atribuído pelas partes aos itens e aos resultados negociais possíveis. Estas manobras agem
ao nível da informação disponível gerando ambiguidade e incerteza quer na percepção do valor
conferido pelo oponente a os resultados possíveis esperados pelo próprio, quer nas estimativas a
respeito das estimativas do oponente quanto à importância dos resultados para o negociador.
Vejam-se, por exemplo, quatro argumentos típicos de apoio a estas manobras44 p. 60:
«Penso que você não está assim tão convicto acerca dos aspectos que apresentou»;
«Creio que a greve vos irá custar mais do que vocês querem admitir»;
«Apesar das vossas afirmações, creio que a greve não terá grandes custos»;
«Estou muito convicto acerca deste assunto, ao contrário do que vocês afirmam».
Conhecer a MAPAN
Em situação de incerteza acerca do valor do ponto de resistência do oponente, o ponto de
referência do negociador é a sua MAPAN. Como vimos antes, sendo esta baseada em dados
objectivos e verificáveis, constitui um importante apoio para ponderar com segurança a aceitação ou
a recusa de propostas, na medida em que estabelece uma fronteira entre as opções de ruptura ou
de continuidade da negociação. Alguns negociadores tendem a revelar a sua MAPAN durante a
negociação como putativa táctica de ameaça. Na verdade, tal procedimento é contra produtivo: a
outra parte ficará imediatamente ciente do valor aproximado do ponto de resistência e tentará firmar
propostas próximas desse valor, reduzindo a ZAP ao mínimo e retirando espaço de manobra ao
negociador.
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Obter informação sobre a MAPAN do outro constitui uma vantagem substancial em ambiente
competitivo mas, durante a negociação, revela-se uma tarefa tão difícil como conhecer o seu ponto
de resistência. Todavia, fontes indirectas como relatórios, concorrentes ou a Internet podem
providenciar antecipadamente algumas pistas quanto às alternativas do oponente. Dada a relação
estreita entre o ponto de resistência e a alternativa a um acordo negociado, o negociador que tem
acesso a informação sobre a MAPAN da outra parte possui uma informação preciosa mas,
compreensivelmente, difícil de obter uma vez que esta é considerada reservada. Quando detêm
essa informação os negociadores tendem a sobrevalorizá-la ao determinarem a primeira proposta,
secundarizando as informações de mercado e considerações de justiça relativa45.
Primeira proposta
Apesar de persistir em muitos negociadores a crença de que vale a pena deixar a outra parte
apresentar a primeira proposta, toda as evidências empíricas mostram que tomar a iniciativa neste
domínio confere uma vantagem importante. Como vimos antes, ao analisarmos os passos da
preparação da negociação, a primeira proposta gera um efeito de ancoragem, conduzindo a outra
parte a ajustar as suas contrapropostas ao valor inicialmente apresentado pelo negociador e
permitindo-lhe assumir o controlo da condução do processo negocial.
Em contexto distributivo, para além de tomar a iniciativa, o negociador tende a fazer uma
primeira proposta de valor exagerado em relação ao seu objectivo. Vários estudos confirmam que as
partes que assim procedem têm probabilidade de obter ganhos mais elevados46. Uma proposta de
abertura exigente deixa espaço de manobra ao negociador e a justificação da provável recusa por
parte do interlocutor pode ser rica em informações indirectas sobre as suas preferências e prio-
ridades. Por outro lado, esconde pistas sobre o seu ponto de resistência e assinala implicitamente
ao oponente que terá de fazer mais concessões do que tencionava. Todavia, se o valor da proposta
é substancialmente exagerada e, sobretudo se o oponente obteve informação credível para fixar o
seu objectivo, existe o perigo da proposta ser sumariamente rejeitada.
Quando o negociador faz uma proposta que é imediatamente aceite pela outra parte, tende
usualmente a sentir-se desconfortável, apesar de ter aparentemente conseguido o acordo que
queria. Este desconforto indica que o negociador sucumbiu à maldição do vencedor47. Se a primeira
proposta é aceite de imediato isso pode significar que foi demasiado generosa o que é tanto mais
provável quanto mais incerta e escassa é a informação sobre o valor dos recursos em disputa.
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inferir as intenções e interesses da outra parte. De um modo geral, dois aspectos parecem ser
decisivos neste processo: o padrão e a amplitude das concessões.
No que respeita ao padrão de concessões, por exemplo, um negociador que faz concessões
frequentes indica que estará provavelmente mais disponível para um acordo modesto do que outro
que apenas faz concessões ocasionais. Ou ainda, um negociador que, após algumas concessões
iniciais, se mantém inamovível nas suas propostas assinala a proximidade do seu ponto de resis-
tência e veicula a ameaça implícita de abandonar a mesa.
Uma outra consequência do padrão de troca de concessões consiste no fornecimento de
informação acerca da forma como o negociador percepciona o seu oponente. Por exemplo, um
negociador que após apresentar propostas iniciais firmes, suaviza as suas exigências de forma
contingente com as cedências da outra parte pode estar a passar a imagem de um interlocutor de
convicções sólidas mas fiável e flexível48.
A amplitude das concessões possui igualmente um efeito importante no desenrolar da
negociação. Muitos negociadores parecem crer que ao fazerem concessões generosas no início da
negociação (como «sinal de boa vontade») estarão a convidar a outra parte a reciprocar, facilitando
o caminho para o acordo. Todavia, se este gesto não for correspondido com uma cedência de
amplitude semelhante, o negociador coloca-se numa situação de desvantagem de difícil
recuperação. Por isso, a amplitude das concessões deve estar associada ao momento da interacção
em que ocorrem. Os negociadores mais eficazes tendem a usar a estratégia dita de «chapéu
preto/chapéu branco» ou seja, começam por concessões de fraca amplitude e, posteriormente, à
medida que observam reciprocidade da outra parte, vão oferecendo concessões mais amplas49.
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curso de acção que se revela negativo e que, apesar de lesar realmente os seus interesses, satisfaz
o desejo de consistência, particularmente quando este é exacerbado pela necessidade de salvar a
face.
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Poder na negociação
O poder na negociação é determinado, antes de mais, pelo grau relativo de interdependência
das partes. Se a parte A depende da parte B para atingir os seus resultados negociais e se B não
depende ou depende menos de A, o poder na negociação tende a ser estruturalmente favorável a B.
A dependência assenta no controlo dos resultados: a parte mais poderosa é a que possui mais
controlo sobre os resultados desejados pela outra. Nos estudos clássicos sobre a questão do
controlo de recursos importantes, como espaço, tempo ou dinheiro, sendo determinantes para a
capacidade de recompensa ou de punição detida por cada parte, constituiria o principal suporte do
controlo de resultados53. Contudo, a literatura mais recente assinala consensualmente a importância
das alternativas que cada negociador possui. Provavelmente, uma MAPAN robusta constitui a fonte
mais importante do poder negocial. A posse de alternativas atraentes afecta o poder na medida em
que o negociador não se sente compelido a chegar a acordo. A ruptura eventual é encarada com
normalidade sempre que o esboço de acordo é avaliado como menos atractivo do que as
alternativas54.
Para além do valor relativo da MAPAN de cada negociador, outras fontes contribuem para o
poder na negociação como, por exemplo, a autoridade formal associada à posição estrutural na
organização55. A informação constitui também um forte apoio ao poder negocial uma vez que
permite ao negociador organizar argumentos para apoiar as suas posições e colocar objecções
fundamentadas às posições do oponente. Porém, as relações de poder negocial são dinâmicas e
raramente determinadas por uma fonte única. Por exemplo, um comprador que «pesa» fortemente
no volume de negócios de um seu fornecedor dispõe de aparente poder nas negociações com este
parceiro já que a relação de dependência lhe é favorável. Porém, se os bens ou serviços
negociados acarretam um alto grau de especificidade e/ou são raros, então, a relação de poder
tende para o equilíbrio. Este será reforçado se o fornecedor desenvolver uma MAPAN forte como,
por exemplo, conseguir um comprador alternativo com a mesma dimensão.
Tácticas e ética
Em contexto distributivo, as tácticas apoiam-se, na sua maioria, em manobras destinadas a
incrementar o poder negocial, tentando alterar percepção que a outra parte possui da relação de
poder. Este esforço assenta no uso persuasivo da informação para alterar as opiniões, percepções e
posições da outra parte. Assim, os negociadores procuram defender o valor e a razoabilidade das
suas propostas ou a impossibilidade de fazerem mais concessões. Por outro, esforçam-se por
alterar as crenças da outra parte acerca dos seus próprios objectivos, tentando mostrar que as
concessões pedidas são menos importantes do que ela pensa. A maior parte das tácticas baseia-se
nos princípios da influência, utilizando duas vias principais56: argumentos lógico-racionais apoiados
em factos ou indicadores aparentemente mais superficiais, tais como referências à credibilidade
pessoal ou apelos emocionais e motivacionais.
Dada a importância das tácticas na negociação distributiva, muitos negociadores são tentados a
fazerem uso de manobras eticamente dúbias. Para além da distorção deliberada de informação, as
tácticas consideradas eticamente indesejáveis incluem as tentativas de corromper a reputação do
oponente junto dos seus constituintes, promessas ou ameaças falsas e a obtenção de informação
sobre a outra parte por meios ilícitos57.
Algumas tácticas situam-se numa frágil fronteira entre a persuasão e a distorção deliberada de
informação e ocorrem frequentemente sem que as pessoas questionem a sua validade ética. Um
exemplo claro desta situação é a chamada mistificação dos itens de interesse comum. Com maior
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frequência do que se julga, as partes possuem preferências idênticas em alguns itens negociais. Por
exemplo, negociando as condições de admissão com um empregador, um candidato a um posto de
trabalho deseja entrar em funções o mais cedo possível tal como o empregador tem urgência em
substituir o lugar vago. Quando uma das partes se apercebe da existência de completa
compatibilidade com a outra parte num item negocial específico, pode mistificar a sua preferência
com a finalidade de obter mais contrapartidas em troca de falsas concessões. Neste exemplo, o
empregador pode simular a falta de urgência na admissão do candidato para mais tarde «ceder» na
data de entrada em funções em troca de uma moderação salarial. Esta distorção deliberada da
informação sobre o valor dos assuntos negociais de interesse comum ocorre espontaneamente em
28% dos participantes «ingénuos» (estudantes universitários) de uma tarefa experimental de
negociação58.
Como se explica que pessoas que se consideram honestas usem e considerem admissíveis
procedimentos como estes? Dado que ética resulta de uma encruzilhada complexa de normas
culturais e interpessoais, é elevada a probabilidade de existir uma zona «cinzenta» na qual os
factores contextuais afectam o modo como o indivíduo avalia e julga a aceitabilidade de
procedimentos cujas rejeição ou aceitação social aparecem como ambíguas. Assim, a pesquisa
mostra que os negociadores tendem a considerar justificado o uso de tácticas eticamente dúbias
sempre que acreditam que a outra parte também as irá utilizar59. Por outro lado, as pessoas tendem
a julgar de forma mais permissiva a ética dos comportamentos negociais sempre que estes as
favorecem pessoalmente ou quando beneficiam pessoas a que estão ligadas por uma identidade
social comum60. Uma vez que em diferentes organizações parecem existir diferentes climas éticos61,
é igualmente provável que os negociadores adoptem as normas de julgamento ético das
organizações a que pertencem. Por exemplo, o comportamento dos responsáveis hierárquicos pode
servir de referência e de modelo, contribuindo para determinar as crenças dos negociadores acerca
do que é condenável ou aceitável para atingir os objectivos negociais da organização.
A complexidade da interacção de factores que determina os comportamentos éticos na
negociação torna difícil o estabelecimento de orientações prescritivas específicas neste domínio.
Afinal, como sublinha Leigh Thompson62, dado que o que conta na relação negocial é a percepção
do oponente e não o julgamento do negociador, a «regra de ouro» é colocar-se no lugar do outro:
«não faças aos outros aquilo que não gostarias que te fizessem a ti». Todavia, é possível efectuar
um escrutínio pragmático às práticas que envolvem tácticas ambíguas do ponto de vista ético.
Assim, pode recomendar-se aos negociadores que actualmente as utilizam que considerem três
questões pertinentes para decidirem do seu uso em situações futuras63:
Estas tácticas ampliam verdadeiramente o poder do negociador e ajudam-no a atingir os seus
objectivos?
De que modo o seu uso afecta a relação futura do negociador com o oponente?
Conclusão
Humanos do ISCTE-IUL
NEGOCIAR 19
NOTAS
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NOTA IMPORTANTE: a presente versão destina-se única e exclusivamente a uso pessoal dos alunos de “Gestão de Conflitos e Negociação” da Licenciatura em Gestão de Recursos
Humanos do ISCTE-IUL
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20
Adoptamos esta designação para a tradução de BATNA (Best Alternative to a Negotiated Agreement).
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