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O Tamires Barcellos
O Tamires Barcellos
Alicia: Oi, amiga! Queria ter falado com você mais cedo
na aula, mas precisei conversar com o professor e não
consegui te encontrar quando deixei a sala. Queria saber se
você pode me passar o número do James.
— Vovó!
James entrou no restaurante de repente, ofegante e suado
como se tivesse acabado de correr uma maratona. Seus olhos
arregalados se encontraram com os meus conforme se aproximava
de onde a senhora estava, ainda parecendo prestes a desmaiar,
apesar de já ter tomado água e continuar segurando a minha mão.
Ele se ajoelhou ao lado da avó e tocou o seu rosto com cuidado.
— Vovó, eu vim o mais rápido que pude. O que está sentindo?
Vamos para o hospital.
— Não é preciso hospital, só quero que você e Norah me
levem para casa. Sinto que preciso me deitar... Não trouxe meu
remédio de pressão.
— Vovó, sabe que não pode sair sem o seu remédio na bolsa!
Meu Deus, poderia acontecer algo mais grave! Eu vou levá-la ao
hospital.
— Não quero ir para o hospital.
— Sem discussão, vovó! — James se ergueu e a pegou em
seus braços.
Vovó Emory era uma senhora baixinha e magra, com o cabelo
crespo muito bem-cuidado e cheio. Parecia mais nova do que
realmente era, mas a sua saúde frágil deixava bem claro a sua
idade.
— Também acho melhor ir para o hospital, vovó Emory, e se
for algo mais grave? — falei, sentindo Mason parar ao meu lado. Ele
pousou a mão em minha cintura e o gesto não passou despercebido
por James, muito menos por sua avó, que já não parecia mais estar
prestes a desmaiar.
Até sua cabeça cair mole de novo contra o peito do neto.
— Norah tem razão, no hospital o médico poderá tranquilizar a
todos ao afirmar que não é nada grave — disse Mason com um tom
preocupado.
Ele não saiu do nosso lado nem por um segundo e foi quem
pediu para que o garçom trouxesse água. Também fez com que os
curiosos se afastassem para que vovó Emory pudesse respirar.
— Sim, vocês têm razão, eu acho que é melhor mesmo ir ao
hospital... Quero que James e Norah me levem... — Sua voz soou
fraca e deixou o meu coração apertado.
E se fosse algo grave? Eu não queria pensar naquilo. Precisava
acompanhar os dois para ter certeza de que vovó Emory ficaria bem.
Virei-me para Mason com um olhar de desculpa.
— Eu vou com eles, tudo bem?
— Claro. Se quiser, posso acompanhar vocês, estou com o
meu carro aqui.
— Não precisa... — A voz de vovó Emory soou às minhas
costas e eu me virei a tempo de ver uma expressão de dor passar
pelo seu rosto. — Não quero dar trabalho para mais um jovem.
— Não seria trabalho algum — afirmou Mason, mas vovó
Emory tinha razão, não havia motivo para prendê-lo conosco em um
hospital.
— Está tudo bem, eu vou no banco de trás com vovó Emory
enquanto James dirige. Muito obrigada por ter ficado ao nosso lado.
— Não precisa agradecer. — Mason se inclinou em minha
direção e meu coração disparou em um misto de surpresa e
ansiedade ao pensar que me beijaria na boca, mas seus lábios se
encontraram com a minha bochecha. — Me mantenha informado,
ok?
Confirmei com a cabeça e nos afastamos depois de James
agradecer a ajuda de Mason. Fui logo atrás deles, pegando meu
sobretudo com o maître, e abri a porta do carro de James para que
ele pudesse acomodar vovó Emory no banco traseiro. Assim que ela
se sentou, pude ouvir a sua voz de dentro do veículo:
— Peça para que Norah vá ao seu lado, querido, eu preciso me
deitar um pouco.
James murmurou alguma coisa para ela e me deu um olhar
apreensivo ao fechar a porta.
— Ela desmaiou em algum momento, Norah? — perguntou ele
rapidamente.
— Não, mas apresentou vertigem. Acho que é melhor mesmo
levá-la ao hospital.
James concordou e deu a volta para poder ocupar o lugar do
motorista enquanto eu me sentava no banco do passageiro. Virei-me
para trás, encontrando vovó Emory deitada no banco, seus olhos
ligeiramente abertos acompanhando tudo. Estiquei-me e segurei a
sua mão conforme James colocava o carro em movimento.
— Fique falando comigo, vovó. O que está sentindo?
— Agora estou melhor. — Sua voz soou menos cansada. —
Podemos ir para casa.
— Nada disso, vamos para o hospital — James afirmou com
urgência.
— Não preciso de hospital, James.
— Precisa, vovó Emory, apenas para descartar a possibilidade
de que seja algo mais grave — falei.
Vovó Emory revirou os olhos e se ergueu sem muita
dificuldade, recostando-se contra o banco.
— Já estou melhor, não estão vendo? Acho que foi a comida
do restaurante. Estou apenas um pouco enjoada agora.
Eu me virei para James e o encontrei encarando a avó pelo
espelho retrovisor, seus olhos se estreitando conforme seus braços
ficavam tensos ao segurar o volante.
— A senhora não está mentindo sobre passar mal, está?
— Eu? Mentindo? Olha como fala comigo, James McHugh! Sou
sua avó!
— Exatamente, e eu a conheço muito bem.
— James. — Toquei em seu joelho e seus olhos se
encontraram com os meus rapidamente. — Claro que sua avó não
está mentindo. Pode ter sido apenas uma queda de pressão.
— Isso mesmo, foi só uma queda de pressão — afirmou vovó
Emory com muita convicção. — E agora eu já estou melhor. Leve-me
para casa.
— Eu deveria levá-la para o hospital e então o médico deixaria
bem claro se a senhora está mentindo ou não.
— Por que eu mentiria sobre isso? — perguntou ela com um
tom de desafio na voz.
James bufou e voltou a focar na direção, tomando o caminho
para a casa dos seus pais. Eu olhei para trás a tempo de ver vovó
Emory com o que parecia ser um leve sorriso nos lábios, mas a
expressão sumiu rápido demais. Fiquei confusa. Por que ela mentiria
sobre estar passando mal? Aquilo não fazia o menor sentido.
Voltei a segurar a sua mão e seguimos em silêncio até
entrarmos na mansão da família McHugh. James estacionou e saiu
do carro, dando a volta no veículo para voltar a tomar a avó nos
braços, que não protestou. Ela acariciou o peito do neto conforme
entrávamos na casa em estilo vitoriano.
— Eu te amo, meu neto, nunca se esqueça disso.
James pareceu ficar menos tenso ao ouvir aquilo e eu sorri. A
relação dos dois era tão bonita quanto a minha com a minha avó. Os
pais de James, que estavam na sala de TV, logo se levantaram assim
que entramos no cômodo, os dois ficando nervosos ao ver o filho
carregando a matriarca da família nos braços.
Fui eu que expliquei tudo o que aconteceu conforme a
levávamos para o segundo pavimento da casa. James acomodou
vovó Emory em sua cama e Louise foi buscar o seu remédio de
pressão.
— Mãe, por que não me ligou? Eu já estava ficando
preocupado, prestes a ir ao restaurante, pois fiquei esperando sua
ligação para que eu fosse buscá-la e estava demorando demais —
disse Jonathan ao se sentar ao lado de vovó Emory.
— Eu vi Norah jantando com um rapaz e me aproximei para
cumprimentá-la, acabei me sentindo mal de repente. Ah, obrigada,
querida — agradeceu à Louise pelo remédio e o copo de água. —
Não imaginei que isso fosse acontecer, só pedi para que Norah
ligasse para James porque não queria preocupar vocês.
— Não é melhor irmos para o hospital? — perguntou a mãe de
James.
— Não, eu estou melhor agora, só preciso descansar. Vou
tomar um banho e dormir. — Vovó Emory olhou para mim e sorriu.
— Muito obrigada por ter ficado comigo, minha querida. Você é a
neta que eu não tive, especial demais para mim.
— Eu nunca a deixaria sozinha, vovó Emory.
— Claro que não, você é amorosa, gentil, tem uma alma doce
e um coração maior ainda. O homem que se casar com você vai ser
o mais sortudo do mundo e aquele que te perder vai se arrepender
amargamente.
Eu apenas sorri, ficando com as bochechas quentes de
vergonha por conta do seu elogio fora de hora. Ao meu lado, James
perguntou:
— Tem certeza de que está se sentindo melhor, vovó?
— Sim, meu querido, eu tenho certeza. Pode ir em paz. Direto
para casa, ouviu? Você e Norah.
Nós ficamos mais um tempinho com vovó Emory, até ela
praticamente nos expulsar ao afirmar que estava bem e que tomaria
um banho. Saímos do seu quarto e nos despedimos dos pais de
James após o jogador pedir, pelo menos cinco vezes, para que eles o
avisassem caso a avó voltasse a sentir alguma coisa. Deixamos a
mansão e James pareceu respirar mais tranquilo pela primeira vez
desde que entrara no restaurante.
— Está tudo bem agora, James. Não aconteceu nada grave
com a sua avó.
— Sei disso, mas tomei um susto. Minha avó já tem certa
idade, qualquer coisa que aconteça com ela me deixa tenso.
— Eu sei, você a ama muito e ela te ama ainda mais. — Sorri,
tocando em seu ombro. — Sua avó é forte, tenho certeza de que vai
permanecer ao nosso lado por muitos anos ainda.
— Tem razão. — James me deu um sorrisinho. — Ela não vai
embora até ter certeza de que estou casado e sendo pai de pelo
menos três filhos.
Eu ri. Sabia que aquele era o maior sonho da vida da sua avó.
— Pois trate de realizar esse desejo dela — falei, apenas
imaginando como James seria um marido maravilhoso e um pai
melhor ainda.
Vovó Emory disse que o homem que ficasse comigo seria o
mais sortudo do mundo, mas eu acreditava que sortuda de verdade
seria a mulher que, um dia, ganharia o coração de James McHugh.
Eu tinha certeza de que minha avó estava mentindo.
Obviamente, assim que recebi a ligação de Mason, não
desconfiei de que vovó poderia estar encenando. Ela era uma
senhora, eu sabia que às vezes tinha picos de pressão quando
estava nervosa e que seu coração já não era tão forte quanto antes,
realmente acreditei que pudesse estar passando mal. Apenas
quando dei partida no carro e a vi se sentar no banco como se não
estivesse sentindo mais nada, foi que comecei a desconfiar.
Seu discurso no telefone voltou com tudo em minha cabeça, a
indignação em seu tom de voz, principalmente quando falei que
também estava indo a um encontro. Foi um erro meu, deveria ter
ficado quieto sobre aquilo. Talvez não impedisse minha avó de tentar
arruinar o encontro de Norah com Mason, mas com certeza não
seria um motivo a mais para fazer com que a matriarca dos McHugh
se intrometesse daquela forma na minha vida — e na vida de Norah,
que não imaginava que minha avó queria dar uma de cupido para
cima de nós dois.
Preferi não contar nada para a irmã do meu melhor amigo,
pois não queria que ela ficasse preocupada ou com medo de que
minha avó pudesse fazer algo para atrapalhar o seu envolvimento
com Mason. Eu conversaria com a senhora Emory McHugh e a faria
entender que Norah e eu não gostávamos um do outro da forma
como ela gostaria, que éramos apenas amigos. Minha avó precisava
começar a respeitar isso.
Encontramos a casa toda escura quando chegamos, o que não
fora uma surpresa, afinal, Benjamin raramente passava um final de
semana sem ir para festas e Logan dissera que iria dormir na casa
de Avalon. Acendi a luz a tempo de ver Norah tirando o sobretudo e
levei um novo soco no estômago ao notar como ela estava bonita.
Obriguei-me a tirar os olhos de cima dela antes que as palavras de
minha avó começassem a fazer uma lavagem em meu cérebro.
— Preciso de uma bebida — resmunguei enquanto ia para a
cozinha.
Abri a geladeira e peguei uma cerveja, desejando algo mais
forte. Talvez, fosse melhor mandar uma mensagem para Benjamin e
perguntar onde ele estava. Festa, música alta, bebida e uma garota
formariam o combo perfeito para fechar aquela noite desastrosa.
— Também quero uma — Norah disse atrás de mim.
Peguei uma cerveja para ela e a encontrei do outro lado da
ilha central da cozinha. Seus olhos bonitos me acompanharam
conforme eu abria as duas bebidas e estendia uma em sua direção.
Dei um gole longo, sentindo a cerveja bater com tudo em meu
estômago vazio. Seria inteligente da minha parte comer alguma
coisa, mas a bebida parecia mais interessante naquele momento.
— Conte-me como foi o encontro com Alicia, estou curiosa! —
Norah pediu com um sorrisinho por trás da garrafa.
— Foi legal.
Norah pousou a garrafa sobre a bancada e arqueou uma
sobrancelha.
— Legal? Só isso?
Lembrei-me de sua amiga. Alicia estava muito bonita usando
um vestido vermelho e justo, rosto maquiado e um sorriso enorme
quando entrou no restaurante. Nós começamos a conversar assim
que nos sentamos à mesa, mas eu sentia minha cabeça longe. Em
Norah, especificamente. Se ela estava gostando do encontro com
Mason, se ele a estava tratando como ela merecia, se estava
babando nela como eu babei ao ver como estava extraordinária
naquela noite.
Eu me senti um babaca e mal conseguia compreender o que
estava acontecendo com a porcaria da minha cabeça. Estava na
companhia de uma garota bonita e inteligente, que tinha um papo
divertido e mal conseguia tirar os olhos de cima de mim, mesmo
assim, estava pensando na irmã do meu melhor amigo. Qual era o
meu problema?
Quando meu celular tocou, quase agradeci a Deus pela
interrupção. Alicia não merecia estar desperdiçando a sua noite de
sexta-feira com um idiota como eu e, dependendo da ligação, eu
teria a desculpa perfeita para encerrar aquele encontro desastroso.
Tomei um susto ao ver que era Mason, mil coisas passaram pela
minha cabeça, todas sobre Norah. Nunca imaginei que ele estaria
me ligando para falar sobre a minha avó, o que era bem irônico, na
verdade.
Vovó nem precisava ter se esforçado tanto para arruinar meu
encontro com Alicia. Eu mesmo estava fazendo um bom trabalho ao
não conseguir tirar Norah da minha cabeça.
— Alicia é uma garota incrível. Muito bonita, divertida e
inteligente, mas receber a ligação de Mason falando sobre a minha
avó tirou o brilho da noite — falei parte da verdade. Saber que
minha avó estava passando mal me fez esquecer de toda a confusão
que meu cérebro estava arrumando.
— James, não fique assim. Sua avó está bem agora, com
certeza foi só uma queda de pressão. Acho que você e Alicia podem
tentar de novo um dia.
— Sim, um dia, quem sabe. Isso se ela ainda quiser se
encontrar comigo depois de hoje à noite.
— Claro que ela vai querer, Alicia parece estar realmente
interessada em você.
— E você não sente nem um pouco de ciúmes ao saber disso?
— Puta merda. Meus olhos se arregalaram assim que a pergunta
insana saiu da minha boca. Precisei me questionar pela milésima vez
qual era a porra do meu problema. Forcei uma risada alta demais. —
Afinal, eu sou um grande gostoso...
Norah pegou um pano de prato que estava ali por perto e
jogou em minha direção.
— Você é um idiota, isso sim. — Sua risada me deixou aliviado.
Norah levara a minha pergunta na brincadeira. — E o que sinto não
é realmente ciúmes, é só...
— Só...? — Instiguei, curioso demais para ouvir o que tinha a
me dizer.
— É só medo de perder a intimidade que temos caso um de
nós dois comece a namorar — Norah disse mais baixo, olhando para
a cerveja ao invés de me encarar. — Quando me mudei para cá,
você ainda namorava a vaca da Megan. Nós éramos amigos, mas
não tanto como somos agora e eu sinto que criamos um laço mais
forte desde que você ficou solteiro. Tenho medo de que isso se
perca.
Eu larguei a cerveja na bancada e dei a volta na ilha da
cozinha, parando ao lado de Norah e tocando em seus ombros até
fazer com que olhasse para mim. Os saltos da sua bota a deixavam
mais alta, mas ela ainda batia abaixo do meu queixo. Notar aquilo
me fez sorrir.
— Nós não iremos perder nada. Você sempre será a minha
baixinha e se algum babaca tentar mudar isso, vai se ver comigo.
Norah riu e eu fiquei encantado, quase sem piscar. Ela parecia
se tornar mais bonita a cada vez que eu a via e não conseguia
entender como aquilo era possível.
— E se a sua namorada quiser mudar isso?
— Ela não vai conseguir. — Puxei-a para mim até sentir os
seus braços ao redor da minha cintura e a sua cabeça em meu peito.
— Algumas coisas precisarão mudar, é claro. Você não vai mais
poder invadir a minha cama e implorar para dormir comigo de
conchinha.
— Ei, eu não faço isso! E só dormimos de conchinha duas
vezes.
— Porque você implorou...
— Eu nunca implorei! — Minha risada ecoou pela cozinha
quando senti seu soquinho fraco nas minhas costelas. — E tenho
certeza de que você vai sentir falta de dormir comigo.
— Não vou sentir falta de acordar com um mar de cachos no
meu rosto e com a sensação de que perdi um braço por conta dos
músculos dormentes.
— Vai sim, eu tenho certeza. Você também precisa encontrar
uma namorada que jogue videogame tão bem quanto eu, ou ela vai
ficar com ciúmes ao ver que você só não consegue vencer de mim.
— Isso é mentira, já que eu finjo perder para que você não
fique triste.
Norah se afastou e me encarou com os olhos estreitos.
— Mentiroso! Eu sou mil vezes melhor do que você no
videogame e posso provar. Vamos estrear o jogo de zumbi.
— Vamos! — Peguei as nossas cervejas e comecei a me dirigir
à sala. Virei-me a tempo de ver Norah me seguindo. — Se eu vencer,
quero receber café da manhã na cama pelo próximo mês.
— Se eu vencer, você vai ter que me fazer uma surpresa no
meu aniversário. Uma surpresa gigantesca!
— O quê? Que surpresa?
Norah parou com as mãos na cintura.
— Você sabe qual é o significado da palavra surpresa?
— Sim, mas... Seu aniversário é só em junho.
— Exatamente. Sabe o que isso significa? — Norah se
aproximou de mim e eu neguei com a cabeça. — Que você tem
bastante tempo para criar algo incrível para mim. É melhor já
começar a pensar, porque vai perder esta noite, James McHugh!
A danada deu dois tapinhas em meu peito e passou à minha
frente para ir até a sala. Eu fiquei parado no mesmo lugar, pensando
em como poderia surpreender uma garota que já tinha tudo, afinal,
Norah era rica. Sacodi a cabeça, livrando-me do pensamento.
Eu não precisaria pensar em nada, pois Norah iria perder.
Acordei com uma ressaca filha da puta que não tinha nada a
ver com bebida.
Era uma ressaca moral.
Norah me venceu não apenas uma, mas duas vezes, o que me
fez perder a nossa aposta no critério de desempate após a terceira
rodada. Eu venci no primeiro round e fui um bobo quando ela pediu
revanche. A filha da mãe me venceu na segunda partida e decidimos
jogar uma terceira vez para desempatar.
Foi a derrota mais agridoce da minha vida, pois tentei ficar
puto e demonstrar revolta, mas ver Norah pulando no meio da sala
às quatro da manhã, com um sorriso que ia de orelha a orelha, me
impediu de sentir qualquer outra coisa que não fosse alegria por vê-
la tão feliz. Eu parecia o Logan ao ver qualquer conquista de Avalon
e pensar nisso me deixou com o estômago gelado.
Meu melhor amigo era completamente apaixonado pela sua
namorada.
Eu estava muito longe de sentir algo sequer semelhante por
Norah.
Ela bebeu pelo menos uma dúzia de cerveja após a vitória e
eu precisei colocar a sua bunda bêbada na cama quando percebi
que havia extrapolado na bebida. Norah não tinha o costume de
beber daquela forma. O sorriso se recusou a sair do seu rosto
conforme eu acomodava sua cabeça no travesseiro e puxava a
coberta sobre o seu corpo. Fiquei alguns minutos apenas a
admirando dormir e me senti meio bobo por causa disso, sem querer
pensar demais no que eu estava sentindo.
Não pude ignorar o sentimento como tanto queria. No fundo,
eu estava feliz por Norah estar encerrando aquela noite comigo,
mesmo saindo como perdedor após mais uma rodada de videogame
com ela e sabendo que precisaria pensar em uma surpresa
grandiosa para o seu aniversário. Norah não me deixaria esquecer
daquilo.
Deixei o seu quarto, tomei um banho e caí na cama. Acordei
com o despertador e a sensação de que a ressaca moral não era tão
ruim assim. Eu aceitaria perder mil vezes para Norah, apenas para
ver aquele sorriso bobo e alegre em seu rosto pelo resto da vida.
Realmente me importava com aquela garota, de uma forma
como nunca me importei com qualquer outra mulher em minha vida.
Encontrei uma mensagem da minha mãe assim que peguei o
celular. Ela informou que minha avó passara bem a noite e que
acordara disposta, o que me fez lembrar do que a senhorinha
esperta aprontara. Dei um pulo da cama e tomei uma chuveirada
para despertar, saindo do quarto em seguida. Encontrei Logan na
cozinha, suado e com roupa de academia.
— Avalon te expulsou tão cedo assim? — perguntei.
— No meu relógio é quase meio-dia — disse ele, dando uma
olhada para algo atrás de mim. Segui a direção para onde estava
olhando e não vi nada.
— O que foi?
— Pensei que estivesse acompanhado quando vi aquele monte
de garrafa de cerveja vazia na mesinha de centro.
— Bebi com a sua irmã — falei, vendo-o arquear uma
sobrancelha. — E perdi para ela de novo no videogame.
Abri a geladeira a tempo de ouvir a gargalhada de Logan ecoar
pela cozinha.
— Não acredito que perdi isso. É sempre um evento quando
vocês jogam juntos.
— Estou feliz por você e Ben não estarem aqui, ninguém
precisava ver a minha derrota.
— Eu discordo, queria muito ter visto isso. — Logan agarrou a
garrafa de isotônico que joguei para ele e abri outra para mim. — Só
você mesmo para passar uma noite de sexta-feira jogando com a
minha irmã.
Pensei em tudo o que havia acontecido ontem. Se Logan
imaginasse...
— Passar um tempo com Norah é sempre um privilégio.
— Sim, eu sei disso, minha irmã é a melhor pessoa que
conheço. — Ele bebeu o isotônico quase todo de uma só vez. — E
isso me lembra de que eu preciso passar mais tempo com ela.
— Sim, precisa mesmo. Talvez você consiga sondar o que ela
quer de aniversário.
— Aniversário? Como assim? Estamos indo para fevereiro e
minha irmã só faz aniversário em junho.
— Eu sei, mas nós fizemos uma aposta ontem. Se eu
perdesse, teria que fazer uma surpresa no aniversário dela. Você
sabe que eu perdi, agora, preciso pagar a aposta. — Joguei a
garrafa de isotônico no lixo após dar o último gole. — Como meu
melhor amigo, você precisa me ajudar com isso.
Logan voltou a rir e se aproximou de mim apenas para dar
dois tapinhas em meu ombro.
— Vou ver o que posso fazer, mas não prometo nada... — O
filho da mãe começou a se afastar, mas manteve um olho sobre
mim. — Sabe como é, eu gosto de ver meus amigos sofrerem, é
sempre muito divertido.
— Vai se foder, estrelinha dourada. — Logan me soprou um
beijo e continuou a rir da minha cara conforme subia a escada. — E
cuide da sua irmã, ela vai acordar de ressaca.
— Depois de ter feito uma aposta com você e te derrotado,
com certeza cuidarei dela. Minha irmã merece o mundo.
Dei o dedo do meio para ele, mesmo sabendo que não
conseguiria ver, pois já estava praticamente no topo da escada, e
sorri. Eu amava a minha vida e a minha amizade com Logan. Não
faria nada que pudesse colocar nossa irmandade em risco.
Logan provavelmente foi passar o dia com Avalon, pois não foi
para casa conosco e simplesmente não atendia qualquer ligação
minha ou respondia minhas mensagens. Decidi seguir o conselho de
Benjamin e dar tempo para ele, mas começou a anoitecer e fui
ficando ansioso. Logan e eu nunca brigamos de verdade. Éramos
amigos literalmente desde o nascimento, nossas avós eram amigas,
sempre estudamos na mesma escola, ele era o irmão que nunca
tive. Ser ignorado por ele daquela forma era algo que eu não sabia
direito como lidar.
Norah chegou em casa com o céu já escuro depois de ter
passado a tarde ensaiando para o teste da peça de teatro na casa
de John e fiquei esperando pelo que iria falar. Mason com certeza
devia ter conversado com ela e contado o que acontecera na
academia, no entanto, não vi nada diferente em sua expressão.
Bom, nada diferente do seu novo habitual, sempre um pouco
distante de mim.
— O que houve? — Ela deixou o casaco no gancho atrás da
porta e se aproximou. — Parece tenso.
Ela não sabia de nada. Mason não contara nada para ela? Abri
a boca para responder, mas a porta de casa se abriu de repente e
Logan entrou, seguido por Avalon. Eu me ergui do sofá e o observei
passar pela irmã como se mal a tivesse visto e parar bem na minha
frente com a expressão fechada. Ele ainda estava com raiva de mim,
o que era compreensível.
— Desde quando você se tornou um traidor do caralho, porra?!
— Logan... — Avalon se aproximou e tocou no ombro do
namorado, mas o QB não tirou os olhos de cima de mim. — Lembre-
se do que conversamos.
— Sei muito bem o que conversamos, mas agora chegou a vez
de conversar com esse mentiroso!
— Ei! — Norah correu em nossa direção, quase parando entre
nós dois. — O que está acontecendo? Por que está falando com
James assim?
Logan finalmente se virou para Norah e ela deu um passo para
trás ao ver a raiva em seus olhos. Aquilo me deixou puto e tirou
parte da ansiedade que eu sentia.
— Com você eu converso depois!
— Você não vai ser um merda com ela, Logan! — falei,
entrando na frente de Norah. — Desconte a sua raiva em mim.
— Mas é em você mesmo que vou descontar! Você mentiu
para mim, porra!
— Sobre o quê? — Norah perguntou baixinho parando ao meu
lado, mas eu nem precisava olhar para ela para ter certeza de que a
garota já sabia a resposta.
— Sobre você e Mason! — Logan cuspiu, apontando para a
irmã e depois para mim. — Quantas vezes eu te perguntei se sabia
algo sobre os dois e você disse que não, James? Mentiu na minha
cara, porra!
— Sim, eu fiz isso. Menti para você, Logan — confidenciei sem
raiva em meu tom de voz, pois sabia que havia errado. — Mas foi
por uma boa causa...
— Boa causa? — Logan riu com escárnio. — Existe mentira
boa agora?
— Você mentiu que estava namorando com Avalon e conheceu
a mulher da sua vida, então, sim, existe mentira boa — Norah
rebateu e Logan trincou a mandíbula.
— Isso é diferente!
— Não, não é diferente! Norah pediu a minha ajuda e eu dei.
Amo você, Logan, sabe disso, mas também amo muito a sua irmã e
estarei do lado dela sempre que precisar de mim. Porque eu posso
não ser nada dela, como você mesmo disse para Mason hoje de
manhã, mas sentimento é algo que não se compra, é algo que não
tem nada a ver com sangue. Pensei que soubesse disso, afinal,
sempre afirmou que éramos irmãos.
— Irmãos não mentem um para o outro — Logan murmurou
entredentes, parecendo abalado, mas não querendo dar o braço a
torcer.
— Tem razão, não estou aqui para fingir que não errei. Sim, eu
errei em mentir para você, mas não me arrependo. — Olhei para
Norah e vi seus olhos cheios de lágrimas em cima de mim. Tentei
sorrir para ela. — Norah parece feliz. Ela está vivendo pela primeira
vez, está se aventurando, se apaixonando, e eu faria tudo de novo,
ainda que machucasse a mim mesmo ao saber que estaria mentindo
para você, apenas para vê-la desse jeito. Não mudaria nada do que
fiz.
Norah ofegou e algumas lágrimas caíram pela sua bochecha
sem que ela precisasse piscar. Senti vontade me aproximar dela e
secá-las, de socar Logan por fazê-la chorar, de tirá-la dali e
simplesmente ficar sozinho com ela, em qualquer lugar. Éramos bons
juntos, fosse apenas conversando, sentados lado a lado em uma
sala de cinema ou jogando videogame, onde ela sempre gargalhava
ao vencer de mim. Eu sentia falta daquilo. Porra, eu sentia falta de
tanta coisa!
Sentia falta dela. Caramba, sentia uma falta absurda de Norah
em minha vida.
Mas ela não era minha. Nunca foi e jamais seria.
— Bom saber que você mentiria de novo se fosse necessário.
Fico me perguntando que tipo de amizade é essa onde mentiras são
aceitas!
Norah se virou para Logan e o encarou de cima a baixo, seu
rosto passando da palidez para a vermelhidão em poucos segundos.
— Não posso acreditar que mesmo depois de ouvir tudo isso,
mesmo depois de ter conhecido Avalon, de estar feliz em um
relacionamento, você continua sendo tão egoísta, Logan!
— Egoísta? — Logan pareceu ofendido e Avalon tentou falar
alguma coisa, mas ele a interrompeu. — Eu estou sendo egoísta?!
Meu amigo é um traidor e minha irmã não confia em mim para
contar as coisas, mas eu sou egoísta?!
— Já parou para pensar por que eu não confio em você? —
Norah perguntou, dando um passo para perto dele. — Será que em
algum momento você realmente olhou para mim ou sempre se
escondeu atrás desse discurso idiota de que só queria me proteger?
— Eu quero proteger você! Sei como são os homens, Norah, e
você é importante demais para mim, não quero nunca que se
machuque.
— Mas você me machucou e nem mesmo percebeu! — Ela
gritou e eu senti vontade de abraçá-la. Sua mágoa vinha do fundo
da alma. — Nunca olhou para mim como uma pessoa, sempre como
a sua irmãzinha, nunca levou em consideração o que eu queria, o
que eu pensava! Parece que você nunca olhou para mim de verdade,
Logan, e eu nunca pensei em julgá-lo sobre isso. Você sempre viveu
em um impasse com o papai, depois, nós perdemos a nossa mãe, e
eu abri mão de tudo para estar do seu lado. Nunca me importei
sobre isso. Passei o último ano ignorando tudo para cuidar de você,
para te manter vivo, porque não suportaria perdê-lo! Eu senti medo
de que você me deixasse também, como a mamãe me deixou. Senti
medo de que morresse.
— Norah...
Logan estava pálido, boquiaberto, e quando tentou tocar em
Norah, ela deu um passo para trás.
— Quando Avalon entrou em nossas vidas e eu vi que ela
estava conseguindo acessar uma parte do seu coração que eu
jamais conseguiria, fiquei feliz. E quando percebi que vocês se
amavam e que você não corria mais riscos de fazer uma besteira, eu
me senti em paz, mas também me senti perdida. Qual era o sentido
da minha vida, afinal? Sempre me vi entre você e meu pai, fosse
antes da morte da mamãe ou depois, sempre me vi agindo mais
como a sua irmã mais velha do que o contrário. Então, de repente,
eu já não precisava mais ir a festas apenas para poder tomar conta
de você ou acordar no meio da madrugada para te resgatar bêbado
de algum lugar. Pela primeira vez na vida, eu podia viver por mim,
mas não sabia como fazer isso, Logan. Sempre vivi às suas sombras
e nunca me importei, de verdade, mas entendi que eu queria
começar a viver por mim e James me ajudou a fazer isso.
Norah se virou para mim e sorriu em meio às lágrimas,
tomando a minha mão.
— Recorri a ele porque você me sufocou, não com a sua dor
ou o seu luto, nunca com isso, mas com a sua proteção exagerada.
Eu amo o seu lado protetor, mas não preciso me esconder atrás
dele. Eu sou uma mulher adulta, que simplesmente quer viver. Eu
posso errar e me machucar, isso faz parte da vida, ninguém pode
evitar, nem mesmo você. Preciso que entenda que eu quero e
mereço ser livre, e não posso ser livre se você continuar querendo
me prender. — Norah soltou a minha mão e se aproximou de Logan,
secando uma lágrima que acho que nem mesmo ele percebeu que
havia caído. — Deixe-me encontrar um outro sentido para a minha
vida que vai além de você, Logan. Porque até mesmo quando tenta
me proteger, está pensando mais em você do que em mim.
Norah se afastou e simplesmente subiu os degraus que a
levariam para o seu quarto. Eu a acompanhei com o olhar até ela
sumir de minhas vistas, querendo ir até ela e simplesmente abraçá-
la, tomar aquela dor que eu nem imaginava que ela sentia.
Logan se sentou no sofá e coçou os olhos com força para
tentar impedir que as lágrimas voltassem a cair, mas foi em vão.
Avalon se sentou ao lado dele e acariciou as suas costas com pesar.
— Sou um irmão de merda! — Ele resmungou com a voz rouca
e embargada, dando um soco de leve na própria cabeça. — Sou um
irmão ruim pra caralho!
— Claro que não, Logan. Você é um bom irmão, só que errou
como qualquer outra pessoa é capaz de errar — Avalon falou.
— Errei a minha vida toda, pelo visto! — O QB riu sem humor.
— Como não percebi como Norah se sentia? Como não dei valor aos
sentimentos dela? — Seus olhos vermelhos se chocaram com os
meus. — Você tem razão, afinal, sempre teve. Sangue não quer
dizer nada. Você é para Norah um irmão bem melhor do que eu. —
Logan se ergueu e, para a minha surpresa, tocou a minha nuca
antes de encostar a testa na minha. — Obrigado por isso. Obrigado
por ter visto o que eu não vi e por ter cuidado tão bem dela. Eu te
devo um pouco mais da minha vida agora.
— Pare de besteira, Norah te ama e você sempre será o
melhor irmão do mundo para ela.
— Não como você. — Não havia inveja em sua voz, apenas um
pesar que apertou o meu coração.
Logan estendeu a mão para Avalon e foi com ela em direção à
escada. Eu os acompanhei com o olhar, assim como acompanhei
Norah, e me senti um merda quando me vi sozinho no meio da sala.
Porque Logan estava errado.
Nunca fui como um irmão para Norah, porque dentro do meu
peito não havia mais qualquer sentimento fraternal por ela.
Eu amava Norah, mas de uma forma completamente diferente
do que o meu melhor amigo imaginava.
Duas batidas na porta do meu quarto me fizeram erguer a
cabeça do travesseiro, onde havia me enterrado desde o momento
em que me afastei de Logan. Engoli em seco, pensando que poderia
ser o meu irmão, mas a voz do outro lado me tranquilizou.
— Sou eu, James. Posso entrar?
Limpei as lágrimas que ainda insistiam em descer e respondi
que sim. James entrou em meu quarto com o semblante abatido,
mas tentou sorrir. Eu me senti ainda mais culpada ao ver a tristeza
em seus olhos, pois com certeza James era a última pessoa que
merecia estar no meio de tudo aquilo. Ele se aproximou de mim e se
sentou ao meu lado na cama, puxando a minha mão e entrelaçando
os nossos dedos.
Por um momento, ficamos apenas em silêncio, sua companhia
diminuindo gradativamente o meu nervosismo. Parecia bobagem,
mas senti medo durante aquele tempo em que me obriguei a ficar
afastada de James. Medo de perdermos a nossa amizade, o nosso
companheirismo, porque eu não fazia ideia de como lidar com a
tormenta que ele causava em meu coração.
— Sinto muito. — Fui a primeira a falar, mas não tive coragem
de encará-lo enquanto as palavras deixavam a minha boca. — Sinto
muito por ter feito aquela proposta idiota para você, por ter pedido
para que mentisse para o meu irmão. Sei o quanto Logan é
importante na sua vida, o quanto você o ama, e agora estão
brigados por minha causa.
James tocou em meu queixo, um costume que tinha desde
quando eu era mais nova, e me fez olhar em seus olhos. Vi que ele
não me culpava, mas aquilo não fez com que o sentimento deixasse
o meu peito.
— Não se desculpe, baixinha. Não ouviu nada do que eu disse
para Logan? Eu faria tudo de novo, Norah, mil vezes, apenas para te
ver feliz.
Meu queixo tremeu e me senti ainda pior, porque eu não
estava feliz de verdade. Não conseguia ficar, ainda que tentasse
muito, porque entendi que não era por Mason que eu estava
apaixonada. Tive a real noção dos meus sentimentos quando James
falou tudo aquilo para Logan olhando em meus olhos.
Eu vi aquele homem lindo, alto, forte, com um coração
enorme, gentil e amoroso, simplesmente enfrentando o seu melhor
amigo de infância, seu irmão de alma, por mim. Afirmando que me
amava e que não se arrependia de ter me ajudado, mesmo sabendo
que colocaria em risco a sua relação com Logan. Meu coração...
Pensei que ele fosse saltar pela minha garganta, de tão rápido que
batia. Ele parecia gritar em meu peito, berrar com uma força que
nunca ouvi antes, que nunca senti antes, e exigia que eu o ouvisse.
Não me deixou mais ignorá-lo. Esfregou em minha cara que eu
amava James como homem e tirou a venda dos meus olhos.
Ter aquela percepção, aquela certeza, me deixou abalada, me
fez repensar em toda a minha vida até aquele momento. E me fez
querer chorar, porque eu sabia que um relacionamento entre mim e
James era impossível. Ele me amava como uma irmã e, mesmo se
não amasse, havia Logan em nosso caminho. Se meu irmão agiu
daquela maneira apenas porque James me ajudou a chegar perto de
Mason, o que faria se sonhasse que eu estava apaixonada pelo seu
melhor amigo?
Não queria imaginar. Não queria pensar naquilo.
— Eu o agradeço por isso — falei, levando sua mão até a
minha boca e dando um beijo nos nós dos seus dedos. — Mas não
quero que faça mais nada por mim. Não quero nunca mais colocar
em risco a sua amizade com Logan, eu sei o quanto se amam, não
podem perder tudo o que construíram até aqui por minha causa.
— Não vamos perder nada, seu irmão é cabeça-dura, mas
você deu um choque de realidade nele com tudo o que falou. —
James soltou a minha mão e passou o braço pelos meus ombros até
ter a minha cabeça encostada em seu peito. Seu coração batia tão
forte quanto o meu. — Seu discurso foi devastador. Não imaginava
que se sentia daquele jeito.
Mordi o lábio para impedir que mais lágrimas se derramassem,
porque não aguentava mais chorar. Foi em vão, no entanto, pois elas
se acumularam em meus olhos e caíram mesmo assim.
— Acho que nem eu tinha dimensão do que realmente sentia.
Eu apenas... explodi. Amo meu irmão, James, amo profundamente,
mas estava tão cansada. Venho me sentindo cansada há muito
tempo e nem percebi.
— Você passou por muita coisa no último ano, perdeu a sua
mãe e não conseguiu processar direito o luto, focou em Logan e
esqueceu de cuidar de si mesma, mas isso acaba agora. — James
deu um beijo longo em minha testa e solucei em meio ao choro.
Minha alma se aqueceu por ele não ter pedido para que eu parasse
de chorar. — Está na hora de pensar em você, Norah, exatamente
como vem fazendo. Precisa viver a sua vida sem culpa, por mais que
seja difícil após essa briga com o seu irmão. Acredito que Logan
finalmente entendeu que a proteção dele te sufocava e vai tentar
mudar.
— E você e ele? E se a relação de vocês nunca mais voltar a
ser a mesma? Nunca vou me perdoar se isso acontecer, James.
— Acho que seu irmão já não está tão bravo comigo, antes de
subir, me agradeceu por ter cuidado de você. — Havia algo diferente
em seu tom de voz ao falar aquilo, mas não consegui identificar ao
certo o que era. Mal conseguia lidar com os meus sentimentos
naquele momento. — Só espero que tudo isso tenha valido a pena,
que Mason seja o cara certo para você. Se aquele babaca sequer
pensar em te machucar, eu juro por Deus, Norah, que vou
arrebentar a cara dele, acabar com a sua carreira e fazer com que se
arrependa do dia em que pensou em chegar perto de você.
Ergui-me do peito de James e fiquei surpresa ao ver o brilho
da raiva em seus olhos. O wide receiver era uma das pessoas mais
calmas que eu conhecia. Pouca coisa era capaz de realmente tirar
James do sério, por isso, não entendi de onde surgira aquele
sentimento tão feroz dentro dele.
— Por que está falando isso? Descobriu algo sobre Mason que
eu não sei?
— Não, não descobri nada sobre ele, mas essa é uma
promessa que estou fazendo para você agora. — James tomou meu
rosto em suas mãos, limpando delicadamente as minhas lágrimas
com o polegar. — Não serei como Logan, jamais irei te sufocar ou
cortar as suas asas, quero que seja livre, quero que viva cada
experiência que quiser, porque não há no mundo uma pessoa que
mereça mais isso do que você. — Os olhos dele ficaram rasos de
lágrimas. — Mas sempre estarei por perto, cuidando de você, sendo
o homem que você precisa que eu seja. Seu amigo, seu irmão,
qualquer coisa que quiser de mim, você terá, entende isso?
Eu ofeguei e, por um segundo de loucura, eu quase implorei
para que ele simplesmente fosse o meu homem. Meu homem e de
mais ninguém, mas não podia fazer aquilo, não tinha aquele direito
e não suportaria ouvir de James que ele não me via como nada além
de sua irmã mais nova.
— Você entende, Norah? — perguntou mais uma vez,
sondando os meus olhos.
— Sim — sussurrei em resposta, segurando seus pulsos. Eram
grossos demais, meus dedos não se encontravam ao redor deles. —
Sim, eu entendo. Sempre estarei do seu lado também, James,
sendo... sendo a sua irmã. — Doeu intensamente dentro de mim
dizer aquilo. — Sua melhor amiga.
James fechou os olhos por um segundo e respirou fundo,
como se absorvesse minhas palavras. Quando voltou a erguer as
pálpebras, um sorrisinho bonito se abriu no canto dos seus lábios.
— Para sempre? — perguntou.
— Sim, para sempre.
O jogador me puxou novamente de encontro ao seu peito e foi
a minha vez de fechar os olhos enquanto o abraçava com força.
Respirei fundo, querendo guardar o seu cheiro dentro de mim, o
calor do seu corpo em minha pele, o toque gentil das suas mãos
grandes em minhas costas, porque não sabia quando teria outra
oportunidade de estar tão perto e íntima de James outra vez.