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RECURSO ESPECIAL Nº 1.097.

266 - PB (2008/0222166-4)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO


R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
ADVOGADO : KELLY NASCIMENTO DE LUNA E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDOBERTO SANTIAGO DA SILVA
ADVOGADO : VALTER DE MELO E OUTRO(S)
EMENTA

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CARTA


REGISTRADA. EXTRAVIO DE CORRESPONDÊNCIA. DANO
MORAL IN RE IPSA. CONFIGURAÇÃO. RECURSO
DESPROVIDO.
1. O extravio de correspondência registrada acarreta dano moral in re
ipsa.
2. Tendo o consumidor optado por enviar carta registrada, é dever dos
Correios comprovar a entrega da correspondência, ou a impossibilidade
de fazê-lo, por meio da apresentação do aviso de recebimento ao
remetente. Afinal, quem faz essa espécie de postagem possui provável
interesse no rastreamento e no efetivo conhecimento do recebimento da
carta pelo destinatário, por isso paga mais.
3. Constatada a falha na prestação do serviço postal, é devida a
reparação por dano moral.
4. Recurso especial desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,


decide a Quarta Turma, por maioria, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto
divergente do Ministro Raul Araújo. Vencido o relator, Ministro Luis Felipe Salomão e o Ministro
Antonio Carlos Ferreira, que davam provimento ao recurso especial. Votaram vencidos os Srs.
Ministros Luis Felipe Salomão e Antonio Carlos Ferreira. Votaram com o Sr. Ministro Raul
Araújo os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti e Marco Buzzi.
Brasília, 07 de fevereiro de 2013(Data do Julgamento)

MINISTRO RAUL ARAÚJO


Relator

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 1 de 6
RECURSO ESPECIAL Nº 1.097.266 - PB (2008/0222166-4)

RECORRENTE : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS


ADVOGADO : KELLY NASCIMENTO DE LUNA E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDOBERTO SANTIAGO DA SILVA
ADVOGADO : VALTER DE MELO E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Hildoberto Santiago da Silva ajuizou ação de indenização por danos morais


em face da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Narra que, em 27 de janeiro de
2006, procedeu à postagem, em uma agência dos Correios situada no município de João
Pessoa, de carta registrada, endereçada ao CEP 25.036-210, tendo pago o valor, para
postagem, de R$ 3,05 (três reais e cinco centavos). Informa que houve extravio da carta que
continha procuração por instrumento público outorgando poderes de mandato a Alcir Dutra
Soares, para assuntos relativos à indenização referente à desapropriação de lote situado no
município de Duque de Caxias - RJ. Sustenta que teve que encaminhar nova procuração para
viabilizar a continuidade das negociações. Afirma que "o que se viu da parte da ré, foi ato de
desleixo, de omissão e de negligência, bem como de alta culpabilidade em detrimento do
direito do consumidor e de cidadania". Requer compensação por danos morais no valor
correspondente a 100 (cem) vezes o valor do salário mínimo vigente por ocasião da
propositura da ação.
O Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba julgou
improcedentes os pedidos formulados na inicial.
Interpôs o autor apelação para o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que
deu provimento ao recurso e fixou a indenização em R$1.000,00, em decisão assim
ementada:
CIVIL. CORREIOS. CARTA REGISTRADA. ENTREGA NÃO COMPROVADA.
DANO MORAIS. INDENIZAÇÃO.
- Se os Correios não comprovam a efetiva entrega de carta registrada
remetida pela vítima que pagou tarifa especial para possibilitar o
rastreamento pelo próprio órgão de postagem, reconhece-se a falha do
serviço prestado a ensejar a devida reparação a título de dano moral.
- Apelação provida.

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Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.
Interpôs o réu Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos recurso especial,
com fundamento no artigo 105, inciso III, da Constituição Federal, sustentando divergência
jurisprudencial e violação aos artigos 17 e 33 da Lei Postal.
Alega que o dano a ensejar indenização deve ser verossímil, real e efetivo, não
pairando dúvidas sobre sua existência.
Argumenta que, para a configuração da obrigação de reparar, deve existir ato
contrário ao direito, um dano e relação de causalidade entre o ato e o dano, não havendo
quaisquer indícios de haver o autor sofrido constrangimento, ofensa à honra ou imagem, por
isso o pleito é improcedente.
Sustenta que o recorrido não fez declaração de valor do conteúdo postado,
propiciando fosse apurado o prejuízo efetivamente suportado, embora existisse campo
específico para isso. Argumenta que não houve danos morais na utilização do serviço postal,
na modalidade "sem declaração de valor" e que não é cabível o arbitramento do pagamento
por extravio da carta, além dos valores fixados na norma da empresa.
Acena que o artigo 33, § 2º, da Lei Postal prevê que os prêmios são fixados
com base no valor declarado nos objetos postais.
Não houve oferecimento de contrarrazões.
O recurso especial foi admitido.
É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.097.266 - PB (2008/0222166-4)


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VOTO VENCIDO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):


2. A principal questão controvertida consiste em saber se, de fato, conforme
entendimento perfilhado pela Corte de origem, o mero extravio de carta, por si só, ocasiona
danos morais.
A sentença consignou:
Cuida-se de Ação Ordinária movida por Hildoberto Santiago da Silva em
face da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, visando ao
pagamento pela Ré da quantia de R$ 35.000,00, correspondente a cem
salários mínimos, a título de indenização por danos morais.
O Autor afirma o seguinte:
1) Em 27.01.2006, procedeu à postagem de carta registrada nº
126345995-PB com destino ao CEP nº 25036210, tendo pago o valor de R$
3,05, na Agência da ECT nº 30904897, situada no Bairro do Valentina
Figueiredo, em João Pessoa.
2) A correspondência continha procuração pública lavrada em 26.01.2006
pelo Cartório de Registro Civil da Comarca de Itabaiana, e passada pelo
Autor em favor de Alcir Dutra Soares, outorgando-lhe poderes para tratar
de indenização relativa à desapropriação do lote nº 40 da quadra 107,
localizado no Município de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, e ainda de
todo e qualquer assunto relacionado ao Autor junto ao Banco Bradesco S/A,
Agência nº 2108-3.
3) Alcir Dutra Soares informou posteriormente ao Autor que não pôde
representá-lo junto aos órgãos públicos no Estado do Rio de Janeiro, uma
vez que não havia recebido a procuração pública.
4) Procurou a Agência da ECT através da qual enviara a correspondência
com a procuração pública e aquela lhe informou que não constava
registros da postagem.
Sustenta que o extravio da correspondência é causa de
responsabilização civil por danos morais, porquanto a procuração
pública destinava-se a representá-lo em procedimento de desapropriação
de imóvel.
[...]
O Autor pretende a indenização por danos morais em razão de extravio de
correspondência, afirmando que enviou, através da ECT, carta registrada
de João Pessoa com destino ao Estado do Rio de Janeiro, contendo
procuração pública por ele outorgada ao destinatário.
[...]
Observo, em primeiro lugar, que não há registro na ECT de extravio da
correspondência ou de reclamação do autor relativamente a eventual
extravio (fls. 34).
Em segundo lugar, o Autor não logrou demonstrar que teria havido o
extravio, nem o conteúdo da correspondência, em desacordo com o

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artigo 333, inciso I, do CPC.
[...]
ISTO POSTO, julgo improcedente o pedido.
Condeno o Autor ao pagamento em favor da ECT da quantia de R$
3.500,00 correspondente a 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa
(R$ 35.000,00), ficando sobrestada a execução dos honorários, pelo prazo
de 5 (cinco) anos, enquanto persistir a condição de hipossuficiência do
Autor como beneficiário da gratuidade judiciária... (fls. 53-58)

O acórdão recorrido, por seu turno dispôs:


Na inicial, o autor alega que postou carta registrada nos Correios , em
27/01/2006, com destino à cidade do Rio de Janeiro (fl. 10), contendo uma
procuração pública por ele outorgada a amigo com intuito de representá-lo
na Prefeitura Municipal de Duque de Caxias para cuidar da desapropriação.
Por sua vez, entendeu o juiz a quo que o autor nã ose desincumbiu a
contento do seu ônus de provar o extravio da carta, nem que o conteúdo da
correspondência tratar-se-ia realmente de procuração pública (fl. 11),
acrescentado que o autor não formalizou reclamação à ré (fl. 34).
No entanto, penso que o fato narrado consubstancia conduta reprovável
por parte da mencionada empresa pública federal que causou problema ao
particular vitimado, uma vez que se reconhece a falha na prestação do
serviço a ensejar devida compensação a título de dano moral.
Ora, não importa se o autor fez ou não uma reclamação administrativa ou
qual o conteúdo da encomenda. O cerne da questão gira em torno
tão-somente do seguinte fato: uma carta registrada foi remetida pelo autor,
cujo recebimento pelo destinatário não foi comprovado pela ré.
Com efeito, a carta registrada é um serviço prestado pela ECT que
assegura a confirmação da entrega através de rastreamento pelo próprio
órgão de postagem, por isso a tarifa cobrada para o procedimento é mais
cara do que para o envio de uma carta simples (vide
http://www.correios.com.br).
Assim, não obstante a oportunidade de comprovar em juízo a efetiva
entrega da correspondência ao destinatário ou qualquer outro motivo que o
eximisse da responsabilidade, a apelada apenas tergiversa na contestação,
sem cumprir o disposto no art. 333, II, do CPC.
A ausência de entrega da carta, poo si só, caracteriza o dano moral. É que
a responsabilidade civil do Estado é objetiva e só se afasta se comprovada
a culpa exclusiva da vítima, o que não ocorre no caso em testilha, tendo em
vista que o apelante não deu causa ao extravio.
O dano moral independe de prova, porque presumido, bastando apenas a
demonstração do ato ilícito. Não se exige a comprovação de algo que se
opera no plano psicológico do lesado. Prescinde de análise subjetiva,
porquanto se configura com a simples violação.
O magistrado, portanto, ao fixar a reparação pecuniária, norteia-se em
conformidade com os critérios doutrinários, tais como: o fato ofensivo
propriamente dito, a intensidade do abalo suportado pelo ofendido e as
condições socioeconômicas das partes.
No tocante ao quantum indenizatório, penso, pois, que o valor pretendido
(cem salários mínimos) é exorbitante, não se afinando com as finalidades
retributiva, punitiva e pedagógica da indenização, devendo ser arbitrado em
observância ao princípio da razoabilidade.
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Diante do exposto, dou provimento à apelação, para julgar procedente a
ação e condenar a ré a indenizar R$ 1.000,00 (um mil reais) ao autor a
título de dano moral e pagamento de honorários advocatícios no valor de
R$ 300,00 (trezentos reais). (fls. 88 e 89)

3. O artigo 17 da Lei Postal, dispositivo tido por violado, dispõe:


Art. 17º - A empresa exploradora ao serviço postal responde, na forma
prevista em regulamento, pela perda ou danificação de objeto postal,
devidamente registrado, salvo nos casos de:
I - força maior;
II - confisco ou destruição por autoridade competente;
III - não reclamação nos prazos previstos em regulamento.

Destarte, embora a responsabilidade dos Correios seja objetiva, não parece


adequado o entendimento, perfilhado pela Corte de origem, de que o extravio de
correspondência, por si só, acarreta dano moral presumido - prescindindo, para seu
reconhecimento, da efetiva demonstração do dano.
É que os incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal - fundamentos
jurídicos primaciais, em se tratando de responsabilidade civil por danos extrapatrimoniais-,
consagram o direito à compensação por danos morais, correlacionando-os à violação dos
direitos da personalidade:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;

Dessarte, o direito à reparação exsurge de condutas que ofendam direitos da


personalidade, bens tutelados que não têm, per se, conteúdo patrimonial, mas extrema
relevância conferida pelo ordenamento jurídico, quais sejam: higidez física e psicológica, vida,
liberdade, privacidade, honra, imagem, nome, direitos morais do autor de obra intelectual
(v.g., direito de paternidade e integridade da obra) .
Desse modo, na verdade, como bem leciona a abalizada doutrina, o direito
tutela a personalidade, impondo sanção ao causador do dano e compensação ao lesado,
visto que, como bem observa Mazeaud e Mazeaud, de regra, não há possibilidade de se
"apagar os efeitos da lesão".
Nessa esteira, consoante vem reconhecendo doutrina e jurisprudência, mero

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aborrecimento, contratempo, mágoa - inerentes à vida em sociedade -, ou excesso de
sensibilidade por aquele que afirma dano moral são insuficientes à caracterização do abalo
moral, tendo em vista que esta depende da constatação, por meio de exame objetivo e
prudente arbítrio do magistrado, da real lesão a direito da personalidade daquele que se diz
ofendido:
O que configura e o que não configura o dano moral? Na falta de critérios
objetivos, essa questão vem se tornando tormentosa na doutrina e na
jurisprudência, levando o julgador a situação de perplexidade.
Ultrapassadas as fases da irreparabilidade do dano moral e da sua
inacumulabilidade com o dano material, corremos, agora, o risco de
ingressar na fase da sua industrialização, onde o aborrecimento banal ou
mera sensibilidade são apresentados como dano moral, em busca de
indenizações milionárias.
Este é um dos domínios onde mais necessárias se tornam as regras da boa
prudência, do bom-senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa
ponderação das realidades da vida. Tenho entendido que, na solução
dessa questão, cumpre ao juiz seguir a trilha da lógica do razoável, em
busca da concepção ético-jurídica dominante na sociedade. Deve tomar por
paradigma o cidadão que se coloca a igual distância do homem frio,
insensível, e o homem de extrema sensibilidade.
"A gravidade do dano - pondera Antunes Varela - há de medir-se por um
padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as
circunstâncias de cada caso), e não a luz de fatores subjetivos (de uma
sensibilidade particulamente embotada ou especialmente requintada). Por
outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano
deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação
de ordem pecuniária do lesado" (Das obrigações em geral, 8ª ed., Almedina,
p. 617).
Dissemos linhas atrás que dano moral, à luz da Constituição vigente,
nada mais é do que agressão à dignidade humana. Que consequências
podem ser extraídas daí? A primeira diz respeito à própria configuração do
dano moral. Se dano moral é agressão à dignidade humana, não basta para
configurá-lo qualquer contrariedade.
Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral, a
dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade,
interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo,
causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar.
Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade
exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de
fazerem parte do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os
amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e
duradouras a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo.
Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral,
ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais
triviais aborrecimentos.
Dor, vexame, sofrimento e humilhação são consequência e não causa.
Assim como a febre é o efeito de uma agressão orgânica, dor, vexame e
sofrimento só poderão ser considerados dano moral quando tiverem por
uma causa uma agressão à dignidade de alguém.
Como julgador, há mais de 35 anos, tenho utilizado como critério aferidor do
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dano moral se, no caso concreto, houve alguma agressão à dignidade
daquele que se diz ofendido (dano moral em sentido estrito e, por isso, o
mais grave) ou, pelo menos, se houve alguma agressão, mínima que seja, a
um bem integrante da sua personalidade (nome, honra, imagem, reputação
etc). Sem que isso tenha ocorrido, não haverá que se falar em dano moral,
por mais triste e aborrecido que alega estar aquele que pleiteia a
indenização. (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabildiade
Civil. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2010, ps. 86-87)
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De maneira mais ampla, pode-se afirmar que são danos morais que são
danos morais os ocorridos na esfera da subjetividade, ou no plano
valorativo da pessoa na sociedade, alcançando os aspectos mais íntimos da
personalidade humana... Derivam, portanto, de "práticas atentatórias à
personalidade humana" (STJ, 3ª T., voto do Relator EDUARDO
RIBEIRO, no REsp 4.326, in BUSSADA, Súmulas do Superior Tribunal de
Justiça, São Paulo, Jurídica Brasileira, 1995, vol. I, p. 680). Traduzem-se em
"um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida" (STF, RE 69.754/SP,
RT 485/230) capaz de gerar "alterações psíquicas" ou "prejuízo à parte
social ou afetiva do patrimônio moral" do ofendido (STF, RE 116.381 - RJ,
BUSSADA, ob. cit., p. 6.873). (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Dano
Moral.7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, ps. 2 e 3)
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"O descumprimento de contrato pode gerar dano moral quando envolver


valor fundamental protegido pela Constituição Federal de 1988".
(Enunciado 411 da V Jornada de Direito Civil do CJF)

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Indaga-se quem pode buscar a reparação por danos morais.


Por evidente que, em uma primeira resposta, estão habilitados aqueles que
sofreram de frente os danos, e, assim, os lesados corporalmente, os
atingidos pela ofensa à honra, os acusados injustamente, os que tiveram
maculado o nome, os que sofreram aleijão ou deformidade, e são
portadores de deformidade física, os enquadrados como devedores sem o
ser, enfim, todas as pessoas que suportaram na própria alma ou no
espírito, na sua sensibilidade, nos recônditos de seu interior, o
sofrimento, a humilhação, a dor, a tristeza, o vexame, o desterro da
sociedade, a reprovação alheia.
Aparecem, em segundo lugar, aqueles sobre os quais refletem os
acontecimentos, embora outras as pessoas atingidas diretamente. Nesse rol
encontram-se os pais pela morte dos filhos, e estes pelo decesso daqueles;
o cônjuge que fica viúvo, ou o companheiro que perde seu par. Mesmo os
irmãos sofrem danos morais com a morte de um irmão. Os avós são
atingidos no falecimento dos netos. (RIZZARDO, Arnaldo.
Responsabilidade Civil. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 265)

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O dano moral não é a dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a
humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois esses
estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a consequência do
dano.
[...]
O direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles que
forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima
teria interesse reconhecido juridicamente. Por exemplo: se vemos alguém
atropelar outrem, não estamos legitimados para reclamar indenização,
mesmo quando esse fato nos provoque grande dor. Mas, se houver relação
de parentesco próximo entre nós e a vítima, seremos lesados indiretos.
Logo, os lesados indiretos e a vítima poderão reclamar a reparação
pecuniária em razão de dano moral, embora não peçam um preço para a
dor que sentem ou sentiram, mas tão somente, que se lhes outorgue um
meio de atenuar, em parte, as consequênias da lesão jurídica por eles
sofrida (Eduardo Zannoni, El dano en la responsabilidade civil, Buenos
Aires, Ed. Astrea, 1982, p. 234 e 235).
[...]
Para evitar excessos e abusos, recomenda Sérgio Cavalieri, com razão, que
só se deve reputar como dano moral "a dor, vexame, sofrimento ou
humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e
desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa,
irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral,
porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no
trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são tão intensas e duradouras, a ponto de romper o
equilíbrio psicológico do indivíduo" (Programa, cit., p. 78).
[...]
Exemplar o art. 496 do Código Civil português, verbis: "Na fixação da
indenização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua
gravidade, mereçam tutela do direito". Assim, somente o dano moral
razoavelmente grave deve ser indenizado. "O que se há de exigir como
pressuposto comum da reparabilidade do dano não patrimonial, incluído,
pois, o moral, é a gravidade, além da ilicitude. Se não teve gravidade o
dano, não se há pensar em indenização. De minimis non curat praetor"
(Pontes de Miranda, Tratado, cit., t. 26, p. 34-5, § 3.108, n. 2).
A propósito, decidiu o Superior Tribunal de Justiça que incômodos ou
dissabores limitados à indignação da pessoa e sem qualquer repercussão
no mundo exterior não configuram dano moral. (GONÇALVES, Carlos
Roberto. Responsabilidade Civil. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, ps.
650-652)

No mesmo sentido é a jurisprudência da Casa:


RESPONSABILIDADE CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO
ESPECIAL. CONCESSIONÁRIA PRESTADORA DE SERVIÇO DE
TELEFONIA. ENVIO DE COBRANÇAS PARA O ENDEREÇO DE HOMÔNIMA,
EM VIRTUDE DE A VERDADEIRA CLIENTE TER FORNECIDO
COMPROVAÇÃO DE RESIDÊNCIA INVERÍDICA. DANOS MORAIS.
INEXISTÊNCIA. REVISÃO DO ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE ORIGEM.
REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE.
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1. É tranquila a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de
que mero aborrecimento, mágoa ou excesso de sensibilidade por parte de
quem afirma dano moral, por serem inerentes à vida em sociedade, são
insuficientes à caracterização do abalo, visto que tal depende da
constatação, por meio de exame objetivo e prudente arbítrio, da real
lesão à personalidade daquele que se diz ofendido.
[...]
5. Recurso especial não provido.
(REsp 944308/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA,
julgado em 06/03/2012, DJe 19/03/2012)

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RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - INDENIZAÇÃO POR


DANOS MORAIS - IMÓVEL - DEFEITO DE CONSTRUÇÃO - INFILTRAÇÕES
EM APARTAMENTO - POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO - CONSTATAÇÃO,
PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS - LAMENTÁVEL DISSABOR - DANO
MORAL - NÃO CARACTERIZADO - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I - As recentes orientações desta Corte Superior, a qual alinha-se esta
Relatoria, caminham no sentido de se afastar indenizações por danos
morais nas hipóteses em que há, na realidade, aborrecimento, a que todos
estão sujeitos.
II - Na verdade, a vida em sociedade traduz, infelizmente, em certas
ocasiões, dissabores que, embora lamentáveis, não podem justificar a
reparação civil, por dano moral. Assim, não é possível se considerar meros
incômodos como ensejadores de danos morais, sendo certo que só se deve
reputar como dano moral a dor, o vexame, o sofrimento ou mesmo a
humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, chegando a causar-lhe aflição,
angústia e desequilíbrio em seu bem estar.
III - No caso, a infiltração ocorrida no apartamento dos ora recorrentes,
embora tenha causado, é certo, frustração em sua utilização, não justifica,
por si só, indenização por danos morais.
Isso porque, embora os defeitos na construção do bem imóvel tenham sido
constatados pelas Instâncias ordinárias, tais circunstâncias, não tornaram o
imóvel impróprio para o uso.
IV - Recurso especial improvido.
(REsp 1234549/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 01/12/2011, DJe 10/02/2012)

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Processual Civil. Recurso Especial. Ação de reparação por danos materiais
e compensação por danos morais. Inadimplemento de contrato. Cláusula
penal. Danos morais. Ausência de prequestionamento. Reexame de fatos e
interpretação de cláusulas contratuais. Inadmissibilidade.
[...]
- O mero inadimplemento contratual não acarreta danos morais.
Precedentes.
[...]
Recurso especial não provido.
Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 10 de 6
(REsp 803.950/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 20/05/2010, DJe 18/06/2010)

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RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. NOTIFICAÇÃO FEITA PELO


ESTABELECIMENTO BANCÁRIO A CORRENTISTA, COMUNICANDO-LHE O
INTENTO DE NÃO MAIS RENOVAR O CONTRATO DE ABERTURA DE
CRÉDITO. EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO. MERO
ABORRECIMENTO INSUSCETÍVEL DE EMBASAR O PLEITO DE
REPARAÇÃO POR DANO MORAL.
[...]
- Mero aborrecimento, dissabor, mágoa, irritação ou sensibilidade
exacerbada estão fora da órbita do dano moral.
Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 303396/PB, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA,
julgado em 05/11/2002, DJ 24/02/2003, p. 238)

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AGRAVO REGIMENTAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E


RESPONSABILIDADE CIVIL. PARA A DEMONSTRAÇÃO DO DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL, NOS TERMOS DO § 2º, DO ARTIGO 255 DO
REGIMENTO INTERNO DO STJ, É NECESSÁRIO O CONFRONTO ENTRE
TRECHOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO E O DAS DECISÕES APONTADAS
COMO DIVERGENTES. MERO DISSABOR NÃO É SUFICIENTE PARA
ENSEJAR OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR POR DANOS MORAIS. NOS
TERMOS DA SÚMULA 83 DESTE TRIBUNAL, NÃO SE CONHECE DE
RECURSO FUNDADO EM DIVERGÊNCIA QUANDO ORIENTAÇÃO DESTA
CORTE SE FIRMOU NO MESMO SENTIDO DA DECISÃO RECORRIDA.
RECURSO MANIFESTAMENTE INFUNDADO. APLICAÇÃO DA MULTA
PREVISTA NO ARTIGO 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
AGRAVO IMPROVIDO.
(AgRg no Ag 1054587/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
TURMA, julgado em 12/05/2009, DJe 25/05/2009)

4. No caso específico, não há nenhuma demonstração de situação excepcional


a implicar o afirmado dever de indenizar.
Ao revés, o Juízo de piso deixa asseverado que nem sequer existe prova do
extravio nem do conteúdo da carta.
Em casos tais, já há precedente desta Corte Superior. A Terceira Turma
interpretou o artigo 17 da Lei 6.538/78, em decisão assim ementada:
RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. CORREIOS.
EXTRAVIO DE CORRESPONDÊNCIA. CONTEÚDO NÃO DECLARADO.
DEVER DE INDENIZAR APENAS O VALOR DA POSTAGEM.

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 11 de 6
1. A alegação de que a correspondência extraviada continha objeto de valor
deve ser provada pelo autor, ainda que seja objetiva a responsabilidade
dos Correios.
2. À falta da prova de existência do dano, é improcedente o pedido de
indenização.
(REsp 730.855/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro
HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em
20/04/2006, DJ 20/11/2006, p. 304)

Nesse mencionado precedente, o relator para o acórdão, Ministro Humberto


Gomes de Barros, dispôs:

Não se oponha - como fez a instância precedente - a existência de


responsabilidade objetiva da ECT. Esse fato, por si só, não afasta o
dever processual do autor, que é provar a ocorrência do dano.
O dano material foi meramente alegado. Isso não é suficiente.
O Art. 17 da Lei 6.538/78 tem o seguinte teor:
[...]
É bem verdade que tal dispositivo legal estabelece taxativamente as
hipótese de exclusão de responsabilidade da ECT, no caso de extravio de
correspondência.
Não se nega que a ECT tem o dever de indenizar. O extravio, como dito, é
incontroverso.
Mas a indenização deve se restringir ao dano comprovado pelo
autor, que é apenas o do valor da postagem. O conteúdo do envelope não
foi objeto de prova.
A instância precedente, ao determinar o pagamento de indenização no
montante em que reclamado pelo autor, terminou por interpretar
incorretamente o Art. 17 da Lei Postal.
O pedido de indenização por danos morais também se baseou no suposto
conteúdo da correspondência. Por isso, não merece acolhida.

5. Não se descarta, por óbvio, possa haver casos em que, demonstrado o


extravio de correspondência, de fato, seja reconhecida lesão à direito de personalidade do
consumidor .
No entanto, para que se caracterize a obrigação de reparar danos morais, não
basta haver responsabilidade objetiva, é preciso que, além do descumprimento da obrigação
contratual configurado pelo extravio da correspondência, exsurja, como efeito, o dano de
ordem extrapatrimonial:
RESPONSABILIDADE CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO
ESPECIAL. CONCESSIONÁRIA PRESTADORA DE SERVIÇO DE
TELEFONIA. ENVIO DE COBRANÇAS PARA O ENDEREÇO DE HOMÔNIMA,
EM VIRTUDE DE A VERDADEIRA CLIENTE TER FORNECIDO
COMPROVAÇÃO DE RESIDÊNCIA INVERÍDICA. DANOS MORAIS.
INEXISTÊNCIA. REVISÃO DO ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE ORIGEM.
REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE.
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[...]
2. A responsabilidade objetiva da Concessionária prestadora do serviço de
telefonia, por si só, não traz a obrigação de indenizar, sendo necessário,
além da ilicitude da conduta, que desta exsurja, como efeito, o dano.
[...]
5. Recurso especial não provido.
(REsp 944.308/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA,
julgado em 06/03/2012, DJe 19/03/2012)

Nesse passo, a título de exemplo, esta Corte já reconheceu danos morais


ocasionados por desdobramento de extravio de talonário de cheque:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF.
EXTRAVIO DE TALONÁRIO. FRAUDE. RESPONSABILIDADE DA
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ALTERAÇÃO DO VALOR FIXADO. INCIDÊNCIA
DA SÚMULA 7/STJ.
- A ausência de decisão acerca dos argumentos invocados pelo agravante
em suas razões recursais impede o conhecimento do recurso especial.
- A instituição financeira é responsável pelos danos resultantes de extravio
de talonários de cheques, que posteriormente são utilizados
fraudulentamente por terceiros e são devolvidos.
- A alteração do valor fixado a título de compensação por danos morais
somente é possível, em recurso especial, nas hipóteses em que a quantia
estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada.
- Agravo não provido.
(AgRg no AREsp 80.284/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 04/05/2012)

Contudo, no caso em exame, o autor afirma que a correspondência extraviada


continha instrumento público de mandato para que o seu procurador pudesse representa-lo
perante a administração pública municipal e estadual, não tendo sido, objetivamente,
apontado nenhum outro desdobramento ocasionado pelo extravio do documento.
Todavia, como o pleito exordial limita-se à compensação por danos morais, o
acolhimento do recurso especial para restabelecer a sentença é medida que se impõe, visto
que, da própria da leitura causa de pedir, extrai-se apenas lamentável aborrecimento
insuficiente, contudo, para ocasionar efetiva lesão à direito da personalidade do autor.
6. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para julgar
improcedentes os pedidos formulados na inicial, restabelecendo o decidido na sentença,
inclusive no que tange aos ônus sucumbenciais - observada a gratuidade de Justiça
concedida ao autor.
É como voto.

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.097.266 - PB (2008/0222166-4)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO


RECORRENTE : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
ADVOGADO : KELLY NASCIMENTO DE LUNA E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDOBERTO SANTIAGO DA SILVA
ADVOGADO : VALTER DE MELO E OUTRO(S)

VOTO VENCEDOR

O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO:

O presente recurso especial foi interposto pela EMPRESA BRASILEIRA DE


CORREIOS E TELÉGRAFOS visando ao afastamento de sua responsabilidade por dano moral,
reconhecida pelo colendo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, sob o fundamento de que, "se os
correios não comprovam a efetiva entrega de carta registrada remetida pela vítima que
pagou tarifa especial para possibilitar o rastreamento pelo próprio órgão de postagem,
reconhece-se a falha do serviço prestado a ensejar" responsabilidade civil (fl. 92).

Afirmou, para tanto, que o v. acórdão recorrido incorreu em divergência


jurisprudencial e em ofensa aos arts. 17 e 33 da Lei Postal.

O eminente Ministro Relator concluiu pelo provimento do recurso especial, afastando


o pedido de indenização por danos morais, decorrente do extravio de correspondência.

Contudo, peço vênia para divergir.

Se se estivesse falando em dano material, haveria, efetivamente, a necessidade de


comprovação do montante do dano ocorrido em função de um valor patrimonial envolvido com o
extravio da missiva. Mas, no caso, tem-se uma alegação de dano moral, que, se sabe, em alguns
casos, pode ser reconhecido ipso facto. O chamado dano moral in re ipsa.

A perda de uma correspondência é algo que normalmente acarreta aborrecimento,


não para ensejar indenização em milhões de reais, mas, como bem fixou a instância federal, num
montante razoável, de R$ 1.000,00 (mil reais). Até em termos pedagógicos, é importante reconhecer
o dano moral, para que os Correios não fiquem tão descuidados na entrega das correspondências.

Cabe lembrar que, às vezes, leva-se horas escrevendo uma carta de conteúdo
meramente pessoal, sem valor econômico algum, mas de imenso valor sentimental. A pessoa
destinatária de tal missiva jamais saberá o lhe fora escrito e o missivista dificilmente conseguirá

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 14 de 6
reproduzir fielmente o que antes escreveu.

O consumidor pode enviar uma correspondência simples ou registrada. Nesse


segundo caso, ele tem provável interesse no rastreamento e na efetiva comprovação da entrega da
missiva.

Desse modo, se o consumidor escolhe enviar a carta registrada, os Correios têm que
apresentar o aviso de recebimento para quem fez a postagem, de maneira que o simples fato da
perda da correspondência, nessa hipótese, acarreta dano moral.

Portanto, se os Correios não comprovaram a efetiva entrega da carta registrada


postada pelo consumidor, que pagou tarifa especial para possibilitar o rastreamento pelo próprio
órgão de postagem, conforme delineado nas instâncias ordinárias, deve ser reconhecida a falha do
serviço prestado a ensejar a devida reparação por dano moral.

Como diz a eminente Ministra ISABEL GALLOTTI, é importante que o


consumidor faça a comprovação inicial mínima de que, efetivamente, celebrou o contrato de entrega
da carta pelos Correios, por meio, por exemplo, do recibo respectivo ou apenas do número da carta
registrada, como fez o autor. Quanto ao ponto, os Correios, na contestação, limitam-se a dizer que o
autor não comprovou documentalmente o conteúdo da correspondência, mas não negam o envio da
correspondência. Por sua vez, o d. Juízo a quo, com base na análise do contexto fático-probatório
dos autos, embora afirme a não comprovação do extravio, deixa clara a demonstração do envio da
carta registrada.

Ora, se esta foi enviada, caberia aos Correios a comprovação de que a


correspondência, devidamente registrada, quando muito, não chegou a seu destinatário, afastando,
assim, a alegação de extravio.

Destarte, o dano moral decorre do próprio fato de extravio de carta registrada, sendo
certo que o montante indenizatório deve ser avaliado em cada oportunidade, conforme as alegações
do consumidor promovente da ação.

Entende-se que, no caso em exame, a instância local não exacerbou, porque fixou
em R$ 1.000,00 (mil reais) a indenização por danos morais, algo perfeitamente suportável e
compatível com o objeto da lide.

Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso especial.

É como voto.

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 15 de 6
RECURSO ESPECIAL Nº 1.097.266 - PB (2008/0222166-4)

VOTO

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Sr. Presidente, acompanho a


divergência, considerando que o autor postou uma carta registrada, informou o número
do comprovante respectivo, e a ECT não negou que esse protocolo correspondesse
realmente a uma correspondência enviada pelo autor, apenas alegou que não havia
prova do conteúdo da carta. E o acórdão recorrido, instância soberana na análise da
prova, entendeu que estava comprovada a remessa da carta.
Portanto, a meu ver, o simples fato do extravio de uma carta registrada
implica dano moral. Observo que se o autor optou por enviar uma carta sob essa
modalidade, pagando mais caro pelo serviço, indica que se tratava de um conteúdo de
importância para o autor, o que dá relevo a sua alegação de dano moral.
Portanto, com a devida vênia, acompanho a divergência.

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 16 de 6
RECURSO ESPECIAL Nº 1.097.266 - PB (2008/0222166-4)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO


RECORRENTE : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
ADVOGADO : KELLY NASCIMENTO DE LUNA E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDOBERTO SANTIAGO DA SILVA
ADVOGADO : VALTER DE MELO E OUTRO(S)

VOTO-VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA: Sr. Presidente,


acompanho o voto de V. Exa.

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 17 de 6
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA

Número Registro: 2008/0222166-4 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.097.266 / PB

Números Origem: 200682000056509 412689

PAUTA: 07/02/2013 JULGADO: 07/02/2013

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator para Acórdão


Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. LUCIANO MARIZ MAIA
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
ADVOGADO : KELLY NASCIMENTO DE LUNA E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDOBERTO SANTIAGO DA SILVA
ADVOGADO : VALTER DE MELO E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil - Indenização por Dano Moral

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Quarta Turma, por marioria, negou provimento ao recurso especial, nos termos do
voto divergente do Ministro Raul Araújo. Vencido o relator, Ministro Luis Felipe Salomão e o
Ministro Antonio Carlos Ferreira, que davam provimento ao recurso especial. Lavrará o acórdão o
Ministro Raul Araújo.
Votaram vencidos os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão e Antonio Carlos Ferreira.
Votaram com o Sr. Ministro Raul Araújo Filho os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti e
Marco Buzzi.

Documento: 1208161 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/08/2013 Página 18 de 6

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