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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MMM
Nº 70083418509 (Nº CNJ: 0313759-84.2019.8.21.7000)
2019/CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.


OUTORGA DE ESCRITURA PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE HABITE-SE. ALTERAÇÃO DA OBRA PELO
PROMITENTE COMPRADOR. IRREGULARIDADES.
DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA.
A justiça gratuita deve ser deferida aquele que comprovar
nos autos não ter condições de arcar com as despesas
processuais. A parte autora comprova sua carência
financeira, razão pela qual faz jus ao deferimento da Justiça
Gratuita.
OUTORGA DE ESCRITURA PÚBLICA.
Hipótese dos autos em que as partes ajustaram que a
outorga da escritura pública ocorreria após ao pagamento
integral do preço. Adimplida a integralidade do valor, a
outorga da escritura pública não foi possível por conta da
impossibilidade de expedição do habite-se em razão de o
promitente comprador ter realizado obras irregulares no
imóvel, alterando substancialmente o projeto aprovado na
Prefeitura Municipal e em desacordo com o código de
posturas do município.
Ausência de responsabilidade do promitente vendedor, que
somente poderá obter o habite-se mediante a necessária
modificação e/ou demolição da construção irregular.
Sentença de improcedência mantida.

APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA.

APELAÇÃO CÍVEL DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL

Nº 70083418509 (Nº CNJ: 0313759- COMARCA DE ESTÂNCIA VELHA


84.2019.8.21.7000)

ANDERSON MACIEL LOPES APELANTE

ALOISIO INACIO HANSEN APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

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MMM
Nº 70083418509 (Nº CNJ: 0313759-84.2019.8.21.7000)
2019/CÍVEL

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Nona Câmara Cível


do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso de
apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes


Senhores DES. EDUARDO JOÃO LIMA COSTA E DES. MARCO ANTONIO ANGELO.

Porto Alegre, 21 de maio de 2020.

DES.ª MYLENE MARIA MICHEL,


Relatora.

RELATÓRIO

DES.ª MYLENE MARIA MICHEL (RELATORA)

Trata-se de recurso de apelação interposto por ANDERSON MACIEL LOPES


em face da sentença (fls. 155/157) que julgou improcedentes os pedidos formulados na
Ação de Obrigação de Fazer com Outorga de Escritura Pública, ajuizada em desfavor de
ALOÍSIO INÁCIO HANSEN, em dispositivo assim, exarado:

“Diante do exposto, com base no art. 487, inciso I, do


Código de Processo Civil, julgo IMPROCEDENTES os pedidos
formulados por ANDERSON MACIEL LOPES em face de
ALOÍSIO INÁCIO HANSEN.
Por fim, condeno a parte autora ao pagamento da Taxa
Única de Serviços Judiciais e das Despesas Processuais, bem
como ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono
da parte adversa, que fixo em R$ 1.500,00 (hum mil e
quinhentos reais), fulcro no artigo 85, §8º do CPC/2015. A
verba honorária deve ser corrigida pelo IGP-M a contar da
data da prolação da sentença e acrescida de juros
moratórios de 1% a.m. a partir de seu trânsito em julgado.

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Interposto recurso de apelação, intime-se a parte contrária


para o oferecimento de contrarrazões, no prazo de 15
(quinze) dias. Da mesma forma, havendo interposição de
apelação adesiva, intime-se a parte contrária para
apresentar suas contrarrazões, no mesmo prazo. Após,
remetam-se os autos para o Tribunal de Justiça, em
consonância com o que dispõe o artigo 1.010 §3º, do CPC.
Com o trânsito em julgado, arquive-se com baixa.”

Em suas razões sustenta que não possui condições de arcar com as


despesas das custas processuais e honorários advocatícios, pelo que deve ser restabelecido
o benefício da Justiça Gratuita. Alega que a inadimplência do apelado está demonstrada
pelo fato de não ter outorgado a escritura pública do imóvel. Refere a não comprovação
nos autos das alterações que impediram a expedição do habite-se. Destaca que o contrato
está devidamente quitado e a responsabilidade do apelado é a outorga da escritura pública
para promover o registro no cartório. Discorre ser cabível no presente caso, indenização
por danos morais em razão dos dissabores sofridos. Pugna pelo provimento do presente
recurso de apelação.

Juntou documentos para comprovar a necessidade da Justiça Gratuita.

Apresentadas contrarrazões, sustentou o apelado a preliminar de ausência


de preparo e o não conhecimento do recurso por não atacar os fundamentos da sentença.

Vieram-me os autos conclusos.

Registro terem sido observadas as disposições contidas nos arts. 931 e 934
do CPC, diante da adoção do sistema informatizado por este Tribunal de Justiça.

É o relatório.

VOTOS

DES.ª MYLENE MARIA MICHEL (RELATORA)

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Recebo o presente recurso de apelação, porquanto preenchidos os


pressupostos de admissibilidade.

DA JUSTIÇA GRATUITA.

Alega o apelante que não possui condições de suportar as despesas


processuais e os honorários advocatícios sem prejuízo de seu sustento e de sua família.

O art. 98 do CPC/2015 dispõe que, para beneficiar-se da gratuidade


judiciária, a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, deve comprovar a
insuficiência de recursos para arcar com as custas, as despesas processuais e os honorários
advocatícios.

No caso em exame, o apelante demonstra que não houve alteração de sua


situação econômica para ter revogado o benefício da Justiça Gratuita.

Refere que possui uma pequena empresa de funilaria (ME) e que recebe a
título de pró-labore o valor de R$ 998,00 mensais. Cotejando tal informação com os
extratos bancários anexados verifica-se que a conta bancária não possui grande
movimentação financeira, situação pela qual se depreende estarem preenchidos os
requisitos para concessão da Justiça Gratuita.

Assim, defiro o benefício da Justiça Gratuita ao apelante, dispensando o


preparo.

DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. DO CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. DA


OUTORGA DA ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA.

Cuida de ação de obrigação de fazer, na qual o apelante postula seja o


apelado condenado a outorgar a escritura do imóvel para consequente registro do imóvel,
bem como a condenação ao pagamento de indenização por danos morais.

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Alega o apelante que as partes firmaram contrato de promessa de compra


e venda em 21.12.2006 referente a “um quinhão ideal de 94,50 metros quadrados,
medindo 10,50 metros de comprimento por 9,00 metros de largura, constituído do
apartamento número 286, com 50m2 de área construída, situado à rua Carlos Chagas n.º
286, bairro Rincão dos Ilhéus, Estância Velha-RS, composto de parte de um todo maior
abaixo descrito”.

O preço restou ajustado no pagamento de R$ 45.000,00, sendo R$ 1.400,00


de entrada, pagos na data da assinatura do contrato e R$ 44.100,00 divididos em 126
parcelas mensais e sucessivas de R$ 350,00, que correspondem, nesta data a 0,39 CUBs,
cada uma delas, vencendo-se a primeira em 05.12.2006 e as demais, mensal e
consecutivamente, importâncias corporificadas por cento e vinte e seis notas promissórias.

Constou ainda, consoante cláusula 5ª do contrato, que a escritura definitiva


de compra e venda do imóvel em tela, seria outorgada tão logo pago o total do preço
devido pela transação imobiliária.

O apelante refere que adimpliu todas as parcelas do contrato e, portanto, é


devida a outorga da escritura pública e o apelado não se insurge quanto ao pagamento.
Pelo contrário, reconheceu na contestação que o pagamento da última parcela ocorreu em
janeiro de 2017.

Todavia, justificou que não foi possível outorgar a escritura pública por
culpa exclusiva do apelante, que após a aquisição do bem realizou obras irregulares na
propriedade, em afronta ao Código de Posturas do Município. Referiu ainda que para
obtenção do habite-se faz-se necessária a modificação e/ou demolição da construção
irregular.

O imóvel foi construído de acordo com o projeto aprovado pela Prefeitura


Municipal de Estancia Velha em 29.06.2006 (fls. 117/121).

Ocorre que o apelante após o recebimento do imóvel alterou a área


construída edificando acréscimos que impediram a obtenção do habite-se.

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O apelado até tentou encaminhar a documentação para expedição do


habite-se, contratando um engenheiro para regularização do imóvel, contudo encontrou
inúmeros obstáculos, conforme se pode observar da COMUNICAÇÃO, fls. 111/112, firmado
pelo Engº Haroldo A. Finger, embora realizado de forma unilateral, traz informações sobre
as alterações efetuadas no imóvel, pelo apelante.

A comunicação apresentada apontou “3 - O aumento fechar a iluminação e


ventilação das peças já aprovadas, ocupa o recuo de jardim, tornando impossível a sua
regularização (está em desacordo com o plano Diretor e o Código de Obras do Município de
Estância Velha)”.

E para regularização do imóvel, o documento concluiu “4 – Uma solução


para ser liberado o habite-se seria demolir as partes construídas de forma irregular”

O apelante não nega o aumento da área de construção, porém refere que


engenheiro não entrou no local e não possui qualificação para falar sobre o imóvel.

Apesar do documento ter sido elaborado de forma unilateral, ele foi


realizado por profissional habilitado na área da engenharia e traz informações que
corroboram as imagens fotográficas do imóvel e evidenciam as alterações ocorridas,
conforme planta baixa anexada.

Referidas informações são corroboradas pela prova testemunhal produzida


nos autos.

A testemunha Estevo Bombieri Kotowski, referiu, suscintamente, que o


imóvel estava pronto quando foi vendido ao autor.

Valdeci Dalla Barba, funcionário da prefeitura e corretor de imóveis referiu


que tanto o autor quanto o réu são seus clientes. Referida testemunha, apesar de ter sido
ouvido como como informante trouxe esclarecimentos acerca do imóvel do apelante.
Referiu que quando o apelante pediu para que olhasse seu imóvel para vender “verificou
que havia acréscimo na obra que não estava regularizado”. e referiu ainda que “para que o
imóvel fosse vendido ele deveria regularizar a construção, pois não seria possível vender o
bem com construção irregular.

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E ainda, a testemunha pontuou que conhece o processo que tramita junto à


prefeitura, bem como o funcionário efetuou a vistoria e ressaltou que a expedição do
habite-se não foi possível em razão dos acréscimos realizados pelo apelante, inclusive, os
realizados dentro do recuo do jardim, em desacordo com o Plano Diretor.

Desse modo, concluiu-se que efetivamente houve alteração do projeto


inicialmente aprovado pela prefeitura do município, o qual se encontra em desacordo com
o Plano Diretor da cidade, o que impossibilita a expedição do habite-se e, via de
consequência, a outorga da escritura pública.

O apelante não contesta os acréscimos realizados na obra. Restringe-se a


impugnar, tão somente, a qualificação do engenheiro que apresenta a comunicação e
informa que quitou o valor do contrato.

Todavia, é a alteração no projeto inicial realizada por conta e risco do


apelante, sem aprovação pelo órgão competente, que obsta a expedição do habite-se e,
por conseguinte, a regularização do imóvel. O apelante não demonstra interesse na
adequação e/ou demolição da área irregular.

O apelado, por outro lado, demonstrou interesse na resolução do


problema, contratando engenheiro e encaminhando processo de regularização na
prefeitura local. Contudo, diante das alterações na construção, tal regularização não se
mostra possível.

DO DANO MORAL

Não demonstrada que a responsabilidade pela reguralização da obra é de


responsabilidade do apelado, cujo óbice se dá em razão das alterações na construção
realizadas pelo apelante, em desacordo com o Plano Diretor, não há se falar em
indenização por dano moral.

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Por fim, ausentes elementos a ensejar alteração da conclusão apresentada


pela magistrada prolatora da sentença, Dra. Rebecca Roqetti Fernandes, a manutenção da
sentença é medida que se impõe.

DISPOSITIVO.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso de apelação.

Sendo devida a majoração dos honorários ao patrono da apelada pela


presente fase recursal, conforme estabelece o art. 85, § 11, do NCPC, majoro o valor fixado
na origem para R$ 2.000,00, com incidência de juros de mora de 1% ao mês a contar do
trânsito em julgado. Suspensa a exigibilidade, haja vista a gratuidade concedida na origem.

É o voto.

DES. EDUARDO JOÃO LIMA COSTA - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. MARCO ANTONIO ANGELO - De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª MYLENE MARIA MICHEL - Presidente - Apelação Cível nº 70083418509, Comarca de


Estância Velha: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: REBECCA ROQUETTI FERNANDES

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