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A ESTRUTURA DA RELAÇÃO

JURÍDICA DE CONSUMO.
• Maria Helena Diniz: “a relação jurídica consiste
num vínculo entre pessoas, em razão do qual uma
pode pretender um bem a que outra é obrigada.
Tal relação só existirá quando certas ações dos
sujeitos, que constituem o âmbito pessoal de
determinadas normas, forem relevantes no que
atina ao caráter deôntico das normas aplicáveis à
situação. Só haverá relação jurídica se o vínculo
entre pessoas estiver normado, isto é, regulado
por norma jurídica, que tem por escopo protegê-
lo”.Desse modo, na esteira das lições dos juristas,
constata-se que são elementos da relação jurídica,
adaptados para a relação de consumo:
• Existência de uma relação entre sujeitos jurídicos, substancialmente entre um sujeito
ativo – titular de um direito – e um sujeito passivo – que tem um dever jurídico. Na
relação de consumo, tais elementos são o fornecedor de produtos e o prestador de
serviços – de um lado – e o consumidor – do outro lado. Na grande maioria das vezes, as
partes são credoras e devedoras entre si, eis que prevalecem nas relações de consumo as
hipóteses em que há proporcionalidade das prestações (sinalagma). Isso ocorre, por
exemplo, na compra e venda de consumo e na prestação de serviços, principais situações
negociais típicas de consumo.
• b)   Presença do poder do sujeito ativo sobre o objeto imediato, que é a prestação, e
sobre o objeto mediato da relação, que é o bem jurídico tutelado (coisa, tarefa ou
abstenção). Na relação de consumo, o consumidor pode exigir a entrega do produto ou a
prestação de serviço, nos termos do que foi convencionado e do disciplinado na Lei
Consumerista. Nos termos do art. 3º do CDC, constata-se que os elementos objetivos,
que formam a prestação da relação de consumo, são o produto e o serviço.
• c)   Evidência na prática de um fato ou acontecimento propulsor, capaz de gerar
consequências para o plano jurídico. De acordo com Maria Helena Diniz, “pode ser um
acontecimento, dependente ou não da vontade humana, a que a norma jurídica dá a
função de criar, modificar ou extinguir direitos. É ele que tem o condão de vincular os
sujeitos e de submeter o objeto ao poder da pessoa concretizando a relação”. No plano
do Direito do Consumidor, esse fato é substancialmente um negócio jurídico, guiado pela
autonomia privada, que é o direito que a pessoa tem de se autorregulamentar no plano
contratual.
• O fornecedor de produtos e o prestador de
serviços. O conceito de fornecedor equiparado
• Estabelece o art. 3º, caput, da Lei 8.078/1990 que
“Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica,
pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como os entes despersonalizados, que
desenvolvem atividade de produção, montagem,
criação, construção, transformação, importação,
exportação, distribuição ou comercialização de
produtos ou prestação de serviços”. A
palavra fornecedor está em sentido amplo, a
englobar o fornecedor de produtos – em sentido
estrito – e o prestador de serviços.
• A respeito da finalidade lucrativa ou não da pessoa jurídica
fornecedora, é interessante reproduzir o entendimento do
Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que “Para o fim de
aplicação do Código de Defesa do Consumidor, o
reconhecimento de uma pessoa física ou jurídica ou de um
entre despersonalizado como fornecedor de serviços atende
aos critérios puramente objetivos, sendo irrelevantes a sua
natureza jurídica, a espécie dos serviços que prestam e até
mesmo o fato de se tratar de uma sociedade civil, sem fins
lucrativos, de caráter beneficente e filantrópico, bastando
que desempenhem determinada atividade no mercado de
consumo mediante remuneração” (STJ – REsp 519.310/SP –
Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 20.04.2004).
Desse modo, entidades beneficentes podem perfeitamente
ser enquadradas como fornecedoras ou prestadoras, sem
qualquer entrave material.
• Na verdade, o que interessa mesmo na caracterização do
fornecedor ou prestador é o fato de ele desenvolver
uma atividade, que vem a ser a soma de atos coordenados para
uma finalidade específica, como bem pontua Antonio Junqueira
de Azevedo:
• “‘Atividade’, noção pouco trabalhada pela doutrina, não é ato, e
sim conjunto de atos. ‘Atividade’ foi definida por Túlio Ascarelli
como a ‘série de atos coordenáveis entre si, em relação a uma
finalidade comum’ (Corso di diritto commerciale. 3. ed. Milano:
Giuffrè, 1962. p. 147). Para que haja atividade, há necessidade: (i)
de uma pluralidade de atos; (ii) de uma finalidade comum que
dirige e coordena os atos; (iii) de uma dimensão temporal, já que
a atividade necessariamente se prolonga no tempo. A atividade,
ao contrário do ato, não possui destinatário específico, mas se
dirige ad incertam personam (ao mercado ou à coletividade, por
exemplo), e sua apreciação é autônoma em relação aos atos que a
compõem”
• Se alguém atuar de forma isolada, em um ato único, não poderá se
enquadrar como fornecedor ou prestador, como na hipótese de
quem vende bens pela primeira vez, ou esporadicamente, com ou
sem o intuito concreto de lucro. Como bem observa José Fernando
Simão, há, na relação de consumo, o requisito da habitualidade,
retirado do conceito de atividade, sendo interessante a ilustração do
jurista:
• “O sujeito que, após anos de uso do carro, resolve vendê-lo,
certamente não será fornecedor nos termos do Código de Defesa do
Consumidor. Entretanto, se o mesmo sujeito tiver dezenas de carros
em seu nome e habitualmente os vender ao público, estaremos
diante de uma relação de consumo e ele será considerado
fornecedor”.
• Pelo mesmo raciocínio, não pode ser tido como fornecedor aquele
que vende esporadicamente uma casa, a fim de comprar outra, para
a mudança de seu endereço. Do mesmo modo, alguém que vende
coisas usadas, de forma isolada, visando apenas desfazer-se delas.
• O art. 966 do Código Civil: “Considera-se empresário quem exerce
profissionalmente atividade econômica organizada para a produção
ou a circulação de bens ou de serviços.” Na doutrina empresarial,
merecem atenção os comentários no sentido de que não se pode
falar em atividade quando há o ato ocasional de alguém, mas, sim,
em relação àquele que atua “de modo sazonal ou mesmo periódico,
porquanto, neste caso, a regularidade dos intervalos temporais
permite que se entreveja configurada a habitualidade”. A mesma
conclusão serve para a relação de consumo, visando a caracterizar o
fornecedor de produtos ou prestador de serviços, em um mais
um diálogo de complementaridade entre o CDC e o CC/2002.
• A atividade desenvolvida deve ser tipicamente profissional, com
intuito de lucro direto ou vantagens indiretas. A norma descreve
algumas dessas atividades, em rol meramente exemplificativo
(numerus apertus), eis que a Lei Consumerista adotou um modelo
aberto como regra dos seus preceitos. Vejamos, com as devidas
exemplificações:
– Atividade de produção – caso dos fabricantes de gêneros alimentícios
industrializados.
– Atividade de montagem – hipótese das montadoras de automóveis
nacionais ou estrangeiras.
– Atividade de criação – situação de um autor de obra intelectual que
coloca produtos no mercado.
– Atividade de construção – caso de uma construtora e incorporadora
imobiliária.
– Atividade de transformação – comum na panificação das padarias,
supermercados e afins.
– Atividade de importação – como no caso das empresas que trazem
veículos fabricados em outros países para vender no Brasil.
– Atividade de exportação – caso de uma empresa nacional que fabrica
calçados e vende seus produtos no exterior.
– Atividades de distribuição e comercialização – de produtos e serviços
de terceiros ou próprios, desenvolvidas, por exemplo, pelas empresas de
telefonia e pelas grandes lojas de eletrodomésticos.
• Por fim, em um sentido de ampliação ainda maior, a doutrina
construiu a ideia do fornecedor equiparado. A partir da tese de
Leonardo Bessa, tal figura seria um intermediário na relação de
consumo, com posição de auxílio ao lado do fornecedor de
produtos ou prestador de serviços, caso das empresas que
mantêm e administram bancos de dados dos consumidores. A
nova categoria conta com o apoio da nossa melhor doutrina, caso
de Claudia Lima Marques, que cita o seu exemplo do estipulante
profissional ou empregador dos seguros de vida em grupo e
leciona:
• “A figura do fornecedor equiparado, aquele que não é fornecedor
do contrato principal de consumo, mas é intermediário, antigo
terceiro, ou estipulante, hoje é o ‘dono’ da relação conexa (e
principal) de consumo, por deter uma posição de poder na relação
outra com o consumidor. É realmente uma interessante teoria,
que será muito usada no futuro, ampliando – e com justiça – o
campo de aplicação do CDC”.

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