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Profº MSc.

Luiz Felipe Machado

E-mail: lfmachado@univali.br
coexistência de todos os seres e a luta por sua continuidade
constituem a Lei Fundamental de qualquer um deles, o que
não é diferente para o ser humano que também possui,
como instinto básico, a perpetuação da espécie.

homem, desde o seu nascimento, faz parte de diversas


instituições ou necessidades, formadas por indivíduos
ligados pelo parentesco, por interesses materiais ou por
objetivos espirituais. Este conjunto indefinível de
sentimentos de simpatia recíproca, de amor às mesmas
tradições, de aspirações de grandeza futura, de unidade e
permanência de uma personalidade coletiva, caracteriza-o
como ser social.
ssim, o homem passou a viver em sociedade, abdicou de uma
parcela de sua liberdade, buscando, como contrapartida,
normas e regras que garantissem sua segurança e os seus
direitos. Assim surgiu o Direito enquanto conjunto de normas
de conduta, impostas coativamente por um Estado
politicamente organizado, traduzindo-se em princípios
reguladores do convívio social tendentes a realizar a busca
pela Justiça.

sistematização desses princípios de conduta social, em


normas legais, constituiu a denominada ordem jurídica, ou
seja, o sistema legal adotado para assegurar existência do
Estado e a coexistência pacífica dos indivíduos em sociedade.
ssa ordem jurídica pode ser dividida em duas facetas:
ordem jurídica interna (limitada pela soberania do
Estado); ordem jurídica internacional, quando constitui
em regras superiores aceitas reciprocamente pelos
Estados, visando à harmonia entre as diversas Nações.

Direito é dividido para fins didáticos, em diversos


ramos, porém reconhecem-se somente dois grandes
ramos, consoante a sua destinação: ramo do direito
público e ramos do direito privado.
ramo do direito público compõe-se
predominantemente de normas que disciplinam as
relações jurídicas, tendo o Estado como parte, seja nas
questões internas ou externas (internacionais), visando
regular os interesses estatais e sociais.

á o ramo do direito privado rege as relações entre


particulares, tutelando, sobretudo, os interesses
individuais, de modo a assegurar a covivência harmônica
das pessoas em sociedade, além da fruição de seus bens.
ste ramo trata-se de normas supletivas, que podem ser modificadas
e acordo com interesse das partes, porém importante ressaltar,
ainda, o conceito de normas de ordem pública, que são regras
imperativas e inafastáveis pela vontade das partes.

onclui-se que toda a regra de direito público é também de ordem


pública, mas o inverso não é verdadeiro, porque também é possível
verificar regras inafastáveis pela vontade das partes no ramo de
direito privado.

xemplo: capacidade das pessoas e os impedimentos para o


casamento, dentre outras.
m sentido amplo, o Direito Administrativo pode ser
conceituado como um ramo de Direito Público Interno que
tem como objeto a busca pelo bem da coletividade pelo
interesse público. A coletividade aqui deve ser compreendida
como uma entidade dotada de interesses, de direitos e
deveres, de pretensões e obrigações.

orém, na doutrina brasileira, o conceito de Direito


Administrativo é tema que apresenta grande divergência. Tal
polêmica é oriunda de uma ausência de definição clara
quanto ao objeto do Direito Administrativo, que vem sendo
sistematicamente ampliado, modificado, ou mesmo reduzido
em alguns pontos, em virtude dos anseios da sociedade,
como também das mutações estatais que foram vivenciadas
nas últimas décadas.
ortanto, deve-se primeiramente delimitar os critérios adotados pela
doutrina para o objeto e demarcar a área de atuação dessa disciplina do
Direito.

nicialmente, o objeto do Direito Administrativo foi definido pela Escola


Legalista, também denominada exegética, empírica ou caótica, segundo
a qual os doutrinadores limitaram-se a compilar as leis existentes e
interpretá-las principalmente na jurisprudência. Esta corrente não
prosperou pois o direito é muito mais amplo que a norma posta, não se
esgota n a lei.

pós, os doutrinadores passaram a ampliar o objeto de estudo do Direito


Administrativo, fixando princípios aliados à Ciência da Administração,
que envolve a matéria de política de administração, e não matéria
jurídica propriamente dita.
odavia, após a Revolução Industrial, o Estado necessitou
intervir de forma mais efetiva para solucionar questões sociais
e econômicas geradas pelo Estado liberal, o que ampliou o
campo do Direito Administrativo, necessitando uma cisão,
ficando a Ciência da Administração com a atividade social do
Estado e o Direito com a atividade jurídica, o que acaba
envolvendo um complexo de normas e princípios jurídicos que
regem a organização e a atividade administrativa.

ssim, fixa-se o objeto do Direito Administrativo, estando


restrito apenas aos temas de natureza jurídica, a sua
formatação ficou mais sistemática e científica.
sse mote inicial foi substituído por Leon Duguit, que passou a
utilizar a noção de “serviço público”, isto é, de serviços
prestados à coletividade pelo Estado, por serem
indispensáveis à coexistência social, dando origem à Escola
do Serviço Público. Aqui o Direito Administrativo tinha como
objeto de estudo, o “serviço público”, o que abrangia, na
época, praticamente toda a atuação do Estado, inclusive as
atividades industriais e comerciais por ele exploradas.

sse critério acabaça gerando inúmeras confusões, pois o


Direito Administrativo acabava se preocupando com
atividades estranhas à sua verdadeira missão, deixando de
fora outras atividades relevantes para seu objeto e que não
estavam incluídas no conceito de serviço público, como, por
exemplo, o poder de polícia.
ma outra corrente doutrinária passou a se valer da atuação do Poder
Executivo, para qual o Direito Administrativo centralizou todo o seu
estudo na atuação desse Poder. Esse entendimento também
demonstrou-se insuficiente, pois desprezava o fato de que os outros
Poderes do Estado também exercem a atividade administrativa e
que o próprio Poder Executivo exerce outras atividades que não
interessam à disciplina, porque gozam de natureza política,
configurando-se objetivo do Direito Constitucional.

ossui aqueles que consideram o Direito Administrativo como o


conjunto de regras que disciplinam as relações entre a Administração
e os administrados, denominado Critério das Relações Jurídicas.
Essa orientação também é imprecisa pois existem outros ramos de
Direito Público que também se preocupam com essas relações, como
é o caso do Direito Constitucional, o Penal, o Processual, o Eleitoral e
outros, além de excluírem assuntos importantes para essa disciplina,
tais como a atividade que ela exerce em proteção de seus bens.
ode-se, ainda, apontar o Critério Teleológico, o qual delimita o
Direito Administrativo como um sistema de princípios jurídicos que
regula as atividades concretas do Estado, para cumprimento de
seus fins na busca do interesse público. Esta corrente foi defendida,
no Direito brasileiro, por Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, com
algumas ressalvas.

quinto critério esta intimamente ligado com o anterior e denomina-


se Critério Negativo ou Residual. Aqui o Direito Administrativo deve
ser observado em dois sentidos diferentes: no sentido positivo (os
institutos jurídicos pelos quais o Estado busca a realização dos seus
objetivos) e no sentido negativo (representa uma forma de
definição de seus objetivos, o que se faz por exclusão afastando-se
as demais funções do Estado, a legislativa e a jurisdicional, além das
atividades regidas pelo direito privado). No Direito brasileiro, esse
critério foi adotado por Tito Prates da Fonseca.
lguns doutrinadores conceituaram o Direito Administrativo como o
“conjunto que regulam a atividade jurídica não contenciosa do
Estado e a constituição dos órgãos e meios de sua ação em geral”,
nas palavras de Mário Masagão e José Cretella Júnior. Esse critério
foi titulado Critério da distinção entre atividade jurídica e social do
Estado.

essalta-se que os últimos três critérios apresentados não se mostram


incompatíveis com o nosso ordenamento jurídico, todavia, são
insuficientes quando considerados de forma isolada.

or fim, apresenta-se o Critério da Administração Pública, que parece


representar uma evolução dos três critérios anteriores. Segundo tal
critério, o Direito Administrativo é o conjunto de princípios que
regem a Administração Pública, entendimento adotado pelo Hely
Lopes Meirelles.
egundo Hely “sintetiza-se no conjunto harmônico de
princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as
atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e
imediatamente os fins desejados pelo Estado”.

ortanto, passa-se a esmiuçar o referido conceito:

 Conjunto harmônico de princípios jurídicos: sintetização


indispensável para definição de uma disciplina autônoma, já que esta
não poderia existir, enquanto ciência, sem princípios teóricos
próprios, ordenados e verificáveis na prática, o que constitui o regime
jurídico administrativo.
 Regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas: disciplina os
atos da Administração Pública praticados, nessa qualidade, além da
ordenação de sua estrutura e de seu pessoal, independentemente
de essa atividade administrativa ser exercida pelo Poder Executivo,
Legislativo e Judiciário.

 Tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins


desejados pelo Estado: permite conceituar essa disciplina pelo
critério da exclusão. Na concretude afasta a atuação abstrata do
Estado, que é característica típica da sua função legislativa. No
exercício direto, atua independente de provocação, afastando a sua
função jurisdicional, que representa uma atuação indireta, uma vez
que a jurisdição é inerte. Na atuação imediata, essa corresponde à
atividade administrativa por ele exercida, que não se confunde com
sua função social, caracterizada como função mediata desse ente.

 Por fim, é importante ressaltar que o Direito Administrativo não


define os fins do Estado, essa obrigação é do Direito Constitucional.
Ele somente os realiza.
disciplina do Direito Administrativo está intimamente ligada
a diversos outros ramos do Direito, os quais serão analisados
algumas dessas interseções.

ireito Constitucional: ambas as disciplinas cuidam da mesma


entidade, o Estado. Entretanto, o Direito Constitucional
representa a sua parte estrutural, a sua anatomia, cuidando
das formas, estruturas políticas e estatais, estabelecendo os
seus fins, direitos e as garantias dos administrados. Já o
Direito Administrativo cuida do estado em seu papel
dinâmico, funcional, sua fisiologia, estabelecendo a sua
organização interna, visando satisfazer as finalidades que lhe
são constitucionalmente garantidas.
ireito Tributário e Financeiro: o ponto de congruência é a
receita pública, pois, enquanto estes estudam as atividades
vinculadas à imposição e arrecadação de tributos, a
realização da receita e a efetivação das despesas são
eminentemente, atividades adstritas ao Direito
Administrativo.

ireito Penal: por meio dos ilícitos penais praticados pelos


agente públicos. Contudo, é bom lembrar que ilícito penal é
diferente de ilícito administrativo, pois cada um possui seu
próprio conjunto de leis, procedimentos e sanções aplicáveis.
ireito Processual: a afinidade tem, como principal elemento de
intersecção, o Processo Administrativo, o qual segue princípios
comuns nos Direitos Processual Civil e Processual Penal, enquanto
essas disciplinas se utilizam de normas administrativas para a
prática de seus atos e movimentos de seus processos.

ireito do Trabalho: o empregado público é o elo de ligação,


agente que atua na Administração Pública, mas que está sujeito
ao regime pela CLT.

ireito Previdenciário: nas Instituições de Previdência e Assistência


ao assalariado, são constituídas no regime de autarquias.
ireito Civil e Direito Empresarial: misturam-se quando o tema
se refere aos contratos e obrigações, haja vista obedecerem à
mesma teoria geral e, excepcionalmente, em alguns contratos,
ficar parcialmente afastado o regime jurídico.

ireito Eleitoral: decorre do fato de o Direito Administrativo ser


responsável pela regência dos atos eleitorais, estando sempre
presente na organização da votação e apuração dos pleitos,
no funcionamento dos partidos políticos, no ordenamento e
na fiscalização da propaganda partidária, dentre outros.
iências Sociais: as ciências jurídicas cuidam das normas
coercitivas de conduta, enquanto as ciências sociais (não
jurídicas) preocupam-se com a formulação de princípios
doutrinários, deduzidos dos fenômenos naturais que
constituem o objeto de seus estudos, mas desprovidos de
coação estatal.

iência Política: A política alcança os setores da


Administração, quando os governantes dos três Poderes
travam normas ou praticam atos tendentes a imprimir, por
todos os meios lícitos e morais, os rumos que conduzem a
atividade governamental ao encontro das aspirações da
comunidade.
onsideram-se fontes de uma determinada disciplina
aquelas regras ou comportamentos que provocam o
surgimento de uma norma posta.

s doutrinadores do Direito Administrativo não são


pacificados quanto a enumeração das fontes,
portanto, faz-se mister apontar o entendimento da
maioria, citando as seguintes fontes: a lei, a doutrina,
a jurisprudência, os costumes e os princípios gerais do
direito.
ei: compreendida, em sentido amplo, como toda e qualquer
espécie normativa, significa a norma imposta coativamente
pelo Estado, isto é, todos os atos decorrentes do poder
legiferante e do poder normativos dessa pessoa jurídica,
representado uma fonte primária de qualquer ramo do Direito.

importante lembrar que o ordenamento jurídico pátrio está


disposto em uma estrutura escalonada ou hierarquizada de
normas que, sendo o entendimento do STF, obedecem entre si
a uma relação de compatibilidade vertical.

outrina: é a lição dos mestres estudiosos do Direito formando


o sistema teórico de princípios aplicáveis ao direito positivo.
urisprudência: é a reiteração dos julgamentos dos órgãos
do Judiciário sempre num mesmo sentido.

ostume: representa a prática habitual de determinado


grupo que o considera obrigatório. Apesar do seu desuso
em outras disciplinas do Direito, no Direito
Administrativo o costume representa um papel
importante, em razão da deficiente legislação, apesar de
não substituir a previsão legal. A prática administrativa
vem suprindo algumas lacunas geradas pela falta de
codificação nessa área, ficando sedimentada na
consciência dos administradores e administrados.
rincípios gerais do direito: alguns autores inclui os
princípios gerais do direito como fonte desse ramo,
que são critérios maiores, as vezes até não escritos,
percebidos pela lógica ou por indução. Vale dizer que
são normas que representam a base do ordenamento
jurídico, estando intrínsecas e essa ordem legal,
consideradas como orientações necessárias à
exigência de justiça. Exemplo: ninguém deve ser
punido sem ser ouvido, não é permitido o
enriquecimento ilícito, ninguém se beneficiará da
própria malícia, dentre outros.
Direito Administrativo não conta com uma codificação, o
que acaba causando uma discussão doutrinária sobre os
seus benefícios e coloca os doutrinadores, em três
posições: os que negam as suas vantagens, os que
defendem a necessidade de uma codificação parcial e os
que propugnam pela codificação total, o que representa a
maioria da doutrina.

prática atual deixou bem claro que o Código não traz a


estagnação do Direito, como defendia Savigny e seus
seguidores.
atual formação dessa disciplina que é feita por leis
esparsas, muitas vezes dificulta a obtenção do
conhecimento pelos interessados, não permitindo
uma visão panorâmica do Direito a que pertencem.
Somente o Código remove esses inconvenientes da
legislação fragmentária, pela aproximação e
coordenação dos textos que se interligam para a
formação do sistema jurídico, dando maior segurança
ao aplicador e resolvendo grandes questões.
nterpretar significa alcançar o sentido de algo. Assim, interpretar
o Direito é buscar o sentido de suas normas, é desvendar o
próprio sentido das palavras da lei.

a dinâmica de interpretação das regras do Direito, é importante


lembrar que o Direito Administrativo, por ser um ramo do direito
público, não se adéqua a todos os princípios de hermenêutica do
direito privado.

diversidade de seu objeto, a natureza específica de suas normas,


os fins sociais a que elas se dirigem, o interesse público que elas
visam sempre a tutelar exigem regras próprias de interpretação e
aplicação das leis, atos e contratos administrativos.
ara a interpretação do Direito Administrativo, há de
considerar, necessariamente, a presença de três
pressupostos: a desigualdade jurídica entre a
Administração e os adminsitrados, em razão da
prevalência do interesse público sobre o interesse
particular, devendo o bem comum prevalecer, mantendo-
se um equilíbrio desses direitos; a presunção relativa de
legitimidade dos atos da Administração e a necessidade
de poderes discricionários para a Administração atender
a esses interesses, já que o administrador não é um mero
aplicador da lei. Por isso, a discricionariedade
administrativa é necessária na prática rotineira das
atividades da Administração, devendo ser demarcada pela
finalidade pública e pelo bem comum, sob pena
arbitrariedade e abuso de poder.
impulso decisivo para a formação do Direito Administrativo
foi dado pela Teoria dos Poderes, desenvolvida por
Montesquieu, em “Os espíritos das Leis”, em 1784.
Posteriormente, na França, após a Revolução de 1789,
definiu-se a tripartição das funções do Estado em executiva,
legislativa e judicial, o que veio a ensejar a especialização das
atividades do governo e dar independência aos órgãos
incumbidos de realizá-las, surgindo a necessidade de
julgamento dos atos da Administração ativa, o que
inicialmente ficou a cargo dos Parlamentos.

m um estágio subsequente, foram criados em paralelo os


tribunais judiciais, os tribunais administrativos, como
consequência natural da estruturação de um Direito
específico da Administração.
o Brasil, a cadeira de Direito Administrativo foi criada em
1851, por meio do Decreto nº 608, de 16 de agosto de 1851,
ficando para 1857, em Recife, a edição da primeira obra
doutrinária, intitulada “Elementos de Direito
Administrativo Brasileiro”, de Vicente Pereira do Rego.

om o advento do período republicano, a doutrina passou a


sofrer influencia do direito público norte-americano,
copiando o seu modelo de federação, e daí para cá,
inúmeras obras foram publicadas, demonstrando uma
grande evolução para a disciplina.

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