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Exames complementares em

Nefrologia

Introdução para o 3º ano médico


2019

Prof Eduardo Coelho


Disciplina de Nefrologia
Depto Clínica Médica
FMRP-USP
Objetivos
 Entender como avaliar clinicamente a
função renal e sua importância para o
diagnóstico e seguimento de paciente com
doenças renais
 Discutir as limitações dos exames usados
para avaliar a função renal
 Discutir como interpretar o exame de
sedimento urinário
Doenças renais
 São silenciosas
 Queixas vagas inespecíficas
 Podem ter evolução aguda, subaguda ou
crônica, esta a forma mais usual de
apresentação.
 Como fazer o diagnóstico? Como saber
qual doença? Como traçar um plano
terapêutico e informar ao paciente seu
prognóstico?
O que eu preciso saber?
 Reveja:
 Como o rim controla a taxa de filtração
glomerular (fisiologia)
 Como se dá o transporte de água e
eletrólitos ao longo do nefro (fisiologia)
 Os compartimentos nos quais as doenças
renais podem se desenvolver (patologia)
Rim é um órgão complexo

https://www.niddk.nih.gov/research-funding/at-niddk/labs-branches/kidney-diseases-branch/kidney-disease-sectio
n/glomerular-disease-primer/normal-kidney#glomerular-filtration-barrier
Balanço sódio, potássio, cálcio, fósforo, Controle da Pressão Arterial
Ácido-base (bicarbonato e H+ Volemia

Produção e
metabolismo de
hormônios
Eritropoietina
Insulina
Renina
Vit D3
Adrenomedulina
Excreção de solutos
Controle da osmolaridade
Como saber se o rim está
normal?
 A) Tome 5 litros de agua e veja se você
consegue urinar os mesmos 5 litros
 B) Pergunte ao paciente se ele tem sinais
e sintomas de doenças renais
 C) Pergunte ao Dr. Google
Como saber se os rins estão doentes?
O rim é um órgão localizado na porção posterior do abdômen, paralelamente à
coluna vertebral. A maioria de nós possui dois rins, um em cada lado da coluna,
mas há pessoas que nascem apenas com um.
Os rins são órgãos essenciais à vida, sendo responsáveis por diversas funções,
entre elas, filtragem do sangue, controle dos níveis de eletrólitos (sódio, potássio,
cálcio, fósforo, magnésio…), da pressão arterial, da quantidade de água do corpo,
estimulo à produção de glóbulos vermelhos, produção de vitamina D, etc.
Muitas doenças dos rins apresentam pouco ou nenhum sintoma nas suas fases
iniciais. Boa parte dos pacientes só descobre ser portador de doença renal em
estágios avançados, quando já não há muito o que fazer para salvar a função dos
rins.
A melhor maneira de se identificar precocemente as doenças renais é através de
exames de sangue e urina. A dosagem da creatinina sanguínea nos permite
calcular a taxa de filtração sanguínea dos rins, enquanto que o exame simples de
urina, chamado de Urina 1 ou EAS, pode identificar a presença de sangue,
proteínas, glicose ou outras substâncias que apontam para uma possível doença
renal.

https://www.mdsaude.com/nefrologia/sintomas-doenca-renal
O que é creatinina?
”Marcador”
 A boa e velha creatinina!

Dr. Homer W. Smith, década 30


Dá pra ter uma ideia da TFG
só com a creatinina
plasmática?
Creatinina
 Vantagens
 Detecção bioquímica simples e barata.
 Produção endógena é constante em um mesmo
indivíduo: metabolismo da creatina pelo músculo.
 Valores normais de 0,6 a 1,3 mg/dL
 Inconvenientes
 Variações na produção (Desnutrição ou perda de
massa muscular, envelhecimento)
 Não apresenta relação linear com a TFG
 Tem diferenças entre gêneros e etnias
Relação da Creatina com a TFG
(RFG)
150 homem 35 anos, 70 Kg
homem 75 anos, 70 Kg
mulher 75 anos, 50Kg
RFG (mL/min/1,73m2)

90

60

30
15

0 0,6 1,3 2 4 6 8
Creatinina (mg/dL)
Como a TFG é medida?
 Conceito de clearance
 Substância filtrada livremente pelo glomérulo
 Não reabsorvida ou secretada
massa filtrada = massa excretada na urina

TFG .Px = V.Ux, onde V=fluxo urinário (ml/min)

TFG = V.Ux/Px
Filtração Glomerular
FSR
Membrana
TFG
Filtração

A. A.
Aferente Eferente

Fluxo
urinário
(ml/min)
Resumindo ...
 Para medir a Taxa de Filtração Glomerular
eu preciso:
 1) Dosar o ”marcador” no plasma
 2) Dosar o ”marcador” na urina
 3) Ter uma medida de fluxo urinário, ou
seja, coletar urina em um período definido
para poder calcular o fluxo urinário em
ml/min....
Clearance – Cálculo teórico
 Fórmulas matemáticas para cálculo
Clearance creatinina (Cockcroft e Gault,
1976)
 Cálculo baseado no peso ideal do paciente
(massa muscular),no metabolismo muscular
(idade e gênero) e na medida da creatinina
endógena.
 Cromógenos plasmáticos e secreção tubular.
 Hiperestima clearance em obesos e pacientes
edemaciados
Creatinina Plasmática permite
inferir clearance
 Clearance Teórico:

TFG = (140 - Idade) x Peso (Kg)


-------------------------------------- X 0.85 para mulheres
72 X [creatinina]plasma

Problemas:

Uso da creatinina como marcador de TFG


Peso do paciente
Novas fórmulas
http://mdrd.com/
 CKD-EPI 2009 creatinina (CKD-EPIcreat)
eRFG=141 x min(Creat/κ,1)α x max(Creat/ κ,1)-
1,209
x 0,993 Idade x 1,018 (se mulher) x1,159 (se
negro)
κ= 0,7 se mulher ou 0,9 se homem
α=-0,329 se mulher ou -0,411 se homem
 Equação do estudo MDRD

eRFG= 186 x (CrS)-1,154 x (Idade)-0,203 x (0,742 se


mulher) x (1,210 se negro)
Usos clínicos da medida do
clearance
• Detecção de doença renal

• Avaliação da progressão das doenças renais

• Avaliação do início da terapêutica (diálise ou


transplante renal)

• Avaliação para ajuste da posologia de


medicamentos de excreção renal
Filtração glomerular

 Valores normais: 90-120 ml de filtrado por


minuto por 1.73m2 de área de superfície
corporal.
Estadiamento da Doença Renal
Crônica
Propedêutica Renal - Filtração

 Uréia (Richard Bright, 1827)


 produção variável com dieta proteica
 reabsorção variável (Túbulo coletor:
relacionada com HAD)
 HAD =  TcH2O =  reabsorção de uréia

 Concentração plasmática variável com:


Doenças hepáticas, sangramentos intestinais
(amônia), drogas, bilirrubinas, ácido úrico e
hiperlipemia.
Uso clínico da quantificação da
uréia
 Idéia: com redução da TFG renal há
acúmulo de substâncias nitrogenadas no
plasma
 Uréia = marcador de retenção
nitrogenada.
 Valor normal = < 50 mg/dl em plasma.
Correlaciona-se com a clínica de falência
renal (uremia) geralmente com valores
acima de 200 mg/dl.
Ureia
Depende do estado nutricional e
da dieta. A clínica é soberana!

Ureia não mede função renal.


Quem estima a TFG é a
creatinina!

Não faz sentido pedir Ureia se a


Creatinina for
Normal (não jogue $ pela janela!)
Outros métodos disponíveis
para aferição da TFG
 51Cr-EDTA,125I-Iotalamato, 99m
Tc-
DTPA, 99mTc-MAG3,
 Cistatina C
 Proteina livremente filtrada
 Produzida constantemente (inibidor de
cisteína-proteases)
 Correlação linear com a TFG.
Moral da História - 1
 A Taxa de filtração glomerular dá uma idéia da
função global dos rins
 A TFG pode ser inferida através das dosagem
plasmática de creatinina.
 A variação da creatinina no plasma não está
relacionada de forma linear com a TFG. Deve-se
calcular o clearance teórico para se ter uma idéia
mais precisa da função renal de um dado
indivíduo: TFG= (140 – idade) x peso/72 x creat
(x 0.85 ♀). Melhor uso App com calculo CKD-EPI
2009
 Uréia é um marcador útil para dimensionar o grau
de retenção nitrogenada.
Quando eu devo pedir o
clearance medido?

 Para a indicação de diálise (Lei)


 No doador renal ”vivo”
Estadiamento da Doença Renal
Crônica
Proteinúria
 Por sorte, haverá uma aula somente sobre
proteinúria – Aguardem!
A excreção de proteínas é baixa

Normal: < 300 mg/dia


Destes < 30mg/dia são
albumina!
Proteinuria = mg proteinuria /g creatinina
Risco de progressão para DRC baixo moderado alto muito alto
Kdigo 2013
Como deve ser feita a
pesquisa de proteinuria?
 Preferencialmente por amostra da manhã,
corrigida pela creatinina urinária –
Equivalente aos valores de mg/dia (mg de
proteina/ g de creatinina urina);
 Alternativamente em coleta de urina de
24h.
 *Albuminúria (detecção de doença
precoce glomerular) pode ser feita da
mesma forma
Microalbuminúria

Proteinuria = mg proteinuria /g creatinina


Risco de progressão para DRC baixo moderado alto muito alto
Kdigo 2013
Avaliação da Função Renal
 Avaliação
 Quantitativa = clearance de creatinina

 Qualitativa = natureza da composição da urina


 Composição da membrana de filtração glomerular
 (fluído tubular tem baixa concentração de
proteínas)
 Função tubular (secreção e reabsorção tubular)
Urina
Rotina

Gérard Dou, Mulher hidróptica,


Louvre, Paris.
Análise bioqúimica
Alterações da cor
Amarelo Palha - Recente ingestão de líquidos ou no caso de diabetes
(tanto insípidus quanto mellitus).

Âmbar - Presença de bilirrubina na amostra.

Alaranjada - Interferência de medicamentos, como Piridium ou mesmo


vitamina A.

Vermelha - Presença de hemácias, hemoglobina, mioglobina e porfirinas.

Castanha / Preta - Alcaptonúria (presença de ácido homogentísico),


presença de melanina.

Verde - Interferência de medicamentos (Amitriptilina, metocarbamol,


indican e azul-de-metileno
Avaliação bioquímica
 Glicose (positivo acima de 180 mg/dl plasma).
Qualitativo (+/++++)
 Proteínas: Reação específica para albumina:
traços a ++++. (acima de 150 mg/24hs).
 Nitrito: Na urina há nitrato, que pode ser
convertido a nitrito na presença de bactérias.
 Hemoglobina: Reação para detectar peroxidase:
hemácias, Hb, Mb +/++++.
 Leucócitos: Detecta mieloperoxidase: +/++++
Avaliação bioquímica -UR
 pH: pH urinário é ácido (~5). Varia com a
dieta (consumo de proteínas)
 Densidade: Correlaciona-se com
osmolaridade plasmática. Capacidade de
concentrar urina está preservada se
densidade>1018.
 Se houver proteinúria ou glicosúria, a
densidade não se correlaciona com a
osmolaridade urinária.
1500
Osmolaridade (mOsm)

1250

1000

750

500

250

0
1000 1005 1010 1015 1020 1025 1030 1035
Densidade Urinária
Urina Rotina – Análise sedimento
urinário
 Hemácias: < 2-4 por campo.
 Leucócitos: < 10 por campos, sem
agrupamentos
 Cilíndros: Hialinos (proteínas), hemáticos
(glomerulonefrite) ou granulosos (células).
 Cristais: Urato, fosfato, oxalato etc…
Hematúria Diagnóstico
Diferencial
 Dismorfismo eritrocitário
 Análise do sedimento urinário em microscópio
de contraste de fase
 Objectivo: Analisar a forma das hemácias

 Hematúria glomerular:
 acima de 70% de hemácias dismórficas
(deformadas).
 5% acantócitos
Dismorfismo eritrocitário

hemácias hemácias
isomórficas dismórficas
HEMATÚRIA GLOMERULAR E ACANTÓCITOS
Cilindros
Hialinos

Granulosos

Hemáticos
Cristais

Urato
Oxalato de
cálcio

Cistina Estruvita
(fosfato
magnésio
amônio)
Urina Rotina: Uso Clínico
 Exame barato e de simples execução (fita
custa cerca de R$ 0,50!)
 Fornece pistas importantes em doenças
glomerulares, infecções do trato urinário,
litíase, neoplasia de bexiga, mieloma
múltiplo e outras doenças renais.
 Lembre-se: Muitas doenças renais são
assintomáticas e a Urina Rotina pode
fornecer sinal de alerta.
Propedêutica Renal - Manutenção da
composição do “meio interior”

 Eletrólitos: sódio, potássio, cálcio e


fosfatos (FeNa)
 Equilíbrio ácido-base (gasometria)
 Tonicidade (prova de concentração
urinária)
 Hemograma: Avaliar anemia.
 PTH, vitamina D
Conclusão
 A medida da TFG permite avaliar
quantitativamente a função renal.
 A análise da urina, através da urina rotina,
permite avaliar parcialmente alguns
aspectos qualitativos e detectar
proteinúria, hematúria e capacidade de
concentração urinária
Muito Obrigado

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