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O RACIONALISMO

DE RENÉ DESCARTES
Da dúvida ao cogito

O projeto cartesiano

FILOSOFIA 11.º ano


O PROJETO CARTESIANO
• René Descartes (1596-1650) é um dos mais famosos racionalistas de
todos os tempos.
• O seu objetivo era encontrar um fundamento seguro para o
conhecimento, uma vez que o conhecimento do seu tempo era duvidoso e
mal organizado. Para isso, pretende fazer uma reforma radical do
conhecimento e “começar de novo” a construir o edifício do saber.
• Atenção que para Descartes seguro significa indubitável.
• O método a que decidiu recorrer consistia em quatro regras racionais, da
qual se destaca a regra da evidência e que usa como instrumento
a“dúvida metódica”.
O PROJETO CARTESIANO
O objetivo fundamental do pensamento de Descartes é uma profunda
reforma do conhecimento humano que o coloque à margem de qualquer
dúvida – Projeto cartesiano

Trata-se de justificar ou fundamentar as nossas crenças de forma a


garantirmos, sem margem para dúvida, a sua verdade.
A dúvida metódica, de acordo com a regra da evidência, consiste em rejeitar
como falso tudo o que seja meramente duvidoso até encontrar uma crença que seja
absolutamente certa e indubitável.
O MÉTODO CARTESIANO
• O seu objetivo era encontrar um fundamento seguro para o conhecimento.
O método a que decidiu recorrer consistia e quatro regras racionais, da qual se destaca a regra da evidência e que
usa como instrumento a“dúvida metódica”. Como encontrar uma verdade absolutamente indubitável? Como
encontrar uma verdade sobre a qual não possa recair a mínima suspeita de falsidade?
Método Racional – 4 regras – salienta-se a primeira: regra da evidência O QUE DIZ?

“ Nunca aceitar como verdadeira alguma coisa sem a


conhecer evidentemente como tal: não incluir nos
nossos juízos senão o que se apresentar tão clara e tão
distintamente ao meu espírito que não tivesse nenhuma
ocasião para o pôr em causa” Discurso do Método
Instrumento? DÚVIDA METÓDICA
O MÉTODO CARTESIANO
“ Nunca aceitar como verdadeira alguma coisa sem a conhecer evidentemente
como tal: não incluir nos nossos juízos senão o que se apresentar tão clara e
tão distintamente ao meu espírito que não tivesse nenhuma ocasião para o
pôr em causa”
Instrumento? DÚVIDA METÓDICA
• A dúvida metódica, de cordo com a regra da evidência, consiste em rejeitar como
falso tudo o que seja meramente duvidoso até encontrar algo que seja absolutamente certo
e indubitável.
• Funciona como um teste – Porquê?
SEPARANDO O VERDADEIRO DO FALSO

 Descartes sempre se preocupou em dirigir bem o seu


espírito na procura da verdade.

 Para isso, inventou um método constituído por quatro


regras simples das quais se destaca a primeira – a regra da evidência.
 Esta ordena que se se considere como falso o que não for
absolutamente verdadeiro ou evidente (claro e distinto) E considerar como sempre nos enganando aquilo que
alguma vez nos enganar – Dúvida hiperbólica
Para mostrar que os céticos estavam enganados, Descartes
propõe um método de investigação cuja regra fundamental
É a regra da evidência e de que o instrumento principal é :
a dúvida metódica.
Consiste em tomar como se fossem
falsas todas as nossas crenças acerca
ca c a
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das quais possa ser levantada a mais


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pequena dúvida. Então, o que carateriza


e h vida

a dúvida?? Ela é

metódica e hiperbólica.

OBJETIVO
Encontrar uma ou mais crenças indubitáveis.
Da dúvida ao cogito

METÓDICA?

• Porque cumpre a regra metódica da evidência que exige considerar


falso o que for duvidoso – separar o verdadeiro do falso
• O que vai considerar falso?

FILOSOFIA 11.º ano


Dúvida Metódica

Metódica
•Porque aplica a regra metódica da evidência que exige
considerar falso o que for duvidoso – separar o verdadeiro do
falso
•O que vai considerar falso?
1. Considerar falsa qualquer opinião ou crença em que
detetarmos a mínima fragilidade, isto é, sobre a qual possamos
ter uma razão para duvidar, por mais ténue que seja.
2. Considerar que qualquer faculdade que usamos para
conhecer não merece confiança se alguma vez nos tiver
enganado ou se tivermos alguma razão para suspeitar de que
nos pode enganar.
FILOSOFIA 11.º ano
Da dúvida ao cogito

HIPERBÓLICA?

• Propositadamente exagerada… Qual é o exagero?


1. Identificar o duvidoso com o falso.
2. Considerar que aquilo (“faculdade de conhecimento”) que nos enganou uma
vez pode enganar-nos sempre.

• Para quê? Finalidade da dúvida metódica e hiperbólica


• Assegurar que a crença que resistir à dúvida é absolutamente evidente – verdade
inquestionável.
FILOSOFIA 11.º ano
Da dúvida ao cogito

O EXERCÍCIO DA DÚVIDA

Só o que for impossível considerar duvidoso merece o nome de


verdade – de acordo com a regra da evidência

A dúvida é o instrumento ou meio de examinar que crenças ou


opiniões merecem o nome de verdades indiscutíveis (teste).

FILOSOFIA 11.º ano


Da dúvida ao cogito

O EXERCÍCIO DA DÚVIDA

1. Considerar falsa qualquer opinião ou crença em que detetarmos a


mínima fragilidade, isto é, sobre a qual possamos ter uma razão para
duvidar, por mais ténue que seja.
2. Considerar que qualquer faculdade que usamos para conhecer não
merece confiança se alguma vez nos tiver enganado ou se tivermos
alguma razão para suspeitar de que nos pode enganar.

FILOSOFIA 11.º ano


Da dúvida ao cogito

OUTRAS CARATERÍSTICAS…

• Provisória ????

• Universal?????
• P. 20

FILOSOFIA 11.º ano


DÚVIDA METÓDICA

• É metódica porque …
• Não se trata de uma suspensão permanente do juízo, mas sim de uma
decisão de considerar provisoriamente falso tudo o que seja minimamente
duvidoso.

• É hiperbólica (ou exagerada), pois rejeita como falso


tudo aquilo que seja meramente duvidoso.– para quê?
• É absolutamente universal, pois, à partida, aplica-se a todas as crenças,
isto é?, pelo menos até que se encontre algo que seja absolutamente
indubitável.
DÚVIDA METÓDICA VS DÚVIDA CÉTICA

• A dúvida metódica é provisória porque não se identifica com a dúvida


cética original.

• Trata-se de um instrumento do método para alcançar o conhecimento e


provar a insustentabilidade do próprio ceticismo.

• Assim, não é um ponto de chegada – o desfecho inevitável de um


rigoroso processo de reflexão –, mas sim um ponto de partida
– um meio para alcançar a verdade.
O projeto de Descartes

Será que Descartes vai ser bem-


sucedido? Será que conseguirá provar
sem margem para dúvida que há crenças
verdadeiras?
Aguarde pelos próximos episódios.

FILOSOFIA 11.º ano


A APLICAÇÃO DA DÚVIDA METÓDICA P. 21

• A dúvida metódica não se aplica individualmente a cada uma das nossas


crenças (tarefa que seria interminável), mas sim às nossas principais
fontes de crenças: os sentidos (crenças a posteriori) e a razão (crenças
a posteriori).

• Assim, Descartes vai começar por averiguar se temos boas razões para
confiar nos nossos sentidos e, em seguida, irá tentar perceber se podemos
confiar nos nossos raciocínios.
RAZÕES PARA DUVIDAR

• Ao longo deste exercício, Descartes apercebe-se que existem razões para


duvidar destas duas fontes de crenças, a saber:

– As ilusões dos sentidos;

– A indistinção vigília-sono – o argumento do sonho

– Os erros de raciocínio

– A hipótese do Génio Maligno


AS ILUSÕES DOS SENTIDOS

“Sem dúvida, tudo aquilo que até ao presente admiti como maximamente
verdadeiro foi dos sentidos ou por meio dos sentidos que o recebi. Porém,
descobri que eles por vezes nos enganam, e é de prudência nunca confiar
totalmente naqueles que, mesmo uma só vez, nos enganaram. ”
René Descartes (1641). Meditações sobre a Filosofia Primeira.
Trad. Gustavo de Fraga. Coimbra: Almedina, 1992, p. 107

Os sentidos não são uma fonte


segura de conhecimento.
AS ILUSÕES DOS SENTIDOS

Acreditas se te disser que os círculos azuis têm o mesmo tamanho?


AS ILUSÕES DOS SENTIDOS
1) Os nossos sentidos enganam-nos algumas vezes.

2) Se os nossos sentidos nos enganam, então não podemos saber se nos


estão a enganar neste momento ou não.

3) Se não podemos saber se os nossos sentidos nos estão a enganar, então


não podemos confiar neles.
Aplicando o princípio hiperbólico da dúvida, segundo o qual devemos
rejeitar como falso tudo o que seja minimamente duvidoso, Descartes
conclui:
(4) Logo, não podemos confiar nos sentidos e nas crenças a posteriori.
A INDISTINÇÃO VIGÍLIA-SONO
“deCom efeito, quantas vezes me acontece que, durante o repouso noturno, me deixo persuadir
coisas tão habituais como que estou aqui, com o roupão vestido, sentado à lareira, quando,
todavia, estou estendido na cama e despido! Mas agora, observo este papel seguramente com
os olhos abertos, esta cabeça que movo não está a dormir, voluntária e conscientemente
estendo esta mão e sinto-a: o que acontece quando se dorme não parece tão distinto. Como se
não me lembrasse de já ter sido enganado em sonhos por pensamentos semelhantes! Por isso,
se reflito mais atentamente, vejo com clareza que vigília e sono nunca se podem distinguir por
sinais seguros.

René Descartes (1641). Meditações sobre a Filosofia Primeira.
Trad. Gustavo de Fraga. Coimbra: Almedina, 1992, p. 108

Não podemos distinguir de forma segura as experiências que temos quando


estamos acordados daquelas que temos nos nossos sonhos.
A INDISTINÇÃO VIGÍLIA-SONO
A INDISTINÇÃO VIGÍLIA-SONO
1) Não podemos distinguir por nenhum sinal seguro as experiências que temos durante os sonhos
daquelas que temos durante o estado de vigília.
2) Se não podemos distinguir por nenhum sinal seguro as experiências que temos durante os sonhos
daquelas que temos durante o estado de vigília, então as crenças que formamos a partir da
experiência sensível não estão devidamente justificadas.
3) Se as crenças que formamos a partir da experiência sensível não estão devidamente justificadas,
então não podem constituir conhecimento.
4) Não havendo um critério absolutamente claro e distinto para distinguir o sonho da realidade, não
podemos considerar verdadeira a crença na existência de realidades físicas. Aplicando o princípio
que regula a aplicação da dúvida hiperbólica, tenho de concluir que o facto de julgar que tenho
um corpo e de existirem coisas físicas é uma ilusão.
5) Logo, as crenças que formamos a partir da experiência sensível não podem constituir
conhecimento, incluindo a crença empírica sobre a existência do mundo físico.
ERROS DE RACIOCÍNIO

“mais
E porque há homens que se enganam ao raciocinar, mesmo a propósito dos
simples temas de geometria […], ao considerar que eu estava sujeito a
enganar-me como qualquer outro, rejeitei como falsas todas as razões de que
anteriormente me servira nas demonstrações.

René Descartes (1637). Discurso do Método.
Trad. João Gama. Lisboa: Edições 70, 2013, pp. 49-50

Não podemos confiar nos nossos raciocínios.


ERROS DE RACIOCÍNIO

1) Podemos cometer erros mesmo nos raciocínios mais simples.

2) Se podemos cometer erros mesmo nos raciocínios mais simples, então não
podemos justificadamente acreditar em crenças que tenham origem no
nosso raciocínio.
3) Aplicando o princípio hiperbólico….

4) Logo, não podemos justificadamente acreditar em crenças que tenham


origem no nosso raciocínio a priori ou demonstrativos
A HIPÓTESE DO GÉNIO MALIGNO

“génio
Vou supor, por consequência, não o Deus sumamente bom, fonte da verdade, mas um certo
maligno, ao mesmo tempo extremamente poderoso e astuto, que pusesse toda a sua
indústria em me enganar. Vou acreditar que o céu, a terra, as cores, as figuras, os sons, e todas
as coisas exteriores não são mais do que ilusões de sonhos com que ele arma ciladas à minha
credulidade. Vou considerar-me a mim próprio como não tendo mãos, não tendo olhos, nem
carne, nem sangue, nem sentidos, mas crendo falsamente possuir tudo isto. […]
Por conseguinte, suponho que é falso tudo o que vejo. Creio que nunca existiu nada daquilo que
a memória enganadora representa. Não tenho, absolutamente, sentidos; o corpo, a figura, a
extensão, o movimento e o lugar são quimeras. Então, o que será verdadeiro? Provavelmente
uma só coisa: que nada é certo.
” René Descartes (1641). Meditações sobre a Filosofia Primeira.
Trad. Gustavo de Fraga. Coimbra: Almedina, 1992, pp. 113-118
A HIPÓTESE DO GÉNIO MALIGNO
1) Não podemos saber se existe um Génio Maligno.
Aplicando o princípio da duvida hiperbólica….

2) Se não podemos saber se existe um tal Génio Maligno, então não temos
justificação para acreditar que as nossas crenças, mesmo as demonstrações
matemáticas, não têm origem nas suas maquinações.

3) Se não temos justificação para acreditar que as nossas crenças não têm
origem nas maquinações de um tal Génio Maligno, então não temos
conhecimento.

4) Logo, não temos conhecimento a posteriori e também não temos


conhecimento apriori.
O COGITO
O COGITO

“falso,
Mas, logo a seguir, notei que, enquanto assim queria pensar que tudo era
era de todo necessário que eu, que o pensava, fosse alguma coisa. E
notando que esta verdade: penso, logo existo, era tão firme e tão certa que
todas as extravagantes suposições dos céticos não eram capazes de a abalar,
julguei que a podia aceitar, sem escrúpulo, para primeiro princípio da filosofia

que procurava.
René Descartes (1637). Discurso do Método.
Trad. João Gama. Lisboa: Edições 70, 2013, pp. 50-51

“Penso; logo, existo!” é uma crença absolutamente certa e indubitável.


O COGITO

1) Se fosse verdade que nada se pode saber, então nem sequer poderíamos
saber que existimos.

2) Mas sabemos que existimos (essa ideia não pode ser seriamente posta em
causa).

3) Logo, é falso que nada se pode saber.


A IMPORTÂNCIA DO COGITO - CARATERÍSTICAS
• O cogito é a primeira verdade - é uma crença básica, que não precisa de ser justificada
com base noutras crenças.
• É uma intuição racional –não é uma dedução ou indução porque não implica qualquer
tipo de raciocínio
• O cogito pode estabelecer-se como o fundamento seguro para o conhecimento que
Descartes procurava – “alicerce”
Assim, o cogito representa um triunfo sobre o ceticismo.
• O cogito pode ser conhecido a priori, pois basta-me pensar para saber que esta proposição
é verdadeira e fornece-nos informação acerca do mundo, a saber, diz-nos que existe pelo
menos um ser pensante e é uma Ideia inata p. 37
• É uma substãncia pensante independente do corpo – dualismo cartesiano p. 35
• O cogito é também um modelo daquilo que deve ser considerado verdadeiro, ou seja,
oferece um critério de verdade.
CRITÉRIO DE VERDADE

Só devemos aceitar como verdadeiras as ideias que, à


semelhança do cogito, somos capazes de conceber de
forma absolutamente clara e distinta.
Da dúvida ao cogito

AS CARATERÍSTICAS DA PRIMEIRA VERDADE INDUBITÁVEL

6. É um modelo e um critério de verdade.

O Cogito é um modelo e um critério de verdade porque só é verdadeiro


o que apreendemos com clareza e distinção. Serão verdadeiras todas as
ideias que forem tão claras e distintas como este primeiro
conhecimento. É claro e distinto o que a razão, independentemente dos
sentidos, considera impossível ser falso.

FILOSOFIA 11.º ano


Da dúvida ao cogito

AS CARATERÍSTICAS DA PRIMEIRA VERDADE INDUBITÁVEL

O Cogito é uma ideia inata – que a razão descobre em si sem recorrer à


experiência. A primeira verdade é uma ideia inata (tem origem na razão) e
não uma ideia adventícia (ideias que derivam da experiência) ou factícia
(produto da imaginação).
O «Eu penso, logo, existo» ou a existência do eu pensante é uma verdade que
não deriva ou depende da experiência, dos sentidos. Apresenta-se à razão como
verdade de que ela não pode duvidar. Está no nosso espírito desde sempre (ao
nascer) e, mesmo que não tenhamos desde logo consciência dela, a nossa razão
descobre-a quando dá atenção a si e não às coisas exteriores.
FILOSOFIA 11.º ano
TIPOS DE IDEIAS
Adventícias Factícias Inatas

Não dependem da Inventadas pela Parecem ter nascido connosco, pois


vontade e parecem vontade e não parecem ter sido causadas por
ser causadas por imaginação, a partir objetos físicos exteriores à mente nem
objetos físicos de outras ideias dependem da vontade (isto é, não são
exteriores à mente (exemplos: sereias; criadas pela nossa imaginação);
(exemplos: mesa; unicórnios; dependem apenas da nossa capacidade
cadeira; calor;…). centauros;…). de pensar, ou seja, correspondem a
conceitos matemáticos – como os
conceitos de número; triângulo;
círculo; etc. – e a conceitos metafísicos
– como os conceitos de substância;
verdade; Cogito e Deus.
LIMITAÇÃO DA PRIMEIRA VERDADE

O solipsismo ????
A DESCOBERTA DE UMA VERDADE ABSOLUTAMENTE
INDUBITÁVEL – MAS….

O Cogito corresponde ao “grau zero” do conhecimento no


que respeita aos objetos físicos e inteligíveis – Solipsismo –
só temos verdades na primeira pessoa.
Descartes fala na 1ª pessoa. De facto, dizer “Penso que
tenho uma folha de papel à minha frente” é diferente de
“Tenho uma folha de papel à minha frente” .
Só a primeira proposição passa no teste da dúvida. Mas daí não se
Cada um de nós sabe sem dúvida possível que pensa, logo, segue que possa
existe. saber o mesmo
acerca de
qualquer outra
coisa além de si.
nor num

?
em
par
me
Re
por
LIMITAÇÕES DO COGITO
. O Cogito corresponde ao “grau zero” do conhecimento
no que respeita aos objetos físicos e inteligíveis –
Solipsismo – só temos verdades na primeira pessoa. O
conteúdo do pensamento (a priori e a posteriori) pode
ser falso. Só temos a certeza da existência do
pensamento (substância pensante) mas não do seu
conteúdo objetivo – LIMITAÇÃO DA PRIMEIRA
VERDADE.
A IDEIA DE DEUS
• Entre as várias ideias que Descartes encontra na sua mente, existe uma
que se distingue de todas as outras: a ideia de Deus, ou ser perfeito.
• Esta ideia é especial porque provar que Deus existe e não é enganador
talvez seja a única forma de podermos estar certos de muitas outras coisas
para além da nossa existência enquanto pensamento, pois um criador
supremo e sumamente bom não nos teria criado de forma que
estivéssemos permanentemente a ser enganados e nunca pudéssemos
conhecer a verdade.
• Para provar que Deus existe, Descartes recorre, entre outros, ao chamado
“argumento da marca”.
O que falta aqui?
O ARGUMENTO DA MARCA
“inteiramente
Depois disto, tendo refletido que duvidava e que, por consequência, o meu ser não era
perfeito, pois via claramente que conhecer é uma maior perfeição do que
duvidar, lembrei-me de procurar de onde me teria vindo o pensamento de alguma coisa
mais perfeita do que eu; e conheci, com evidência, que se devia a alguma natureza que
fosse, efetivamente, mais perfeita. […] De maneira que restava apenas que ela tivesse
sido posta em mim por uma natureza que fosse verdadeiramente mais perfeita do que
eu, e que até tivesse em si todas as perfeições de que eu podia ter alguma ideia, isto é,
para me explicar com uma só palavra, que fosse Deus.

René Descartes (1637). Discurso do Método.
Trad. João Gama. Lisboa: Edições 70, 2013, pp. 52-53

Além de mim, tem de existir um Deus ou ser perfeito que é a origem da


minha ideia de perfeição.
O ARGUMENTO DA MARCA

1) Tenho a ideia de “ser perfeito”.

2) Se eu tenho a ideia de “ser perfeito”, é porque existe um ser perfeito que é


a origem desta ideia. Porquê? Princípio da Causalidade…..

3) Ou eu mesmo sou o ser perfeito ou há outra coisa (além de mim) que é o


ser perfeito e que deu origem à minha ideia de perfeição.

4) Eu não sou perfeito.

5) Logo, existe outra coisa (além de mim) que é o ser perfeito e que
deu origem à minha ideia de perfeição.
O PAPEL DA EXISTÊNCIA DE DEUS
“creio
E por mais que os melhores espíritos estudem isto, tanto quanto lhes agradar, não
que possam apresentar alguma razão que seja suficiente para eliminar essa dúvida,
se não pressupuserem a existência de Deus. Pois, primeiramente, aquilo mesmo que há
pouco tomei como regra, isto é, que são inteiramente verdadeiras as coisas que
concebemos muito clara e distintamente, só é certo porque Deus é ou existe, e porque é
um ser perfeito e tudo o que existe dele nos vem. Donde se segue que as nossas ideias
ou noções, sendo coisas reais e que provêm de Deus em tudo aquilo em que são claras e
distintas, unicamente podem ser verdadeiras.

René Descartes (1637). Discurso do Método.
Trad. João Gama. Lisboa: Edições 70, 2013, pp. 59

Aquilo que concebo de forma clara e distinta só é certo porque Deus existe.
O PAPEL DA EXISTÊNCIA DE DEUS

o Deus garante que:


• podemos confiar nas nossas ideias claras e distintas atuais e passadas;
• podemos confiar nos nossos raciocínios apoiados em premissas claras
e distintas.
• o mundo material existe.
• podemos, geralmente, saber quando estamos apenas a sonhar,
ou seja, podemos distinguir a vigília do sono.
OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO

o Objeção à hipótese do Génio Maligno:


• O filósofo George Edward Moore considera que, ao recorrer à hipótese
do Génio Maligno para descobrir o que é que podemos efetivamente
saber, Descartes está a estabelecer padrões demasiado elevados para o
conhecimento. É certo que se não tivermos forma de justificar uma
dada crença, não podemos dizer que temos conhecimento, mas isso não
significa que a nossa justificação tem de ser absolutamente infalível, à
prova de Génio Maligno.
OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO

o Objeção ao cogito:
• Alguns autores consideram que o cogito não é algo absolutamente certo
e indubitável. Em vez de o entenderem como uma proposição simples,
que se limita a afirmar: “Há pensamento”, veem nessa afirmação uma
conjunção de várias ideias: “Há pensamento e há um e apenas um ser
pensante a quem esse pensamento pertence e esse ser pensante sou Eu”.
Ora, Descartes não se encontrava em condições de afirmar que sabia
tudo isso.
OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO

o Objeção ao argumento da marca – parte I:


• Para alguns filósofos, na melhor das hipóteses, temos uma conceção
vaga e difusa do que possa ser um ser perfeito, mas dadas as nossas
capacidades limitadas, não somos capazes de abarcar através do nosso
pensamento um conceito tão vasto e ilimitado quanto o conceito de
Deus. Assim sendo, nem sequer podemos dizer que temos
propriamente a ideia de “ser perfeito”.
OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO

o Objeção ao argumento da marca – parte II:


• Podemos ser nós mesmos a criar a ideia de “ser perfeito” através da
nossa imaginação. Tal como formamos a ideia de “Super-Homem”,
imaginando um homem dotado de capacidades extraordinárias, também
podemos imaginar o que seria um ser dotado de todas as perfeições de
que nos conseguimos lembrar. Nesse caso, o facto de termos a ideia de
“ser perfeito” não implica que o ser perfeito existe na realidade e
que é ele quem está na origem da nossa ideia de perfeição.
OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO

o Objeção do círculo cartesiano:


• Esta objeção acusa Descartes de cometer uma falácia da petição de
princípio, pois procura estabelecer a existência de Deus raciocinando a
partir de ideias claras e distintas (através do argumento da marca, por
exemplo), ao mesmo tempo que admite que só podemos estar certos de
que as nossas ideias claras e distintas atuais e passadas são verdadeiras
porque Deus existe.

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