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Crime preterdoloso

Trata-se de delito da espécie de crimes qualificados pelo resultado.


Previsto no art. 19 do Código Penal, caracteriza-se pelo cometimento de um crime,
mais grave, diverso do pretendido pelo agente.

Art. 19 - Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o


agente que o houver causado ao menos culposamente.

Cezar Roberto Bitencourt (Tratado de Direito Penal: parte geral, 1. Ed.


16ª. São Paulo. Saraiva. 2011. p. 343), ao tratar do assunto aduz que:

Além das duas modalidades de crimes – dolosa e culposa – expressamente


reguladas pelo nosso Código Penal, doutrina e jurisprudência reconhecem a
existência de uma terceira, que costumam designar como crime
preterdoloso ou crime qualificado pelo resultado. Crime preterdoloso ou
preterintencional tem recebido o significado de crime cujo resultado vai além
da intenção do agente, isto é, a ação voluntária inicial dolosamente e
termina culposamente, porque, afinal, o resultado efetivamente produzido
estava fora da abrangência do dolo. Em termos bem esquemáticos, afirma-
se, simplesmente, que há dolo no antecedente e culpa no consequente.

Assim, nos crimes pretedolosos o agente tem a intenção (dolo) da


prática de um determinado delito, entretanto, por negligência, imprudência ou
imperícia (culpa), acaba por produzir um crime mais grave.

Desse modo, diz-se que os crimes preterdolosos são aqueles onde há


dolo no antecedente (conduta querida, desejada pelo agente) e culpa no
consequente (crime produzido sem a intenção, por culpa).

Um bom exemplo é o trazido pela doutrina. Rogério Greco exemplifica


(resumidamente):

Um sujeito, com a intenção de causar lesões corporais em seu desafeto,


dar-lhe vários golpes na rua, este cai e vem a bater a cabeça no meio fio
causando sua morte.

O exemplo trazido possui todas as características de um delito


preterdoloso, vejamos: o agente tinha dolo no antecedente (causar lesões corporais
– crime menos grave), contudo, deu causa, a um crime mais grave (homicídio),
agindo com culpa (no consequente), haja vista que lhe era previsível a ocorrência do
resultado mais gravoso, assim agindo ele com imprudência, imperícia e negligência.
Portanto, houve dolo no antecedente (crime menos grave – lesão
corporal) e culpa no consequente, característica dos crimes preterdolosos.

Nesse sentido, o delito de lesão corporal seguida de morte (art. 129, §


3, do CP) ser um crime preterdoloso.

Lesão corporal

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

Lesão corporal seguida de morte

§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não


quís o resultado, nem assumiu o risco de produzí-lo:

Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Nesse contexto, importa frisar-se que, pela dicção do art. 19, do CP,
em não havendo culpa (caso furtuíto ou força maior) na produção do resultado mais
grave, o agente não será responsabilizado por este, significa dizer que apenas
responderá por seu dolo (crime o qual quis produzir), sem a incidência da
qualificadora.

Rogério Greco nos traz também um bom exemplo:

Um sujeito, com a intenção de causar lesões corporais em seu desafeto,


dar-lhe vários golpes em meio às dunas, este cai e vem a bater a cabeça
em uma pedra escondida pela areia da duna, causando sua morte.

Nesse caso, o agente só responde pela lesão corporal, haja vista que
não teria previsibilidade quanto a existência da pedra causadora da morte de seu
desafeto, portanto, não sendo o fato previsível, inexiste culpa, e não havendo culpa,
o agente responde exclusivamente pelo dolo (lesões corporais).

Não obstante, importante salientar que crime preterdoloso não é


sinônimo de crime qualificado pelo resultado, em outras palavras, todo crime
preterdoloso é um crime agravado pelo resultado, mas nem todo crime agravado
pelo resultado é preterdoldo.
Isto porque, nos crimes preterintecionais a lesão ao bem jurídico
antecedente é meio necessário a dar causa a lesão ao bem jurídico consequente.
Assim, não haveria a morte (lesão a vida, bem jurídico consequente), sem a lesão a
integridade física (bem jurídico antecedente).

Todavia, há crimes onde esse raciocínio não é válido, pode haver lesão
ao bem jurídico consequente independentemente de ser necessária a lesão ao bem
jurídico antecedente. É o caso do aborto seguido de morte da gestante (art. 125 e
126 combinados com o art. 127 in fine, do CP).

Nesse caso, a morte da gestante poderia ser provocada sem a


necessária tentativa do abortamento. Neste caso teremos um delito agravado pelo
resultado, mas não preterdoloso.

Na precisa lição de Bitencourt (Bitencourt, p. 344):

Têm-se utilizado, a nosso juízo, equivocadamente, as expressões crime


preterdoloso e crime qualificado pelo resultado como sinônimos. N entanto,
segundo a melhor corrente, especialmente na Itália, no crime qualificado
pelo resultado, ao contrário do preterdoloso, o resultado ulterior, mais grave,
derivado involuntariamente da conduta criminosa, lesa um bem jurídico que,
por sua natureza, não contém o bem jurídico precedente lesado. Assim,
enquanto a lesão corporal seguida de morte ( art. 129, § 3º) seria
preterintencional, o aborto seguido de morte da gestante ( arts. 125 e 126
combinados com o 127, in fine) seria crime qualificado pelo resultado. O
raciocínio é simples: nunca se conseguirá matar alguém sem ofender sua
saúde ou integridade corporal (lesão corporal seguida de morte: crime
preterdoloso), enquanto para matar alguém não se terá necessariamente de
fazê-lo abortar (aborto com ou sem consentimento da gestante: crime
qualificado pelo resultado).

Em conclusão, na prática de um delito preterdoloso haverá dolo no


antecedente e culpa no consequente, e necessariamente a lesão ao bem jurídico
antecedente é requisito necessário a lesão ao bem jurídico consequente. Ao
contrário estaremos diante de um delito meramente agravado pelo resultado.

Por fim, cumpre lembrar que se não houver, por parte do agente, culpa
no resultado agravante, este responde pelo delito o qual desejou praticar (seu dolo),
sem a incidência da agravante.

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