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FLAVIO FARAH

Ética Pessoal e Empresarial


Gestão de Pessoas

SAÚDE MENTAL NO TRABALHO


Flavio Farah*

Introdução
Este texto discorre sobre saúde mental no trabalho em seus vários aspectos.

Saúde mental no trabalho – conceito


De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), saúde mental é um estado de bem-estar
no qual o indivíduo usa plenamente suas capacidades, consegue lidar com as tensões normais do dia
a dia, é capaz de trabalhar de modo produtivo e eficaz e consegue contribuir para sua comunidade.

Fatores de risco mental no trabalho


Fatores de risco mental no trabalho são práticas de organização e de gestão do trabalho adotadas
ou toleradas pela empresa que têm probabilidade significativa de provocar danos à saúde mental
do trabalhador, ou seja, probabilidade significativa de causar-lhe problemas psicológicos.

Os fatores de risco mental no trabalho podem ser divididos em duas grandes categorias:

 Fatores relativos ao trabalho propriamente dito;

 Fatores relativos ao ambiente geral no qual o trabalho é realizado.

Fatores de risco relativos ao trabalho propriamente dito


 Carga de trabalho excessiva ou insuficiente;

 Imposição de metas inviáveis;

 Trabalho excessivamente difícil ou complexo;

 Tarefas monótonas ou desagradáveis;

 Subutilização das capacidades do trabalhador;

 Falta de participação nas decisões que afetam o trabalho.

Fatores de risco relativos ao ambiente geral


 Demandas múltiplas mutuamente incompatíveis por parte de gestores ou colegas;

 Incerteza em relação ao que a empresa espera do trabalhador;

 Falta de reconhecimento;
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 Percepção de tratamento injusto;

 Relações interpessoais inadequadas com colegas: bullying (intimidação) ou isolamento social;

 Estilo inadequado do chefe imediato: autoritarismo ou assédio moral ou sexual;

 Ameaça de perda do emprego;

 Demandas conflitantes entre a vida profissional e pessoal;

 Falta de apoio, no ambiente de trabalho, para compromissos pessoais ou falta de apoio, em casa,
para compromissos de trabalho.

Saúde mental no trabalho – abordagens


No tocante à saúde mental no trabalho, há duas abordagens possíveis: a abordagem de reabilitação,
que atua sobre os efeitos dos problemas, e a abordagem preventiva, que atua sobre suas causas.

Abordagem de reabilitação. A abordagem de reabilitação focaliza o trabalhador individual


e consiste em oferecer atendimento psicológico. A abordagem de reabilitação pode, eventualmente,
incluir também o estímulo à melhoria dos hábitos dos empregados, visando preservar sua saúde men-
tal e, talvez, aumentar sua capacidade de suportar condições de trabalho mentalmente prejudiciais.

A abordagem de reabilitação possui uma séria desvantagem: pelo fato de focalizar apenas o trabalha-
dor, sem intervir na organização, deixa de atacar as causas de seus problemas psicológicos. Como
consequência, seus efeitos tendem a ser de curta duração, ou seja, os problemas tendem a se repetir.

Abordagem preventiva. Em contraste, a abordagem preventiva foca a organização, o ambiente


de trabalho, em busca de fatores de risco mental. A vantagem desta abordagem é que, pelo fato de
atacar as causas dos problemas de saúde mental, constitui a maneira mais eficaz de preveni-los.

Uso exclusivo da abordagem de reabilitação. Uma das causas do uso exclusivo da aborda-
gem de reabilitação pelas empresas relaciona-se à questão da solução de problemas. Para se resolver
um problema, é imprescindível identificar suas causas. Os gestores, porém, costumam combater
os efeitos ou sintomas do problema em vez de buscar suas causas. O resultado é a não resolução
do problema e a produção de consequências nocivas.

A outra causa do uso exclusivo da abordagem de reabilitação é que a abordagem preventiva exige mu-
danças organizacionais no projeto do trabalho, em cronogramas de produção, na estrutura organiza-
cional ou em práticas gerenciais. Por essa razão, as medidas de intervenção tendem a se restringir aos
programas de reabilitação por serem mais simples, mais baratos e mais fáceis de implementar.

Efeitos da abordagem de reabilitação. Os programas de reabilitação induzem as pessoas


a acreditar que condições de trabalho mentalmente insalubres são normais, que ocorrem em todas
as empresas e que é natural os trabalhadores terem ansiedade, depressão e estresse. Assim, permane-
cem ocultos os fatores de risco mental no trabalho e a responsabilidade da empresa por eles. O uso
intencional e exclusivo da abordagem de reabilitação é uma prática típica de empresas antiéticas.
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Criação de um ambiente de trabalho sadio


Como poderia uma empresa agir preventivamente, criando um ambiente de trabalho sadio, que pro-
mova a saúde mental dos trabalhadores? Propõe-se um programa cujo conteúdo é dividido em quatro
etapas. Esse programa destina-se a eliminar os fatores de risco mental no trabalho.

Primeira etapa – Ética

É conveniente começar pelo início, pelo que é básico. A primeira etapa para criar um ambiente de tra-
balho sadio chama-se Ética. No caso, Ética Pessoal e Empresarial.

A empresa deveria criar um ambiente de trabalho pautado pelo cumprimento dos valores morais.

Segunda etapa – Relações Humanas

A segunda etapa chama-se Relações Humanas. Trata-se de modelar o ambiente de trabalho para que
seja baseado em práticas sadias de relações interpessoais.

Fases. Cada uma dessas duas etapas é dividida em três fases:

1ª) Educação (treinamento);


2ª) Normatização;
3ª) Fiscalização.

Ordem de realização. A primeira fase (educação) deveria ser ministrada aos diversos públicos
internos da empresa na seguinte ordem:

1º) Diretoria;
2º) Gerentes;
3º) Demais funcionários.

A razão dessa ordem de realização é que os cursos a serem ministrados na fase de educação incluirão
várias práticas e conceitos novos que, provavelmente, nunca foram vistos pelos participantes. Nestas
condições, será preciso que haja consenso na aplicação de tais conceitos e práticas, e esse consenso
deverá ser alcançado, em primeiro lugar, no escalão superior da empresa. Ademais, se os cursos fo-
rem ministrados primeiro aos gerentes ou aos demais funcionários, eles adquirirão conceitos, princí-
pios e critérios totalmente novos que não serão entendidos pelos diretores, o que, provavelmente,
criará sérios problemas de comunicação e talvez até conflitos.

A segunda fase (normatização) da primeira etapa (Ética) deveria incluir a revisão de todas as normas
empregatícias da empresa para que haja Ética na Gestão de Pessoas.

As duas primeiras etapas podem ser implantadas sem um diagnóstico da situação de cada funcionário
porque as normas de Ética e de Relações Humanas são uniformes, ou seja, valem para todos.
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Terceira etapa – Motivação – Teoria dos Dois Fatores

A terceira etapa refere-se à motivação para o trabalho. Essa etapa é baseada em uma teoria de moti-
vação para o trabalho denominada Teoria dos Dois Fatores, de autoria de Frederick Herzberg. A teo-
ria de Herzberg tem sido comprovada ano após ano pelas pesquisas.

Em resumo, segundo Herzberg, a produtividade depende de duas categorias de fatores: fatores moti-
vadores e fatores higiênicos.

Fatores motivadores. Os fatores motivadores são os seguintes:

 Realização (sentimento de auto-realização);


 Reconhecimento (reconhecimento pela empresa do bom desempenho do empregado);
 O trabalho em si (trabalho prazeiroso);
 Responsabilidade (autonomia);
 Progresso (na carreira);
 Crescimento (no cargo).

Os fatores motivadores referem-se à relação do empregado com o trabalho propriamente dito. Esses
fatores podem ou não existir. Quando existem, causam a produtividade e produzem satisfação profis-
sional.

Fatores higiênicos. Os fatores higiênicos são os seguintes:

 Políticas e administração da empresa (p. ex., excesso de burocracia);


 Estilo do supervisor;
 Relações interpessoais;
 Condições de trabalho (condições inadequadas ou falta de condições de trabalho);
 Salário;
 Segurança (no emprego);
 Status.

Os fatores higiênicos dizem respeito à relação do empregado com o ambiente de trabalho. Os fatores
higiênicos sempre existem, podendo estar adequados ou inadequados. Quando inadequados, pre-
judicam a produtividade (ainda que existam fatores motivadores) e produzem insatisfação profissio-
nal.

Em tais condições, a empresa deveria criar um programa de mudança com os seguintes objetivos:

1) Oferecer aos empregados os fatores motivadores citados por Herzberg.

2) Assegurar que os fatores higiênicos estejam adequados, pois eles têm forte impacto na saúde men-
tal dos trabalhadores. Por exemplo, um supervisor que pratique o assédio moral ou sexual contra
um subordinado poderá prejudicar seriamente sua saúde mental (fator Estilo do supervisor).
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Quarta etapa – Dinâmica do trabalho

A quarta etapa refere-se à dinâmica do trabalho. A empresa deveria oferecer a todos os empregados
uma carga de trabalho e uma jornada de trabalho adequadas, bem como estabelecer que, aos empre-
gados, só seriam impostas metas viáveis, onde metas viáveis são aquelas que a própria chefia imedia-
ta é capaz de cumprir e capaz de explicar como cumprir (explicação sobre as estratégias de alcance
das metas).

O critério oferecido acima para se identificar se uma certa meta é ou não viável tem, como principal
vantagem, impedir que qualquer gerente imponha metas inviáveis à equipe apenas para aumentar
seus próprios ganhos ou para criar motivos para demitir alguém.

Fases. A terceira e a quarta etapas do programa descritas acima são divididas em três fases:

1ª) Diagnóstico;
2ª) Plano de ação;
3ª) Implantação.

A terceira e a quarta etapas do programa iniciam-se com um diagnóstico porque cada empregado está
em uma situação diferente em termos de motivação e de dinâmica do trabalho, precisando, portanto,
de um diagnóstico e de um plano de ação individuais. O diagnóstico será feito por meio da realização
de uma Entrevista de Retenção com o funcionário.

Público-alvo. A terceira e a quarta etapas do programa visam primordialmente os funcionários


não gerentes. Caso necessário, essas etapas serão estendidas aos gerentes.

Conclusão
A questão da saúde mental no trabalho deve ser enfrentada adotando-se, simultâneamente, as duas
estratégias: prevenção e reabilitação.

Em particular, afirma-se que a prevenção, que se materializa por meio de um conjunto de mudanças
organizacionais, é uma questão ética. Em outras palavras, as empresas têm o dever moral de erradi-
car os fatores de risco mental no trabalho.

* Flavio Farah é Engenheiro, Mestre em Adm. de Empresas (concentração em RH) e Prof. Universitário da área de
Gestão de Pessoas e Comportamento Organizacional (20 anos de docência).
Experiência profissional anterior como engenheiro de projetos, líder de equipe de projetos, responsável técnico,
engenheiro de vendas, analista de processos e assistente de diretoria.
Especialista em Ética Pessoal e Empresarial (mais de 20 anos de experiência).
Autor do livro “Ética na Gestão de Pessoas”.
Autor do livro “Personalidade Autoritária: o caso do povo brasileiro” (30 anos de experiência no tema).
Especialista em Erros de Gestão de Pessoas (mais de 10 anos de experiência).
Articulista, palestrante e instrutor de treinamento.
Contato: farah@flaviofarah.com .
Endereço do currículo de Flavio Farah em seu perfil Linkedin .

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