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AULA 1

AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO
PSICOPEDAGÓGICA
INSTITUCIONAL

Profª Ana Paula Picheth


CONVERSA INICIAL

Compreender o processo de avaliação psicopedagógica institucional


requer apropriar-se das abordagens científicas que conversam sobre o tema. Esta
aula objetiva apresentar as concepções teóricas que contribuem
significativamente com a psicopedagogia escolar e que nutrem de elementos
práticos o fazer avaliativo do profissional que atuará na instituição.

CONTEXTUALIZANDO

Independente do contexto em que um sujeito esteja inserido, sempre estará


vivenciando oportunidades de aprendizagem que o ajudam a obter um resultado
adequado ao proposto pela tarefa principal, ou o colocam em dificuldade de
compreensão e execução desse processo. Cabe ao psicopedagogo institucional
detectar o desafio que impede a conclusão da tarefa objetivada e criar
oportunidades de superação. Algumas estratégias fundamentam o agir do
profissional institucional e facilitam a mediação da ação em prol da atividade em
si. Elementos de teoria sistêmica, epistemologia convergente, grupos operativos,
psicodrama e dinâmicas de grupo subsidiarão o exercício da ação
psicopedagógica institucional.

TEMA 1 – TEORIA SISTÊMICA

A teoria sistêmica considera que o sujeito é parte de um sistema de


funcionamento, o qual interfere na constituição do ser. Em se tratando de uma
instituição educacional, é importante observar que o psicopedagogo vai atuar nos
entraves da expressão da aprendizagem do aluno, do professor, da instituição e
de seus processos, e também da comunidade e seus costumes culturais.
Qualquer elemento desse contexto pode, em algum momento, não funcionar em
favor da tarefa a ser executada. As razões que prejudicam o aprendizado em
questão estão relacionadas aos demais elementos.
Uma visão psicopedagógica sistêmica analisa, dentro do processo de
aprendizagem, os contextos:

 De quem ensina: sua família (como pensa e age com base em princípios),
sua individualidade (personalidade, capacidade cognitiva), seu ambiente
social (experiências, constituição de parâmetros e crenças) e sua formação

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acadêmica;
 De quem aprende: sua família (como conhece, entende e age com base
em princípios), sua individualidade (personalidade e vínculo pessoal e com
a aprendizagem), seu ambiente social (experiências, constituição de
parâmetros e crenças, oportunidades e estímulos) e sua capacidade
cognitiva;
 Do ambiente escolar: sua estrutura e funcionamento, seus processos, o
contexto histórico de sua visão e a influência do ambiente em que está
inserido.
 Do contexto social: sobre as possibilidades de acesso da comunidade,
com demandas, crenças e costumes culturais.

Um psicopedagogo conhecedor dos sistemas em que se desenvolve o


processo de aprendizagem, e todas as variáveis que influenciam o processo, será
capaz de realizar, com mais precisão, um diagnóstico avaliativo, além de
promover intervenção que auxilie o sistema a avançar e desenvolver a
aprendizagem assertivamente.

TEMA 2 – EPISTEMOLOGIA CONVERGENTE

A Epistemologia Convergente foi criada por Jorge Visca (1935-2000), que


nasceu em Beradeiro, província de Buenos Aires, na Argentina. Essa linha teórica
propõe um trabalho clínico baseado no aproveitamento de três teorias que se
complementam e dão luz ao trabalho que Visca desenvolveu. São elas: a
Psicogenética (Piaget), a Psicanálise (Freud) e a Psicologia social (Enrique
Pichon Riviere).
Para Visca (1987), a aprendizagem é dependente de uma estrutura que
envolva o cognitivo/afetivo/social e das ligações indissociáveis entre esses três
elementos. Para analisar a origem das causas da aprendizagem, Visca faz uso
dessas três teorias quando considera, em uma análise, o sintoma (nível
semiológico), as causas atuais que promovem o aparecimento do sintoma (nível
patogênico), e um terceiro aspecto que investiga a gênese, ou seja, a causa
histórica (nível etiológico).

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2.1 Teoria psicogenética

A ideia fundamental da teoria genética de Piaget é que o conhecimento se


desenvolve com base nas relações de troca que o indivíduo estabelece com o
meio, e como age, física ou mentalmente, sobre a realidade. A ação do sujeito é
a principal fonte do conhecimento, e é de onde surgem as noções de assimilação,
acomodação e adaptação (conceitos da teoria piagetiana). Para Piaget o
conhecimento não é estático, pois se movimenta e é dinâmico, uma vez que varia
constantemente entre desequilíbrio a equilíbrio. Toda vez que, no conhecimento
dominado, surge um conflito cognitivo, há desequilíbrio. De acordo com Piaget, o
desenvolvimento humano se divide em quatro estágios. Em Visca (1987),
encontra-se a seguinte definição:

1. Estágio da inteligência sensória motora (até os dois anos) – As ações


da criança são representadas, ou seja, ela não representa para si mesma
o ato do pensamento, pois há apenas uma ação motriz.
2. Estágio da inteligência simbólica ou pré-operatória (de 2 a 8 anos) –
Nesse segundo nível, já existe representação ou simbolização. Há
claramente uma distinção entre o significante (conduta de imitação,
desenho, imagem mental, jogo, palavra) e o significado (situação evocada,
objeto representado). Porém, o pensamento desse nível não pode
organizar os objetos e acontecimentos em categorias lógicas gerais.
3. Estágio da inteligência operatória concreta (de 7-8 a 11-12 anos) – O
pensamento da criança torna-se reversível, e ela pode realizar a operação
inversa no pensamento. Pode concluir que, mesmo mudando a forma de
uma massa (de bolinha para salsicha, por exemplo), a transformação não
modifica a quantidade do objeto.
4. Estágio da inteligência operatória formal (12 anos a 14-15 anos) – No
quarto nível, que corresponde à inteligência formal ou hipotético-dedutiva,
o pensamento torna-se independente do concreto: é um pensamento
abstrato.

Os estudos de Piaget permitem a aplicação de provas operatórias que


possibilitam a verificação e o diagnóstico do nível de aprendizagem em que o
sujeito se encontra. Como afirma Visca (1987), ninguém pode aprender algo
acima do seu nível de estrutura perceptiva.

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2.2 Teoria psicanalítica

Segundo a teoria psicanalítica de Sigmund Freud, nossa energia psíquica


é gerada pela libido. Freud sugeriu que os nossos estados mentais são
influenciados por duas forças concorrentes: catexia, que busca realizar o desejo;
e anticatexia, que, ao contrário, intenciona inibir o desejo.
Ao tratar do comportamento humano, Freud refere-se aos instintos de vida
e morte: Eros e Tanatos. Os instintos de vida são os que se relacionam com uma
necessidade básica de sobrevivência, reprodução e prazer. Ele também sugeriu
que todos os seres humanos têm um desejo inconsciente de morte, quando
apresentam um comportamento autodestrutivo, por exemplo.
Na teoria freudiana, a mente humana está estruturada em duas partes
principais: a mente consciente e inconsciente. A mente consciente engloba o que
é conhecido e consciente; a mente inconsciente, por outro lado, inclui desejos,
esperanças e memórias que se encontram fora da consciência, mas que ainda
continuam a influenciar o comportamento.
Sobre a personalidade, Freud traz as ideias de id, ego e superego. O id,
segundo Freud, é a parte mais primitiva de personalidade, nossos impulsos mais
básicos. O ego é o componente da personalidade que lida com a realidade e ajuda
a garantir que as exigências do id sejam satisfeitas de maneira realista, segura e
socialmente aceitável. O superego é a parte da personalidade que mantém todas
as normas morais internalizadas de acordo com o que adquirimos de nossos pais,
da família e da sociedade em geral.
Nas considerações de Visca, a psicanálise enriquece o trabalho
psicopedagógico ao considerar os vínculos e relações afetivas que o sujeito
estabelece ao estar em contato com o aprender. Nessa relação com o objeto de
aprendizagem, percebe-se e coleta-se informações sobre como esse ser se
conhece – seus impulsos, desejos e valores.

2.3 Teoria da psicologia social

Enrique Pichon Rivière é um dos representantes da psicologia social,


criador da teoria dos grupos operativos. Seus estudos têm como propósito
conhecer o funcionamento horizontal e vertical do grupo, para que a realização de
uma tarefa aconteça da forma esperada, e para que ajustes de integração da
equipe viabilizem a operação em prol do crescimento do grupo.

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TEMA 3 – GRUPOS OPERATIVOS

Enrique Pichon Rivière criou a teoria do Grupo Operativo, que se constitui


em uma técnica terapêutica de atendimento grupal. O princípio básico é promover,
por meio de uma técnica integrativa de seus membros, processos de mudança
em grupo. O objetivo é levar os participantes a aprender a pensar e operar, isso
é, a desenvolver a capacidade de resolver contradições dialéticas, sem resultar
em situações conflitantes que imobilizem o crescimento do grupo. Alguns
conceitos explicam a teoria e dão subsídios para a compreensão necessária que
leva à possível atuação prática com o trabalho de grupos.

3.1 Ecro

O Ecro (Esquema Conceitual Referencial Operativo) é um instrumento de


observação, análise e diagnóstico sobre a forma de funcionamento de um grupo
e de cada participante integrante desse grupo. O Ecro é um processo permanente
e em desenvolvimento, que se torna dependente de referências e esquemas de
aprendizagem e interação:

Num grupo sempre haverá ECROs individuais e o ECRO do próprio


grupo que vai sendo construído na medida em que o trabalho do grupo
for se desenvolvendo e depende da história da instituição ou do grupo
em si, e da contribuição individual de cada componente: com suas
histórias, seus esquemas conceituais, referenciais e operativos,
colocados no interjogo das relações interpessoais que aí acontecem e
vão se construindo. (Rivière, 2009)

O Ecro é o que somos e podemos nos tornar.

3.2 Enquadramento

A ideia de enquadramento é definida pelos "combinados" que definem a


ação do grupo. É a regra estabelecida, os parâmetros que norteiam o objetivo
geral. O enquadramento funciona como o ponto de partida – sua clareza ou não
pode comprometer o resultado contratado. É importante que um grupo sempre
saiba qual o enquadramento combinado, e que ele possa ser revisto e ajustado,
sempre que necessário.

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3.3 Observação

O que é observar?

Observar não é invadir o espaço do outro, sem pauta, sem planejamento,


sem devolução e muito menos sem encontro marcado. Observar uma
situação pedagógica não é vigiá-la, mas sim, fazer vigília por ela, isto é,
estar e permanecer acordado por ela, na cumplicidade da construção do
projeto, na cumplicidade pedagógica. (Freire, 1996, p. 3)

Pichon Rivier (2009, p. 174) aborda que o observador é, geralmente, “um


não participante cuja função consiste em recolher todo o material expresso verbal
e pré verbalmente no grupo com objetivo de realimentar o coordenador, num
reajuste das técnicas de condução”.
Ao observar, é necessário transitar entre o contexto, as experiências e as
nossas percepções, sendo imprescindível a separação entre esses aspectos para
favorecer a leitura das condutas. É preciso observar a temática (a fala, o tema que
se discorre verbalmente) e a dinâmica (tudo mais que não é fala, ou verbal, é a
conduta corporal ou de relação).
Além disso, ao longo da observação é importante que o observador indique
as hipóteses que surgem durante o processo ou em sua análise posterior.

3.4 Grupo

Há dois tipos de grupos: primário e secundário. A família é um grupo


primário. Secundários são os grupos de trabalho, estudo, instituições etc. Em
todos eles, encontramos um lugar, um papel, uma forma de estar, que por sua vez
constitui nossa maneira de ser. Nesse espaço, desempenhamos nosso papel,
segundo nossa história e as marcas que trazemos conosco.
Na visão de Pichon Rivière (2009), onde houver grupos em tarefa, haverá
leis que reagem à funcionalidade do grupo. As leis da complementariedade e
suplementariedade, são as habilidades e potencialidades dos integrantes de um
grupo de funcionarem de forma complementar ou suplementar. Nas leis de
horizontalidade e verticalidade, o grupo é interpretado como uma unidade em
funcionamento, que reconhece as características individuais de cada integrante.
Porém, no grupo, elas são compreendidas como sinalizadoras de uma forma de
funcionamento. As leis da heterogeneidade e homogeneidade consideram que,
quanto mais heterogêneo e diferente for um grupo em suas individualidades, a

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estrutura dos grupos se compõe pela dinâmica dos 3D: o depositado, o depositário
e o depositante mais homogêneos caracterizam a aprendizagem.

3.5 Teoria do vínculo

Segundo Pichon-Riviere (2009), a forma de organizar dos grupos é


determinada pela dinâmica dos 3D: o depositado, o depositário e o depositante.
O depositado é algo que uma pessoa, ou um grupo, não consegue assumir no
seu contexto, e por isso transfere a alguém, que por suas características o permite
e o aceita (exemplo: a pessoa de um grupo a quem é sempre atribuída a “culpa”
por uma tarefa não ser concluída). Quem recebe nossos depósitos são os
chamados depositários. As pessoas que “se livram” desses conteúdos,
colocando-os fora de si, são os depositantes. Quando houver aceitação do
depósito feito por alguém num grupo, constitui-se relação vincular positiva.
Quando não há aceitação do depósito, não se estabelece vínculo. Quando não há
como não aceitar o depósito (relações familiares e professor aluno, por exemplo),
e ele se torna "indigesto" ou incômodo, forma-se um vínculo negativo.

3.6 Papéis do grupo

São cinco os papéis que constituem um grupo, segundo a denominação de


Pichon Riviere: líder de mudança, líder de resistência, bode expiatório,
representantes do silêncio e porta-voz (Freire, 2005).
Líder de mudança é aquele que se encarrega de levar adiante as tarefas
necessárias, enfrentando conflitos, buscando soluções, e arriscando-se sempre
diante do novo. O seu contrário é o líder de resistência. Este sempre “puxa” o
grupo para trás, frenando avanços. Depois de intensa discussão, ele coloca uma
pergunta que remete o grupo ao início do que já foi discutido. Sabota as tarefas
(levantando sempre as melhores intenções de desenvolvê-las, ainda que poucas
vezes as cumpra, assumindo sempre o papel de “advogado do diabo”).
O líder de mudança e o líder de resistência não podem existir um sem o
outro. Os dois são necessários para o equilíbrio do grupo. Para cada acelerada
maior do líder de mudança, haverá freios e brecadas do líder de resistência. Isso
porque muitas vezes o líder de mudança radicaliza suas percepções e
encaminhamentos na direção dos ideais do grupo, descuidando do princípio de
realidade. Nesse momento, o líder de resistência traz para o grupo uma crítica

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excessiva (princípio de realidade exacerbado), provocando uma desidealização
(desilusionamento), o que traz um contrapeso às propostas do outro.
O bode expiatório é quem assume as culpas do grupo. Serve-se de
depositário a esses conteúdos, livrando o grupo do que lhe provoca mal-estar,
medo, ansiedade etc.
Os silenciosos são aqueles que assumem as dificuldades dos demais para
estabelecer a comunicação, fazendo com que o resto do grupo se sinta obrigado
a falar. Num grupo falante, se “queima” quem menos pode sobreviver ao silêncio.
Aqueles que calam representam essa parte nossa que desejaria calar, mas que
não pode.
É necessário um exercício apurado de observação e leitura sobre o que os
silenciosos falam, para poder possibilitar, assim, ruptura do papel de
“ocultamento”, de omissão. A coordenação deverá estar atenta para não permitir
uma relação hostil, que obriga os silenciosos a falarem, pois desse modo não
estará respeitando-se a “fala”. Também não se pode cair na armadilha da
marginalização: “eles nunca falam mesmo” – isso favorece a omissão.
O porta-voz é quem se responsabiliza em ser a “chaminé”, por onde
emergem as ansiedades do grupo. Através da sensibilidade apurada do porta-voz,
ele consegue expressar, verbalizar e dar forma a sentimentos e conflitos que
muitas vezes estão latentes no discurso do grupo. O porta-voz é como uma antena
que capta de longe o que está por vir.

TEMA 4 – PSICODRAMA

O psiquiatra romeno Jacob Levy Moreno (1889-1974) foi o criador do


psicodrama. O psicodrama é uma ciência que busca a verdade por meio de
métodos dramáticos, valendo-se da ação como uma forma de investigar a alma
humana (Moreno, 1999).
No psicodrama, o instrumento principal utilizado como “gatilho” das ações
de investigação é a dramatização, que pode acontecer em grupo ou de forma
individual. A intenção é colocar o sujeito a vivenciar uma situação conflituosa e
então realizar intervenções direcionadas que oportunizem aprofundar as relações
e vínculos do contexto real do sujeito em aprendizagem.

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4.1 Estudo socionômico

Com o intuito de desenvolver estudos e técnicas que explicitem sobre a


ciência das leis sociais e a compreensão da complexidade que envolve as
relações humanas, a teoria de Moreno tem como fundamento três campos de
ação:

1. Sociometria: estudo que mensura as características acerca dos


relacionamentos;
2. Sociodinâmica: estudo que busca compreender o funcionamento das
relações interpessoais isoladas ou em grupo;
3. Sociatria: estudo dos sistemas sociais que englobam o Psicodrama e o
Sociodrama.

4.2 Matriz de identidade

Moreno, ao estudar o desenvolvimento humano, considera que é desde o


início dos primeiros momentos de vida da criança que ela conhecerá e assimilará
os mecanismos necessários para suportar as frustrações e satisfações que a
realidade de interação apresenta. Esse contexto do aprender sobre a realidade e
operar sobre ela é chamado de matriz de identidade. Para Moreno, há três fases
da matriz de identidade: matriz total e indiferenciada (a criança concebe pessoas
e objetos como pertencentes a ela mesma e não faz a diferenciação
realidade/fantasia); matriz total e diferenciada (a criança começa a perceber que
as coisas se diferenciam dela mesma, mas ainda atribui o mesmo grau de
realidade, seja para criações imaginárias ou reais). E há também a matriz da
brecha entre realidade e fantasia (onde finalmente o mundo da realidade e da
fantasia são identificados e separados).
Para elucidar como ocorre esse processo de desenvolvimento, Moreno
define cinco etapas da formação na matriz de identidade:

1. Fase da indiferenciação, em que a criança, a mãe e o mundo são


percebidos como um só;
2. Fase do reconhecimento do eu, momento em que a criança percebe o outro
e começa a individualizar-se, criando sua identidade como pessoa;
3. Fase do reconhecimento do tu, quando a criança volta para si e percebe-
se como ser independente, já conseguindo identificar sensações;

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4. Fase da tomada de papéis, quando percebe o outro e as influências que
ele sofre devido a suas ações, podendo assumir seu papel, mas jamais
deixa o outro assumir o seu;
5. Fase de inversão de papéis, momento em que a criança vive
constantemente a troca de papéis, permitindo que os outros assumam seu
papel.

Resumindo: a fase do duplo é o período de indiferenciação em que a


criança precisa de outro (ego-auxiliar) para fazer o que não consegue fazer
sozinha; fase do espelho, que é composta por dois movimentos, o de se
concentrar em si mesma e esquecer o outro, e o de focar no outro e esquecer-se
de si mesma; e por fim a fase de inversão, quando a criança primeiramente se
permite assumir o lugar do outro, para depois inverter concomitantemente os
papéis outro-eu e eu-outro.

4.3 Espontaneidade/criatividade

Segundo Moreno, a espontaneidade é o catalisador da criatividade. O


indivíduo espontâneo é criativo, e o treinamento da espontaneidade é
considerado uma forma de tratamento que permitirá a melhor organização do ato
criativo, promovendo como consequência a saúde psíquica dos indivíduos. Todo
ato criativo é uma expressão do mundo interno de quem o realiza, da relação do
sujeito com sua criação; todo indivíduo se organiza intrapsiquicamente na medida
em que cria, se tornando cada vez mais espontâneo. O Psicodrama promove
possibilidades de mudanças comportamentais significativas, por oportunizar aos
indivíduos o treinamento da espontaneidade-criatividade e a “catarse de
integração”. A partir da representação dos papéis, das cenas dramatizadas, os
indivíduos têm a oportunidade de reeditarem-se. Os conflitos podem ser
elaborados ou se colocarem em vias de resolução. O treinamento da
espontaneidade-criatividade consiste no maior objetivo da metodologia
psicodramática.

4.4 Papéis

Na teoria de Moreno, papel é uma função social do indivíduo, em que se


pode observar a sua conduta e como ele funciona em cada situação. Os papéis
podem ser: psicossomáticos, que acontecem nas situações de dependência, em

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que não há interação entre duas pessoas; papéis sociais, que se referem à
interação entre as pessoas; e os papéis psicodramáticos, que revelam o
desempenho do sujeito no seu papel social.
Para desenvolver em si um novo papel, o sujeito precisa passar por três
etapas: o role-taking, role-playing e o role-creating. Esse processo todo passa pela
imitação, seguida por experimentos das formas de se representar, até chegar ao
desempenho do papel de forma espontânea e criativa. A intenção de Moreno ao
estudar a matriz de identidade, e os papéis sociais, foi desenvolver técnicas
psicoterápicas que auxiliassem o sujeito a sair da sua estagnação ou
“paralização”, mediante momentos de aprendizagem, para conseguir então
desempenhar um papel aberto, com movimento e criatividade.

4.5 Psicoterapia grupal

Para Moreno, a psicoterapia de grupo é um método para tratar,


conscientemente, na fronteira de uma ciência empírica, as relações interpessoais
e os problemas psíquicos dos indivíduos de um grupo. O método aspira alcançar
o melhor agrupamento de seus membros para os fins que persegue. Não trata
somente dos indivíduos, mas de todo o grupo e dos indivíduos que estão em
relação com ele. Moreno enumera os métodos a serem utilizados, entre os quais
destacam-se: método de clube ou associação, de assessoramento, de
conferência, de classes, psicanalítico, visuais, discussão livre, sociométricos, de
histórias clínicas, da bibliografia, magnetofônico (sessões gravadas), da música e
da dança, ocupacionais e laboratoriais. O que mais se destaca é o método
psicodramático.

4.6 Prática

A prática das técnicas de psicodrama referencia-se em três elementos:


contextos, instrumentos e etapas. São três os contextos do Psicodrama:

1. Social: constituído pela realidade social, pelo tempo cronológico e pelo


espaço concreto;
2. Grupal: constituído pela realidade grupal, pelo tempo cronológico dentro
de um intervalo pré-estabelecido e pelo espaço concreto, que pode ser
escolhido e determinado.

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3. Dramático: constituído pela realidade dramática no "como se", pelo tempo
fenomenológico, subjetivo e pelo espaço também fenomenológico, virtual,
construído sobre espaço concreto, devidamente marcado.

São cinco os instrumentos do psicodrama:

1. Cenário: é o espaço onde ocorre a ação dramática, multidimensional e


móvel.
2. Protagonista: é o sujeito que emerge para a ação dramática, trazendo
consigo os sentimentos comuns que permeiam o grupo.
3. Diretor: é o terapeuta que coordena a sessão.
4. Ego auxiliar: é o terapeuta que interage em cena com o protagonista,
fazendo a ligação entre o diretor e o protagonista da cena dramática, com
as funções de ator, auxiliar do protagonista e observador social.
5. Público: é o conjunto dos demais participantes da sessão psicodramática.

São cinco as etapas do Psicodrama:

1. Aquecimento inespecífico: momento em que se objetiva diminuir a tensão


e sensibilizar os indivíduos para a interação com o grupo e consigo mesmo.
2. Aquecimento específico: momento para oportunizar o contato e a
expressão da temática interna dos indivíduos e do grupo.
3. Dramatização: quando a temática/drama do indivíduo ou do grupo é
colocada em ação; a dramatização se dá criativamente e cada vez mais
espontaneamente, através de cenas, expressões corporais, desempenho
de personagens, danças, poemas, fábulas etc.
4. Compartilhamento: após a dramatização, os sentimentos de cada
participante do grupo são compartilhados, de forma que cada um fala
essencialmente das ressonâncias da dramatização em si, atentos para não
comentarem, tampouco aconselharem, o protagonista da “cena”.
5. Processamento: para fins de aprendizagem, o processamento constitui-se
de comentários técnicos e teóricos da aplicação do método na situação
específica.

TEMA 5 – DINÂMICAS DE GRUPO

A dinâmica de grupo foi primeiramente utilizada pelo psicólogo Lurt Lewin.


É uma área das ciências sociais, em particular da sociologia, psicologia e

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antropologia, que utiliza métodos científicos para estudar os fenômenos que
ocorrem em grupos.
As dinâmicas de grupo são instrumentos que têm, no seu uso, a intenção
de recriar, inovar e transformar conhecimentos. Criam, em seu exercício, a
possibilidade de perceber sobre o que as pessoas pensam, sentem, vivem e
sofrem, a fim de, ao sistematizar na prática esse processo, transformá-lo e
redimensioná-lo.
As dinâmicas de grupo tornam-se um processo de aprendizagem que
expande e liberta, porque permitem desenvolver discussão e reflexão,
enriquecendo o potencial e o conhecimento individuais e coletivos, o que
possibilita criar, formar, transformar e conhecer. Esses indivíduos são sujeitos de
sua elaboração e execução.
Para que uma técnica sirva como ferramenta educativa libertadora, deve
ser utilizada em função de temas específicos, com objetivos concretos e aplicados
de acordo com os participantes com os quais se esteja trabalhando. Uma dinâmica
em grupo deve considerar:

 Objetivo: o que se quer alcançar com esse trabalho.


 Materiais: os elementos que auxiliarão na execução e na aplicação da
dinâmica (TV, vídeo, som, papel, tinta, mapas). Outros recursos que podem
ser utilizados em grupos grandes são: retroprojetor, exposições dialogadas,
técnicas de teatro, tarjetas e cartazes.
 Ambiente: preparar um local adequado para a aplicação da dinâmica
(amplo, fechado, escuro, claro, forrado, coberto), onde as pessoas
consigam compreender o que é proposto e participar de forma empenhada
na atividade.
 Tempo determinado: determinar e prever um tempo com início, meio e
fim.
 Passos: Organizar os momentos que serão necessários para o
desenvolvimento da atividade, e que permitam chegar ao seu final de
maneira gradual e clara.
 Número de participantes: ajuda a ter uma previsão do material e do tempo
para o desenvolvimento da dinâmica.
 Perguntas e conclusões: momento para resgatar a experiência
vivenciada, avaliando o que foi visto, os sentimentos, o que se aprendeu, o

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momento da síntese final e os encaminhamentos; viabiliza, assim, atitudes
avaliativas e orientações.

Vejamos, por fim, os tipos de dinâmicas:

 Técnica quebra-gelo: Ajuda a tirar as tensões do grupo, desinibindo as


pessoas para o encontro. Pode ser uma brincadeira na qual as pessoas se
movimentam e se descontraem. Resgata e trabalha as experiências de
criança. São recursos que quebram a seriedade do grupo e aproximam as
pessoas.
 Técnica de apresentação: Ajuda na apresentação uns aos outros,
possibilitando descobrir: quem sou, de onde venho, o que faço, como e
onde vivo, o que gosto, sonho, sinto e penso. Sem máscaras e
subterfúgios, mas com autenticidade, e sem violentar a vontade das
pessoas. Exige diálogo verdadeiro, quando partilho o que posso e quero ao
novo grupo. São as primeiras informações da minha pessoa. Precisa ser
desenvolvida num clima de confiança e descontração. É o momento para a
apresentação, motivação e integração. É aconselhável que sejam
utilizadas dinâmicas rápidas, de curta duração.
 Técnica de integração: Permite analisar o comportamento pessoal e de
grupo, a partir de exercícios bem específicos, que possibilitam partilhar
aspectos mais profundos das relações interpessoais do grupo. Trabalha-se
interação, comunicação, encontros e desencontros do grupo. Ajuda a
sermos vistos pelos outros na interação de grupo e como nos vemos. O
diálogo profundo no lugar de indiferença, discriminação, desprezo, vividos
pelos participantes em suas relações. Os exercícios interpelam as pessoas
a pensar suas atitudes e seu ser em relação.
 Técnica de relaxamento: Tem como objetivo eliminar as tensões, soltar o
corpo, voltar-se para si e dar-se conta da situação em que se encontra,
focalizando cansaço, ansiedade, fadigas etc. Elabora-se tudo isso para um
encontro mais ativo e produtivo. Essas técnicas facilitam um encontro entre
pessoas que se conhecem pouco, e também quando o clima de grupo é
muito frio e impessoal. Devem ser usadas quando é preciso romper o
ambiente frio e impessoal, ou quando se está cansado e necessita-se
retomar uma atividade.

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 Técnica de capacitação: Deve ser usada para trabalhar com pessoas que
já possuem alguma prática de animação de grupo. Possibilita a revisão, a
comunicação e a percepção do que fazem os destinatários, pensando na
realidade que os rodeia. Amplia a capacidade de escutar e observar.
Facilita e clareia as atitudes dos animadores para que orientem melhor seu
trabalho de grupo, de forma mais clara e livre com os grupos.

FINALIZANDO

Num processo de avaliação institucional, visando ações de intervenção que


venham solucionar conflitos e direcionar a efetividade da tarefa grupal, é
importante que o psicopedagogo tenha fundamentos que lhe possibilitem
conhecer o funcionamento do grupo e as ações que surtiriam efeito para o seu
crescimento. Elementos estudados pela teoria sistêmica, epistemologia
convergente e grupos operativos conversam sobre a constituição individual e
grupal, conseguindo explicar os papéis de cada integrante, as influências de todo
o contexto e a dinâmica dessas relações. No psicodrama e nas dinâmicas de
grupo, se apresentam os caminhos para o agir, de modo a conscientizar e
transformar os movimentos em prol do que o encontro grupal objetiva.

LEITURA OBRIGATÓRIA

Texto de abordagem teórica

FREIRE, M. O que é um grupo? 2005. Disponível em:


<http://www.famema.br/famema/ensino/pdd/docs/oqueeumgrupo.pdf>. Acesso
em: 24 ago. 2018.

Texto de abordagem prática

CASTRO, M. L. G. de. O olhar psicopedagógico na instituição educacional: o


psicopedagogo como agente de inclusão social. Revista da Associação
Brasileira de Psicopedagogia, v. 21, ed. 65, 2004. Disponível em:
<www.revistapsicopedagogia.com.br/detalhes/353/o-olhar-psicopedagogico-na-
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Acesso em: 24 ago. 2018.

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REFERÊNCIAS

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Curitiba: Expoente, 2001.

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IBPEX, 2010.

BARBOSA, L. M. S.; CALBERG, S. O que são consignas? Contribuições para o


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