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ABORDAGEM PSICOLÓGICA DO PACIENTE VITIMIZADO

• Escolher ambiente acolhedor, alegre e individualizado sem expor a criança


• Dar tempo para o paciente se expor, sem manipular ou direcionar a conversa, e as vezes
são necessários outros encontros para melhor abordagem, além de não tomar tudo como
verdade absoluta
• Desenvolver habilidades empáticas, não verbais devem ser praticadas durante à entrevista
para melhorar o vínculo, parafrasear alguns pontos da conversa para que a vítima
compreenda que você à escuta e que entendeu corretamente
• Avaliar indicadores de veracidade dos fatos declarados
• Internação hospitalar, caso a família não consiga garantir a segurança física e emocional
da paciente
VIOLÊNCIA SEXUAL
Fluxo de Atendimento

Definição de violência sexual:


Qualquer tipo de atividade de natureza erótica ou sexual que não respeita o direito de
escolha de um dos envolvidos.

Abordagem clínica:
• Equipe multiprofissional (médico, enfermeiro, psicólogo, assistente social)
• Acompanhamento das ISTs, saúde psicossexual, saúde reprodutiva e estresse pós-trauma
• Atendimento médico imediato, que não depende de confirmação de violência ou do
acionamento prévio de autoridade policial ou judicial
Atendimento:
• Registro cuidadoso e minucioso no prontuário da história e exame físico (relatar a fala do
entrevistado, evitando traduzir tecnicamente o que foi relatado)
• Não fechar o diagnóstico nesse momento
• Confidencialidade e sigilo devem ser preservados

Exame físico
• Não deve ser uma nova experiência traumática para a criança ou adolescente. Se for
necessário, o exame deverá ser realizado sob sedação, em centro cirúrgico
• Examinar o corpo inteiro da vítima – procurar por lesões ou cicatrizes indicativas de
violência física
• Na urgência, sempre observar a diurese e excluir hematúria

Exame ginecológico (obrigatório na urgência)


• Avaliar presença de lacerações sangrantes, que demandam intervenção cirúrgica
imediata, e diagnosticar eventuais ISTs ou gestação.
• A avaliação himenal tem importância apenas do ponto de vista médico-legal.
o Hímen de diâmetro alargado ou de bordas finas não tem significado diagnóstico.
• O exame da região anal também deve ser realizado em todos os casos.
o Lesões perianais são mais frequentes em meninos e em meninas na pré-
adolescência.
o Após um episódio agudo de abuso, pode haver alterações do tônus do esfíncter
anal, hematomas, abrasões ou lacerações.
o Os traumas podem evoluir sem deixar sinais (em 50% a 70% dos pacientes o
exame clínico é normal) ou deixar cicatrizes ou alterações nas
pregas anais.

Avaliação laboratorial das doenças sexualmente transmissíveis:


Deve-se realizar coleta imediata de:
• Sorologia para HIV (Anti-HIV)
• Teste VDRL
• Sorologias para hepatite B (HBsAg, Anti-HBc e Anti-HBs) e hepatite C (Anti-HCV);
o Após 30 e 90 dias da exposição: sorologia para HIV, Hepatite B, Hepatite C e
Sífilis
o Após 180 dias: repetir: Hepatite B e Hepatite C
Paciente com Anti-Hbs reagente (> 10 UI/ mL) dispensa posteriores coletas de
Hepatite B.
- Em função da toxicidade dos antirretrovirais (ARV), coletar hemograma, AST, ALT,
bilirrubinas, ureia, creatinina e glicemia no primeiro atendimento e repetir os exames após 15 dias
e 30 dias do início dos ARV;
- Imediatamente após o atendimento: iniciar a quimioprofilaxia e imunoprofilaxia para as ISTs
(Quadros 2 a 9) e notificar o evento com a ficha de notificação de violência doméstica, sexual
e/ou outras violências interpessoais do SINAN (de responsabilidade de qualquer membro da
equipe de saúde);
- Pesquisa de Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis em secreção de vagina,
endocérvice e/ou reto.

Profilaxias:
• Anticoncepção de emergência: preferencialmente até 72 horas. Pode ser utilizada até o
5º dia após a relação sexual desprotegida (Quadro 1);
• Início da antibioticoprofilaxia para ISTs não virais (Quadro 2);
• Profilaxia da hepatite B: pacientes que não foram vacinadas contra hepatite B ou com
situação vacinal desconhecida devem receber imunoglobulina específica anti-hepatite B,
além da complementação do esquema vacinal (Quadro 3);
• Quimioprofilaxia antirretroviral (Quadros 4 a 9): uso criterioso e por 28 dias.
o Somente em casos agudos com penetração anal ou vaginal
o Intervalo entre a exposição e o início da tomada da medicação < 72 horas
o Conhecido o status sorológico do agressor
* IGHAHB: Imunoglobulina Humana Anti-hepatite B: dose é 0,06 mL/kg, IM, em extremidade diferente
da vacina e se a dose ultrapassar 5mL, deve- se dividir a aplicação em duas áreas corporais diferentes.

** Tanto a vacina quanto a imunoglobulina devem ser administradas preferencialmente nas primeiras 24
horas após o ocorrido, não excedendo o período de 14 dias após exposição sexual (7 dias para acidente com
material biológico).

*** Se o paciente tem vacinação completa, porém com anti-HBs não reagente, considerar uma dose booster
de vacina de hepatite B e após verificar a resposta vacinal (anti-HBs > 10 U/mL)
* O RAL está indicado a partir da 14a semana de gestação.
** Em caso de gestação com menos de 14 semanas, recomenda-se o uso de ATV/r

Coleta de provas forenses:


Após o atendimento médico emergencial necessário, a vítima ou seu responsável deve ser
encaminhado à delegacia mais próxima do hospital ou do local da ocorrência, com relatório
médico, para realização de boletim de ocorrência. À autoridade policial compete encaminhamento
ao IML.
Se a coleta de provas for durante o atendimento emergencial (pela gravidade das lesões
corporais e não houver tempo hábil para tal coleta pelo perito do IML), recomenda-se testemunhas
do ato que também assinem o documento identificando o material com todo rigor.

Encaminhamentos aos órgãos de segurança pública:


Após o atendimento médico, o responsável pela criança ou adolescente deverá lavrar o
boletim de ocorrência (BO) em uma delegacia, de preferência especializada no atendimento à
infância e juventude ou família, e o paciente deve ser encaminhado para exame de corpo de delito
pelos peritos do IML. Caso os responsáveis estejam envolvidos na violência, como agressores ou
por conivência, ou se houver suspeita de poder de constrangimento do responsável legal agressor
em relação ao outro, o Conselho Tutelar deverá ser chamado para fazer o registro (BO) na
delegacia e acompanhar a criança para exame de corpo de delito.

QUANDO SUSPEITAR DOS DEMAIS TIPOS DE VIOLÊNCIA

NEGLIGÊNCIA
• Internações frequentes
• Negação ao tratamento ou vacinação, ou demora na procura de recursos médicos
• Acidentes repetitivos (com frequência acima do esperado)
• Tratamentos adequados sem resultados ou inadequados
No Exame Físico:
• Alterações comportamentais da criança ou do adolescente
• Existência de enfermidades passíveis de prevenção
• Doenças parasitárias ou infecciosas frequentes
• Alterações nutricionais, como desnutrição ou obesidade, sem doença de base que as
determinem.
• Atrasos de fala e de domínio da linguagem.
• Cáries dentárias ou descuidos de higiene em geral
• Falta de proteção contra intempéries climáticas.
• Uso de vestimentas muito inferiores ou contrastantes com demais membros da família

VIOLÊNCIA FÍSICA
• Incompatibilidade entre dados da história e os achados clínicos
• Omissão total ou parcial da história de trauma
• Pais que mudam a história a cada vez que dão informações
• Histórias diferentes quando os membros da família são questionados isoladamente
• Demora inexplicável da procura de recursos médicos na presença evidente de trauma
• Crianças maiores que não querem relatar o que aconteceu, com medo de represálias, em
especial quando os agentes agressores são os pais
• Evidência de negligência

No Exame Físico:
• Comportamento agressivo, retraído ou apático
• Aspecto desnutrido
• Qualquer lesão em crianças jovens que ainda não deambulam
• Lesões em múltiplos sistemas orgânicos
• Múltiplas lesões em diferentes estágios de cicatrização
• Marcas de objetos
• Lesões em localizações não usuais, tais como tronco, orelhas, face, pescoço ou parte
superior dos braços
• Lesões significativas inexplicadas
• Presença de lesão sentinela

VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA
• Relação permeada de ansiedade e conflitos com responsáveis
• Falta de vontade de ir à escola ou sentir-se mal na hora de sair de casa /queda rendimento
escolar/ solicitação de troca de escola/perda repetida de pertences levados à escola
• Mudanças frequentes no trajeto de ida ou de volta
• Roupas ou livros/cadernos rasgados ao voltar da escola
• Pesadelos frequentes ou eventualmente falar durante o sono expressões como “me larga”,
“socorro” ou equivalentes
• Mudanças abruptas de comportamento
• Desenhos mórbidos, sem o colorido vivo dos desenhos infantis, com imagens riscadas

No Exame Físico:
• Machucados inexplicáveis ou autoinfligidos.
• Hipotrofias de estatura e de peso não orgânicas
• Atrasos psicomotores diversos
• Distúrbios alimentares
• Distúrbios da excreção
• Distúrbios cognitivos
• Distúrbios do comportamento
• Sofrimento depressivo
• Desconfiança paranoica e Incapacidade de empatia
• Pouca comunicação ou comunicação feita sempre de modo destrutivo
• Hiper-reatividade de caráter passivo ou agressivo

MUNCHAUSEN
• Crianças sem malformações, problemas genéticos ou doenças crônicas que apresentarem
prontuário volumoso
• Antecedentes das diferentes violências ou presença de outros fatores ambientais
estressantes na história do agressor
• Agressor (geralmente a mãe) pode ter algum relacionamento com a área da saúde ou
cuidados a crianças ou tem antecedente pessoal de internação hospitalar prolongada

Comportamento do agressor:
• Inteligente, articulada, simpática, comunicativa, aparentemente cuidadosa
• Vocabulário médico adequado, fazendo perguntas e exigindo respostas
• Sugere condutas, manifestando entusiasmo com novos exames e tratamentos
• Comporta-se como uma cuidadora experiente, assume funções e tende a ultrapassar os
limites impostos pelas normas e regulamentos do serviço, criando confusões para
conseguir atenção e desafiar o saber da equipe de saúde.
• Não demonstra preocupação com a gravidade da doença nem com seu prognóstico
• A agressora é particularmente cordial com o pessoal médico e de enfermagem que ela
identifica como chefes, mas evita o contato com os profissionais que manifestam dúvidas,
suspeitas ou questionam os sintomas e sua falta de consistência. Quando confrontadas
abertamente com a hipótese, tornam-se agressivas, ameaçadoras e arrogantes
• Históricos familiares podem revelar várias doenças graves em outros membros da família,
inclusive com mortes súbitas e inexplicáveis
• O pai geralmente é omisso ou ausente e acredita que a mãe é cuidadosa e incapaz de fazer
qualquer mal à criança
• As visitas de outros parentes ao hospital são raras

No Exame Físico
• Avaliação neurológica
• Avaliar alterações Gastrointestinais
• Presença de “Rashes cutâneos” ou sintomas alérgicos
• Transtornos de comportamento ou outros sintomas psiquiátricos, muitas vezes assumidos
pela vítima
• Referência à febre
• Sangramentos simulados ou provocados
• Sintomas que parecem impróprios, inverossímeis e incongruentes, que só ocorrem na
presença da agressora e predominam à noite, quando a supervisão por outras pessoas é
menor

EXAMES COMPLEMENTARES GERAIS

Laboratoriais
• Hemograma completo
• Coagulograma
• CPK (quase sempre aumentado em casos de traumas)
• Amilase (trauma abdominal);
• TGO; TGP; Gama-GT (trauma abdominal).
• Exame qualitativo de urina (Urina tipo I).
• Sangue e urina para intoxicações exógenas
• B-HCG
• Sorologias para DST e repetir em 30, 90 e 180 dias.

De imagem
• Raio X
o Em crianças < 2 anos e que não se comunicam, havendo suspeita, realizar todas
as radiografias, mesmo não havendo evidências de trauma esquelético ao exame
físico
o Em crianças maiores que se expressam verbalmente, radiografar as áreas
suspeitas doloridas ou com limitação de movimentos
• Ultrassom
o Transfontanelar e/ou abdome se houver suspeita de agravo
• Tomografia computadorizada
o Crânio, tórax e/ou abdome se houver suspeita de agravo
• Ressonância nuclear magnética de crânio pode auxiliar na visualização de pequenos
hematomas subdurais, lesões axonais difusas, contusões corticais e hematomas inter-
hemisféricos posteriores.

NOTIFICAÇÃO:

1. Conselho Tutelar ou Vara da Infância e Juventude ou Ministério Público


2. SINAN – ficha de Notificação/Investigação Individual de Violência Doméstica, Sexual e
Outras Violências

Todos os casos, mesmo que só suspeitos, devem ser notificados ao Conselho Tutelar da
região de moradia da suposta vítima e, na omissão deste, a notificação deverá ser feita à Vara da
Infância e Juventude da região de moradia da suposta vítima ou ao Ministério Público (Artigos
13 e 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA) e, também ao SINAN, que é feita pela
Ficha de Notificação/Investigação Individual de Violência Doméstica, Sexual e Outras
Violências, instituída pela Portaria GM/MS 104/201119, que inclui os casos suspeitos ou
confirmados de violência como doença de notificação compulsória a ser encaminhada à
Vigilância Epidemiológica.
A notificação de suspeita de vítima de maus-tratos é um dever do médico, previsto no
artigo 28 do Código de Ética Médica. Ao juiz da Vara da Infância e da Juventude cabe decidir o
encaminhamento a ser dado ao caso. Em caso de internação, a alta hospitalar dependerá de
critérios clínicos e da decisão judicial.
É importante ressaltar a importância da proteção e preservação física de quem notifica. Por
isto, a notificação deve ser realizada pela instituição onde a suposta vítima está sendo atendida,
pois convém evitar envolvimentos pessoais.
A notificação deve ser codificada e emitida em nome da instituição, que tem o dever
legal de garantir esta denúncia (artigo 245 do ECA). A codificação evita que o agressor venha
intimidar ou ameaçar o profissional responsável pela notificação, mas permite que um juiz solicite
maiores esclarecimentos sobre o caso denunciado, garantindo a proteção da vítima.
Residentes: Preceptor: Data:
Eduarda, Emanuelle, Fernanda, Dr. Fernando Steffen Antunes Junho 2021
Gabriela, Leticia, Osmar e Rafael

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