Você está na página 1de 45

PSICOLOGIA SOCIAL - Noções Introdutórias

AULA 06 – DIALÉTICA SUJEITO-SISTEMA (PROCESSO DIALÉTICO)

Prof. NEURI PIRES DAS MERCES


2022.2
A dialética é um amplo e antigo modo de operação do
pensamento racional dentro da filosofia. Não é possível
determinar com precisão quem foi o primeiro filósofo a
delineá-la, sabe-se apenas que ela surgiu entre os
filósofos pré-socráticos e popularizou-se com o método
socrático por meio dos escritos platônicos.
Com base em Sócrates, Platão definiu seu próprio modo
de pensar a dialética, que perdurou como pano de
fundo para o conhecimento filosófico durante séculos.
No século XIX, Karl Marx operou uma verdadeira
revolução no conceito de dialética, pensando-a
baseado na luta de classes e na produção material da
sociedade.
Dialética advém do grego dialetiké.
Dia letiké = interação, troca.
Dia letiké = Letiké possui a mesma raiz que logos,
significando, portanto, palavra, razão ou conceito.
Assim, dialética é, a rigor, uma troca de palavras, de
informações que pode resultar em outra palavra ou
informação.
Não há um consenso sobre a origem do termo dentro da
história da filosofia. Alguns historiadores dizem que o “pai”
da dialética teria sido Heráclito, ao identificar esse
movimento intelectual como algo presente e fundante da
natureza: uma troca de informações do constante movimento
da natureza que resulta num complexo entendimento do
natural como algo que sempre muda e nunca fica estático.
De qualquer modo, há um consenso de que a dialética
originou-se entre os pré-socráticos, mas foi Platão quem
popularizou, aprofundou e, de fato, teorizou o seu conceito.
A dialética é, a princípio, um jogo de ideias, concepções ou
palavras que resulta no embate por serem elas, entre si,
diferentes. O resultado do embate de ideais diferentes pode
proporcionar uma nova ideia. Dialética pode significar a arte
de debater, de persuadir, tendo então uma estreita relação
com a retórica.
Resumidamente, podemos dizer que a dialética é uma
espécie de movimento da argumentação com fundamento no
intelecto e na razão. No entanto, ela sofreu transformações
ao longo do tempo de acordo com cada pensador.
Sócrates não falou diretamente da dialética, mas o seu modo
de filosofar era bastante dialético. Na filosofia clássica não
há relatos originais desse pensador grego. No entanto, os
diálogos socráticos deixados por Platão são uma referência
para entender-se a dialética antiga, tanto no que tange ao
pensamento de Sócrates quanto no que tange ao
pensamento do escritor dos diálogos, o filósofo Platão.
Sócrates desenvolveu um método filosófico dialógico (feito
por meio de diálogos) conhecido como maiêutica. A
maiêutica socrática consiste numa sucessão de perguntas
aos interlocutores visando fazer com que eles demonstrem
uma resposta.
No entanto, a constatação de Sócrates era que seus
interlocutores, que se julgavam detentores do saber sobre o
que era perguntado, não conseguiam responder
satisfatoriamente às perguntas. Aliada à maiêutica, Sócrates
utilizava-se da ironia como modo de instigar os
interlocutores.
O método filosófico socrático pode ser considerado dialético
por apresentar as contradições lançadas por seus
interlocutores e, com base nisso, conseguir formular um
conhecimento novo, uma formação de um conceito sobre
determinado assunto.
Ao demonstrar que seus interlocutores lançavam respostas
contraditórias, o filósofo conseguia expor uma nova forma de
conhecimento racionalmente válida, que formava um novo
conceito.
Platão, discípulo de Sócrates, traz o pensamento socrático
para a sua própria filosofia e textos. Platão pode ser
considerado o filósofo que, de fato e pela primeira vez,
conseguiu estabelecer de forma correta e concreta o
conceito de dialética.
A dialética platônica faz parte do seu projeto epistemológico,
que afirma que existem duas formas de conhecimento: uma
superior e uma inferior.
O conhecimento sensível (da experiência prática, advindo
dos sentidos do corpo) seria o tipo inferior.
O conhecimento inteligível (advindo do intelecto, do
raciocínio e da razão) seria o superior.
Nesta concepção o ser humano era composto por uma
dualidade chamada de psicofísica:

1. Corpo o que era o material, era imperfeito;


2. Alma vista como algo imortal, relacionada ao
conhecimento inteligível, era superior e perfeita.
Nessa relação, o ser humano deveria sempre buscar o
conhecimento intelectual para chegar à verdade. Como esse
conhecimento estaria ligado à alma e esta seria imortal,
logo, ele ficaria impresso na alma para sempre.
Segundo Platão, o que acontecia é que, no momento em que
a alma encarnava, ela se esquecia temporariamente dos
conhecimentos obtidos anteriormente.
O processo de rememoração dos conhecimentos esquecidos
na encarnação da alma seria de suma importância para que
a pessoa chegasse a um conhecimento verdadeiro. Esse
processo somente seria possibilitado pela educação
(paideia, para os gregos). Para Platão, um dos processos da
paideia seria a dialética.
A dialética, nesse sentido, compreenderia um processo
complexo para chegar-se ao conhecimento da verdade, pois
ela apresentaria as possíveis contradições em relação à
verdade e mostraria o caminho para chegar-se ao
conhecimento verdadeiro.
Aristóteles foi discípulo de Platão. Apesar da divergência
com seu mestre, o filósofo continuou na esteira da dialética,
dando a ela novo significado e nova interpretação. Para
Aristóteles, a dialética consiste num procedimento lógico de
verificação da validade dos argumentos, construídos em
cima da linguagem.
Na filosofia aristotélica, existem dois processos centrais que
delimitam o conhecimento: a lógica e a dialética.
A lógica busca fundamentação na demonstração cabal do
que foi enunciado e nos chamados axiomas.
A dialética assenta-se na opinião, mas em um tipo específico
de opinião: a endoxa (boa opinião).
Para o filósofo, a opinião poderia ser descartável ou
proporcionar um conhecimento válido, de acordo com o que
é demonstrado no argumento apresentado. Se o
conhecimento opinativo for válido e coerente, podemos ver
nele o resultado de um processo dialético.
A dialética materialista foi proposta pelo filósofo
contemporâneo Karl Marx. Marx foi profundamente
influenciado pelo filósofo (também alemão) Georg Wilhelm
Friedrich Hegel, um pensador considerado partícipe do
movimento intelectual chamado idealismo alemão.
Como idealista, Hegel estava profundamente ligado à teoria
platônica das ideias. Por isso, ele ressuscitou a dialética
platônica e aprimorou-a, formulando-a da seguinte maneira:
a dialética consiste na contraposição entre uma tese e uma
antítese (tese contrária), que formam uma síntese
(conhecimento novo).
No início de seus estudos, Marx ligou-se ao idealismo alemão
e à filosofia de Hegel, mas, com o passar dos tempos, o
pensador afastou-se dessas teorias. Para Karl Marx, um dos
fundadores do socialismo científico, não fazia sentido uma
filosofia que não propusesse e nem interferisse na prática,
na realidade material da sociedade.
De acordo com Marx a história da humanidade dá-se por sua
produção material, e que essa produção material é que
compõe o mundo objetivo das relações.
Desta forma o filósofo alemão rompeu com a tradição
idealista e fundou o materialismo histórico dialético, uma
teoria que enxergava o mundo com base em suas
contradições e seus desvios.
Para Marx, a história do mundo dá-se por meio de uma
contradição (em especial no contexto capitalista industrial
europeu do século XVIII), que é a contradição de classes
sociais.
O mundo expressa a sua dialética no embate entre as
classes, que se opõem enquanto conceitual e materialmente
diferentes.
No capitalismo, as duas classes sociais seriam a burguesia
(donos dos meios de produção) e o proletariado
(trabalhadores). Essa diferenciação levaria ao momento em
que o proletariado perceberia as contradições do sistema
capitalista (que explora os trabalhadores) e revelaria uma
nova situação. Essa nova situação seria como uma antítese,
que revelaria a revolução do proletariado, que se libertaria
de sua situação de exploração.
Marx, ao examinar a produção material da sociedade
europeia do século XIX, constatou a existência de uma
acentuada desigualdade social, em que a burguesia, que
detinha os meios de produção, promovia a exploração do
proletariado, classe trabalhadora.
Karl Marx elaborou uma vasta obra que engloba conceitos de
cunho histórico, filosófico e econômico, abrindo caminho
para o desenvolvimento e ampliação do método sociológico.
A notoriedade do filósofo recai em sua teoria de análise e
crítica social, a qual identifica a existência de uma divisão de
classes sociais e a exploração da classe burguesa,
detentora dos meios de produção, sobre a classe
trabalhadora. Daí o surgimento do materialismo histórico
dialético, que compõe um método de análise histórica e
social embasado na luta classes.
Marx e Engels afirmam, logo no início do Manifesto
comunista, que “a história de todas as sociedades até hoje
existentes é a história das lutas de classes”
Na teoria geral marxista, podemos descrever conceitos dos
quais possuem uma extrema relevância dentro do próprio
sistema marxista, destacam-se sobre os outros. São eles:

• Infraestrutura: baseado na economia e em sua


centralidade no âmbito produtivo, elemento principal do
materialismo histórico, esse conceito abarca a divisão do
trabalho, a produção, a compra, a venda etc.
Na teoria geral marxista, há conceitos que, devido à sua
vasta importância dentro do próprio sistema marxista,
destacam-se sobre os outros. São eles:

• Superestrutura: corresponde ao conjunto de instituições e


normas que conservam a ideologia social e a lógica de
exploração. Possui como elementos o Estado, a cultura, as
leis e a religião.
• Mais-valia: corresponde à
diferença presente no valor final de
um produto acrescido pela mão de
obra que é despendida em sua
fabricação.
• Alienação: é retirar dos trabalhadores, da classe operária,
a capacidade de reconhecerem o valor de seu trabalho. É
a separação existente entre o trabalhador, que emprega
sua mão de obra na produção de algo, e o fruto de seu
trabalho.
• Burguesia: refere-se à classe que detém os meios de
produção.
• Proletariado: é a classe operária, trabalhadora, que
emprega a mão de obra.
Assim, ao constatar a existência de um processo de
dominação, Karl Marx evocou como solução para tal
problema uma atitude insubordinada da classe operária ao
conscientizar-se da exploração à qual estava sujeita, o que
denominou Revolução do Proletariado.
Tal revolução colocaria fim ao Estado e à propriedade
privada, e implementaria uma ditadura do proletariado que
promoveria o comunismo — o fim da diferença de classes
sociais.
Karl Marx contribuiu sobremaneira para a difusão da
sociologia e para o fortalecimento de um método sociológico
mais consistente. Apesar de não ter sido o responsável pela
elaboração do método sociológico em si, o que coube à
Émile Durkheim.
Os estudos de Marx sobre a lógica do sistema capitalista,
que prevê a desigualdade social e separação entre as
classes, forneceram aos sociólogos que o sucederam
conceitos importantes sobre a teoria marxista e sobre o
socialismo.
ENGELS, F.; MARX, K. Manifesto comunista. Trad. Álvaro Pina. Introdução e
organização de Oswaldo Coggiola. São Paulo: Boitempo, 2002. p. 40.

MORAES, Isabela. Mais valia: o conceito central da teoria marxista. Disponível em:
https://www.politize.com.br/mais-valia/. Acesso em: 18 oct. 2022.
OBRIGADO

Você também pode gostar