Você está na página 1de 4

Apontamentos Semipresidencialismo

Parte 2

Capítulo I – O Sistema de Governo português como Sistema Semipresidencial

o Características identificadoras do sistema

O sistema português é um sistema de governo semipresidencial: existência de


um Presidente da República dotado de uma legitimidade democrática que lhe dá a
possibilidade de exercício de poderes políticos significativos e a existência de uma
responsabilidade política do Governo perante o Parlamento.
O Presidente da República tem a possibilidade de exercer os poderes pois estes
são-lhe conferidos pela norma constitucional, e porque este tem legitimidade
democrática para o fazer, visto que o Presidente da República é escolhido através de
eleição popular direta.
Do outro lado, a responsabilidade política do Governo perante a Assembleia da
República resulta do facto de o Governo sair da Assembleia da República, das eleições
parlamentares, e significa, não apenas que a Assembleia da República pode pedir
contas ao Governo sobre a bondade ou a execução do seu programa ou sobre a forma
como conduz a vida política, mas também, e sobretudo, significa que a Assembleia da
República pode demitir o Governo.
A presença conjunta destas duas características – poderes políticos
significativos do Presidente da República e dependência política do Governo
relativamente à Assembleia da República – afasta a mínima hipótese de confusão do
nosso sistema de governo com qualquer das outras duas alternativas próprias da
democracia representativa, o sistema presidencial ou o sistema parlamentar.
O nosso sistema não é presidencial, pois temos um Executivo que depende do
Parlamento, ou seja, um Governo que sai das eleições parlamentares, responde
politicamente perante a Assembleia da República e que pode ser destituído por ela.
O nosso sistema também não é parlamentar porque o nosso Presidente da
República é eleito diretamente pelo Povo e, por força da legitimidade democrática que
recolhe nessa eleição, pode exercer poderes políticos significativos.
O poder de dissolução (interromper a legislatura em curso e marcar novas
eleições parlamentares) é um poder da maior contundência que pode alterar a maioria
ou o governo no poder e, com isso, inverter abrupta e radicalmente o curso normal e o
sentido da vida política de um dado país num momento determinado.
O nosso sistema de governo integra-se num tertium genus dos sistemas de
democracia representativa, ou seja, um terceiro tipo autónomo de sistema de governo
e que historicamente veio a ser designado de semipresidencialismo.

o A posição do Presidente da República no sistema político

a) A nossa Constituição define, no artigo 120º CRP, o Presidente da República


como órgão de soberania que representa a República, garante a independência
nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições
democráticas e que é também, por inerência, o Comandante Supremo das
Forças Armadas.
Por sua vez, a Constituição atribui-lhe um extenso conjunto de poderes que o
Presidente da República exerce nos seguintes diferentes domínios ou planos:
relativamente a outros órgãos (artigo 133º), na prática de atos próprios (artigo 134º),
no domínio das relações internacionais (artigo 135º) e, ainda, em emergências, de
necessidade ou de exceção constitucional (artigo 138º).
Funções do Presidente da República:
 A dissolução da Assembleia da República e das Assembleias legislativas das
Regiões Autónomas;
 A nomeação do Primeiro-Ministro e dos restantes membros do Governo;
 A demissão do Governo;
 A promulgação dos atos legislativos e dos decretos regulamentares e a
assinatura de outros atos normativos, com a inerente possibilidade de recusa
de promulgação (veto) ou de assinatura;
 A ratificação e a assinatura das convenções internacionais, com a inerente
possibilidade de recusa de tais atos;
 A iniciativa de fiscalização preventiva e sucessiva da constitucionalidade junto
do Tribunal Constitucional;
 A nomeação de altas figuras do Estado, como as altas chefias militares, os
Representantes da República nas Regiões Autónomas, o Presidente do Tribunal
de Contas, o Procurador-Geral da República e os embaixadores;
 A convocação do referendo, envolvendo a possibilidade de recusa de
convocação que lhe seja proposta por Governo ou pela Assembleia da
República;
 O envio de mensagens à Assembleia da República e às Assembleias regionais;
 O Comando Supremo das Forças Armadas;
 A nomeação de membros do Conselho de Estado e do Conselho Superior de
Defesa Nacional;
 A presidência do Conselho de Ministros a solicitação do Primeiro-Ministro;
 A marcação das eleições para o Presidente da República, para a Assembleia da
República e para o Parlamento europeu;
 A declaração de estado de sítio e de emergência;
 A declaração de guerra e a feitura da paz.

b) Com efeito, o Presidente da República é eleito diretamente pelo Povo para um


mandato de 5 anos, através de um sistema eleitoral que lhe garante, no
mínimo, o apoio manifesto da maioria dos eleitores que expressarem
validamente o seu voto.
Assim, o Presidente da República tem, entre nós, uma inquestionável legitimidade
democrática e, por isso, pode de forma constitucional e politicamente inatacável,
praticar atos como a dissolução da Assembleia da República.

c) Alguns poderes do Presidente da República dependem da iniciativa ou da


proposta de outros órgãos e entidades, designadamente o Governo. É o caso
da nomeação e da exoneração de ministros, sob proposta do Primeiro-
Ministro.
Outros dependem da iniciativa do Governo ou da iniciativa ou autorização da
Assembleia da República, como seja o caso da convocação de referendos, da
declaração do estado de guerra ou da feitura da paz ou como na declaração do estado
de sítio ou de emergência.
Outros poderes do Presidente da República exigem uma audição prévia do
Governo, como o da nomeação e exoneração dos representantes da República para as
Regiões Autónomas.
Por último, a existência jurídica de alguns atos do Presidente da República depende
da posterior referenda ministerial, isto é, da confirmação ou atestado governamentais.
No entanto, praticamente todos os poderes verdadeiramente importantes do
Presidente da República são de exercício livre, autónomo e substancialmente
incondicionado (por exemplo, a dissolução da Assembleia da República, a nomeação
do Governo e a sua demissão, o poder de veto, poder de ratificação).

o A responsabilidade do Governo perante a Assembleia da República

a) É a presença desta característica que distingue o semipresidencialismo dos


sistemas presidenciais e que o aproxima do sistema parlamentar. No
semipresidencialismo o Governo responde politicamente perante o
Parlamento, no sentido de que o Parlamento pode destituir o Governo, pode
fazer cessar o seu mandato ou impedi-lo de iniciar, sequer, as suas funções.
b) A responsabilidade política do Governo perante a Assembleia da República
manifesta-se em três planos: em primeiro lugar, no momento da constituição
do Governo; em segundo lugar, na apreciação do programa e na sua entrada
em funcionamento pleno; e, em terceiro lugar, na posterior possibilidade de
destituição parlamentar do Governo.
No momento de formação, a Constituição exige que o Presidente da República
nomeie o Governo “tendo em conta os resultados eleitorais” (artigo 187º CRP).
Nomeado pelo Presidente da República, o Governo tem de apresentar o seu
programa à Assembleia da República, mas este não tem de ser aprovado ou votado.
Esta especificidade está intencionalmente orientada à facilitação da entrada em
funcionamento dos governos minoritários. O programa só é indiretamente votado pelo
Parlamento se a oposição apresentar uma moção de rejeição do programa ou, já por
iniciativa do próprio Governo, se este solicitar um voto ou moção de confiança (artigo
192º).
O programa só se considera rejeitado se a respetiva moção de rejeição obtiver o
voto favorável da maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções.
Admitindo que o Governo passa na Assembleia da República, a dependência
parlamentar do Executivo manifesta-se, depois, através da possibilidade de
apresentação e aprovação de uma moção de censura por parte das oposições ou o
Governo considera-se igualmente destituído se, tendo apresentado uma moção de
confiança, essa moção não for simplesmente aprovada.

c) O Governo depende sempre da confiança política da Assembleia da República,


o que acaba por determinar e condicionar, não apenas a relação
Governo/Parlamento, mas também os próprios poderes presidenciais
relativamente a um e outro órgão e, desde logo, a sua margem de ação na
nomeação do Governo após as eleições parlamentares ou após a demissão do
Governo em funções.
O funcionamento do sistema político português, como é típico do
semipresidencialismo, é determinado por três centros de poder: Presidente, Governo e
Parlamento.

Você também pode gostar