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INTENSIVO I

Barney Bichara
Direito Administrativo
Aula 02

ROTEIRO DE AULA

Tema 1: Introdução ao Direito Administrativo (continuação)


Tema 2: Regime jurídico administrativo

6. FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO

a) Doutrina Tradicional
Tércio Sampaio Ferraz, em seu livro, cita que, como o Direito não é natural e é resultado de uma construção social, as
fontes do Direito representam os meios pelos quais o Direito se revela e se torna impositivo.

A doutrina tradicional sempre dividiu as fontes do Direito em primárias e secundárias.

✓ Fonte primária é a matriz, ou seja, é de onde surge o Direito. A fonte primária do Direito Administrativo é a lei,
entendida em seu sentido amplo e abrangendo todos os atos normativos produzidos pelo Estado: Constituição,
emendas à Constituição, as leis em sentido estrito (ato legislativo que depende de sanção do Executivo), as
resoluções legislativas, os decretos-legislativos e os regulamentos administrativos.

✓ Fontes secundárias complementam as fontes primárias, suprindo os espaços não preenchidos.


O Direito não comporta lacunas. As fontes secundárias não podem contrariar a fonte primária e nem ir além dela.

São fontes secundárias:


• A doutrina – Direito Administrativo enquanto ciência do Direito.
• A jurisprudência – o conjunto de decisões reiteradas de tribunais no mesmo sentido.

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• Os costumes – são os comportamentos reiterados que se desenvolvem a partir da crença de que há
previsão legal.
• Princípios gerais do direito.

1º. A lei em sentido amplo – fonte primária do Direito Administrativo.


2º. Doutrina
3º. Jurisprudência fontes secundárias (não podem contrariar a fonte primária).
4º. Costumes
5º. Princípios gerais do direito

O professor destaca que, nos últimos tempos, a jurisprudência acabou ganhando uma maior importância no Direito
brasileiro. Neste contexto, surgiram as súmulas vinculantes, os recursos extraordinários com repercussão geral
reconhecida, sentenças proferidas em ações coletivas que produzem efeitos em face de terceiros, entre outros.
Diante das transformações ocorridas, o professor ressalta que a forma tradicional de tratar as fontes do Direito
Administrativo começa a se mostrar um pouco inadequada à nova realidade jurídica (que comporta a existência de efeitos
vinculantes de alguns instrumentos jurisprudenciais).
A despeito disso, ainda subsiste a divisão das fontes do Direito em primárias e secundárias.

b) Maria Sylvia Di Pietro


Diante dessas transformações ocorridas, Maria Syilvia Zanella di Pietro propõe a classificação das fontes do Direito
Administrativo em duas categorias:

1º. Fontes Supranacionais:


• Os tratados e as convenções - Surgem em âmbito externo, mas ingressam no ordenamento jurídico brasileiro à
medida que o Brasil deles participa e, internamente, ratifica-os.
Exemplo: Convenção Americana de Direitos Humanos.
• Princípios Jurídicos Supranacionais – Trata-se dos princípios que qualquer povo civilizado reconhece. Eles não
dependem de previsão no ordenamento jurídico interno.
Exemplos: o princípio do devido processo legal, o princípio da supremacia do interesse público sobre o individual,
a dignidade da pessoa humana.

2º. Fontes Nacionais: criam o Direito Administrativo e têm origem no ordenamento jurídico brasileiro.
• Fontes formais – Equivale às fontes primárias.
São as fontes geradoras/criadoras do Direito Administrativo em primeiro lugar.
São fontes formais do Direito Administrativo: a Constituição, as emendas à Constituição, as leis, as resoluções
legislativas, os decretos legislativos, os regulamentos executivos e a jurisprudência (ver observação).

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Observação: a jurisprudência é fonte quando as decisões se propagam para além das partes iniciais do processo
de origem (força vinculante das decisões). Exemplos: súmulas vinculantes, decisões com repercussão geral
julgadas no mérito etc. Nestes casos, a jurisprudência vincula e, portanto, é fonte primária do Direito
Administrativo.
• Fontes materiais – A fonte material não é originária. À medida em que se aplica o direito, este é criado.
O Direito Administrativo nasce à medida em que ele é aplicado.
São fontes materiais: a doutrina, a jurisprudência (quando não possui efeitos vinculantes), os costumes e os
princípios gerais de direito.
Obs.: Em regra, a jurisprudência é fonte material (fonte secundária). A jurisprudência somente não será fonte
material quando alcançar terceiros e vinculá-los.

OBS: Hipóteses que a jurisprudência é fonte formal


1º. Sentenças com efeito “erga onmes” nas ações coletivas, na ação popular, ação civil pública, mandado de segurança
coletivo.
2º. Súmulas de Efeito Vinculante – art. 102 §2º da CF (EC 45/2004) e Lei 14.417/2006.
3º. Repercussão Geral (art. 1.035 do NCPC).

7. SISTEMAS ADMINISTRATIVOS

a) Conceito: sistemas administrativos são mecanismos de controle judicial dos atos do Poder Público.
✓ Trata-se de meios para garantir o Estado de Direito.

O professor relembra que a Revolução Francesa acabou com o Absolutismo e com tudo o que ele representava. Sobre os
escombros do Estado absoluto, uma nova ordem jurídica e política surgiu: o Estado de direito.

O Estado de direito é soberano para legislar. Entretanto, posta a lei, ela é obrigatória para todos, inclusive para o próprio
Estado – Princípio da legalidade.
Nesse contexto, surgem mecanismos (sistemas administrativos) que têm a finalidade de assegurar que a legalidade seja
observada.

Em suma: O Estado de direito repousa sobre dois grandes pilares:


• Legalidade; e
• Controle judicial – Denominado de sistemas administrativos.
No caso do controle judicial, a atuação somente ocorre quando há provocação. Além disso, é importante
relembrar que, nesses casos, há um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida.

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b) Modalidades (duas):
1º - Sistema Francês ou Sistema do Contencioso Administrativo - Neste sistema, existem duas jurisdições: há uma
jurisdição comum e há uma jurisdição administrativa.
✓ Em ambas, há jurisdição, há a atuação mediante provocação para dirimir controvérsias e as duas decidem com
definitividade.

A jurisdição comum aplica o direto privado. A jurisdição administrativa aplica o direito público.
• Assim sendo, se a lide (conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida) ocorre entre particulares,
a jurisdição comum é a competente para processar, julgar e decidir.
• Se a lide ocorre entre o Estado e o cidadão, a jurisdição administrativa é a competente para processar, julgar e
decidir com força de definitividade.

Cabe à jurisdição administrativa o controle judicial dos atos do poder público.

Na França, a jurisdição comum se chama Corte de Cassação. A jurisdição administrativa se chama Conselho de Estado.
Para dirimir eventuais conflitos de competências, há o Tribunal de Conflitos.
✓ Neste caso, há órgãos administrativos julgando e decidindo com força de coisa julgada.
✓ O professor explica que, na França, o Conselho de Estado subtraiu do Poder Judiciário a competência jurisdicional
para julgar atos que envolvessem o Estado.
✓ Criar a jurisdição administrativa foi a forma de excluir da apreciação do Poder Judiciário os atos envolvendo o
Estado.

O Estado desenvolve 3 funções essenciais: jurisdição, legislação e administração.


• Legislar é produzir a lei.
• Administrar é aplicar a lei ao caso concreto para realizar o que está na lei.
• Julgar é resolver conflitos com força de coisa julgada.
Com a Revolução Francesa, a alta burguesia tomou conta do Estado, exercendo as funções de administração e legislação.
A jurisdição, por sua vez, é atividade técnica e, naquela época, os julgadores que existiam pertenciam ao antigo regime.
Dessa forma, de modo a não haver boicote aos ideais revolucionários, eles decidiram excluir do Poder Judiciário a
competência para julgar atos que envolvessem o Estado. Neste âmbito, surgiu a jurisdição administrativa na França.

2º- Sistema Inglês ou Sistema Judiciário (sistema da unidade/controle da jurisdição):


Neste sistema, o Poder Judiciário monopoliza a jurisdição, ou seja, somente o Poder Judiciário exerce, de forma típica, a
jurisdição.
✓ Só existe uma jurisdição e, portanto, ela exerce o controle judicial de qualquer ato (inclusive dos atos do Estado).

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No sistema inglês, há a common law, ou seja, o direito é comum. Neste caso, existe apenas um direito para o Estado e
para o cidadão. Não há direito público e privado na common law.
Se o direito é comum, há apenas uma jurisdição, monopolizada pelo Poder Judiciário.

✓ Obs.: No sistema da civil law (da qual o Brasil faz parte), há um direito público (para o Estado), marcado por
verticalidades e supremacia; e há um direito privado (entre cidadãos).

OBS: Brasil - Art. 5º, XXXV da CF/881.


O Brasil integra o sistema romano-germânico e adota o sistema da civil law. A despeito disso, desde a Proclamação da
República, todas as constituições brasileiras (inclusive a de 1988) positivaram o sistema inglês, ou o sistema da unicidade
da jurisdição. Neste caso, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

✓ Durante a Constituição de 1969, houve uma emenda constitucional que criou a hipótese de órgão administrativo
decidir judicialmente (hipótese de jurisdição administrativa). Isso ocorreu nos casos envolvendo a segurança do
Estado e surgiu em decorrência de movimentos armados e guerrilhas (1977).
✓ Essa previsão criada por emenda constitucional deveria ser regulamentada por lei, mas, posteriormente, houve a
redemocratização e nunca ocorreu a regulamentação da EC.

OBS: Jurisdição Condicionada


Conforme visto acima, no Brasil, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Assim
sendo, todos os atos que lesem ou ameacem lesar direitos podem ser apreciados pelo Poder Judiciário. Entretanto, em
alguns casos, é possível estabelecer algumas condições.

Jurisdição condicionada ocorre quando a norma estabelece uma condição específica de acesso à jurisdição.
Neste caso, antes de recorrer ao Poder Judiciário, é necessário recorrer a uma manifestação administrativa. Veja os casos
em que isso ocorre:

A. Justiça desportiva - art. 217, § 1º CF2


B. Habeas data - Súmula 2 STJ3

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CF, art. 5º, XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”
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CF, art. 217, §1º: “O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após
esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei.”
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Súmula 2, STJ: “NÃO CABE O HABEAS DATA (CF, ART. 5., LXXII, LETRA "A") SE NÃO HOUVE RECUSA DE INFORMAÇÕES
POR PARTE DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.”

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C. Súmula Vinculante - § 1.º do art. 7.º da Lei 11.417/20064 - Reclamação Constitucional em face à decisão contrária à
súmula vinculante. Neste caso, é necessário o esgotamento das vias administrativas.
D. Ações previdenciárias - RE 631240.

Atenção: Não confunda a jurisdição condicionada com exaurimento das vias administrativas.
✓ O professor explica que a exaustão das vias administrativas se refere à necessidade de requerimento prévio às
instâncias administrativas para, posteriormente, ingressar com a ação judicial. Em regra, isso não é necessário,
ou seja, não é necessária uma negativa administrativa para ingressar com a ação judicial. Entretanto, nos casos
de jurisdição condicionada, a comprovação de requerimento e decisão administrativa é condição para ingresso
com ação judicial. Exemplo: justiça desportiva.
✓ Em suma: A jurisdição condicionada ocorre quando é necessário, antes de o cidadão recorrer ao Poder Judiciário,
demonstrar a manifestação administrativa que causa lesão ao seu direito.

8. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Se a “Administração Pública” é o objeto do Direito Administrativo, é necessário definir o conceito desta expressão.
✓ Obs.: O professor destaca que essa expressão é equívoca, ou seja, possui mais de um significado.
✓ O sentido da expressão depende do contexto dentro do qual a expressão está inserida e depende do sentido que
o interlocutor pretende dar a ela.

a) Administração Pública em Sentido Amplo: a expressão “Administração Pública”, em sentido amplo, refere-se ao
governo e à Administração em sentido estrito.

Governo + Administração Pública em sentido estrito.

b) Governo: esta palavra comporta dois significados:


1º - Sentido Objetivo: Nesse sentido, o governo é uma das atividades estatais.
No sentido objetivo, governo é a função estatal de governar. Trata-se de atividade política (uma das atividades essenciais
do Estado).
✓ Em sentido objetivo, governo é uma das finalidades do Estado (ao lado da jurisdição, da administração e da
legislação).

Conforme já estudado, o Estado é pessoa jurídica de direito público dotada de autonomia política. O Estado exerce
funções essenciais a ele mesmo e à coletividade.

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Lei 11.417/06, art. 7º, §1º: “Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após
esgotamento das vias administrativas.”

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✓ O Estado legisla, julga e administra. Esta é a concepção do Século XIX. Entretanto, com o avançar dos anos, é
possível identificar que o Estado exerce a atividade de governo.
✓ Governar consiste em dirigir o Estado e em definir a vontade superior do Estado. Administrar, por sua vez, é
executar. Assim, o governo aponta os fins e a Administração aplica a lei ao caso concreto para realizar estes fins.
✓ A doutrina indica os respectivos atos como exemplos de atos de governo: declarar guerra, celebrar paz, decretar
estado de defesa ou de sítio, assinar tratados internacionais etc.

A partir dessa ideia, Celso Antônio Bandeira de Mello conceitua agente político. Para o autor, agente político é o agente
público encarregado de exercer a atividade política (ou de governo).
✓ Trata-se do agente público constitucionalmente encarregado de dirigir o Estado.
✓ Observação: Celso Antônio Bandeira de Mello afirma que o magistrado não é agente político, pois a sua função
estatal é a jurisdição (e não atividade de governo).

2º - Sentido Subjetivo
Em sentido subjetivo, governo são os órgãos constitucionais encarregados de exercer a função de governo.

No ordenamento jurídico brasileiro, a atividade de governo é dividida basicamente entre dois órgãos: Poder Executivo e
Poder Legislativo.

✓ Para Celso Antônio, são agentes políticos: chefe do Poder Executivo, seus vices, seus auxiliares imediatos
(ministros de Estado, secretários estaduais e estaduais, e parlamentares) e parlamentares de todos os níveis.

Exemplo 1: quem declara a guerra é o Presidente da República (Poder Executivo), autorizado pelo Congresso Nacional
(Poder Legislativo).

Exemplo 2: o chefe do Poder Executivo assina o tratado internacional, mas este só entra no ordenamento jurídico se o
Poder Legislativo o ratificar.

Exemplo 3: A derrubada do veto pelo Congresso Nacional é uma atividade de governo (e não ato de legislar).

Governo em sentido subjetivo são os órgãos constitucionais encarregados de exercer a função política.
✓ O professor explica que a principal característica do Poder Judiciário é a inércia (ele age apenas por provocação).

c) Administração Pública em Sentido Estrito


A expressão “Administração Pública” em sentido estrito é uma expressão que exclui do seu alcance a ideia de governo.
Isso porque, se se incluir o governo, há a “Administração Pública” em sentido amplo.

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Sentido Objetivo (material ou funcional): a Administração Pública é a função administrativa (uma das funções essenciais
do Estado).
✓ A premissa é que o Estado legisla, julga, administra e governa.

Sentido Subjetivo (formal ou orgânico): a Administração Pública são os sujeitos encarregados de desempenhar a
atividade administrativa.
✓ São os órgãos públicos e as entidades incumbidos de exercer a atividade administrativa.

Observações:
Sentido Subjetivo:
▪ Órgãos públicos que exercem a função administrativa são chamados de Administração Pública Direta
▪ Entidades (pessoas jurídicas) que exercem a função administrativa são chamadas de Administração Pública
Indireta
Quando se fala em Administração Pública direta (órgãos) e em Administração Pública Indireta (entidades), há a
administração em sentido subjetivo.

Sentido Objetivo:
Como visto, a expressão “Administração Pública” em sentido objetivo é a própria atividade administrativa.
A atividade administrativa, segundo a doutrina, desdobra-se em 4 atividades:
▪ Serviços Públicos
▪ Poder de Polícia
▪ Fomento
▪ Intervenção (indireta) no Domínio Econômico – Essa quarta atividade é defendida por Maria Sylvia Zanella di
Pietro.

Em suma:
• A Administração Pública em sentido amplo abrange a Administração Pública em sentido estrito e o governo.
• A Administração Pública em sentido estrito se subdivide em:
1º Sentido Subjetivo:
▪ Órgãos públicos - Administração Pública Direta
▪ Entidades - Administração Pública Indireta
2º Sentido Objetivo:
▪ Serviços Públicos
▪ Poder de Polícia
▪ Fomento
▪ Intervenção no Domínio Econômico

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OBS: Conceitos
Serviço público é uma atividade administrativa (distinta das demais atividades administrativas).
✓ Obs.: O professor destaca que o “serviço público”, neste contexto, não possui o sentido amplo da Escola Francesa
de serviço público visto na aula passada.

Conceito: Serviço público é uma atividade administrativa, assim definida pelo ordenamento jurídico, prestada pelo próprio
Estado ou por quem lhe faça as vezes, que consiste em satisfazer necessidades públicas ou oferecer vantagens e
comodidades à coletividade, segundo o regime jurídico de Direito Público ou predominantemente de Direito Público.
✓ Só são serviços públicos aqueles definidos pela CF/1988 e pelas leis.
✓ O Estado pode prestar o serviço diretamente ou pode delegá-la.

Poder de polícia é a atividade administrativa, segundo a qual o Estado restringe o exercício de direitos para garantir o
bem comum (art. 78, CTN5).
Quando o Estado exerce o poder de polícia, ele também visa ao bem comum, mas este é atingido a partir da limitação de
direitos individuais. Isso é feito segundo o regime jurídico de direito público.
✓ Observação: a diferença entre poder de polícia e serviço público está no objeto da atividade.
✓ A finalidade de ambos é o interesse público e ambas são prestadas pelo Estado. Entretanto, enquanto o objeto
do serviço público é a satisfação de um direito (oferecimento de algo pelo Estado); o objeto do poder de polícia
é a restrição de um direito.

O fomento é a atividade pública/administrativa que consiste em estimular a atividade privada de interesse público.
✓ O fomento se realiza mediante atos de incentivo à iniciativa privada, de forma que as empresas realizem
atividades privadas de interesse coletivo.
✓ O professor destaca que as atividades privadas podem ter fins lucrativos ou não.
• Algumas das atividades privadas com fins lucrativos são de interesse público porque geram empregos,
pagamento de tributos e, portanto, é possível que o Estado conceda benefícios fiscais e creditícios.

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CTN, art. 78: “Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito,
interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à
segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à
propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 1966)
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos
limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária,
sem abuso ou desvio de poder.”

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• Por outro lado, há atividades privadas sem fins lucrativos que são de interesse público. Geralmente, são
ligadas às áreas da saúde, educação, previdência social, ciência e tecnologia. Para incentivá-las, o Estado
realiza o fomento por meio de parcerias (Lei 13.019/2014 – marco regulatório do terceiro setor).

✓ O professor destaca que a Lei 13.019/2014 (Lei de OSC), a Lei 9.637/1998 (Lei da OS) e a Lei 9.790/1999 (Lei da
OSCIP) trazem instrumentos de fomento.
✓ A decisão de fomentar ou não uma atividade é uma decisão política/decisão de governo. A execução das políticas
de fomento é atividade administrativa.

Intervenção no domínio econômico


Maria Sylvia Zanella di Pietro defende que a intervenção no domínio econômico pode ocorrer de maneira direta e de
maneira indireta.
1º Direta – exploração de atividade econômica.
O Estado pode intervir na atividade econômica de duas formas: em regime de livre iniciativa e em regime de monopólio
(art. 1736 e 1777 CF/88).

✓ Neste caso, a atividade de explorar diretamente a atividade econômica não é função administrativa.
Exemplos: Banco do Brasil e Petrobrás exploram atividades econômicas e não exercem funções administrativas.
Obs.: Em sentido subjetivo, o Banco do Brasil e a Petrobrás são Administração Pública. Em sentido objetivo, a
atividade dessas pessoas jurídicas não é administrativa.
As estatais que exploram atividade econômica possuem regime híbrido (normas de direito privado e normas de
direito público) porque o sujeito é a Administração, mas a atividade não é administrativa (e sim econômica).

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CF, art. 173, caput: “Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo
Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo,
conforme definidos em lei.”
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CF, art. 177, incisos: “Constituem monopólio da União:
I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos;
II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;
III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos
anteriores;
IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País,
bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;
V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais
nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser
autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição
Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 49, de 2006)”

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2º. Indireta – regulação – art. 177, §2º, II CF/888
Ocorre quando o Estado regula a atividade econômica.
Exemplo: atuação do Banco Central ao regular a política monetária.

✓ Só a intervenção indireta caracteriza função da Administração no entendimento de Di Pietro.

Observação final:
A Lei 13.847/2019 traz a declaração de liberdade econômica e se relaciona ao disposto no art. 170 da CF/1988.

Tema 2: REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO

Obs.: inicialmente, o professor aconselha que essa matéria deve ser estudada no livro de Celso Antônio Bandeira de Mello,
juntamente com o tema princípios.

1. REGIMES JURÍDICOS DA ADMINISTRAÇÃO

A expressão “regimes jurídicos da administração” é ampla e é utilizada para se referir tanto ao regime jurídico de direito
público, quanto ao regime jurídico de direito privado a que a Administração pode se submeter.
✓ Ora a Administração Pública atua segundo regras de direito público;
✓ Ora a Administração Pública atua segundo o regime jurídico de direito privado.
Obs.: regime jurídico é o conjunto de princípios e regras.

Exemplos

• de atuação da Administração em regime jurídico de Direito Público: intervenção do Estado na propriedade (há
poderes e prerrogativas estatais – verticalidade).

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CF, art. 177, §2º, II: “ A lei a que se refere o § 1º disporá sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 9, de 1995)
(...)
II - as condições de contratação;”

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• de atuação da Administração em regime jurídico de Direito privado: contrato de locação.
É a norma que determina o regime jurídico de atuação da Administração Pública.
Exemplo: Se o Estado institui uma fundação pública por lei e define que a personalidade jurídica desta fundação é de
direito público, ela se sujeitará aos princípios e regras do direito público. Por outro lado, se ele define que o regime
jurídico é de direito privado, ela seguirá as normas de direito privado.

✓ Obs.: Quando a Administração atua sob normas de direito privado, o regime jurídico é híbrido, pois o sujeito é
a Administração (que se submete ao art. 37 da CF/1988), mas a atividade não é administrativa.

Embora a norma defina o regime jurídico, algumas atividades exigem, necessariamente, o regime de direito público.
Nestes casos, o que define o regime é a natureza da atividade.
Exemplo: uma lei municipal não pode definir que o município exercerá poder de polícia segundo normas de direito
privado. Essa lei seria inconstitucional.
✓ A atividade do poder de polícia, por si mesma, exige regime jurídico de direito público.

Em suma: quem define o regime jurídico de direito público ou de direito privado é a norma. A despeito disso, deve ser
observada uma premissa: o exercício de qualquer atividade que requeira prerrogativa pública exige o regime de direito
público.

2. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO

A expressão “regime jurídico administrativo” foi criada pela doutrina para se referir a um conjunto de princípios e regras
que dá identidade ao direito administrativo.

Tal conjunto de princípios e regras possui dois pilares (“pedras de toque” do regime jurídico administrativo – Celso Antônio
Bandeira de Mello):
(i) Princípio da Supremacia do Interesse Público;
(ii) Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público.

Segundo o autor, todo o ordenamento jurídico administrativo é calcado nesses dois princípios.

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✓ O princípio da supremacia do interesse público se traduz em poderes e prerrogativas conferidas à Administração
Pública.
Todos os poderes e prerrogativas decorrem desse princípio. Exemplos: atos administrativos imperativos e
autoexecutórios; poderes de polícia etc.

✓ Já o princípio da indisponibilidade do interesse público se traduz em limitações impostas à Administração.


Administrar é a atividade de quem não é dono e não possui a livre disposição sobre a coisa.
Exemplos: publicidade dos atos, licitar, prestar contas, realização de concurso público etc.

3. PRINCÍPIOS DO DIREITO ADMINISTRATIVO NA DOUTRINA


Este tema não é uniforme na doutrina (indicação, abordagem e denominação). É possível encontrar diferentes nomes
para os mesmos princípios, diferentes abordagens e diferentes indicações.

Principais autores:
A. Hely Lopes Meirelles
B. Celso Antônio Bandeira de Mello
C. José dos Santos Carvalho Filho
D. Maria Sylvia Zanella Di Pietro

4. HELY LOPES MEIRELLES: princípios básicos da Administração Pública


A. Legalidade
B. Moralidade
C. Impessoalidade ou finalidade: para este autor, impessoalidade e finalidade são sinônimos.
D. Razoabilidade
E. Publicidade
F. Eficiência
G. Segurança Jurídica
H. Motivação
I. Ampla defesa e contraditório
J. Interesse público ou supremacia do interesse público

Atenção:
✓ Para Hely Lopes Meirelles, impessoalidade é sinônimo de finalidade.

5. CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO: princípios constitucionais no Direito Administrativo Brasileiro


A. Princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado
B. Princípio da legalidade

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C. Princípio da finalidade
D. Princípio da razoabilidade
E. Princípio da proporcionalidade
F. Princípio da motivação
G. Princípio da impessoalidade
H. Princípio da Publicidade
I. Princípio do devido processo legal e ampla defesa
J. Princípio da moralidade administrativa
L. Princípio do controle judicial dos atos administrativos
M. Princípio da responsabilidade do Estado por atos administrativos
N. Princípio da boa administração (eficiência)
O. Princípio da segurança jurídica

Atenção:
✓ Celso Antônio Bandeira de Mello afirma que o que a EC 19/98 inseriu no art. 37, caput, da CF/1988 (princípio da
eficiência), é o que a doutrina italiana já chamava há muitos anos de boa administração. Assim, o autor chama o
princípio da eficiência de princípio da boa administração.

6. JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO: princípios administrativos


A. Princípios da legalidade
B. Princípios da Impessoalidade
C. Princípios da Moralidade
D. Princípios da Publicidade
E. Princípios da Eficiência
F. Princípio da supremacia do interesse público
G. Princípio da autotutela
H. Princípio da indisponibilidade
I. Princípio da continuidade dos serviços públicos
J. Princípio da segurança jurídica (proteção à confiança)
L. Princípio da precaução
M. Princípios da Razoabilidade
N. Princípios da Proporcionalidade

7. MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO: princípios da Administração Pública (Sequência a ser estudada neste curso).
A. Legalidade
B. Supremacia do interesse público
C. Impessoalidade

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D. Presunção de legitimidade ou veracidade
E. Especialidade
F. Controle ou tutela
G. Autotutela
H. Hierarquia
I. Continuidade do serviço público
J. Publicidade
K. Moralidade administrativa
L. Razoabilidade e proporcionalidade
M. Motivação
N. Eficiência
O. Segurança Jurídica, proteção à confiança e boa-fé.

8. PRINCÍPIOS EM ESPÉCIE

A. Legalidade

➢ A legalidade pode ser decomposta em dois aspectos:

a.1. Reserva da lei – vinculação positiva – A atuação administrativa depende de previsão legal, ou seja, a Administração
Pública só faz o que a lei determina.

a.2. Supremacia da lei – vinculação negativa – Este princípio traduz a ideia de que a lei é um ato jurídico superior aos
demais atos jurídicos.

Em suma: A Administração Pública deve agir diante de previsão legal e submetendo-se a ela. Para entender isso, basta
lembrar do conceito de ato administrativo: declaração da vontade do Estado, inferior à lei, e para cumprir a lei.

➢ Legalidade administrativa X Legalidade constitucional.

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A Administração Pública, quando atua, submete-se tanto à supremacia da lei quanto à reserva de lei, pois há uma
legalidade administrativa (art. 37, caput, CF9) e há uma legalidade constitucional (art. 5º, II, CF10).
• A legalidade administrativa sob o aspecto da supremacia da lei alcança particulares e Administração Pública. No
caso da Administração, esta não pode agir de forma contrária à lei.
• A legalidade constitucional sob o aspecto da reserva de lei somente alcança a Administração Pública, porque esta
somente pode fazer aquilo que a lei manda.

➢ Princípio da juridicidade (legalidade em sentido amplo).


O princípio da juridicidade surge dentro do movimento de constitucionalização do Direito Administrativo. Assim, o
princípio da juridicidade (ou legalidade em sentido amplo) se baseia no fato de que não basta atuar conforme a lei, mas
é necessário atuar conforme todos os princípios que compõem o ordenamento jurídico administrativo.

Art. 2º da LEI 9.784/1.999


✓ Obs.: Embora essa lei seja federal, ela se aplica subsidiariamente aos demais entes federativos.

Lei 9.784/1.999, art. 2º, I: “A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade,
motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse
público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
I - atuação conforme a lei e o Direito; (...)”

A Lei 9784/99 conceitua a legalidade em sentido amplo (juridicidade).

➢ Restrições constitucionais ao princípio da legalidade


Embora exista o princípio da legalidade, este sofre “deformações” em determinados contextos. Assim, há situações
excepcionais, previstas na Constituição Federal, que modificam a aplicação e a interpretação da legalidade. São elas:
1. Medida Provisória;
2. Estado de Defesa;
3. Estado de Sítio.

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CF, art. 37, caput: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e,
também, ao seguinte:”
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CF, art. 5º, II: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes: (...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”

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B. Supremacia do interesse público

O princípio da supremacia do interesse público traduz uma ideia bastante simples: o interesse público é mais importante
do que o particular. Portanto, esse princípio se traduz em poderes e prerrogativas.

➢ Interesse Público Primário X Interesse Público Secundário.


A doutrina classifica o interesse público em primário (bem-comum que satisfaz a coletividade de modo geral) e secundário
(interesse do Estado enquanto pessoa jurídica – interesse estatal).

✓ O interesse público secundário deve ser meio para a obtenção do interesse primário.
Obs.: O interesse público secundário só é legítimo se coincidir com o interesse público primário.
✓ É ilegítimo transformar o interesse secundário em finalidade do Estado.
Exemplo 1: o Estado decide multar todas as pessoas de forma a apenas arrecadar dinheiro. Neste caso, somente
há interesse público secundário e ele não é legítimo.
Exemplo 2: O Estado nega o fornecimento e contesta uma ação judicial que pleiteia um medicamento muito caro
sob o fundamento de tutela do interesse da coletividade. Neste caso, o interesse secundário é legítimo, pois ele
está vinculado ao interesse primário.

Reflexões sobre o princípio da supremacia do interesse público:


1. Harmonização do interesse público com os direitos fundamentais - A finalidade do estado é o bem comum das pessoas
e, desse modo, é preciso harmonizar a supremacia do interesse público com os direitos fundamentais da pessoa.

2. A satisfação do interesse público passa pela satisfação dos interesses privados – O Estado existe para realizar o interesse
da coletividade como um todo, mas isso implica a satisfação do interesse de cada cidadão.

3. Não existe supremacia de um interesse sobre outro, trata-se de uma ponderação entre direitos fundamentais.
✓ Os princípios não se excluem, mas se ponderam no caso concreto.
✓ A supremacia do interesse público se dá pela ponderação de interesses.

RE 657718 (repercussão geral reconhecida)


“1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede,
como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão
judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo
superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do
medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);(ii) a existência de
registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico

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com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão
necessariamente ser propostas em face da União.” (22/05/2019)

✓ Obs.: nas ações judiciais, os medicamentos experimentais são chamados de off label (indicação fora da bula).
Exemplo: um laboratório possui um determinado medicamento para transplantado de coração. Entretanto, a
experiência mostra que o medicamento é ótimo para transplantados de rim. Neste caso, o médico prescreve o
medicamento para a pessoa que sofreu transplante de rim. O SUS nega o fornecimento por se tratar de
medicamento experimental.
✓ Em regra, a competência para o fornecimento de medicamentos é solidária. Entretanto, se o medicamento
pleiteado não possuir registro na ANVISA, a ação deve ser proposta na justiça federal.

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