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DIREITO

INTERNACIONAL
PRIVADO
Limites à Aplicação do Direito Estrangeiro:
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

Professora Raquel Perrota


Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

1. Ordem Pública

- O Juiz, ao julgar uma relação jurídica de direito privado com


conexão internacional, aplica sempre as normas de Direito
Internacional Privado da lei do foro.

- Tais normas resolvem conflitos de leis no espaço, de modo a


determinar a legislação aplicável.
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

1. Ordem Pública

- Sendo aplicável o direito estrangeiro, o Direito internacional


Privado da lex fori, em princípio, não leva em consideração o
seu conteúdo.

- Entretanto, o direito estrangeiro não será aplicado se este


violar a ordem pública.
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

LINDB, art. 17

As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer


declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando
ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons
costumes.
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

1. Ordem Pública

- A reserva da ordem pública é uma cláusula de exceção que


visa corrigir a aplicação do direito estrangeiro, quando este
leva a um resultado incompatível com os princípios
fundamentais da ordem jurídica interna.
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1. Ordem Pública

- Nas palavras de Haroldo Valadão, “denega-se, no Brasil, efeito


ao direito estrangeiro que choca concepções básicas de foro,
que estabelece normas absolutamente incompatíveis com os
princípios essenciais da ordem jurídica do foro, fundados nos
conceitos de justiça, de moral, de religião, de economia e
mesmo de política, que ali orientam a respectiva legislação”.
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1. Ordem Pública

- A ordem pública é um conceito relativo com variações no


tempo e no espaço.

- É, outrossim, um conceito aberto que precisa ser concretizado


pelo juiz ao julgar uma causa de direito privado com conexão
internacional, à qual é aplicável o direito estrangeiro.
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1. Ordem Pública

- Quanto mais próxima e intimamente vinculada à lex fori


estiver uma relação jurídica, embora aplicável o direito
estrangeiro no caso concreto, tanto mais o juiz leva em
consideração a compatibilidade com a ordem pública
(Binnenbeziehung).
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1. Ordem Pública

- Caso o direito estrangeiro não venha a ser aplicado ao caso


concreto por violar a ordem pública, a regra é a de que o juiz
aplique a lex fori.
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1. Ordem Pública

- Reservas gerais: intervêm sempre que aplicável o direito


estrangeiro a uma relação jurídica de direito privado com
conexão internacional (art. 17 da LINDB)
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

LINDB, art. 17

As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer


declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando
ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons
costumes.
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

1. Ordem Pública

- Reservas especiais: configuram-se quando a reserva refere-se


tão somente a determinada matéria de direito (Ex: art. 7º,
§6º, da LINDB).
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LINDB, Art. 7º, §6º O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou


ambos os cônjuges forem brasileiros, só será reconhecido no
Brasil depois de 1 (um) ano da data da sentença, salvo se houver
sido antecedida de separação judicial por igual prazo, caso em
que a homologação produzirá efeito imediato, obedecidas as
condições estabelecidas para a eficácia das sentenças
estrangeiras no país. (...)
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LINDB, Art. 7º, §6º (...) O Superior Tribunal de Justiça, na forma


de seu regimento interno, poderá reexaminar, a requerimento do
interessado, decisões já proferidas em pedidos de homologação
de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que
passem a produzir todos os efeitos legais.
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1. Ordem Pública

- Reservas negativas: impedem a aplicação do direito


estrangeiro, aplicável conforme as normas do Direito
Internacional Privado da lex fori, quando os seus pressupostos
estão cumpridos no caso concreto.
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1. Ordem Pública

- Reservas positivas: refere-se de leis de aplicação imediata


quando trata da matéria.
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1. Ordem Pública

- Quando uma norma de aplicação imediata intervém numa


relação jurídica de direito privado com conexão internacional,
não é necessário verificar o conteúdo do direito estrangeiro e
examiná-lo em seguida sob o aspecto da violação da ordem
pública.
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1. Ordem Pública

- As normas da lex fori são aplicáveis de imediato, devido ao


conteúdo imperativo e cogente e isso, também, no plano
internacional.
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1. Ordem Pública

- Fala-se, ainda, de ordem pública interna e ordem pública


internacional.
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1. Ordem Pública

- Quando se fala de ordem pública internacional/mundial têm-se


em vista que o juiz deve levar em consideração não só os
princípios básicos da ordem jurídica interna, mas também
aqueles do Direito Internacional, consubstanciados nos
tratados internacionais, no direito costumeiro internacional,
em princípios gerais de direito e em outras fontes
supranacionais.
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1. Ordem Pública

- Os tratados internacionais regulamente preveem cláusulas de


reserva da ordem pública nos seus textos ao determinares o
direito aplicável a uma relação jurídica de direito privado com
conexão internacional.
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1. Ordem Pública

- Essas cláusulas ressaltam o direito do juiz de aplicar a ordem


pública lex fori quando a aplicação do direito estrangeiro, no
caso concreto, for manifestamente incompatível com os
princípios fundamentais da ordem jurídica interna.
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1. Ordem Pública

- Exemplo disso é a Convenção Interamericana sobre as Normas


Gerais de Direito Internacional Privado (1979), em seu art. 5º.
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“A lei declarada aplicável por uma convenção de direito


internacional privado pode ser recusada no território de um
Estado signatário que a considere manifestamente contrária aos
princípios de sua ordem pública”
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1. Ordem Pública

- Trata-se de verdadeira cláusula de exceção, aplicada somente


em casos de extrema desarmonia com os princípios básicos da
ordem jurídica interna.
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1. Ordem Pública

- A reserva da ordem pública pode intervir tanto perante a


aplicação do direito estrangeiro substantivo ou material,
quanto perante o reconhecimento e a execução de decisões
judiciais estrangeiras no país (reserva da ordem pública
processual).
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1. Ordem Pública

- Destaca-se, por fim, a aplicação direta e indireta da ordem


pública.

- A aplicação das leis estrangeiras configura a ordem pública


direta, ao passo que o reconhecimento dos atos e sentenças
de outro país, a ordem pública indireta.
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2. Normas imperativas

- Jus cogens (direito cogente) são as normas peremptórias,


imperativas do direito internacional, inderrogáveis pela vontade
das partes.
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2. Normas imperativas

- As regras imperativas são as normas que impõem aos Estados


obrigações objetivas, que prevalecem sobre quaisquer outras.
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2. Normas imperativas

- O jus cogens compreende o conjunto de normas aceitas e


reconhecidas pela comunidade internacional, que não podem ser
objeto de derrogação pela vontade individual dos Estados, de
forma que essas regras gerais só podem ser modificadas por
outras de mesma natureza.
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Art. 53 da Convenção de Viena de 1969

“Tratados incompatíveis com uma norma imperativa de direito


internacional geral (jus cogens)

É nulo todo o tratado que, no momento da sua conclusão, seja


incompatível com uma norma imperativa de direito internacional
geral. Para os efeitos da presente Convenção, uma norma
imperativa de direito internacional geral é uma
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

Art. 53 da Convenção de Viena de 1969

norma aceite e reconhecida pela comunidade internacional dos


Estados no seu todo como norma cuja derrogação não é
permitida e que só pode ser modificada por uma nova norma de
direito internacional geral com a mesma natureza.“
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Art. 64 da Convenção de Viena de 1969

Superveniência de uma norma imperativa de direito internacional


geral (jus cogens)

Se sobrevier uma nova norma imperativa de direito internacional,


geral, qualquer tratado existente que seja incompatível com essa
norma torna-se nulo e cessa a sua vigência.
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2. Normas imperativas

Um exemplo reconhecido de "jus cogens" é a Declaração


Universal dos Direitos Humanos da ONU de 1948, que apesar de
não ser uma norma formalmente cogente, já que não é um
tratado, possui obrigatoriedade material, uma vez que foi votada
na assembleia geral das nações unidas.
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3. Fraude à Lei

- A fraude à lei constitui uma forma de abuso de direito, não


sendo ela admitida perante o Direito Internacional Privado.

- Para que se caracterize fraude à lei, há que se observar alguns


pressupostos.
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3. Fraude à Lei

- O primeiro deles é se mostra na pretensão de evitar a


aplicação de determinadas normas substantivas ou materiais
do direito interno, ou também do direito estrangeiro, cujas
consequências legais não são desejadas.
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3. Fraude à Lei

- Num segundo espectro, têm-se a observância de uma


manobra legal extraordinária para obter o resultado desejado
(ex: um divórcio que não é possível no país de origem).
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3. Fraude à Lei

- Por fim, quando se observa o objetivo de evitar a aplicação do


direito substantivo ou material interno, transferindo atividades
e praticando atos para e no exterior.
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3. Fraude à Lei

- Pode ocorrer, ainda, a escolha de um foro favorável no


estrangeiro com a mesma intenção.
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3. Fraude à Lei

- Exemplo disso foi o casamento entre Sophia Loren e Carlo


Ponti.

- Ambos adquiriram a nacionalidade francesa para que Carlo


pudesse divorciar-se de sua primeira esposa e contrair núpcias
com Sophia.
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3. Fraude à Lei

- A Itália, país de origem de Carlo Ponti e de Sophia Loren, à


época, não permitia o divórcio, enquanto na França não
existiam restrições nesse sentido.
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3. Fraude à Lei

- Segundo Beat Walter Rechsteiner e Jacob Dolinger, a fraude à


lei somente deve ser admitida quando o objetivo for evitar a
aplicação de normas cogentes e imperativas no plano
internacional.
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3. Fraude à Lei

- Nesse sentido, não está restrita às normas do direito interno,


vindo a abranger, outrossim, normas do direito estrangeiro.
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3. Fraude à Lei

- Em relação à sanção em face de uma fraude à lei praticada,


têm-se que a de maior gravidade seria a de que uma sentença,
um negócio jurídico ou um outro ato jurídico obtido mediante a
prática de fraude à lei não será reconhecido pelo direito interno
e, consequentemente, não surtirá quaisquer efeitos jurídicos no
país.
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3. Fraude à Lei

- Importante frisar, entretanto, que cabe ao magistrado a


ponderação dos interesses conflitantes no caso concreto.
Ordem Pública, Normas Imperativas e Fraude à Lei

Convenção Interamericana sobre Normas Gerais de Direito


Internacional Privado (1979), art. 6º

“Não se aplicará como direito estrangeiro o direito de um Estado


–Parte quando artificiosamente se tenham burlado os princípios
fundamentais da lei de outro Estado-Parte. Ficará a juízo das
autoridades competentes do Estado receptor determinar a
intenção fraudulenta das partes interessadas”.

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