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DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA

Parte I- Quadro Institucional da Comunidade Europeia: composição,


funcionamento e competências das instituições e órgãos da União
Europeia.

1. Parlamento Europeu

Composição:

 O Parlamento Europeu é composto por representantes dos cidadãos da União


(para se ser cidadão da União, tem de se ser cidadão de um Estado-Membro),
eleitos por um mandato de 5 anos, por sufrágio universal direto.

 O número de deputados ao Parlamento Europeu não pode ser superior a


751+ o presidente (752) e varia entre 6 e 96 membros por Estado, sendo a sua
posição fixada por unanimidade, pelo Conselho Europeu. Os deputados reúnem-
se em grupos políticos constituídos em formato de partidos políticos europeus,
segundo a respetiva afinidade ideológica.

Funções:

 Orçamental:

O Parlamento dispunha de competências quanto às despesas não obrigatórias,


na discussão, aprovação e fiscalização do orçamento. Já quanto às despesas
obrigatórias a última palavra cabia ao Conselho.

Contudo, o processo de aprovação do orçamento foi simplificado (Arts. 312º a


314º do TFUE): o orçamento anual da União tem de respeitar o quadro
financeiro plurianual estabelecido por um período de pelo menos 5 anos. O
Parlamento Europeu passa a controlar tanto as despesas obrigatórias como
as não obrigatórias (sendo que antes só detinha competências quanto as não
obrigatórias). Além disso, o Conselho e o Parlamento Europeu passam a fazer
uma única leitura da proposta do orçamento apresentada pela Comissão.

 Legislativa:

O Parlamento Europeu vê reforçado o seu poder normativo com a criação do


processo de codecisão1 pelo Tratado da União Europeia. Nesta codecisão, o
Conselho da União Europeia vai perdendo o domínio do processo legislativo,
uma vez que os atos apenas serão adotados com a concordância do Parlamento e
do Conselho.

 Outras competências;

Desenvolve também funções consultivas, nomeadamente no âmbito da política


externa e segurança comum (Art.36º do TUE) e pode ser necessária a sua
aprovação quanto à celebração de certos acordos internacionais (Art.218º,
nº 6, alínea a) do TFUE), bem como no processo de adesão de novos Estados
(Art.49º do TUE).

O Parlamento Europeu também pode adotar comissões de inquérito temporárias,


ou seja, investigações parlamentares sobre determinados assuntos e eventos (Art.
226º do TFUE), receber petições (Art.227 do TFUE), eleger o Provedor de
Justiça2 (Art. 228º TFUE), interpor recursos de anulação e intentar ações de
omissão para garantir o cumprimento do direito da União Europeia, submeter ao
Conselho projetos de revisão e “vetar” atos delegados ou mesmo revogar a
delegação (Art.290 do TFUE). Em suma, baseando-se o funcionamento da
União na democracia representativa, nos termos do Artigo 10º do TUE, o
Parlamento assegura que os cidadãos europeus estão diretamente representados
ao nível da União, promovendo os valores e prosseguindo os objetivos da União.

1
Processo de decisão conjunta do Parlamento Europeu e do Conselho, ou seja, as duas instituições co
legislam. Este processo foi redenominado de processo legislativo ordinário.
2
Pessoa concreta, que a lei dá um conjunto amplo de poderes para que possa representar,
individualmente, o cidadão junto das instituições.
A contribuição dos Parlamentos Nacionais para o bom
funcionamento da União Europeia

Os Parlamentos Nacionais participam, nos termos do Artigo 12º do TFUE, no


processo de revisão dos Tratados (Art.48º do TUE), são informados do pedido
de adesão de novos Estados (Art.49º do TUE), participam na cooperação
interparlamentar entre Parlamentos Nacionais e Parlamento Europeu e podem
vetar o uso de passarelas (também conhecida por bridging caluses- cláusulas de
ponte) da regra de votação da unanimidade para a maioria qualificada e do
processo legislativo especial para o processo legislativo ordinário.- Art.48º/7 do
TUE e 81º/3 do TFUE). Isto é, o Conselho Europeu, depois de obter a aprovação
do Parlamento, permite ao Conselho que em vez de votar por unanimidade, votar
por maioria qualificada e em vez de decidir por processo legislativo especial,
decidir por processo legislativo ordinário.

A tarefa mais importante é a de atuarem como vigilantes ex ante do princípio


da subsidiariedade, garantindo que as decisões são adotadas ao nível mais
próximo das populações. A Comissão envia diretamente aos Parlamentos
Nacionais projetos de atos legislativos, podendo os Parlamentos invocar o
sistema de alerta precoce, isto é, no prazo de 8 semanas a contar do envio do
projeto do ato legislativo, os Parlamentos Nacionais podem formular um
parecer fundamentado sobre a inobservância do princípio da
subsidiariedade3.
Se o parecer representar pelo menos 1/3 dos votos atribuídos aos
Parlamentos Nacionais (19 numa União com 28), uma vez que, cada PN dispõe
de 2 votos ou de 1/4 (14 numa União com 28) nos domínios de liberdade,
segurança, justiça ou mesmo a maioria simples no quadro de processo
legislativo ordinário (29 votos numa União com 28 Estados), o projeto deve
ser reanalisado.

3
Exclui a intervenção da União quando uma matéria pode ser regulamentada de modo eficaz pelos
Estados-Membros a nível central, regional ou local e confere legitimidade à União para exercer os seus
poderes quando os objetivos de uma ação não puderem ser realizados pelos Estados-Membros de modo
satisfatório. Por outras palavras, a célula mais próxima do problema é que o deve regular.
 Procedimento de Cartão Amarelo: Pela primeira vez foi contemplada
no direito primário a possibilidade de os PN obrigarem ao reexame do
projeto do ato legislativo ainda que nos primeiros dois casos (Art. 7º, nº 1
e 2 do Protocolo nº 2, relativo à aplicação do pp da subsidiariedade e
proporcionalidade) seja o autor do ato a decidir se ele deve ser mantido
ou não.

 Procedimento de Cartão laranja: Ao passo que, na terceira hipótese


(Art. 7º, nº 3 do Protocolo nº 2) se a Comissão decidir manter a proposta,
a decisão final é transferida para o legislador da União (Parlamento
Europeu e Conselho), que a pode manter ou não.

É certo que o pp da subsidiariedade poderá vir a ser fiscalizado ex post pelo


Tribunal de Justiça, nos termos do Art. 8º do Protocolo relativo à aplicação dos
princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. Trata-se, contudo, de uma
solução que acarreta os inconvenientes da atuação a posteriori, além de que há o
risco de o controlo a efetuar ser sobretudo de ordem formal. Por outro lado, a
própria redação do Art. 8º referido tem suscitado dúvidas sobre a legitimidade
ativa para a interposição de um recurso de anulação nos termos dos art. 263 do
TFUE, com fundamento na violação do pp da subsidiariedade.

2. Conselho Europeu

Com o Tratado Reformador, o Conselho assume o seu estatuto de instituição (art.13º do


TUE), que possui um papel preponderante na definição das principais decisões políticas
da União Europeia.

Composição:

 O Conselho reúne-se, nos termos do Art. 15º do TUE, duas vezes por semestre
e é composto pelos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados-Membros,
bem como pelo seu Presidente e pelo Presidente da Comissão, participando
ainda nos seus trabalhos o Alto Representante da União para os Negócios
Estrangeiros e a Política de Segurança.
Funções:

 O Conselho Europeu tem por missão definir “as orientações gerais da política
externa e segurança comum”, incluindo matérias com “implicações no
domínio da defesa” (Art. 26º do TUE), bem como “as orientações estratégicas
da programação legislativa operacional no espaço de liberdade, segurança e
justiça” (Art. 68º do TFUE).
 Pode ainda ser solicitada a intervenção do Conselho Europeu no domínio da
segurança social e da cooperação judiciária em matéria penal, sempre que
um membro do Conselho considere que o projeto de ato legislativo prejudica
aspetos fundamentais do seu ordenamento jurídico (Artigos 48º, 82º e 83º do
TFUE). Além disso, o Concelho Europeu avalia periodicamente as ameaças
(como ataques terroristas ou catástrofes naturais ou humanas) com que a
União se depara, além de participar nos processos de revisão dos Tratados (Art.
48º do TUE) e de adesão de novos Estados (Art. 49º do TUE).
 Finalmente, compete ao Conselho estabelecer a lista de formações do
Conselho (Art. 263º do TFUE), fixar o sistema de rotação para a escolha dos
membros da Comissão (Art. 244º), nomear a Comissão Europeia (Art. 17º do
TUE) e a Comissão Executiva do Banco Central Europeu (Art. 283º do
TFUE), permitir que a regra de votação do Conselho por unanimidade em
certos casos passe a maioria qualificada (Art. 312º do TFUE), bem como
alterar o regime especial de associação aplicável a certos países e territórios
ultramarinas (Art. 335º do TFUE).

Os novos cargos criados e redefinidos pelo Tratado de Lisboa: Presidente do Conselho


Europeu e Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de
Segurança

 Os grandes Estados-Membros defenderam a eleição de um Presidente do


Conselho Europeu, com poderes acrescidos, que representasse externamente a
União no âmbito da Política Externa e da Segurança Comum. Assim, o
Presidente do Conselho Europeu, eleito por maioria qualificada, por um
mandato de 2 anos e meio, renovável uma vez, garante, nos termos do novo
Tratado, a continuidade da atividade do Conselho Europeu, mantém a
cooperação com as outras instituições, informando-as devidamente dos assuntos
debatidos nas reuniões, e assegura a representação externa da União no domínio
da Política Externa e de Segurança Comum (Art. 15º do TUE).

 Foi redefinida a figura do Alto Representante da União para os Negócios


Estrangeiros e a Política de Segurança. O Alto Representante é nomeado pelo
Conselho Europeu, por maioria qualificada, com o acordo do Presidente da
Comissão, nos termos do Art. 18º do TUE. A sua missão é conduzir a Política
Externa e de Segurança Comum da União, assegurando a coerência da ação
externa da União (Art. 18º do TUE). O Alto Representante dá, deste modo, voz à
União no contexto internacional, isto é, representa a União no plano
internacional e nesse domínio emite pareceres (Art. 329º do TFUE) apresenta
propostas (Arts. 215º, 218º e 222º do TFUE), recomendações (Art. 218º do
TFUE) e assegura ligações com outras organizações internacionais (Art. 220º do
TFUE). Além disso, é mandatário do Conselho no que se refere à Política
Comum de Segurança e Defesa (PCSD), preside ao Conselho dos Negócios
Estrangeiros e é um dos vice-presidentes da Comissão, incumbindo-lhe
assegurar a unidade e coerência da ação externa da União.

3. O Conselho da União Europeia

Composição:

O Conselho da União Europeia é composto, nos termos do Art. 16º do TUE, “por um
representante de cada Estado-Membro ao nível ministerial, com poderes para
vincular o Governo do respetivo Estado-Membro e exercer o direito de voto” e “reúne-
se por convocação do seu Presidente, de um dos seus membros ou da Comissão (Art.
237º do TFUE), sendo as reuniões quando versem sobre um ato legislativo.

Ao contrário do Conselho Europeu que apresenta uma composição fixa, a composição


do Conselho da EU varia em função dos assuntos a tratar, podendo, deste modo
apresentar várias formações (Art. 16, nº 6 do TUE):
 O Conselho de Assuntos Gerais, o qual garante a coerência dos trabalhos das
diferentes formações).
 O Conselho dos Negócios Estrangeiros, que elabora a ação externa da União e
assegura a sua atuação coerente.

O COREPER auxilia o Conselho no desempenho das suas tarefas (nos termos do Art.
240º, nº 1 do TFUE, cabe a um comité, composto pelos representantes permanentes dos
Governos dos Estados-Membros, a responsabilidade pela preparação dos trabalhos do
Conselho a execução dos mandatos que este lhe confia” e um Secretário-Geral (Art.
240º, nº 2 do TFUE) com competências para desempenhar tarefas sobretudo de índole
administrativa.

Princípio do Efeito Direto


O efeito direto consiste na possibilidade de alguém invocar uma norma num litígio ou
perante um Tribunal Nacional, mesmo quando essa norma não previa aquela pessoa que
a invoca como seu destinatário.

O Efeito Direto nasce no acórdão 26/62, Van Gend & Loos, e de forma simples há uma
sociedade holandesa q importa produtos químicos e que vê ser lhe aplicada uma taxa
aduaneira q na sua opinião não era possível em face das normas do Tratado.

Problema: As normas do Tratado eram destinadas aos EM e a empresa quer invocar


essas normas para rejeitar a taxa que lhe foi aplicada.

PODE OU NÃO FAZÊ LO?

O Tribunal responde SIM PODE! Uma empresa pode invocar uma norma do Tratado
que tem como destinatário outro ou os EM, mesmo não sendo a empresa o beneficiário
óbvio ou evidente dos Tratados, nem parte dos Tratados

E ENTÃO PORQUÊ?

1º Argumento: O objetivo do Tratado é instituir o mercado comum, cujo funcionamento


diz diretamente respeito aos nacionais da União.

2º Argumento: O preâmbulo do Tratado faz referência aos povos.

3º Argumento: Os Tribunais Nacionais são tribunais comuns de Direito da EU, o que


confirma que os Estados reconheceram ao Direito da EU uma autoridade suscetível de
ser invocada pelos seus Nacionais perante aqueles Tribunais.

4º Argumento: Com os Tratados, os Estados criaram uma nova ordem jurídica


autónoma, limitaram os seus direitos soberanos. E nessa ordem jurídica nova autónoma
os sujeitos não são apenas os EM, mas também os seus nacionais. Logo, tal como o
Direito da UE impõe obrigações aos particulares também lhes atribui direitos que
entram na sua esfera jurídica.

 Art.30º do TFUE: Além disso, norma em causa contém uma proibição clara e
incondicional que é suscetível de produzir efeitos diretos, não precisa de mais
atos ou concretização e, nessa medida, em litígios particulares pode invocar-se a
violação deste artigo. Este acórdão vem estabelecer que as normas dos Tratados
podem ser invocadas por particulares contra os Estados nos TN. Uma norma que
não era pensada para ser aplicada a empresas pode ser aplicada por essas
empresas contra o Estado, trata-se do efeito direto (suscetibilidade de invocar
uma norma sem mais) vertical (contra o Estado) ou seja, o Estado visto em cima,
particular em baixo. Opõe-se o chamado efeito direto horizontal- a possibilidade
de uma norma ser invocada por um particular contra outro particular.

Caso contra Sabena

Houve um caso em que a política da empresa Sabena era que as hospedeiras tinham de
se reformar aos 40 anos e isto implicava uma diminuição em termos de rendimentos e
há uma norma no art. 57 TFUE que impede/proíbe a discriminação por género em
termos de pagamento. Uma hospedeira quer invocar essa norma contra a companhia de
aviação belga e, portanto, temos um particular (a hospedeira) a querer invocar uma
norma do tratado contra outro particular (a empresa belga de aviação). No fundo, temos
uma questão ainda mais intensa do que no acórdão Van Gend & Loos, pois neste temos
um do sujeito, que é o Estado, contra quem é invocada a norma do Tratado e ainda é
parte do Tratado. Aqui temos 2 particulares (uma hospedeira e uma empresa) nenhum
deles sendo parte do Tratado e havendo um deles a querer invocar a norma do Tratado
contra outro. O TJUE conclui que a norma é clara, precisa e incondicional e, por isso,
nada impede que a hospedeira a possa invocar contra a empresa belga.

As condições dos 2 acórdãos para que uma norma possa ter efeito direto é preciso
que seja clara, precisa, incondicional.

Clara: posso perceber claramente o seu conteúdo;

Precisa: consiste +- na mesma ideia;

Incondicional: não está dependente de outros fatores para poder ser aplicada.

Estes requisitos não são absolutos! A norma em causa para ter efeito direto tem de ter
um conteúdo determinável para poder ser aplicada sem mais, não basta um pp como a
mais elevada proteção dos direitos de autor mas temos também de ter uma norma que
estabelece um prazo ou assim, algo que eu consiga perceber o melhor possível.

Não podem ter efeito direto as normas que estabelecem um intervalo de prazos, ela não
é clara, precisa e incondicional…. Cabe no fundo ao Estado aplicar esse valor.
Também é claro na jurisprudência que uma norma não tem de atribuir direitos aos
particulares para ter efeito direto. Ou seja, há outras que mesmo que não atribuem
direitos aos particulares podem ser consideradas precisas, claras, incondicionais e ter
efeito direto- Acórdão C8/81.

Os sujeitos: O efeito direto também afeta a administração, ela é obrigada a aplicar o


Direito da UE!

Neste sentido, o Acórdão C103/88 em que se diz que, tal como o juiz nacional, a
administração tem o dever de aplicar as disposições não aplicando as de direito nacional
que com elas não estejam em conformidade (parágrafo 33 do acórdão).

Qual o alcance? O que pode ter efeito direto? Pode ter efeito direto quer vertical quer
horizontal, as normas dos Tratados claras, precisas e incondicionais, mas também
algumas disposições de direito derivado, os regulamentos (têm aplicabilidade direta, isto
é, não precisam de nenhum ato de transposição, valem diretamente, mas também
reconheceu o Tribunal C-93/71 que os regulamentos podem ter efeito direto). Por outro
lado, as decisões também podem ter efeito direto (C-9/70 afirmam). Mais tarde também
se diz que os acordos internacionais celebrados pela União o podem ter (C-104/91 e C-
149/96).

A questão + complexa é o efeito direto das diretivas, pois as diretivas têm a


característica de terem como destinatários os EM. São de forma simplificada, instruções
para o legislador nacional, logo um ato incompleto. Há partida as diretivas não tem
aplicabilidade direta, têm que ser transpostas- Art. 112/8 CRP. Se tudo correr bem, as
diretivas são transportas e a lei nacional é aplicável e se esta é aplicável o assunto não se
colocaria. No caso Comissão contra Alemanha discutiu-se: se então o direto nacional já
garantir o que a diretiva propõe, é preciso transpor da mesma? Não! Basta notificar,
basta dar notícia à Comissão que o direito nacional já transpôs a diretiva ou já realiza os
seus objetivos da diretiva- C- 131/98. Também se discutiu como é que a diretiva tem de
ser transposta (no caso da nossa Constituição já vimos), mas no caso da Comissão/Belga
(C-102/79) exige apenas que seja dada a publicidade adequada.

E se a diretiva não tiver sido transposta ou bem transposta? No Caso Frundin, uma
senhora holandesa pertencia a uma igreja, esta no Reino Unido era vista como
organização terrorista e por isso a senhora não podia entrar no Reino Unido. No entanto,
há uma diretiva que diz que eu não posso impedir a entrada de alguém pelo simples
facto de pertencer a um grupo, mas sim a que me devo ater ao comportamento concreto
dessa pessoa para impedir a sua entrada.

O tribunal inglês pergunta ao TJUE, é saber se esta diretiva pode ou não ser aplicada ou
invocada pela senhora, por outras palavras, se a diretiva tem efeito direto. O tribunal diz
‘as diretivas têm caracter obrigatório e é preciso garantir o seu efeito útil; as diretivas
podem ser objeto de reenvio prejudicial nos termos do art.267º; o pp da cooperação leal
impõe que os EM tomem todas as medidas para garantir o respeito pelo DUE incluindo
as diretivas e, por isso, SIM!, desde que esteja em causa uma obrigação que seja clara,
precisa, incondicional, por sua natureza suscetível de produzir efeitos diretos – no caso
a norma poderia ser e portanto podia ter efeito direto.

Caso Rati “pode haver efeito direto antes de ter passado o prazo de transposição?’
– Uma diretiva fixa um prazo de transposição (que geralmente são 2 anos). Parágrafo 22
acrescenta um outro fundamento para o efeito direto das diretivas: ‘o EM tinha uma
obrigação de legislar, não legislou e não pode agora ter o benefício de não ter feito
aquilo que lhe competia’ – ARGUMENTO DE ABUSO DE DIREITO/
COMPORTAMENTO ABUSIVO – o Estado não transpôs a diretiva e não é por isso
que diretiva não vai ser aplicada porque senão era beneficiado pelo incumprimento do
Direito da UE.

Conclusão: parágrafo 23- se a obrigação da diretiva for incondicional e for


suficientemente precisa e p. 24- já tiver passado o prazo fixado para a sua transposição,
então a diretiva tem efeito direto. Em contrapartida, no p. 44 deste mesmo caso, que
enquanto não tiver decorrido o prazo os EM continuam livres nas matérias.

Sintetizando: Acórdão Van Gend & Loos vem dizer que as diretivas podem ter efeito
direto desde que se trate de uma obrigação incondicional e suficientemente precisa
(p.13). O acórdão Ratti vem dizer SIM, mas além disso é preciso que já tenha passado o
prazo (p. 43 e 44). E isto é assim porque carácter obrigatório das diretivas, pp da
cooperação leal, o argumento do reenvio prejudicial e o abuso de direito.

Caso Comissão contra Bélgica: ‘é preciso transpor se diretiva tem efeito direto?’ O
Tribunal diz “SIM”, o efeito direto não é suficiente, a transposição tem de acontecer!
Caso Comissão contra Alemanha: ‘e o facto de a diretiva estar a ser respeitada e esta
nunca ter sido violada, basta?’ “NÃO”, é preciso uma transposição informativa dando
nota que o direito nacional já respeita o conteúdo da diretiva e como é que o faz.

NOTA: Há algo enganoso no p. 44 do acórdão Ratti que diz que a transposição tem de
ocorrer a um prazo, se o prazo já passou pode haver efeito direto, antes disso os EM
continuam livres na matéria. Ora não é bem assim, porque o acórdão Vallonin C-129/96
vem fixar aquilo que é uma proibição de medidas retrogradas/retrocesso… O caso é que
há uma fixação por parte de uma diretiva relativa a resíduos de montantes máximos e
determinadas regras, há um prazo de transposição, a legislação belga era já protetora
bastante, mas eles aproveitam e dizem que iam ficar mais restringidos daqui a 2 anos e
logo decidem poluir tudo o que podem porque dali a 2 anos tinham a diretiva para
transpor. E portanto, o sentido que a publicação da diretiva tem antes de passar o prazo
de transposição acaba por ir contra o objetivo da diretiva, dessa forma! E o TJUE diz no
p.45: ‘resulta da aplicação conjugada dos Artigos 4, nº 3 TUE e 288 do TFUE que além
da própria diretiva os EM apesar de não estarem obrigados de adotar medidas da
diretiva antes de expirar do prazo da transposição, devem abster-se durante esse prazo
de adotar disposições suscetíveis de comprometer o resultado prescrito por essas
diretivas- PROIBIÇÃO DE MEDIDAS RETRÓGADAS. Uma diretiva é publicada,
imediatamente os Estados ficam impedidos de adotar medidas que ponham em causa os
objetivos fundamentais da diretiva e são obrigados a transpor no prazo fixado. Não
transpondo, se a norma em causa for clara, precisa, incondicional, a diretiva pode ter
efeito direto.

“Efeito direto de que espécie?” – Efeito direto vertical, em todos estes casos, particular
invocar a norma de uma diretiva que seja clara, precisa, inconstitucional, cujo prazo já
passou, contra o Estado.

Isso é admitido!
Caso Marshall “então e o efeito direto horizontal das diretivas é possível?” Há uma
senhora que trabalha num hospital e por ter 62 anos é obrigada a reformar-se por ser
mulher, pois os homens são obrigados a reformar-se só a partir dos 65 anos. Ela
considera que isto viola uma diretiva relativa à igualdade de tratamento em razão do
sexo e, portanto, invoca o efeito direto da diretiva. Discute-se neste caso se as diretivas
podem ou não ter efeito direto horizontal. Resposta do TJUE é: NÃO PODEM!
Porque:

1º Argumento: Primeiro, as diretivas são diferentes de regulamentos, têm destinatários


diferentes (argumento fraco).

2º Argumento: Se as diretivas tivessem efeito direto tornavam-se iguais a regulamentos.

3º Argumento: Este argumento hoje em dia já não faz sentido, porque antes do Tratado
de Lisboa as diretivas não eram publicadas eram notificadas e agora SÃO! E, portanto,
o argumento que era a segurança jurídica, desapareceu.

Mas neste acórdão p.48 diz que ‘uma diretiva não pode por si só criar obrigações na
esfera jurídica de um particular e uma disposição de uma diretiva não pode ser invocada
enquanto tal contra tal pessoa’. Há um argumento mais forte, p.22do acórdão Ratti que é
o argumento de que o fundamento do efeito direto é o comportamento abusivo do
Estado que estava obrigado a transpor e não transpôs. Ora, o particular não tinha de
transpor, logo não tem comportamento abusivo.

Críticas a esta recusa de efeito horizontal das diretivas: discriminação entre


trabalhadores públicos e privados- os trabalhadores do setor público podem invocar
conteúdo de diretivas, desde que as normas que queiram invocar sejam claras, precisas e
incondicionais e já tenha passado o prazo, enquanto os trabalhadores do setor privado
NÃO! Ao fazer isto, criam-se distorções a nível da concorrência podendo admitir-se que
determinadas empresas por serem públicas estejam sujeitas a regras diferentes das
privadas. Além disso há uma distinção artificial entre vertical e horizontal em que
empresas privadas podem ter grande poder e de papel de compressão/ataque aos direitos
dos particulares porventura mais intenso e esmagador do que o Estado. Mas conclusão é
que a diretiva não tem efeito direto horizontal, ou seja, o cidadão/uma empresa não pode
invocar o conteúdo de uma diretiva mesmo que ela seja clara, precisa e incondicional e
mesmo que o prazo já tenha passado, contra outro particular.
Várias questões:

1) O que quer então dizer Estado neste contexto? Quanto + amplo for o Conselho
de Estado menos situações se deixam de fora! No acórdão Marshall, o Tribunal
considerou que aquela entidade era uma autoridade pública e, portanto, apesar
de ter negado o efeito direto horizontal da diretiva, a senhora Marshall ganhou a
causa por que se considerou que ali a autoridade era Estado.

2) Processo 188/89 Foster em que estava precisamente em causa a violação da


mesma diretiva quanto ao pp da igualdade de tratamento entre homens e
mulheres e há a discussão de saber se esta empresa é ou não Estado para efeitos
de aplicação do efeito direto vertical das diretivas. Aí o p.17 deste acórdão diz
‘quando os particulares estejam em condições de invocar uma diretiva contra o
estado podem fazê-lo qualquer que seja a qualidade em que haja este último: a
de empregador ou autoridade pública. Isto é, “o Estado é sempre o Estado
independente da atividade que está a desempenhar.”

P. 18 e 20 define Estado de forma ampla: diz que é um organismo que seja qual for a
sua natureza jurídica foi encarregado por um ato duma autoridade pública de prestar sob
controlo desta um serviço de interesse público e que disponha para esse efeito de
poderes especiais que exorbitem das normas aplicáveis às relações entre particulares.
No fundo, estabelece-se um conceito alargado de Estado de tal forma que quase
qualquer relação com o poder público ou quaisquer poderes que não sejam poderes
normais, que não sejam poderes de direito privado, a existência destes é suficiente para
se considerar que estamos perante Estado.

Há soluções alternativas: a interpretação conforme, muitas vezes conseguimos ter um


efeito semelhante através da maleabilidade dos textos de direito nacional, interpretamos
à luz do DUE e escolhendo de entre vários resultados de interpretação possível aquele
que é mais conforme ao DUE. Além disso, pode dar-se o caso de não haver efeito direto
horizontal (que já sabemos que não há) e se tivesse havido transposição não se teriam
verificado determinados danos e ,portanto, a violação da obrigação de transposição por
parte do Estado gerou danos na esfera jurídica de um particular e esses danos serão
ressarcíeis através da responsabilidade do Estado por violação do DUE- obrigação de
indemnizar.

Além disso há outras 2 situações:

- Efeito de exclusão: o Tribunal diz “o conteúdo de uma diretiva pode não ter efeito
direto horizontal, mas, não obstante, deve ser tido em conta especialmente quando
expressa um pp geral e pode afastar a aplicação de uma norma nacional que seja
contrária a esse pp geral contido na diretiva”. Ou seja, o que acontece é a
inaplicabilidade do Direito Nacional contrário ao DUE incluindo aquele que está vertido
numa diretiva, e portanto isto é mais uma expressão do primado – O efeito de exclusão
é dizer-se “a diretiva pode não conferir direitos ou faculdades que um particular possa
invocar contra outro particular por não ter efeito direto horizontal mas, não obstante,
não é relevante e pode ser tido em conta como qualquer DUE deve ser tido em conta ao
abrigo do pp do primado. Caso Cucu

- Efeito direto em situações triangulares: Caso Delena Wells- há uma senhora que
tem litígio contra as autoridades do Reino Unido, por causa da exploração de uma
pedreira. A exploração foi retomada sem ter havido um estudo de impacto ambiental
como impunha uma diretiva. Diz a senhora que a exploração da mina é ilegal porque
não se pediu um estudo de impacto ambiental como impunha uma diretiva. O que se
discute é ‘se ela pode invocar isto contra o Estado, vai estar a conseguir, de forma
triangular, atingir negativamente quem explora a pedreira, e será que isto é compatível
com a negação do efeito direto horizontal feita no Acórdão Marshall? TJUE responde
(p. 57) “simples repercussões negativas sobre direitos de terceiros mesmo que certas,
não justificam que se negue ao particular a possibilidade de invocar as disposições de
uma diretiva contra o EM em causa”. Ou seja, ela invoca a diretiva contra o Estado
(e.d.v) e isso afeta negativamente terceiros que não são Estado, mas é irrelevante.

Em suma:

- Há efeito direto numa diretiva se a norma que quero invocar for clara, precisa,
incondicional e já tiver passado o prazo de transposição.

- Posso invocar o conteúdo dessa norma contra o Estado, não contra outros particulares.
Última questão: “E o Estado pode invocar o conteúdo de uma diretiva contra o
particular?” – Já passou o prazo de transposição, a diretiva contém uma norma clara,
precisa e incondicional, que o Estado não transpôs e agora quer invocar o conteúdo
dessa norma que ele não transpôs contra o particular. E a resposta é NÃO– Efeito
diretivo vertical invertido – p.42 Ratti “se o fundamento do efeito direto das diretivas é
o comportamento abusivo (o Estado não se poder prevalecer do incumprimento da
obrigação de transpor) por maioria de razão não pode haver efeito direto vertical
invertido”. E, por isso, as diretivas não podem ter efeito direto vertical invertido nem
horizontal. Só efeito direto vertical ascendente! – Permitem a um particular invocar
o conteúdo da norma, sem ter sido transposta, contra o Estado nos tribunais
nacionais em seu favor.

Conclusão: Temos então uma conjugação entre primado e efeito direto baseados na
existência de uma nova ordem jurídica. O DUE é um complexo normativo que se
integra e que é inseparável da vida jurídica de cada EM e que atribui direitos à esfera
jurídica dos particulares e que eles podem invocar. É assim com os Tratados que têm
efeito direto vertical e horizontal, desde que as normas em causa sejam claras, precisas e
incondicionais; é assim com os regulamentos que tem aplicabilidade direta e efeito
direto; é assim com as decisões que podem ter efeito direto; com as convenções
internacionais que podem ter efeito direto e com as diretivas ,que apenas em
determinadas circunstancias (isto é, serem normas claras, precisas, incondicionais, ter
passado o prazo de transposição e estarmos perante um particular que quer invocar o
conteúdo da norma contra o Estado), também podem ter efeito direto.
Princípio da Interpretação Conforme ou Efeito Indireto

 Todos o sistema jurídico de direito nacional tem que ser livre, interpretado e
aplicado tendo em conta todo o sistema de direito da unia europeia, porque na
visão do TJUE não há dois sistemas, mas uma única ordem jurídica que é
integrada. Ou seja, o sistema jurídico nacional dos EM é diferente entre si mas
de todos eles faz parte como comum o Direito da EU.

Acórdão Von Colson diz:

Os tribunais devem interpretar as leis nacionais de transposição em conformidade


com as normas que transpõem. Isto é sobretudo pensado para diretivas.

Os argumentos principais são:

 Os tribunais são Órgãos do Estado, a diretiva obriga os Estados e como tal, pelo
Art.288º do TFUE os tribunais são obrigados a tomar todas as medidas
necessárias para dar efetividade às diretivas, nomeadamente lendo as normas
nacionais que as transpõem, à luz do que consta das diretivas. E isto também
decorre do pp da cooperação leal do Art.4º, nº 3 do TUE.
 A ideia de tutela jurisdicional efetiva. Reforçado no Acórdão C- 432/05 Unibet-
a ideia de que a cada direito deve corresponder uma ação e, portanto, se a
diretiva prevê determinados direitos, os tribunais devem fazer dentro dos limites
do possível para dar efetividade ao direito que a diretiva prevê).
 A garantia da plena eficácia de direito da UE. Devemos o mais possível tomar as
medidas necessárias para que o direito da EU valha, se aplique na sua maior
extensão possível.

Ao contrário do efeito direto, não se exige que a norma seja clara, precisa e
incondicional. Isto é, uma norma de uma diretiva que contenha um
princípio/uma formulação inespecífica, desde que ela possa extrair algum
sentido útil e condicionar o resultado de uma interpretação pode e deve ser tida
em conta.
Apesar de não se exigir que a norma da diretiva seja clara, precisa e
incondicional, exige-se que o prazo de transposição já tenha passado.

O 1º passo do princípio da interpretação conforme, como foi referido


anteriormente, diz que o direito nacional que transpõe um instrumento/uma
norma de direito da UE, tem de ser interpretado à luz do instrumento que
transpõe.
O Acórdão Marleasing (106/89) leva este passo mais longe. O problema estava
na interpretação de um instrumento já vetusto (o Código Civil Espanhol) à luz
de uma diretiva posterior. Além disso, estava em causa a interpretação de uma
cláusula geral em confronto com uma enumeração taxativa (uma lista fechada
das hipóteses). A pergunta era “Será que a diretiva que tem uma taxatividade
pode influenciar uma cláusula geral?” e “Será que uma diretiva posterior tem
que ser tida em conta na interpretação de um instrumento anterior?”.
O Acórdão Marleasing vem responder de forma a alargar a extensão do princípio
da interpretação conforme dizendo: “o pp da interpretação conforme aplica-se a
todas as leis nacionais e não só à transposição. Isto é assim por causa do
primado: todo o direito da UE prevalece sobre todo o direito Nacional, e,
portanto, o que é aí lex anterior e lex superior é irrelevante porque estamos
sempre a falar de lex superior. Depois fica também claro que isto obriga todas as
entidades nacionais (paragrafo 122 do acórdão Adeneler) e aplica-se a todas as
relações verticais e horizontais. Portanto, o Acórdão Marleasing deixa claro que
não há aqui limitações quanto à natureza das leis nacionais a interpretar (serão
anteriores ou posteriores, de transposição ou não) que se aplica a todas as
autoridades nacionais e que se aplica tanto a relações com o Estado como
relações entre particulares.

Acórdão C-322/88 Grimaldi: Estava em causa a interpretação de uma norma


nacional que tinha dado efeito a recomendações, portanto um instrumento de
Direito da UE não vinculativo. E mesmo aí o tribunal aí disse que o pp da
interpretação conforme aplica-se também a recomendações e vai mais longe
confirmando esta abordagem no acórdão C- 410/03 Batlanta.
A confirmação que o efeito indireto que o pp da interpretação confirme se
verifica também nas relações horizontais, apesar das diretivas não terem efeito
direito horizontal, encontram-se no caso C-282/10 Maribel Dominguez.
A interpretação conforme é exigida não só face às diretivas, mas a todas as
normas de Direito da UE. Não é argumento, por ex. como se discutiu no
Acórdão C-441/14 Ajos: o facto de haver uma interpretação consolidada da
jurisprudência uniforme constante nacional num determinado sentido, isso não é
argumento para impedir a interpretação conforme. No caso Ajos havia um
entendimento sedimentado na jurisprudência dinamarquesa, mas que era
contrario a uma diretiva (a diretiva que proibia a descriminação na idade) e o
tribunal de justiça o que confirmou foi: “Não é pelo facto de os tribunais
dinamarqueses interpretarem este conjunto de normas desta forma à muito
tempo e de forma uniforme, que deve impedir uma alteração do sentido dessas
normas à luz do pp da interpretação conforme.

Em suma, o pp da interpretação conforme diz: todo o Direito da UE deve ser


tido em conta na interpretação de todo o Direito Nacional e entre dois sentidos
possíveis de uma norma de Direito Nacional deve escolher-se aquele que mais
efetividade dá ao Direito da UE (que mais se aproxima àquilo que prescreve o
Direito da Eu).
No entanto, este pp tem limites. A todos estes limites subjaz uma ideia de
garantia da segurança jurídica. São basicamente 3 os limites:
1º não é possível fazer uma interpretação quando a lei não o permite. A lei pode
não o permitir em dois casos:
o Quando o instrumento de Direito da UE vem instituir lei numa área nova.
Imagine-se que não havia normas sobre a proteção do ambiente, não há
matéria de Direito Nacional que me permita fazer uma interpretação
conforme. Portanto, interpretação na ausência de lei não é possível, tal
como não é possível interpretação contra legem. O acórdão C- 334/92 diz
isso, assim como acórdão Propino e Maribel no parágrafo 25.
o Por outro lado, não é possível uma interpretação conforme que agrave a
condenação penal. Não se admite uma interpretação conforme de Direito
da UE que resulte numa interpretação da lei penal mais gravosa para um
particular- Acórdão 168/95 Arcaro confirmando o que já tinha dito o
Acórdão 80/86.

2º Só é possível uma interpretação conforme depois de ter expirado o prazo


de transposição de uma diretiva (Parágrafo 115 do Acórdão Adeneler). Não
posso fazer uma interpretação conforme da lei nacional em relação a uma
diretiva cujo prazo de transposição ainda não passou. Posso, no entanto, por
analogia, como que acontece em relação às diretivas, proibir uma
interpretação da lei nacional que comprometa seriamente os interesses, os
objetivos assegurados pela diretiva. Isto encontra-se sintetizado no Acórdão
Adeneler, parágrafo 110.

Concluindo, ao interpretar e aplicar o Direito Português ou Francês, um juiz


tem de ter em conta todo o Direito da UE e deve escolher sempre o resultado
de interpretação que melhor corresponda ao que diz o Direito Europeu.

Os únicos limites a isso, são os pps da segurança jurídica e da não


retroatividade, nomeadamente:

o quando isso implique uma interpretação na ausência de lei ou contra a


lei.
o quando resulte numa condenação penal mais gravosa para o particular.
o quando não tenha passado o prazo de transposição de uma diretiva.
Responsabilidade Patrimonial do Estado por Violação do Direito da União
Europeia

Itália tinha falhado sistematicamente na transposição de uma diretiva (a diretiva


80 987 CEE) cujo prazo de transposição tinha expirado em outubro de 1983. Já tinha
sido condenada pela falta de transposição numa ação de incumprimento que foi julgada
em fevereiro de 1889 e, não obstante, ainda não tinha transposto essa diretiva. Se tivesse
transposto essa diretiva, existiria um mecanismo de compensação ao dispor dos
empregados em caso de insolvência do empregador.

Francovich era 1 de 34 trabalhadores que, se o Estado Italiano tivesse transposto a


diretiva, não teria ficado sem o seu salário. A questão é então saber se o Estado Italiano
pode ser responsabilizado pelos danos que o incumprimento do DUE causaram a
Francovich e aos seus colegas. Essa é a questão que se coloca no caso C- 6/90 e C-9/90,
o caso Francovich, e o tribunal raciocina dizendo “o efeito útil das normas do DUE, a
proteção dos direitos dos particulares atribuídos pelo DUE, o primado do efeito direto e
o Princípio Da Cooperação Leal, só podem levar a uma resposta” e essa resposta é sim,
Itália pode e deve ser responsabilizada pagando uma indeminização a Francovich e
aos seus colegas. Para isso, faz depender essa responsabilidade de condições:

 A norma violada tem de atribuir direitos aos particulares


 O seu conteúdo tem de ser percetível (tem de ser uma norma clara e precisa)
 Tem de haver um nexo de causalidade entre a violação da obrigação que incumbe ao
Estado (a obrigação de transpor diretivas, neste caso) e o prejuízo sofrido.

Diz-se ainda que são só estes os requisitos, este é um direito que resulta diretamente do
DUE e, portanto, não há necessidade de condenação prévia do Estado numa ação por
incumprimento, no caso até existia, mas não era necessário. Também se diz, no
parágrafo 42, que o tribunal competente para estas ações é o Tribunal Nacional (a
responsabilidade por violação do DUE efetiva-se nos tribunais desse mesmo Estado).

O acórdão Francovich de 1991, inaugurou este Principio Da Responsabilidade Civil Do


Estado (Ou Dos Estados Membros) Por Violação Do DUE, mas foi preciso um segundo
caso, na verdade 2 casos em conjunto, o Acórdão Brasserie du Pêcheur c.
Bundesrepublik Deutschland (C – 46/93 e C- 48/93) e o Acórdão Fraktertein, para
determinar o alcance e os contornos desta responsabilidade. Em ambos os casos
estávamos a falar de leis nacionais violadoras de normas dos Tratados, então a pergunta
que se coloca não é a falta de transposição de uma diretiva, mas sim o comportamento
do estado legislador que por ação ou omissão (ação num caso e omissão no outro),
violou o DUE e com essa violação causou danos aos particulares.

O facto de estar em causa o legislador, o Tribunal responde desde logo é irrelevante


(parágrafos 32 e 35), este Princípio Da Responsabilidade Do Estado Por Violação Do
DUE é válido para qualquer violação por parte do Estado Membro, independentemente
da entidade cuja ação ou omissão está na origem do incumprimento. Para além disso, o
facto de este incumprimento ser imputado ao legislador nacional, não pode pôr em
causa as exigências decorrentes da proteção dos direitos dos particulares que invocam o
DUE.

Portanto, a primeira nota essencial é:

Não interessa se é Estado Legislador, se é Estado De Administração, nem interessa se


atua ou omite uma atuação que é devida, o que interessa é que haja a violação do DUE.

Mas este acórdão é particularmente importante porque sistematiza os três requisitos


necessários, indispensáveis, mas suficientes para haver responsabilidade dos Estados
Membros por violação do DUE. Faz isso no parágrafo 51, onde diz o seguinte: “o
Direito Da União Europeia reconhece um direito à reparação desde que se encontrem
satisfeitas 3 condições”:

 Que a regra de direito violada tenha como objetivo conferir direitos aos particulares
 Necessidade do seu conteúdo ser determinável , uma ideia muito próxima de que
a norma tenha de ser clara, precisa e condicional para o efeito direto das
diretivas.
 Que a violação seja suficientemente caracterizada
 Aponta para a gravidade (parágrafo 55 (a violação suficientemente caracterizada
é manifesta e grave) e 56 (para vermos se uma violação do DUE é ou não
suficientemente caracterizada temos que olhar para o grau de clareza e de
precisão da regra violada; o âmbito da margem da apreciação que a regra violada
deixa às autoridades nacionais ou europeias; caráter intencional ou involuntário
do incumprimento verificado ou do prejuízo causado; o caráter desculpável ou
não do eventual erro de direito; as atitudes eventualmente adotada por uma
instituição europeia terem podido contribuir para a omissão, adoção ou
manutenção de medidas práticas contrárias ao Direito da União Europeia)
 Que haja um nexo de causalidade direto entre a violação da obrigação e o prejuízo
sofrido
 Apresenta dificuldades, isto é, quando não se consegue dizer que o prejuízo
resulta da violação do DUE (por exemplo: recente prende-se com a extensão de
uma pista do aeroporto de Viana, na Áustria, e essa extensão foi feita com
omissão do estudo do impacto ambiental, mas não se pode depreender que esta
ausência seja consequência direta do dano).

Mas fica claro, no parágrafo 66 do acórdão Brasserie du Pêcheur que estas três
condições (que a norma confira direitos aos particulares; que a violação seja
suficientemente caracterizada e que haja um nexo de causalidade entre a norma violada
e os prejuízos sofridos) são necessárias e suficientes para instituir um direito ou obter a
reparação.

Também se diz, por exemplo, no caso Almelo (C- 470/04) que a incerteza em torno do
direito, ou uma jurisprudência muito recente do tribunal de justiça da EU, são fatores
que afastam uma violação do DUE que possa ser considerada uma violação grave, uma
violação suficientemente caracterizada.

Uma violação suficientemente caracterizada é quando o


erro é manifesto e grave. O que resulta do acórdão
C- 178,179,188,189,190 / 94 (todos), no parágrafo 25 é
não transpor uma diretiva no prazo imposto é sempre uma
violação suficientemente caracterizada.
Mas, há outras como a errada transposição de uma diretiva, a transposição incorreta é
uma violação suficientemente caracterizada como por exemplo, C- 392/93. Também
medidas administrativas violadoras da administração do DUE veja -se o caso C-5/94,
resultam ou podem resultar em responsabilidade do Estado por violação do DUE.

Concluindo, a Responsabilidade Civil Do Estado Por Violação Do DUE é um Principio


Geral, pois não se restringe às diretivas, abrange toda a atividade do Estado quer por
ação, quer por omissão.

Mas há um caso espinhoso, então e o exercício da função jurisdicional ? Será que um


estado pode ser responsável pelas decisões que os seus tribunais tomem contrárias ao
DUE?

A Responsabilidade Do Estado Por Violações do DUE perpetradas no exercício da


função jurisdicional, isto é, através de decisões dos seus tribunais, foi objeto de decisão
no C- 224/01.

Neste acórdão estava em causa um professor catedrático que tinha sido prejudicado por
uma decisão tomada pelos tribunais austríacos que além do mais tinham retirado um
pedido de reenvio na matéria. O tribunal diz que o Princípio Da Responsabilidade Do
Estado Por Violação Do DUE é válido para qualquer violação do DUE por qualquer
Estado Membro, independentemente da entidade do Estado Membro, cuja ação ou
omissão está na origem do incumprimento (parágrafo 31). Coisa que são os
fundamentos para dizer que sim. Este é um princípio aceite pela maioria dos EM. Em
matéria de Direito Internacional Publico, o Estado deve ser considerado na sua unida
não diferenciando entre funções, a eficácia das normas do DUE e o Primado e a defesa
dos direitos dos particulares impõem que a resposta seja afirmativa – que haja
responsabilidade do estado por decisões que os seus tribunais tomam se forem
contrárias ao DUE.

Os Estados Membros levantaram várias objeções (parágrafos 37 e seguintes) dizendo


que põem em causa a segurança jurídica, nomeadamente:

 A autoridade do caso julgado


 A independência do poder judicial
 A autoridade do juiz
Existe ainda um problema prático, que era determinar o tribunal competente. O tribunal
de justiça (parágrafo 39), diz:

 A autoridade do caso julgado não é posto em causa, porque o objeto deste processo
não é alterar a decisão do 1º, mas sim tratar essa decisão como danos e é claro que
no caso C- 168/15 que só as decisões transitadas em julgado é que são suscetíveis de
levantar o problema da responsabilidade civil do Estado no exercício da função
jurisdicional, só aí é que o dano se consolida.
 A independência do juiz – o tribunal de justiça responde no parágrafo 42 que o
objeto não era a responsabilidade pessoal do juiz que tomou uma decisão danosa e
violadora do DUE, mas sim do Estado que o juiz representa no exercício da função
jurisdicional.
 Há uma dificuldade prática que diz é o tribunal, no parágrafo 45,46 – o referido
princípio, o Princípio Da Responsabilidade Civil Do Estado Por Violação Do DUE,
não pode ser comprometido pela inexistência do órgão competente. É à ordem
jurídica de cada Estado Membro compete designar os órgãos jurisdicionais
competentes e regular as modalidades processuais das ações judiciais destinadas a
assegurar a plena proteção dos direitos conferidos pelo DUE.

Na verdade, a ideia é os Estados são obrigados a ter um sistema efetivo que garanta a
possibilidade de obter ressarcimento pelos danos causados por violação do DUE. Os
seus contornos concretos não são matéria do DUE desde que não se comprometa a sua
efetividade e assim, o tribunal de justiça já veio dizer no acórdão Traghetti C- 173/03
que o DUE não admite que se limitam a responsabilidade do estado em casos de dolo ou
culpa grave, tal como não admite o que está previsto na lei 67/2007, 31 de dezembro em
Portugal, que no artigo 13º, nº2 exija a prévia revogação da decisão para haver a
responsabilidade do estado pela exercício da função jurisdicional. Isto é inaplicável
quando esteja em causa a violação do DUE, como aliás confirmou o tribunal de justiça
em 2015, no acórdão silva e brito no parágrafo 51.

Ou seja, só se pode afastar a responsabilidade do Estado se não se verificarem os 3


pressupostos que são outra vez enunciados no parágrafo 51 no acórdão Cubber- uma
norma jurídica violada atribuía direitos aos particulares; que a violação seja
suficientemente caracterizada e que haja um nexo de causalidade entre a violação e o
prejuízo sofrido. Mas o tribunal também diz no caso Cubber, parágrafo 53 é preciso ter
em conta a especificidade da função jurisdicional e que só pode haver responsabilidade
no caso excecional do juiz ter ignorado de modo manifesto o direito aplicável. E o
parágrafo 55 volta a lembrar as especificidades e as dificuldades que têm de ser tidas em
conta para que se possa afirmar que há uma violação suficientemente caracterizada. Mas
se houver não é pelo facto de estar em causa o exercício da função jurisdicional que se
deve afastar a responsabilidade do Estado por violação do DUE.

Uma última nota para dar conta que existem críticas à própria existência deste princípio.
Sendo elas de duas naturezas:

 Na verdade, não vão aumentar os impostos por haver responsabilidade civil do


Estado e o Estado vai ter que pagar estas indeminizações e, portanto, isto leva a
um desvio de recursos prejudicando, por exemplo, o serviço nacional de saúde, a
assistência aos mais desfavorecidos ou pobres para pagar indeminizações por
violação do DUE.
 Isto é pouco eficaz na prática e os dados empíricos demonstram que há poucos
processos destes e dos poucos que existem ainda há uma percentagem menor de
processos bem-sucedidos, isto é que terminem numa condenação.

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