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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO

DIREITO

José Vilema, Ph.D.


Doutor em Direito
josevilemapaulo@gmail.com
1. SENTIDO DO DEREITO “QUID IUS”.
ENQUADRAMENTO PRELIMINAR.
• A) O SER HUMANO, A SOCIEDADE E O DIREITO;

• B) DIREITO COMO ORDEM NORMATIVA E COMO SISTEMA INSTITUCIONAL;

• C) CONFRONTO COM OUTRAS NORMAS NORMATIVAS, EM ESPECIAL A


MORAL;

• D) O DIREITO, A AUTORIDADE E PODER. PROBLEMÁTICA DA COAÇÃO E DA


RELAÇÃO COM O ESTADO E COM A ECONOMIA.
a) O SER HUMANO, A SOCIEDADE E O DIREITO
• O Homem sempre viveu em comunidade: clã, tribo, família, cidade (polis),
Sociedade e Estado são, entre outras, formas organizativas em que se tem
manifestado a natureza societária ou a sociabilidade do homem ao longo
da História.

• O Homem é um ser social que estabelece relações com os outros


homens, por esta razão, o seu comportamento deve ser disciplinado por
regras de organização e de conduta – isto é – deve-se fixar uma ORDEM
para a sua actuação.

• ARISTÓTELES defendia a ideia segundo a qual “o Homem, mais do que


qualquer outro animal que viva em enxames ou rebanhos, é, por natureza,
um animal social (zoon politikon) ”.
• A tentativa de compreender o HOMEM EM SOCIEDADE resulta de duas
concepções:
a) CENCEPÇÃO NATURALISTA DA SOCIEDADE:
- Acreditam na origem natural da sociedade, isto é, entendem que a origem
da sociedade tem o seu fundamento ou explicação na natural sociabilidade
do homem, na tendência natural para o homem conviver com outros
homens de modo a satisfazer as suas necessidades e realizar-se como
pessoa. (Principais autores: Aristóteles, Cícero, S. Tomás de Aquino, Stº
Agostinho, etc.)
b) CONCEPÇÃO CONTRATUALISTA DA SOCIEDADE:
- A origem da sociedade baseia-se no CONTRATO SOCIAL. a vida do Homem
em sociedade não era natural, mas antes resulta de um acordo de vontades
entre os homens.
• Defendem que, antes de viverem em sociedade, os homens viviam
num estado pré-social ou “estado de natureza” (status naturalis), em
que não havia leis nem autoridade.

• A passagem à vida em sociedade ou ao “estado de sociedade” (status


civilis), com regras e princípios de convivência colectiva, processar-se-
ia mediante um CONTRATO SOCIAL.

• Por esse contrato social os homens criam um ente regulador da vida


em sociedade tendo em vista o bem comum, surgindo, desta forma,
o Estado e, com ele, as normas que constituem o Direito (normas
jurídicas).
• Onde existe o Homem existe Sociedade (ubi homo, ibi societas).
Porém, onde houver Sociedade haverá Direito (ubi societas, ibi ius).
B) DIREITO COMO ORDEM NORMATIVA E COMO
SISTEMA INSTITUCIONAL;
 O Dto é o princípio ou fundamento normativo que determina a validade dos
nossos comportamentos socialmente revelantes.
• Dto normativamente perspetivado abarca:

CRITÉRIO DE SOLUÇÃO

O jurista pode pretender resolver a situação controvertida de alguém


que arrendou uma casa, em certa localidade, porque julgou ter sido aí
• Dois modos diversos colocado como funcionário público; Partilha de herança de vários co-
herdeiros; Questões de Dto: Quid Ius? O que há de direito? Qual é a
solução jurídica deste caso?

• O Dto é pressuposto da resolução destas situações


circunstancialmente controvertidas, mas não é ele propriamente
problematizado.
PROBLEMATIZAR O
• Dto normativamente perspetivado abarca: DIREITO

• Corresponde ao confronto do Quid Ius?

• Dois modos diversos • Questionar: O que é o Direito?

• O Direito regula, assim, um conjunto de relações que poderíamos figurar num


“triângulo normativo” da seguinte forma: 1. relações entre cidadãos (linha de
base), que têm lugar num plano de igualdade jurídico-social; 2. relações entre
os cidadãos e o Estado (linha ascendente), determinando-se aquilo que os
cidadãos devem à sociedade (Estado) como contribuição para o bem comum;
3. relações entre o Estado e os cidadãos (linha descendente), em que o
primeiro (Estado) aparece com obrigações face aos seus segundos (cidadãos).
• Considerando a sociedade indispensável à vida do Homem, a convivência
humana em sociedade exige que se defina e prevaleça uma ORDEM.
• ORDEM - um conjunto de regras gerais e padrões que orientem de forma
imperativa o comportamento do Homem e estabeleçam as regras de
organização na sociedade bem como as instituições que dela fazem parte.

1. ORDEM NATURAL (Ordem do “SER”);


2. ORDEM SOCIAL:
- ORDEM TÉCNICA;
- ORDEM FÁCTICA;
- ORDEM NORMATIVA (Ordem do “DEvER SER”).
- ORDEM NATURAL (ORDEm DO “SER”);
 É a ordem que não se dirige ao homem, mas que visa compreender os
fenómenos naturais, isto é, é composta por regras que explicam o
fenómeno botânico e o equilíbrio dos animais.
Características:
A ordem natural é alheia a considerações de valor, pois tem por base um
princípio da causalidade (causa/efeito);
 Não pode ser violada, porque se reconduz a esquemas mentais de
explicação da realidade;
 Exprime-se por leis da física, leis da geografia ou leis da genética.
EXEMPLOS: Lei do heliocentrismo ou do geocentrismo e a lei da gravitação
universal de Newton.
- ORDEM social
 É a ordem das condutas humanas que se expressa através de normas
relacionais, pois tem por objecto regular a actividade do homem e as
relações entre os membros da comunidade.

- ORDEM TÉCNICA;

Ordem Social - ORDEM FÁCTICA;

- ORDEM NORMATIVA (ORDEm DO “DEvER SER”).


 ORDEM TÉCNICA – é a ordem que disciplina a actividade humana
tendente à realização de certos objectivos.

Características:
 É composta por regras condicionais, segundo as quais, se se quiser
alcançar algo útil que se proceda de acordo com uma determinada
técnica;
 Não tem imperatividade, dado não se impor ao homem e este não
sentir um “dever”.

EXEMPLOS: Regras de construção civil, regras de fertilização de solos e


regras de fabrico de automóveis.
 ORDEM fáctica – consiste na descrição das condutas humanas e nas previsões de
comportamentos futuros.

Características:
 Exprime-se por leis sociológicas e económicas, segundo as quais, diante de certas
condições, determinadas consequências tendem a verificar-se;

 Distingue-se da ordem técnica porque a ordem fáctica traduz meras enunciações de


juízos de valor da actuação do homem, não orientando a sua conduta para atingir um fim;

É constituída por regras que se separam das regras naturais, pois enquanto estas são
exactas ou universais(a ordem natural é sempre a mesma, podendo apenas mudar a sua
explicação), as regras fácticas são contingentes porquanto a convivência dos homens
muda através dos tempos e do espaço.

EXEMPLOS: A regra tendencial de que depois de uma guerra se verifica uma expansão da
natalidade; a lei da oferta e da procura; o desvio do emprego para países com mão de obra
mais barata, etc.
 ORDEM normativa (ordem do “DEvER SER”) visa orientar a conduta do
homem na relação com os outros homens. Revela-se por importante, pois é a
Ordem que se inclui o Direito (ou a ordem jurídica).

Características:
 Tem um carácter intersubjectivo, pois pretende disciplinar as condutas humanas,
fixando o modo como elas se devem processar;
 Corresponde a realidades éticas do ponto de vista do “dever ser”
(diferentemente da ordem natural que se refere ao “ser”);
 Dirige-se com carácter imperativo à vontade do homem (v.g., o homem sente um
dever de não roubar, pois se o fizer terá consequências);
 É inviolável, porque a conduta do homem pode adequar-se a ela ou não;
 É anterior aos actos que pretende regular, pois impõe-se à vontade do homem
antes de ele agir;
 Difere da ordem técnica, porque, ao contrário desta, a ordem normativa situa-se
num plano axiológica de valores.
Diversidade de ordens normativas:

1. ordem de trato social;


2. ordem religiosa;
3. ordem moral;
4. ordem jurídica.

1. ordem de trato social


A ordem de trato social é a ordem que define as regras de cortesia e de
civilidade que se verificam entre os membros de uma sociedade. Integra
todas as práticas de comportamento: o modo de vestir; a etiqueta; ou os
deveres de respeito para com as outras pessoas.
- A ordem trato social apresenta uma certa vinculatividade para os seus
destinatários, que se traduz no receio de enfrentar sanções sociais.

 usos normativos – gozam de vinculatividade social decorrente da


pressão que o grupo exerce sobre todos os membros para se obter um
certo comportamento. A não observância é sancionada com uma reacção
social adversa (reprovação/marginalização) dependendo da cultura em
que estiver inserido. Ex: o luto por morte de um familiar, etc.

 usos não normativos – são meros “comportamentos convergentes”


que não integram a ordem de trato social. Trata-se de práticas sociais que
traduzem hábitos sem carácter vinculativo.
2. ordem religiosa
A ordem religiosa estabelece o relacionamento do homem com as
divindades, tem por base a fé, e manifesta-se não só no comportamento de
cada um perante si próprio, mas também nas ligações com os outros. Fixam
os deveres do crente para com “Deus”. Ex: os mandamentos da Lei de Deus:
a proibição de matar e de roubar ou o dever de amar o próximo. Possui um
sentido de transcendência da regra religiosa cuja violação implica sanções
divinas – Deus castiga ou não ir ao céu.
3. ordem moral
A ordem moral define os deveres de natureza ética através dos quais se visa
o aperfeiçoamento da pessoa, quer perante si própria, quer no seu
comportamento (externo e interno) em relação aos outros. O desrespeito
da regra moral tem como consequência o surgimento de sanções internas:
remorsos; peso de consciência. Fala-se numa coercibilidade psíquica, por
contraposição à coercibilidade material da ordem jurídica.
• A ordem moral caracteriza-se pela interioridade,
absolutidade e espontaneidade.

• Três grandes áreas:


1. moral de consciência individual – é a moral que faz parte da
consciência de cada ser humano e que leva a optar pelas condutas que
geram o bem, em detrimento das condutas que geram o mal. Ex: a
consciência individual apresenta uma dupla função - “não matar”, ao
mesmo tempo aparece como instância julgadora do cumprimento ou
incumprimento dos seus ditames, cuja sanção é o arrependimento ou o
sentimento de culpa a respectiva violação.
2. moral social ou positiva – diz respeito ao conjunto de preceitos de
carácter ético que se verificam numa certa época entre os membros de
uma sociedade.
• Existem três tipos de moral social ou positiva:
a) A moral social própria de cada país ou de vários países em função do similar
padrão cultural e civilizacional;
b) A moral social no âmbito interno de cada país: moral social urbana e rural;
c) A moral social universal ou consciência moral comum, que respeita às regras
morais genericamente aceites nos vários países e culturas. Ex: a proibição de
matar ou de roubar.
3. morais particulares – atendem aos preceitos de carácter ético
existentes no âmbito de certas profissões:
a) Ética médica ou bioética – respeito aos princípios éticos que devem pautar a
investigação científica e tecnológica sobre a vida humana. Ex: a clonagem, o
aborto ou a eutanásia.
b) Deontologia jurídica ou jornalística – traduz o conjunto deveres de natureza
moral a que se encontram sujeitos os juristas ou jornalistas na relação com as
actividades. Ex: o respeito dos direitos, liberdades e garantias das pessoas.
4. ordem jurídica.
 Ordena os aspectos mais importantes da consciência social. Exprime-se
através de regras jurídicas ou visa a prossecução dos valores da justiça e da
segurança.

A ordem jurídica é, pois, a ordem social regulada ou constituída pelo Direito,


ou seja, por um conjunto de normas gerais, abstractas e imperativas, cuja
observância pode ser assegurada de forma coerciva pelo Estado.
As regras jurídicas ou normas jurídicas da OJ estrutura da ordem
jurídica:
1. previsão ou fattispecie – é a parte da regra que estabelece um acontecimento ou
um estado de coisas. V.g “aquele que perfizer dezoito anos de idade” (art. 130º do cc);
2. estatuição ou efeito jurídico – é a parte da regra que fixa a consequência jurídica
no caso de os factos descritos na previsão se verificarem. V.g., “fica habilitado a reger a sua
pessoa e a dispor dos seus bens”. (art. 130º do cc);

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