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Direito da União Europeia

Prof. Doutora Maria Luísa Duarte

Aula de 17 de Março de 2020

Sumário: Pontos 7.1. e 7.2. do Programa

I. Tópicos de análise

Princípios fundamentais de vinculação internacional

7.1. O princípio do equilíbrio institucional


- Base jurídica – artigo 13.º, n.º 2, TUE
- Equilíbrio institucional e separação de poderes
• Um modelo de bipartição (e não tripartição) de poderes ou funções:
função política v. função judicial
• Respeito pelas competências de cada instituição, órgão ou organismo
/ articulação com o princípio da legalidade da competência)
- Equilíbrio de poderes e configuração prática – os chamados acordos
interinstitucionais (v. artigo 295.º TFUE)
- Equilíbrio institucional e cooperação leal na sua dimensão interna: o
disposto no artigo 4.º, n.º 3, TUE, aplica-se, mutatis mutandis, às relações
que se estabelecem entre as instituições, órgãos e organismos da União;
- Equilíbrio institucional e garantia jurisdicional: o princípio do equilíbrio
de poderes não constitui uma mera directriz de boa orientação institucional,
é vinculativo e susceptível de controlo jurisdicional, nomeadamente controlo
de legalidade dos actos jurídicos adoptados com violação do princípio da
separação de poderes: v.g. caso FNAB, Despacho TJCE de 10.05.2001, Proc.
C-345/00 P, n.º 41, que reconhece o equilíbrio de poderes como
“característica da estrutura institucional” da União e “garantia fundamental
concedida pelo Tratado” – com este alcance, o princípio do equilíbrio
institucional integra o princípio da legalidade que, impondo o respeito do
Direito, se caracteriza como pilar substantivo da União de Direito.

II. Leituras

• Maria Luísa Duarte, União Europeia..., cit., p. 137-141.

7.2. O princípio do respeito pelo acervo eurocomunitário


• Questões de terminologia: adquirido, “acquis” ou acervo
• Origens nos tratados de adesão: vinculação dos Estados aderentes ao
conjunto das decisões, incluindo políticas, que foram adoptadas no
domínio do reforço e desenvolvimento da União e que, como tal,
vinculam todos os Estados-membros: os antigos e os recém-chegados
• Afirmação da ideia da integração como a expressão de uma vinculação
por parte dos Estados-membros aos direitos e deveres que resultam do
“bloco de normatividade” da União
• Acervo eurocomunitário e irreversibilidade das etapas
contratualizadas de integração, o que não é incompatível com opções
institucionais de renacionalização de competências, à luz do princípio
da subsidiariedade (v. artigo 5.º, n.º 3, TUE) ou de decisão pactícia
relativa a redefinição da fronteira entre competências dos Estados-
membros e competências da UE (v. artigo 48.º, n.º 2, TUE); o
princípio do acervo comunitário e o seu corolário de irreversibilidade
da integração não é, pois, incompatível com o princípio contratualista
e a autoridade soberana dos Estados-membros no que se refere ao
estatuto jurídico da União
• Tratado de Lisboa eliminou referência expressa ao princípio do acervo
eurocomunitário (salvo artigo 20.º, n.º 4, TUE), o que não prejudica a
sua relevância conformadora como princípio geral do Direito da UE
que, no que respeita aos procedimentos de decisão política-normativa,
vincula tanto o decisor da União como o decisor nacional
• O princípio do acervo eurocomunitário está ligado, no essencial, à
ideia fundamental, embora insistentemente contestada no passado
recente, da integralidade e coerência do edifício jurídico da União
Europeia, o que deveria impedir, por exemplo, opções políticas que
põem em causa a dimensão social, solidária e de coesão territorial do
projecto de integração europeia em nome de uma visão puramente
economicista

II. Leituras
• Maria Luísa Duarte, União Europeia..., cit., p. 141-143.
Direito da União Europeia

Prof. Doutora Maria Luísa Duarte

Aula de 19 de Março de 2020

Sumário: Pontos 7.3 e 7.4 do Programa

I. Tópicos de análise

7.3. O princípio da cooperação leal


- Base jurídica: artigo 4.º, n.º 3, TUE; artigo 13.º, n.º 3. TUE; artigo 295.º
TFUE
- O seu alcance estruturante é fundamental como princípio geral: o
arquiprincípio da ordem jurídica eurocomunitária que entronca nos
princípios gerais da boa fé e pacta sunt servanda e constitui o devido suporte
normativo expresso para princípios gerais como o do primado que carecem
no corpo dos Tratados de previsão expressa. Em suma, em termos de
arquitectura institucional (i) e de fonte de revelação das obrigações dos
Estados-membros e do decisor da UE em relação aos particulares (ii) é o
princípio combustível que alimenta a veia mais criativa do Tribunal de
Justiça na definição de soluções inovadoras e activistas quando se trata de
impor limites à soberania dos Estados-membros, nomeadamente pela via de
obrigações gerais e específicas de garantia da plena eficácia da norma
eurocomunitária, em especial no que se refere à função de execução interna
das disposições dos Tratados e do direito derivado
- o princípio da cooperação leal vincula tanto o decisor dos Estados-membros
nos vários níveis (político, legislativo, administrativo, judicial) na sua
relação com a UE e na relação com os outros Estados-membros como vincula
o decisor da União na relação com os Estados-membros e na relação
interinstitucional (v. artigo 13.º, n.º 2, TUE e artigo 295.º TUE): projecção
pluridimensional do princípio da cooperação leal
- Cooperação leal e princípio da juridicidade: o princípio da cooperação leal
integra o “bloco de normatividade” e, como tal, é passível de controlo
jurisdicional da legalidade, podendo justificar a declaração de nulidade ou
invalidade de um acto jurídico da UE ou, na perspectiva dos deveres de
actuação dos Estados-membros, um juízo de incompatibilidade ou
incumprimento (v.g. artigo 267.º TFUE e artigos 258.º/260.º TFUE),
incluindo por decisão dos tribunais nacionais enquanto órgãos comuns de
aplicação judicial do Direito da União
- Exemplo: dever de transposição, correcta e atempada, das directivas pelos
Estados-membros (v. artigo 288.º, §3.º, TFUE); aos Estados-membros cabe
garantir o resultado prosseguido pela directiva, mas também a obrigação
genérica de introduzir todas as alterações necessárias na sua ordem jurídica
interna para assegurar o pleno efeito útil da directiva, exigência que o TJUE
deduz do princípio da cooperação leal (c. Comissão c. Itália, de 9.03.2000,
Proc. C-358/98, n.ºs 16-17); o dever de interpretação conforme que impende
sobre os tribunais dos Estados-membros (v. Marleasing, de 13.11.1990,
Proc. C-106/89, n.º 8)
II. Leituras
• Maria Luísa Duarte, União Europeia..., cit., p. 143-147
• Rui Tavares Lanceiro, “O Tratado de Lisboa e o princípio da
cooperação leal”, in Cadernos o Direito, 2010, 5, p. 283-317
• Rui Tavares Lanceiro, O princípio da cooperação leal e a
Administração, AAFDL, 2019.

7.4. O princípio da transparência

I. Tópicos de análise
- Base jurídica: artigo 15.º TFUE / artigo 42.º CDFUE / Regulamento (CE)
n.º 1049/2001
- Origem na jurisprudência e nos Tratados (v.g. Declaração n.º 17, anexa ao
Tratado de Maastricht)
- Transparência e princípio da abertura (v.g. artigo 11.º, n.º 3, TUE,
artigo15.º, n.º 1, TFUE e artigo 298.º, n.º 1, TFUE; concretização: são
públicas as reuniões do Conselho da União em que este delibere e vote um
projecto de acto legislativo, v. artigo 16.º, n.º 8, TUE)
- transparência e o direito de acesso aos documentos: regime jurídico
definido pelo Regulamento (CE) n.º 1049/2001, com definição dos
procedimentos de solicitação pelos cidadãos da União ou qualquer pessoa
física ou colectiva que resida ou com sede estatutária num Estado-membro e
das excepções que por razões de protecção do interesse público (v.g.
segurança pública, relações internacionais) ou de interesse dos particulares
(v.g. intimidade e privacidade das pessoas, segredo comercial e industrial)
justificam a recusa de acesso; dever de fundamentação da decisão de recusa
de acesso com especificação exigida pelo conhecimento das razões pelo
interessado, o que é relevante para efeitos de eventual impugnação judicial
junto do TJUE (v. artigo 263.º TFUE)
- Cerca de 7000 pedidos/ano, com uma percentagem de 80% de decisões
favoráveis ao acesso (v. European Commission, Report on the application in
2018 on Regulation 1049/2001, Com (2019) 356 final, 29.7.2019)
- Caso ClientEarth c. Comissão (Proc. C-57/16 P, de 4.09.2018, n.º 101 e
segs. – documentos internos da Comissão relativos à avaliação de impacto
ambiental e processo legislativo; posição do TJ, contrária à decisão recorrida
do Tribunal Geral, que limita a presunção de afectação do processo decisório
nos termos do artigo 4.º, n.º 3, Regulamento (CE) n.º 1049/2001; ponderação
judicial entre, por um lado, o interesse público relacionado com a divulgação
dos documentos internos e, por outro lado, a salvaguarda do processo
decisório em curso
- Caso Rothmans (Proc. T-188/87, de 19.07.1999, n.º 55) que, ao reconhecer
“o princípio geral da transparência”, obriga a uma interpretação e aplicação
restritivas das excepções ao direito de acesso aos documentos que concretiza
o princípio geral da transparência

II. Leituras
• Maria Luísa Duarte, União Europeia..., cit., p. 147-151
• Catarina Gouveia Alves, “Artigo 42.º”, in A. Silveira / Mariana
Canotilho (coord.), Carta dos Direitos Fundamentais da União
Europeia. Comentada, Almedina, 2013, p. 490 e segs.

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