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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

@ (PROCESSO ELETRÔNICO)
LFBS
Nº 70080185135 (Nº CNJ: 0383725-71.2018.8.21.7000)
2018/CÍVEL

AGRAVOS DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES.


INVENTÁRIO. RECURSOS CONEXOS: 70080185135
E 70081192999.
1. DUPLICAÇÃO DA CAPACIDADE DE BARRAGEM
EM IMÓVEL RURAL. BENFEITORIA ÚTIL. A
duplicação da capacidade de uma barragem existente em
um bem que compõe o espólio é benfeitoria útil, que,
conforme o art. 96, § 2º, do CCB, é aquela que aumenta
ou facilita o uso do bem. Por mais que a herdeira
recorrente, pessoalmente, não exerça o cultivo de arroz,
tal como faz a arrendatária que realizou a benfeitoria, é
inquestionável que o aumento da capacidade da
barragem valorizou imóvel rural e favorece o uso do
bem, que é destinado ao plantio há décadas, permitindo
que o seu proprietário, se for o caso, arrende a área de
terras no entorno da barragem com maior facilidade e
por maior valor, considerando a alta serventia para a
agricultura. Portanto, afigura-se correta a decisão ao
determinar que a benfeitoria seja considerada no monte-
mor e o valor correspondente seja indenizado pelo
espólio. Ao fim e ao cabo, como bem apontado pelo Juízo
de origem, haverá uma “compensação”: o valor da
benfeitoria será acrescido ao monte-mor, mas o mesmo
valor será devido pelo espólio, a título de indenização.
2. CONSTRUÇÃO DE CASA EM IMÓVEL RURAL.
BENFEITORIA ÚTIL. A construção de uma casa,
ampliando a sede do imóvel rural existente ao tempo do
passamento da autora da herança, trata-se de benfeitoria
útil, que aumenta e valoriza o bem. Logo, é imperioso
que o acréscimo patrimonial seja ponderado no cômputo
do monte-mor e, consequentemente, no quinhão da
herdeira recorrente, que receberá a sede a título de
legado. Não sendo possível retornar ao status quo ante,
ou seja, reestabelecer a construção que havia no imóvel
rural anteriormente e sendo inquestionável que a sede do
estabelecimento rural se insere no legado deixado à
agravante, correta a decisão agravada ao determinar que
seja considerado o valor de avaliação atual do bem tanto
no cálculo do monte-mor quanto no cálculo do quinhão
que tocará à herdeira recorrente.
3. EXTENSÃO DO LEGADO. De acordo com as
disposições testamentárias, o legado em favor da
herdeira agravante é constituído pela metade disponível
dos bens imóveis, sendo estabelecido que, neste legado,
deverá a agravante receber a sede do imóvel rural,
também devendo se observar “que a extensão de terras
que lhe couber deverão ser extraídos de frente a fundos na
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propriedade rural, contornando o citado estabelecimento e


em continuidade tendo inclusa a Lagoa do Rodrigues”
(SIC). Portanto, a decisão agravada comporta pequena
reforma, apenas para delimitar o legado nos exatos
termos postos no testamento feito pela autora da
herança.
DERAM PARCIAL PROVIMENTO. UNÂNIME.

AGRAVO DE INSTRUMENTO OITAVA CÂMARA CÍVEL

Nº 70080185135 (Nº CNJ: 0383725- COMARCA DE ALEGRETE


71.2018.8.21.7000)

MARLENE RODRIGUES PEREIRA AGRAVANTE

SUCESSAO DE IEADA AMAZILIA AGRAVADO


RODRIGUES PEREIRA

ESPOLIO DE DILSON RODRIGUES AGRAVADO


PEREIRA

AGROPECUARIA PILECCO LTDA. AGRAVADO

GILBERTO PILECCO AGRAVADO

VILMAR CADORE PILECCO AGRAVADO

CLARISSA PEREIRA FABRES AGRAVADO

ESPOLIO DE MARIA LAURA PEREIRA AGRAVADO


DASTIS

AGROPECUARIA PILECCO LTDA AGRAVADO

CLAUDIO AMILDON ROSSO AGRAVADO

ANADIR RODRIGUES PEREIRA AGRAVADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

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Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do


Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao agravo de
instrumento.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores
DES. RUI PORTANOVA (PRESIDENTE) E DES. JOSÉ ANTÔNIO DALTOÉ
CEZAR.

Porto Alegre, 27 de novembro de 2019.

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS,


Relator.

RELATÓRIO

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR)


MARLENE R. P. interpõe agravo de instrumento da decisão das fls. 63-115
(fls. 2813-2862), proferida nos autos do inventário dos bens deixados por ANADIR R. P.
(processo n.º 002/1.03.0002151-8).

Sustenta que: (1) descabe incluir no acervo partilhável as benfeitorias


realizadas pelos arrendatários na barragem, as quais não foram autorizadas; (2) o aumento da
barragem não constitui benfeitoria necessária ou útil, pois somente interessa aos
arrendatários, que cultivavam arroz na área de terras para fins de exportação; (3) a decisão
merece reforma no tocante à condenação do espólio ao pagamento de indenização em favor
de arrendatários, em virtude de benfeitorias realizadas por estes últimos em açude que caberá
à agravante, porquanto tais benfeitorias não foram efetivadas de boa-fé; (4) a benfeitoria em
questão não beneficia, necessariamente, o espólio, e foi realizada em proveito único de quem
arrendava o bem, devendo ser considerada, pois, voluptuária; (5) assim, a benfeitoria deve
ser declarada perdida e incorporada ao quinhão da recorrente, sem que seu valor seja
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computado no monte-mor; (6) do mesmo modo, descabe considerar o valor de avaliação


atual da sede da fazenda, que também caberá à agravante em razão do testamento feito pela
autora da herança, uma vez que foram os arrendatários que demoliram a construção anterior
e ergueram uma nova sem autorização para tanto; (7) assim, no pagamento do legado da
recorrente, deverá ser considerado o valor da sede rural à época do passamento da
inventariada, declarando-se perdida em seu proveito a edificação feita pelos arrendatários
sem autorização; (8) o legado da recorrente não é composto apenas pelo estabelecimento
rural, diversamente do que constou na decisão agravada, mas, sim, da metade de todos os
imóveis deixados pela inventariada; (9) ademais, os frutos decorrentes do legado também
pertencem exclusivamente à agravante, conforme previsto no art. 1.923, § 2º, do Código
Civil. Requer a concessão de efeito suspensivo e, ao final, o provimento do recurso para:

“a) em relação à barragem, o afastamento da condenação


de indenização aos arrendatários e/ou cessionários
Pilecco’s (pessoas física ou jurídica), bem como pagando-se
à M., por compensação ao prejuízo/perda do legado, o
direito à 50% da melhoria/acréscimo da barragem
(propriedade e/ou uso), seja pela má-fé, seja ausência de
autorização para a implementação da melhoria/dobra de
área;
b) determinar, no tocante à sede rural, que caberá à
agravante em pagamento ao seu legado o valor que dito
bem móvel ostentava na época da transmissão/morte da
inventariada, declarando-se perdida em seu proveito a
melhoria, já que ao arrepio de autorização prévia e boa-fé,
afastando-se toda e qualquer indenização em favor dos
arrendatários e/ou cessionários Pilecco’s (pessoas física ou
jurídica);
c). determinar que o legado da recorrente não se limita ao
estabelecimento rural (expressão de uso comum, mas com
duplo sentido/emprego, o que pode manter dúvidas, algo
nada recomendável diante de uma ação que tramita há 3
décadas), mas sim à metade dos imóveis de propriedade da
inventariada, incluída a sede (casa rural) e todos os frutos
da fração ideal correspondente a este legado até efetiva
partilha.”

Deferi o efeito suspensivo pleiteado (fls. 562-565).

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Contrarrazões nas fls. 572-587, com documentos nas fls. 589-612).

O Ministério Público declinou de intervir (fl. 619).

Ante a interposição do agravo de instrumento n. 70081192999@ em face da


decisão ora agravada, determinei a tramitação conjunta de ambos os recursos.

É o relatório.

VOTOS

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR)


A primeira insurgência manifestada pela herdeira MARLENE diz respeito à
determinação de inclusão da benfeitoria realizada na barragem do imóvel rural no rol
de bens a partilhar e a consequente determinação de pagamento de indenização, pelo
espólio, em favor da arrendatária, referente ao valor da benfeitoria.

Para bem esclarecer a questão, explica-se: em um dos imóveis deixados pela


autora da herança ANADIR, havia uma barragem, cuja capacidade foi aumentada pela
arrendatária do bem (Agropecuária Pilecco). Como a própria recorrente afirma nas razões
recursais, a capacidade da barragem foi dobrada (fls. 36 e 37). Na decisão agravada, o Juízo
que preside o inventário determinou que o valor correspondente ao acréscimo patrimonial
decorrente da benfeitoria deve ser computado no monte-mor, bem como assinalou ser devida
indenização pelo espólio em virtude da benfeitoria, a qual, por ocasião da partilha, será
destinada à herdeira MARLENE, em conformidade com as disposições testamentárias:

“(...) Ressalta-se notícia de ampliação do açude por


Pilecco, açude inicialmente atribuído a herdeira Marlene -
fl. 111. Sobre o ponto, acompanho o entendimento do
inventariante. O valor da melhoria deve ser incluída no
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valor dos bens do espólio. As benfeitorias úteis devem ser


indenizadas, quando há possuidor de boa-fé e autorização
do proprietário. Quando da ampliação do açude não havia
má-fé. Deve o espólio, portanto, indenizar aquele que
realizou a benfeitoria - no caso, o arrendatário Pilecco.
Contudo a benfeitoria passou a integrar o bem, e deve,
portanto, ser partilhada como integrante do espólio. Não há
necessidade de incluir a benfeitoria no cálculo de bens a
transmitir, para fins de ITCMD, uma vez que o valor do
acréscimo ao monte será compensado com o valor da
indenização a pagar a Pilecco. A benfeitoria, contudo,
integra o principal, e será incluída entre os bens atribuídos
a Marlene, pois assim determina o testamento.”

A herdeira MARLENE impugna tal decisão, sob o argumento de que a


arrendatária não solicitou autorização para realizar a benfeitoria, que não pode ser reputada
necessária ou útil. Ademais, referiu que a arrendatária exerceu posse de má-fé, pois usou do
bem arrendado em seu “interesse único e exclusivo” “dando-lhe destinação que lhe beneficia
apenas”, argumentando que a ampliação da barragem facilita a rizicultura, que é a atividade
desenvolvida pela arrendatária, que é grande produtora de arroz, o que não é o caso da
herdeira MARLENE. Por fim, asseverou que a benfeitoria deve ser perdida e incorporada ao
seu quinhão hereditário apenas, não devendo ser computada no monte-mor.

No entanto, não assiste razão à recorrente ponto.

A duplicação da capacidade da barragem não se trata, de fato, de uma


benfeitoria necessária, que, nos termos do art. 96, § 3º, do Código Civil, é entendida como
aquela que tem por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore. Todavia, é evidente que
se está diante de uma benfeitoria útil, que, conforme o art. 96, § 2º, do CCB, é aquela que
aumenta ou facilita o uso do bem. Por mais que a herdeira MARLENE, pessoalmente, não
exerça o cultivo de arroz, tal como faz a arrendatária, é inquestionável que o aumento da
capacidade da barragem valorizou o imóvel rural e favorece o uso do bem, que é destinado
ao plantio há décadas – há notícia de que a Agropecuária Pilecco já arrendava o bem
enquanto a autora da herança era viva -, permitindo que o seu proprietário, se for o caso,

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arrende a área de terras no entorno da barragem com maior facilidade e por maior valor,
considerando a alta serventia para a agricultura.

Além disso, impende salientar que o caráter da posse, de boa-fé ou de má-fé,


não é mensurado pela destinação que o possuidor dá ao bem, ou ao modo que o utiliza, mas,
sim, pela existência, ou não, de vício no exercício da posse. No caso, ao que consta dos
autos, a arrendatária exercia a posse em decorrência de um contrato de arrendamento, ou
seja, com justo título.

No mais, é absolutamente descabida a pretensão da herdeira agravante, de


que a benfeitoria seja declarada perdida e incorporada apenas ao seu quinhão hereditário,
sem que o valor correspondente seja computado no monte-mor. Em outras palavras, isso
significaria privilegiar exclusivamente a agravante não só em detrimento da arrendatária,
mas também de todos os demais herdeiros, pois somente ela se beneficiaria com a benfeitoria
que, reconhecidamente, valorizou o imóvel rural, fazendo que com houvesse uma
indubitável distorção no cálculo dos quinhões hereditários. Tratar-se-ia, pois, de
enriquecimento sem causa. Por mais que a herdeira MARLENE seja herdeira necessária e
testamentária, recebendo parte da herança em virtude das disposições de última vontade da
autora da herança, para que haja o correto cálculo da legítima e da parte disponível, é
necessário que todo o monte-mor seja considerado, o que inclui a benfeitoria em questão,
acrescida ao imóvel rural.

Portanto, correta a decisão agravada ao determinar que a benfeitoria seja


considerada no monte-mor e o valor correspondente seja indenizado pelo espólio. Ao fim e
ao cabo, como bem apontado pelo Juízo de origem, haverá uma “compensação”: o valor da
benfeitoria será acrescido ao monte-mor, mas o mesmo valor será devido pelo espólio, a
título de indenização.

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A segunda inconformidade da agravante relaciona-se, de forma semelhante,


à determinação de que seja considerado o atual valor da sede do imóvel rural, que,
consoante as disposições testamentárias, deve ser destinado à herdeira MARLENE.

De acordo com a narrativa exposta pela recorrente, anteriormente, a sede do


imóvel era uma construção simples, que, à época do passamento da autora da herança, tinha
valor aproximado de R$ 90.000,00. Contudo, a arrendatária do imóvel rural teria ampliado a
construção, cujo valor atual ultrapassaria R$ 500.000,00. Na decisão ora agravada,
determinou o Juízo a quo que seja considerado o valor de avaliação atual da sede do imóvel
rural:

“(...) Igual raciocínio devemos adotar em relação à sede da


Fazenda. Dispõe o testamento que a sede deve integrar os
bens que venham a ser atribuídos a Marlene. Marlene
sustenta que em razão de alteração feita pelos
arrendatários, a sede existente quando da elaboração do
testamento não existe mais, havendo no local outra
construção. Tal fato estaria reconhecido e documentado nos
autos apensos, na avaliação feita pelo experto do Juízo. As
fotografias ali existentes provam que houve alteração
substancial do bem - houve a demolição da sede anterior e a
edificação de uma nova sede.
É a mesma situação do açude - as alterações realizadas no
imóvel rural passam a integrar o patrimônio do espólio.
Eventuais indenizações a terceiros constituem acréscimo, e
devem ser consideradas para a partilha por seu valor atual.
Com a partilha, se era a vontade do testador que a sede
fosse atribuída à Marlene, assim o será, mas o valor que
será considerado será o valor reconhecido pelo avaliador
do Juízo, compondo seu quinhão. Não há outra forma.
Ademais, possuindo valor econômico não questionado pelas
partes quando da feitura do laudo de avaliação, não há
prejuízo à sucessora que o recebe, pois não terá qualquer
decréscimo patrimonial em razão de receber um ou outro
imóvel.
A pretensão de Marlene receber a atual sede pela avaliação
da sede anterior lesa os demais sucessores, que teriam seu
quinhão proporcionalmente diminuído, e causaria
enriquecimento injustificado de Marlene. Portanto o pedido
de fl. 2713 resta indeferido.”

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A herdeira MARLENE pleiteia a reforma da decisão, no sentido de que seja


considerado no monte-mor e, consequentemente, em seu quinhão, o valor de avaliação que a
sede do imóvel rural ostentava ao tempo do passamento da autora da herança, declarando-se
a perda da benfeitoria em favor dela.

Melhor sorte não assiste à agravante quanto ao tema.

Tal como ocorre em relação à barragem, a ampliação da sede rural trata-se


de benfeitoria útil, que aumenta e valoriza o bem. Logo, é imperioso que o acréscimo
patrimonial seja ponderado no cômputo do monte-mor e, consequentemente, no quinhão da
herdeira MARLENE. Não sendo possível retornar ao status quo ante, ou seja, reestabelecer a
construção que havia no imóvel rural ao tempo do passamento da autora da herança, e sendo
inquestionável que a sede do estabelecimento rural se insere no legado deixado à herdeira
MARLENE, correta a decisão agravada ao determinar que seja considerado o valor de
avaliação atual do bem tanto no cálculo do monte-mor quanto no cálculo do quinhão que
tocará à herdeira agravante.

Assim, também vai mantida a decisão ora agravada no ponto.

Por fim, resta apreciar a insurgência da agravante quanto à delimitação do


legado estabelecido pela autora da herança em favor da herdeira MARLENE. Sobre o
tema, assim decidiu o Juízo de origem:

“(...) Ao longo do inventário houve inúmeras discussões


acerca do legado de Marlene, questões relativas a penhora
em favor de terceiros, sub-rogação, frutos, posse do legado.
Há decisões proferidas por diversas câmaras cíveis, por
vezes câmaras de direito privado, por vezes câmara de
família. Em muitas situações há decisão que reconhece um
direito baseado em determinadas premissas - por exemplo, a
de que os direitos de Marlene assegurados no testamento
constituiriam legado. Tal questão será analisada com vagar
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quando do exame da ação de sequestro, ação


002/1.15.0000475-7. Adianta-se, desde já, que este Juízo,
diante da multiplicidade de entendimentos, concessa venia,
reconhece a Marlene direitos hereditários sobre bens
singulares (sede), constituindo o legado, e direitos
hereditários sobre a universalidade, parte em razão do
testamento.
(...)
Aqui, desde já, assinalo: tomo por premissa, para decisões
futuras, que o legado de Marlene, compõe sua herança, é
constituído pelo estabelecimento rural. Quanto aos demais
bens, Marlene é igualmente herdeira, mas a título universal,
parte apenas em razão da lei, parte em razão de decisão do
de cujus quando de suas disposições de última vontade.
Para tanto, central a análise feita por Maria Berenice Dias,
adiante transcrita.”

Em suma, o Juízo de origem reconhece que caberá à herdeira MARLENE a


sede do imóvel rural, como legado, e que, sobre os demais bens, ela possui direito a título de
herdeira testamentária e também a título de herdeira necessária.

A recorrente postula a reforma da decisão agravada, asseverando que o


legado não se resume à sede do imóvel rural. Entendo que, sobre o tema, assiste razão à
agravante.

Com efeito, o herdeiro testamentário não se confunde com o legatário. É


precisa a definição de DIMAS MESSIAS DE CARVALHO (in Direito das Sucessões, 5ª ed.,
p. 315), ao conceituar o legado: “É a transmissão por testamento de um bem determinado a
uma pessoa, sendo importante destacar que o legatário recebe a título singular um ou mais
bem específicos, e não um percentual abstrato da herança, como os herdeiros”.

No mesmo sentido, vale trazer as lições de ARNALDO RIZZARDO (in


Direito das Sucessões, 7ª ed. p. 395):

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“(...)Existe a sucessão legítima, sem testamento, figurando


nela apenas herdeiros legítimos. Há, também, a sucessão
testamentária, que se subdivide em duas espécies: aquela
em que somente se instituem herdeiros, sem especificar os
bens a eles atribuídos; e a que envolve a especificação dos
bens aos mesmos. Nesta última hipótese, dá-se a sucessão
testamentária com legados. Por outras palavras, as pessoas
contempladas na sucessão testamentária ou sucedem numa
quota ideal da herança, ou em bens determinados e
específicos. No primeiro caso, tem-se um herdeiro universal,
participando do monte-mor sem a individuação dos bens
que lhe são transmitidos; já no segundo, herda-se na coisa
singular ou individuada. Coerente, então, afirmar-se que o
herdeiro comum, legítimo ou testamentário, envolve uma
noção de sucessão a título universal, enquanto o legatário
coaduna-se à sucessão a título singular.”.

Da leitura do excerto do testamento feito por ANADIR que é transcrito na


decisão agravada (fls. 67-68; fls. 2817-2818 na origem), depreende-se que a testadora
destinou à filha MARLENE, sem prejuízo da legítima que caberá a esta última, metade dos
bens imóveis, dispondo, além disso, que MARLENE deverá receber, no legado, o
estabelecimento rural, compreendido pelo Juízo de origem como a sede do imóvel rural – e,
no ponto, saliento que não houve a interposição de recurso questionando tal definição -, bem
como estipulando “que a extensão de terras que lhe couber deverão ser extraídos de frente a
fundos na propriedade rural, contornando o citado estabelecimento e em continuidade tendo
inclusa a Lagoa do Rodrigues”. Desse modo, tem-se que o legado estabelecido em
testamento em favor de MARLENE não se resume à sede do imóvel rural.

Cumpre ressalvar apenas que, quanto à percepção de frutos, nada foi


deliberado na decisão agravada, razão pela qual é descabida qualquer manifestação deste
Tribunal, sob pena de inadmissível supressão de grau de jurisdição.

Por tais fundamentos, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao agravo de


instrumento, reformando a decisão agravada apenas para delimitar que, consoante as
disposições testamentárias, o legado em favor de MARLENE é constituído pela metade
disponível dos bens imóveis e que, neste legado, deverá MARLENE receber a sede do

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imóvel rural, também devendo se observar “que a extensão de terras que lhe couber deverão
ser extraídos de frente a fundos na propriedade rural, contornando o citado estabelecimento
e em continuidade tendo inclusa a Lagoa do Rodrigues”.

DES. JOSÉ ANTÔNIO DALTOÉ CEZAR - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. RUI PORTANOVA (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. RUI PORTANOVA - Presidente - Agravo de Instrumento nº 70080185135, Comarca


de Alegrete: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau:

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