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RELATÓRIO
[...] trata-se de dinheiro entregue para captar votos, que além dos mencionados e captados
Dener Antônio da Silva, Rosenildo do Espirito Santo Bregantini e Luiz da Guia de Alcântara, pela
vultuosa quantia em dinheiro, haveria um esquema maior de captação ilícita de sufrágio. (ID
149591138, fl. 5).
A finalidade de obter votos restou demonstrada pelas circunstâncias em que os fatos foram
descortinados, especialmente: a) a ausência de uma causa jurídica válida para a entrega
realizada da quantia de R$ 89.900,00 (oitenta e nove mil e novecentos reais); b) a entrega da
quantia ter sido realizada no escritório do candidato; c) a existência de material de propaganda
eleitoral junto com a quantia; d) entrega realizada a apenas 3 (três) dias antes do pleito; e) a
necessidade dos receptores em “resolver uma situação financeira”; f) o fato do carro usado no
momento da abordagem ser da campanha eleitoral do candidato Carlos Avalone, entre outras,
que serão bem definidas no decorrer da instrução processual.
Em relação a este último fato, de que o carro usado no momento da abordagem pertencia a
campanha eleitoral de Carlos Avalone, apesar de seus ocupantes desconhecer esse fato, o que
por óbvio, pretendiam omitir da autoridade policial, o resta evidenciado com a seguinte imagem
extraída da prestação de contas do então candidato a Deputado Estadual. (ID 149591138, fls. 5-
6 – grifos acrescidos)
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quitação de despesas de campanha não declaradas, conforme confessado pelo Sr. Dener no
momento da abordagem, devidamente comprovado pelos testemunhos prestados pelos agentes
da Polícia Rodoviária Federal que participaram ativamente da abordagem e pelo vídeo inserto em
ID nº 1993022” (ID 149602838, fl. 14);
j) é aplicável, na espécie, o Enunciado Sumular nº 62 do Tribunal Superior Eleitoral,
aos argumentos de que o então representado teria se defendido do fato narrado na petição inicial
e de que teria sido comprovada a vinculação do valor de R$ 89.900,00, apreendido, com sua
campanha, de modo que foi entregue a um coordenador de campanha para fins de execução de
um engenhoso e complexo esquema de cooptação ilegal de votos ou para a quitação de
despesas de campanha não declaradas;
k) foram omitidos os recursos na sua prestação de contas e realizada movimentação
de recursos fora da conta de campanha e sem a identificação da origem, bem como extrapolado o
limite de gastos para a campanha ao cargo de deputado estadual, ao qual concorreu (ID
149602838);
l) a “gravidade da conduta ganha potencial revelo quando se observa que o
representado tomou a decisão de tramitar recursos financeiros à margem da contabilidade oficial
para não ultrapassar o limite de gastos de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) estabelecido pela
legislação de regência para o cargo de deputado estadual” (ID 149602838, fls. 25-26);
m) foi extrapolado o limite de gastos para a campanha de deputado estadual em R$
89.896,00 e omitidas despesas com pessoal;
n) foram movimentados recursos, sem o devido trânsito em conta específica e sem a
identificação de origem, “[...] dentre outros fatos que, em conjunto ou separadamente, atraem a
incidência da sanção capitulada no § 2º do artigo 30-A, da Lei das Eleições” (ID 149602838, fl.
26);
o) o valor apreendido era suficiente para contratar 94 cabos eleitorais;
p) “[...] o fato provado, contratação de cabos eleitorais, têm a efetiva potencialidade
de afetar o resultado da eleição, pois são estes, os cabos eleitorais, que arregimentam votos ao
candidato contratante” (ID 149602838, fl. 27).
Por sua vez, o então representado, em suas considerações finais (ID 149602988),
afirmou que não foram comprovadas a sua ligação com o dinheiro nem a captação ilícita de
sufrágio ou qualquer outra prática ilegal. Defendeu não ser aplicável ao caso o Enunciado
Sumular nº 62 do TSE, pois foram narrados fatos novos, diferentes daqueles que constam da
petição inicial. Aduziu que, mesmo sob a ótica do art. 30-A da Lei das Eleições, deve ser julgado
improcedente o pedido formulado na representação, pois a alegação se baseia em mera
presunção.
Afirmou que, diversamente do alegado pelo ora recorrido, demonstrou-se que o
dinheiro encontrado no veículo alocado para a campanha eleitoral pertencia a Luiz da Guia e foi
proveniente de empréstimo pessoal junto a terceiro, Armando Bueno, tendo por finalidade a
aquisição de imóvel para o próprio mutuário. Requereu fosse julgado improcedente o pedido.
O Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso, rejeitando as preliminares de nulidade
por ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário e de preclusão da indicação de
novas testemunhas e da intempestividade da juntada de mídia, entendendo não ter ocorrido
alteração da causa de pedir, julgou procedente o pedido formulado na representação para
reconhecer que o representado incidiu na prática de captação ilícita de recursos, condenando-o à
penalidade de cassação de seu mandato de deputado estadual, com fundamento no § 2º do art.
30-A da Lei nº 9.504/1997. Decretou, ademais, a perda dos valores apreendidos em favor da
União.
O acórdão ficou assim ementado (ID 149603538):
1. Segundo firme jurisprudência, o legitimado para figurar no polo passivo das representações
por captação ilícita de sufrágio (art. 41-A) e captação e gasto ilícito de recursos (art. 30-A) é
somente o candidato, não ostentando tal posição o terceiro envolvido nas práticas ilícitas.
3. Juntada de nova prova aos autos, logo após audiência de oitiva de testemunha, que se
justifica por circunstâncias ocorridas ao longo do processo, desconhecidas pelo autor ao tempo
da propositura da ação, mas antes do término da fase de instrução do feito. Ausência de
preclusão. Busca da verdade real. Aplicação das normas dos incisos VI e VIII do art. 22 da LC nº
64/90.
fizeram a abordagem do veículo e a juntada de prova, os quais foram requeridos pelo recorrido de
forma extemporânea, quando já operada a preclusão do seu direito;
O recorrente alega, ainda, ofensa aos arts. 369 do CPC e 5º, LVI, da CF, tendo em
vista que foi admitida prova manifestamente ilícita, consistente em gravação de vídeo de suposto
depoimento de um dos ocupantes do veículo abordado, feita pelo policial responsável pela
operação.
Assevera que, além de ser autoridade incompetente para realizar o ato, o agente
público da PRF ignorou os direitos e garantias do interlocutor, nos termos do art. 5º, LXIII, da CF,
e 7º, XXI, da Lei nº 8.906/1994, pois foi apresentado apenas trecho selecionado/editado do vídeo
(o trecho que lhe interessava). No ponto, afirma que (ID 149605938, fl. 21):
[...] o que se controverte, em suma, não é apenas o ato de gravação em si -- que não se diz, em
nenhum momento, ter sido clandestina, até porque o interlocutor olha diretamente para a câmara
--, e sim o fato de que se fez constar dessa gravação depoimento (editado/selecionado) de
informante/testemunha sem a adoção prévia das cautelas de estilo.
Alega ofensa aos arts. 7º, 141 e 329, I e II, do CPC e 23 da LC nº 64/1990, aos
princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como ao disposto no Enunciado nº 62 da
Súmula do TSE, tendo em vista que houve alteração da causa de pedir em âmbito de alegações
finais.
Quanto ao mérito, ressalta que o Tribunal a quo o condenou:
[...] sem a existência de qualquer prova lícita que tivesse relacionado a quantia apreendida à
campanha do Recorrente, mas baseando-se apenas em exercício de presunção e sem
demonstrar o preenchimento de todos os requisitos necessários à imposição da sanção de perda
do mandato, na forma do art. 30-A, § 2º da Lei das Eleições. (ID 149605938, fl. 67)
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Voto
O SENHOR MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (relator): Senhor
Presidente, de início, verifico a tempestividade do recurso ordinário. O acórdão recorrido foi
publicado em 27.7.2021, terça-feira (ID 149605988), e o recurso foi interposto em 29.7.2021,
quinta-feira (ID 149605938), por meio de petição subscrita por advogado constituído nos autos
digitais (IDs 149591838 e 149592988).
Dito isso, passo a analisar, individualmente, as teses recursais, de modo a permitir
melhor compreensão da controvérsia.
Consoante relatado, o recorrente defende a extinção do feito por decadência da
ação, haja vista a ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário no momento
oportuno.
Entretanto, a alegação não merece prosperar. Isso porque esta Corte Superior já
decidiu que não há obrigatoriedade de formação de litisconsórcio entre o candidato e todos
aqueles que teriam participado da captação ilícita de sufrágio e que, sendo o objeto da
representação do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, nos termos do seu § 2º, consistente, tão
somente, na negativa de outorga ou na cassação do diploma do candidato, é inexigível a
formação de litisconsórcio passivo necessário entre o candidato beneficiado e terceiro envolvido
nas práticas ilícitas. Cito precedentes do TSE nesse sentido: REspe nº 238-30/RS, rel. Min.
Henrique Neves da Silva, julgado em 3.9.2015, DJe de 22.10.2015; RO nº 47191-57/MT, rel.
designado Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 23.11.2010, DJe de 4.2.2011, e RO nº 2188-
47/ES, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgado em 17.4.2018, DJe de 18.5.2018.
Assim, no ponto, não merece reparos o acórdão recorrido.
Em suas razões, o recorrente alega, ainda, que houve ofensa aos arts. 7º, 141 e
329, I e II, do CPC e 23 da LC nº 64/1990, aos princípios do contraditório e da ampla defesa, bem
como ao disposto no Enunciado nº 62 da Súmula do TSE, tendo em vista que houve alteração da
causa de pedir em âmbito de alegações finais.
No caso, na petição inicial, o MPE, limitou-se a requerer a condenação do ora
recorrente, imputando-lhe a conduta do art. 41-A da Lei das Eleições, porque:
a) haveria entregue, no seu escritório, a Luiz da Guia Cintra de Alcântara, Rosenildo
do Espírito Santo e Dener Antonio da Silva vantagem econômica, “[...] conforme comprova a
apreensão da quantia como também os depoimentos colhidos em sede extrajudicial” (ID
149591138, fl. 5);
b) “[...] trata-se de dinheiro entregue para captar votos, que além dos mencionados e
captados Dener Antônio da Silva, Rosenildo do Espirito Santo Bregantini e Luiz da Guia de
Alcântara, pela vultuosa quantia em dinheiro, haveria um esquema maior de captação ilícita de
sufrágio” (ID 149591138, fl. 5);
c) a finalidade de obter votos ficou demonstrada pelas circunstâncias em que os
fatos foram descortinados, especialmente: (c.1) a ausência de uma causa jurídica válida para a
entrega realizada da quantia de R$ 89.900,00; (c.2) a entrega da quantia ter sido realizada no
escritório do candidato; (c.3) a existência de material de propaganda eleitoral junto com a quantia;
(c.4) entrega realizada a apenas 3 dias antes do pleito; (c.5) a necessidade dos receptores em
“resolver uma situação financeira”; (c.6) o fato do carro usado no momento da abordagem ser da
campanha eleitoral do candidato Carlos Avalone.
Por sua vez, nas alegações finais, após concluir que as provas produzidas nos autos
digitais não seriam suficientes para comprovar a compra de votos, o MPE formulou requerimento
para que o recorrente fosse condenado na pena do art. 30-A, alegando que:
a) o valor de R$ 89.900,00 em espécie, apreendido na abordagem dos agentes da
PRF, seria destinado à quitação de despesas de campanha não declaradas” (ID ID 149602838);
b) foram omitidos os recursos na sua prestação de contas e realizada movimentação
de recursos fora da conta de campanha e sem a identificação da origem, bem como extrapolado o
limite de gastos para a campanha ao cargo de deputado estadual, ao qual concorreu (ID
149602838);
c) a “gravidade da conduta ganha potencial relevo quando se observa que o
representado tomou a decisão de tramitar recursos financeiros à margem da contabilidade oficial
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para não ultrapassar o limite de gastos de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) estabelecido pela
legislação de regência para o cargo de deputado estadual” (ID 149602838, fls. 25-26);
d) foi extrapolado o limite de gastos para a campanha de deputado estadual em R$
89.896,00 e omitidas despesas com pessoal;
e) foram movimentados recursos, sem o devido trânsito em conta específica e sem a
identificação de origem, “dentre outros fatos que, em conjunto ou separadamente, atraem a
incidência da sanção capitulada no § 2º do artigo 30-A, da Lei das Eleições” (ID 149602838, fl.
26);
f) o valor apreendido era suficiente para contratar 94 cabos eleitorais; “o fato
provado, contratação de cabos eleitorais, têm a efetiva potencialidade de afetar o resultado da
eleição, pois são estes, os cabos eleitorais, que arregimentam votos ao candidato contratante”
(149602838, fl. 27).
De início, insta ressaltar que a alteração do fundamento que sustentou o pedido de
condenação do órgão acusador – em alegações finais – decorreu do conteúdo de vídeo gravado e
pelo depoimento do policial rodoviário federal em abordagem de rotina, o qual somente veio à
tona no curso da instrução processual, mais precisamente durante a oitiva dos dois policiais
rodoviários federais que participaram da abordagem no dia dos fatos.
No ponto, rememoro que a oitiva dos policiais rodoviários federais somente foi
solicitada pelo MPE após a testemunha Luiz da Guia ter colocado sob suspeição a atuação dos
agentes públicos durante a abordagem em que realizada a gravação ambiental – cujo conteúdo,
como dito, fundamentou o pedido do MPE de condenação no art. 30-A da Lei das Eleições, em
substituição ao pedido versado na inicial (fundamentada no art. 41-A da referida lei eleitoral).
Embora o ora recorrente tenha suscitado a preclusão para indicar novas
testemunhas pelo autor da representação e a intempestividade da juntada de vídeo, o acórdão
regional rejeitou tais alegações. Por pertinente, confira-se o seguinte excerto do acórdão recorrido
(ID 149603588):
[...]
A existência do vídeo não havia sido mencionada na petição inicial ou, tampouco – ao contrário
do que afirmou o Ministério Público Eleitoral ao requerer a sua juntada e repetiu o representado
–, no boletim de ocorrência feito pela Polícia Rodoviária Federal ou no registro de ocorrências
feito pela Polícia Federal. Como afirmado pela decisão agravada, a oportunidade para a juntada
do vídeo apresentou-se apenas no momento da oitiva da testemunha Etvaldo, que em seu
depoimento trouxe à tona a existência do vídeo. Não há que se falar, assim, em intempestividade
no pedido de juntada do vídeo. Aqui são aplicáveis as mesmas razões que inspiram os incisos VI
e VII do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990, os quais, como já se mostrou no exame da
preliminar anterior, possibilitam a complementação das provas dos autos no caso de surgimento
de circunstâncias ocorridas no curso da instrução, o que é justamente o que ocorreu na situação
aqui examinada.
O vídeo em questão se trata de uma curta gravação da voz e imagem de Dener Antônio da Silva
feita pelo policial rodoviário federal Fernando Koehler quando da abordagem policial. No vídeo,
Dener afirma que o valor de R$ 89.900,00 encontrado no veículo teria sido pego com o “pessoal”
do deputado Carlos Avalone e seria para “pagar cabo eleitoral” em Cáceres.
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de sufrágio, pugnou pela condenação pela prática do ilícito descrito no art. 30-A da Lei nº
9.504/1997. Por pertinente, veja-se o seguinte trecho do acórdão regional:
[...]
De fato, não restou comprovado o ilícito de captação ilícita de sufrágio. Aliás, como se mostrará
adiante, sequer houve a demonstração na petição inicial de elementos de prova mínimos para
corroborar a imputação desse ilícito. Contudo, entendo que assiste razão ao autor da ação
quanto à comprovação da hipótese prevista no art. 30-A da Lei n° 9.504/97, bem como quanto à
possibilidade de se aplicar as sanções correspondentes a essa hipótese, não obstante a
imputação inicial tenha sido feita com fundamento no art. 41-A da mesma lei, conforme
fundamentação que segue, dividida em duas partes: a primeira, tratando da comprovação da
ocorrência do ilícito do art. 30-A da Lei n° 9.504/97; e a segunda tratando da possibilidade de o
representado ser punido por esse fato. (ID 149603588 – grifos acrescidos)
[...] Segundo a regra da eventualidade, todos os meios de ataque e de defesa devem ser
apresentados de uma só vez, com a inicial ou com a contestação. Da mesma forma que a inicial
deve conter toda a matéria relativa ao pedido, assim, também na contestação deve estar toda a
matéria de defesa.
De todo modo, qualquer que seja a corrente adotada, podemos perceber que o tema da causa
de pedir revela um nexo muito próximo entre o direito material e o processo.
(TUCCI, José Rogério Cruz e Bedaque, Roberto dos Santos. Causa de Pedir e Pedido no
Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 96-97)
Esta Corte, por sua jurisprudência, já assentou que “o aporte de fatos diversos
daqueles que constam da petição inicial após a estabilização da demanda constitui ampliação
indevida da causa de pedir”. Confira-se:
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[...]
12. A juntada de novos documentos e o aporte de fatos diversos daqueles que constam da
petição inicial após a estabilização da demanda constitui ampliação indevida da causa de pedir.
Precedentes.
14. Na espécie, verifica-se que o limiar de dispêndios foi transposto, eminentemente, em função
do fato de que a normativa de regência trata a transferência de recursos de candidatos a comitês
financeiros como gastos efetivos, ainda que o volume monetário não seja amplificado por força
dessa operação.
15. Disso se apura, no limite, a ocorrência de uma impropriedade contábil sem repercussão
eleitoral; a dimensão de seus reflexos no contexto da igualdade de oportunidades é praticamente
nula e, portanto, não ameaça a legitimidade do pleito em questão.
16. Eventual desaprovação das contas de campanha não induz, por si só, a existência de abuso
punível, tendo em consideração que as decisões condenatórias em sede de AIJE exigem, nos
termos do art. 22, caput, da LC nº 64/90, a presença de circunstâncias extraordinariamente
graves à luz dos bens jurídicos tutelados.
(AgR-AgR-RO nº 5376-10/MG, rel. Min. Edson Fachin, julgado em 4.2.2020, DJe de 13.3.2020 –
grifos acrescidos)
Por ocasião desse julgamento, entendeu a Corte que, na linha do voto proferido pelo
eminente Ministro Edson Fachin, não se permite, depois do ajuizamento da demanda, a alteração
de fatos caracterizadores de ilícitos por mera conveniência probatória.
Como visto, a substituição da acusação da prática de captação ilícita de sufrágio
pela captação e gastos ilícitos de recursos na campanha eleitoral se deu em alegações finais.
Conforme o inciso X do art. 22 da LC nº 64/1990, “encerrado o prazo da dilação
probatória, as partes, inclusive o Ministério Público, poderão apresentar alegações no prazo
comum de 2 (dois) dias”.
Ou seja, a controvertida alteração objetivo da lide somente foi levada a efeito pelo
autor da representação após finda a fase de instrução e em sua última manifestação antes do
julgamento da causa.
Embora o Enunciado nº 62 da Súmula do TSE estabeleça que “[...] os limites do
pedido são demarcados pelos fatos imputados na inicial, dos quais a parte se defende, e não pela
capitulação legal atribuída pelo autor”, no caso, houve uma verdadeira alteração do ilícito
imputado ao recorrente.
A fase de instrução foi inteiramente lastreada na acusação da prática de captação
ilícita de sufrágio, porém, em decorrência da não comprovação do ilícito, o autor requereu a
condenação pela prática da conduta descrita no art. 30-A da Lei das Eleições.
Conforme entende esta Corte Superior,
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sob uma ótica garantidora do contraditório e da ampla defesa, a última manifestação prévia à
solução do mérito deve ser efetivada sem que existam questões de forma ou de fundo
pendentes.
[...]
(RO-EL nº 0601423-80/AC, rel. Min. Edson Fachin, julgado em 22.9.2020, DJe de 4.12.2020)
O cenário exposto revela, a meu sentir, uma subversão do devido processo legal,
uma vez que o recorrente logrou êxito em afastar as alegações constantes da inicial, tendo
lastreado o seu contraditório e a sua ampla defesa no afastamento do ilícito previsto no art. 41-A
da Lei das Eleições. Contudo, foi condenado como incurso no art. 30-A da referida lei eleitoral.
Penso que a linha argumentativa do autor em alegações finais implicou a alteração
objetiva da lide, sendo inegável a relevância da modificação, tendo em vista a condenação sofrida
pelo recorrente, fundamentada em ilícito eleitoral diverso daquele que inicialmente lhe foi
imputado.
Não fosse a alteração do ilícito, não haveria condenação alguma na presente
representação, notadamente porque tanto o autor quanto a Corte regional se manifestaram no
sentido de que não houve comprovação da prática da captação ilícita de sufrágio.
Nesse contexto, tendo a condenação decorrido de imputação que não foi sequer
mencionada na exordial, fica patente a violação ao princípio da adstrição. Nesse sentido, confira-
se o seguinte precedente desta Corte Superior:
[...]
6. A ampliação dos poderes instrutórios do juiz pelo art. 23 da LC nº 64/90 e pelo CPC/2015 deve
ocorrer nos limites predefinidos como pedido e causa de pedir pelo autor da ação, porquanto
cabe às partes descrever os elementos essenciais à instrução do feito, e não ao magistrado, que
não é autor da ação.
7. "Uma das garantias processuais mais relevantes, integrante do justo processo jurídico, é
aquela que diz respeito à ciência, pela pessoa acionada, de todos os fatos e argumentos
alegados contra si pela parte promovente. Por isso se diz que a petição inicial define os polos da
demanda e delimita o seu objeto, em face do qual se desenvolve a resposta à lide e se instala a
atividade probatória. A instrução visa ao convencimento do Julgador, quanto à materialidade e à
autoria dos atos postos na imputação (inicial da ação sancionadora), sendo a sua produção o
núcleo ou o centro da solução da questão. Não se pode aceitar (nem se deve aceitar) decisão
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judicial condenatória sem prova concludente dos fatos imputados e da sua autoria". (AIJE nº
1943–58, Redator para o acórdão Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 12/9/2018)
[...]
(AIJE nº 0601575-58/DF, rel. Min. Jorge Mussi, julgada em 11.12.2018, DJe de 28.3.2019)
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