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IDEIAS, IDEOLOGIAS E INSTITUIÇÕES

Toda mudança começa no mundo das idéias. Quando as idéias mudam, formam-
se novas ideologias e estas são materializadas nas instituições.

Muda-se o paradigma, muda-se também a concepção e a proposta de educação:

Por ocasião do tratado de Lancaster, na Pensilvânia, no ano de 1744, entre o


governo da Virgínia e as seis nações indígenas, os representantes da Virgínia
informaram aos Índios que em Williamsburg havia um colégio dotado de fundos para a
educação de jovens índios e que, se os chefes das seis nações quisessem enviar meia
dúzia de seus meninos, o governo se responsabilizaria para que eles fossem bem
tratados e aprendessem todos os conhecimentos do homem branco.

O representante dos índios respondeu:

“Apreciamos enormemente o tipo de educação que é dada nesses colégios e nos


damos conta de que o cuidado de nossos jovens, durante sua permanência entre vocês,
será custoso. Estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e
agradecemos de todo o coração.
Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções
diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a
vossa idéia de educação não é a mesma que a nossa.
Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e
aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando voltaram para nós, eles eram maus
corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportar o frio e a fome. Não
sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e construir uma cabana, e falavam a nossa
língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros,
como caçadores ou como conselheiros.
Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos
aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores da Virgínia que
nos enviem alguns de seus jovens que lhes ensinaremos tudo que sabemos e faremos
deles homens”. Esta resposta foi extraída de um texto escrito por Benjamin Franklin.

De acordo com George Kneller, a educação pode ser considerada em dois


sentidos: um lato, o outro técnico. Em sua acepção lata, a educação diz respeito a
qualquer ato ou experiência que tenha um efeito formativo sobre a mente, o caráter ou a
capacidade física de um indivíduo. Neste sentido a educação nunca termina. Todas as
espécies de experiências podem ser educativas.
Na sua acepção técnica, a educação é o processo pelo qual a sociedade, por
intermédio de escolas, ginásios, colégios, universidades e outras instituições,
deliberadamente transmite sua herança cultural de uma geração para outra.
Devemos distinguir educação como um produto e um processo. Como um
produto, a educação é o que recebemos através da instrução ou aprendizagem. Como
processo, a educação é o ato de educar alguém ou de nos educarmos.
Ao longo da história é possível encontrar diferentes definições de educação.
Herman Horne(1927, 285), um idealista, escreve: “A educação é o processo externo de
adaptação superior do ser humano, física e mentalmente desenvolvido, livre e
consciente, a Deus, tal como se manifestou no meio intelectual, emocional e volitivo do
homem”.
John Dewey(1911, 400), um pragmático, declara: “A educação pode ser definida
como um processo de contínua reconstrução da experiência, com o propósito de ampliar
e aprofundar o seu conteúdo social, enquanto, ao mesmo tempo, o indivíduo ganha o
controle dos métodos envolvidos”.
Segundo o Papa Pio XI (1930): “A educação consiste, essencialmente, em
preparar o homem para o que deve ser e para o que deve fazer aqui na Terra. A fim de
atingir o fim sublime para o qual foi criado. O assunto da educação é o homem global e
inteiro, alma unida ao corpo em unidade da natureza, com todas as suas faculdades
naturais e sobrenaturais, tal como a razão justa e a revelação lhe mostraram que fosse”.
Assim, diferentes filosofias oferecem diferentes definições de educação, estas
novas definições formam e propõem diferentes modelos educacionais. Diferentes
paradigmas oferecem diferentes filosofias e diferentes filosofias formam diferentes
paradigmas. É um ciclo interminável. Desastroso às vezes. Afinal, o simples fato de
chamar de educação não quer dizer que seja realmente.
Ainda segundo Kneller, os próprios filósofos discordam quanto ao número de
escolas filosóficas existentes e no que consistem. Mas, uma coisa é certa, existem
algumas que influenciaram decisivamente a educação. É possível apontar cinco:
idealismo, realismo, pragmatismo, existencialismo e a filosofia analítica. Todas estas
expressões representam classificações amplas, abrangendo cada uma delas uma
variedade de atitudes filosóficas.

IDEALISMO

O idealista acredita que a realidade seja mais espiritual e menos física. Para ele,
o homem é um ser espiritual que exerce o livre arbítrio e é responsável por suas ações.
Sua principal finalidade na vida é dar expressão à sua própria natureza. Neste caso, o
propósito da educação é ajudá-lo nessa tarefa. O homem é, portanto, um ser espiritual
com um destino a cumprir.

Em relação à epistemologia idealista, diferentes filósofos propuseram diferentes


teorias do conhecimento. Os idealistas rejeitam a pretensão de que os métodos
científicos constituem o único caminho para a verdade. Sustentam que na vida pessoal,
especialmente, o pensamento intuitivo é tão importante quanto o científico.

Quanto aos valores, o idealismo acredita que eles são absolutos e imutáveis.
Assim, a orientação educacional deve fundar-se em princípios duradouros que vão
colocar o homem em harmonia com o todo espiritual a que ele pertence. Neste contexto,
o mal é definido como a desorganização e carência de um sistema, o mal é um bem
incompleto. Talvez isso explique a crença comum entre os maiores idealistas: a vida boa
só é viável numa sociedade altamente organizada.

George F. Kneller (1964, 56), afirma:

Se deixamos o idealismo sem crítica, não quer isso dizer que o


idealismo seja a filosofia perfeita a ser defendida e mantida por um
professor. Mas uma crítica adequada do idealismo nos levaria para
muito longe dos nossos propósitos atuais. Será melhor ler os
argumentos das filosofias concorrentes que estabelecem suas próprias
posições, em parte, refutando as das suas rivais. O realismo filosófico
é um desses rivais. Trata-se de outro sistema absoluto, mas que se
baseia numa teoria de realidade inteiramente diversa da do idealismo.
Estudando o realismo estaremos, de fato, lendo um ataque implícito
e, por vezes, explícito, ao idealismo, como filosofia alternativa
daquele.

REALISMO

A base do realismo é a crença na realidade da matéria. O universo, para o


realista, não é uma ilusão, mas, pelo contrário, é algo que realmente e concretamente
existe. Para ele todas as coisas existem em si mesmas, independentes do espírito
humano. Embora os realistas concordem sobre a realidade da matéria, discordam em
muitos outros aspectos e se dividem em muitas escolas diferentes. Muitos realistas
chegam ao absurdo de negarem a existência do espírito. Isso aponta para a dificuldade
de se observar e compreender os paradigmas que vão se formando a partir destas
tendências filosóficas.

Partindo da base comum dos realistas, pode-se afirmar que o universo existe
independentemente do homem e é governado por leis sobre as quais a pessoa humana
exerce um reduzido controle. Neste caso, é preciso saber algumas coisas definidas sobre
o universo para que o ser humano possa se adaptar a ele. Esta é a principal missão da
educação.

Nesta proposta, a finalidade da educação é tornar a pessoa tolerante, bem


ajustada, mental e fisicamente, para que possa experimentar sempre uma harmonia com
o seu meio físico e cultural.

Tal harmonia só é possível, de acordo com o realismo, se o indivíduo estiver de


posse de idéias verdadeiras. E estas, só são verdadeiras, se corresponderem àqueles
aspectos do mundo que pretende descrever. Uma ideia sobre o mundo não pode ser
simplesmente verdadeira pelo fato de ajustar-se ou de ser coerente com outras ideias já
existentes. Para interpretar o mundo validamente, uma ideia deve corresponder-lhe.

Por isso, é da responsabilidade do educando dominar aqueles elementos do


conhecimento que resistiram à prova do tempo. Antes de decidir o que fazer a respeito
do mundo, ele deve aprender o que o mundo realmente é. E os valores para o realista?

Embora todos eles concordem que os valores são permanentes e objetivos, eles
divergem em suas razões para assim pensarem. Os realistas acreditam que qualquer
sistema educacional deve ser engrenado para certos valores bem definidos. Como os
valores não variam em si próprios, tampouco variam os verdadeiros fins da educação.

PRAGMATISMO

Outra escola filosófica que interferiu decisivamente na educação foi o


pragmatismo. Em medida muito maior que o idealismo e o realismo, o pragmatismo foi
influenciado pelos acontecimentos contemporâneos.

Os principais temas dessa filosofia são: a realidade da transformação sobre a


permanência; a relatividade dos valores; a natureza social e biológica do homem; a
importância da democracia como modo de vida; o valor da Inteligência crítica em toda a
conduta humana.

Os pragmáticos estão de acordo com os realistas quando afirmam que o mundo


material existe concretamente e não é uma projeção da mente. Contudo, sustentam que
o mundo não é permanente e nem independente do homem. Sendo a transformação a
essência da realidade.

Para o pragmático, o mundo só é significativo na medida em que o homem seja


capaz de imprimir nele o seu significado. O que o homem não pode experimentar não
pode ter realidade para ele. Esta é uma proposta humanista que subscreve a velha
máxima sofista: “o homem é a medida de todas as coisas”.

O pragmático acredita que a realização própria constitui o fim supremo de todos


os homens. A sociedade encarrega-se de que esta meta seja alcançada através da
educação.

EXISTENCIALISMO

O existencialismo concentra-se na pessoa. Embora ele não tenha proposto um


programa educacional específico como as outras escolas mencionadas, a crítica por ele
desencadeada contra a filosofia tradicional é tão contundente e, por implicação, tão
significativa para a educação que não se pode ignorá-la. Além disso, é uma proposta que
vem crescendo de importância entre os filósofos da educação.
Esta escola filosófica é difícil de definir e ninguém quer admitir que seja
existencialista. Não obstante, há certos elementos mais ou menos comuns à concepção
existencialista.

Para o existencialista, a filosofia não deve ocupar-se, objetivamente, das


questões filosóficas tradicionais; deve, antes, converter-se num encontro apaixonado
com os perenes problemas da vida e, em particular, com a inevitabilidade da morte, a
agonia e a alegria do amor, a realidade da escolha, a experiência da liberdade e a
futilidade ou esterilidade das relações pessoais. Neste caso, o filosofar deve principiar
na apaixonada consciência individual da angustiosa situação humana, que é a finitude e
contingência da existência do homem.

No existencialismo a existência precede a essência. O universo, em si mesmo, é


desprovido de significado. O homem não faz parte de qualquer sistema universal e
possui uma liberdade absoluta. Sendo o homem livre, faz-se a si mesmo.

A intransigente afirmação de liberdade autêntica e de unicidade individual é a


mensagem estimulante do existencialismo para a hodierna filosofia da educação.

FILOSOFIA ANALÍTICA

A filosofia analítica interessa-se pela classificação e verificação da linguagem


corrente e científica. Ao contrário do existencialismo, procura remover o pessoal e o
subjetivo da pesquisa; torna a verdade dependente do significado; afirma que jamais o
homem vai chegar a compreender o significado real de qualquer coisa se não a sujeitar
ao teste da ciência e da lógica.

As raízes desta proposta podem ser localizadas no materialismo dos pré-


socráticos. Sua influência é notada no empirismo britânico e no positivismo de Comte.

Atualmente, existem dois ramos principais da análise filosófica. O primeiro,


agora designado como empirismo lógico, pretende desenvolver uma linguagem lógico-
simbólica que seja mais precisa que as linguagens correntes. O segundo ramo é o da
análise lingüística, que procura desenvolver métodos para esclarecer as expressões e
termos do discurso corrente. E porque estes aspectos interessam à educação?
Estes dois ramos da análise afetam a educação de muitas maneiras. Por um lado,
pela influência que exercem na Sociologia e na Psicologia e, mais recentemente, na
aprendizagem planejada e na medição educacional, os empiristas lógicos tendem a
apoiar aqueles educadores que advogam uma teoria científica da educação, cujos
princípios e conclusões seriam estabelecidos e comprovados por métodos lógicos e
empíricos. Os analistas lingüísticos, por outro lado, sublinham a necessidade de
reavaliar a linguagem especial usada no discurso educacional.

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