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Superior Tribunal de Justiça

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.579.289 - RN (2016/0025416-0)

RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK


AGRAVANTE : FRANCISCO DE ASSIS SOUSA
ADVOGADO : BRENO YASSER PACHECO PEREIRA DE PAULA E
OUTRO(S) - RN007835
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO


ESPECIAL. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
GESTÃO TEMERÁRIA. ART. 4º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N.
7.492/86. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, I, DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL – CPP. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DO CÓDIGO
PENAL – CP. DOLO INTENSO. JUSTIFICATIVA IDÔNEA. NÃO
INERENTE AO TIPO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO.
1. A desvaloração de circunstância judicial que acarreta
exasperação da pena-base deve estar fundada em elementos
concretos, não inerentes ao tipo penal.
1.1. Para o crime de gestão temerária, o desrespeito a
regras da instituição financeira é inerente ao tipo penal. Precedente.
1.2. In casu, o desvalor da culpabilidade pelo dolo intenso
foi justificado nas circunstâncias fáticas e pessoais que determinaram
o crime, tendo o Tribunal de origem destacado a quantidade de
operações indevidas e a concessão de empréstimos indevidos a
parentes.
2. Agravo regimental desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima


indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental.
Os Srs. Ministros Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da
Fonseca e Ribeiro Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 05 de junho de 2018(Data do Julgamento)

MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK


Relator

Documento: 1718286 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 13/06/2018 Página 1 de 8
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AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.579.289 - RN (2016/0025416-0)

RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK


AGRAVANTE : FRANCISCO DE ASSIS SOUSA
ADVOGADO : BRENO YASSER PACHECO PEREIRA DE PAULA E
OUTRO(S) - RN007835
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK:


Trata-se de agravo regimental contra decisão de folhas 335/341 que,
com fundamento na Súmula 568/STJ, negou provimento ao recurso especial.
O agravante sustenta que houve violação ao art. 59 do Código Penal –
CP porque os danos foram inexpressivos para a Caixa Econômica Federal – CEF,
conforme ofício expedido pelo Banco que constou da sentença. Aduz que a
sentença foi alterada em sede de embargos declaratórios para considerar o dolo
intenso, sem fundamentação concreta. Entende que a fundamentação apresentada
pelo Tribunal de origem para ratificar o dolo intenso não pode prevalecer, pois não
houve danos expressivos e as circunstâncias fáticas e pessoais não foram
consideradas na sentença. Entende que a quantidade de empréstimos arriscados e
a concessão de empréstimos a parentes são inerentes ao tipo penal.
Requereu o provimento do agravo com provimento do recurso
especial.
É o relatório.

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AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.579.289 - RN (2016/0025416-0)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK (Relator):


Em que pesem os argumentos veiculados, não há como modificar a
decisão ora agravada em favor da tese dos agravantes.
De início, destaco que o recurso especial foi interposto contra acórdão
proferido em julgamento de revisão criminal, na forma do art. 621, I, do Código de
Processo Penal – CPP, apontando violação ao art. 59 do Código Penal – CP pelo
não reconhecimento de fundamentação inidônea para exasperação da pena-base
na sentença. Pois bem, conforme precedente, admite-se a revisão criminal para
avaliar sentença contrária ao art. 59 do CP. Cito precedente:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
REVISÃO CRIMINAL. DOSIMETRIA. VALORAÇÃO NEGATIVA DOS
ANTECEDENTES FUNDADA EM CONDENAÇÃO POR FATO
POSTERIOR. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DO CP. POSSIBILIDADE DE
ALTERAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA. AGRAVO
IMPROVIDO.
1. Considerando que o aumento da pena-base, pela
consideração negativa dos antecedentes fundado em condenação por
fato posterior, constitui violação ao art. 59 do CP, uma vez que só
podem ser sopesados na sanção inicial fatos cometidos anteriormente
ao ilícito em análise, devida a alteração da dosimetria em sede de
revisão criminal com fundamento no art. 621, I, do CPP. Precedente.
2. Decisão monocrática mantida por seus próprios
fundamentos.
3. Agravo regimental improvido (AgRg no REsp
1533649/SC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe
23/10/2017).

Ainda, a exasperação da pena-base justificada no dolo intenso sem


apontamento de elementos concretos a evidenciá-lo, é inidônea. Cito precedente:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. PENAL. HOMICÍDIO SIMPLES. DOSIMETRIA.
PENA-BASE EXASPERADA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS
DESFAVORÁVEIS. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.
CULPABILIDADE. MOTIVOS, CIRCUNSTÂNCIAS E
CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. AGRAVO DESPROVIDO
1. A desvaloração de circunstância judicial que acarreta
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exasperação da pena-base deve estar fundada em elementos
concretos, não inerentes ao tipo penal.
2. A culpabilidade não pode ser desvalorada mediante
fundamentação vaga, tal como dolo intenso ou elevado grau.
[...]
6. Agravo regimental desprovido (AgRg no AREsp
721.441/PA, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA,
DJe 14/10/2016).

Na sentença, constou que a pena-base foi exasperada em razão do


dolo intenso, decorrente das circunstâncias fáticas e pessoais que determinaram o
crime, cito o trecho:
A) FRANCISCO DE ASSIS E SOUSA:
CONSIDERANDO que a culpabilidade do acusado, em
face das circunstâncias fáticas e pessoais que determinaram o crime,
revela dolo intenso; [...] (fl. 47)

No julgamento da ação revisional, o Tribunal de origem extraiu da


sentença as circunstâncias fáticas e pessoais que configuraram o dolo intenso,
quais sejam, a quantidade de operações indevidas e a concessão de empréstimos
indevidos a parentes. Cito o trecho do voto de mérito vencedor:

Sustenta o Revisionado que o único requisito do art. 59,


do CP, a ele desfavorável foi a culpabilidade, considerada como de
dolo intenso, porém, sem indicar qualquer elemento nos autos que
ateste a suposta intensidade do dolo de sua conduta, 'que seria o
normal à espécie, ressaltando que, havendo gestão temerária,
configura-se apenas atuação irresponsável e arriscada do agente, em
uma atuação marcada pela imprudência, e não o dolo de causar dano,
como ocorre na gestão fraudulenta.
O delito de gestão temerária pressupõe a ocorrência de
dolo eventual, ou seja, que o agente, agindo ao arrepio das cautelas
exigidas, assuma o risco da produção do resultado.
Como se depreende da leitura da sentença, em sua
fundamentação, o dolo foi considerado elevado por dois motivos:
a) pela quantidade das operações indevidas de
concessão de empréstimos e renegociações a clientes insolventes,
aumentando-se continuamente a dívida a ser paga por eles, causou
real e excessivo prejuízo à instituição financeira, que teve que arcar
com os custos da insolvência dos clientes.
b) pelo fato de o Revisionado, utilizando de sua situação
privilegiada na gerência da CAIXA, ter, concedido empréstimos
indevidos a seus familiares, em detrimento das normas da instituição
bancária, demonstrando a existência de uma liberalidade em benefício
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dos seus parentes, em flagrante prejuízo à entidade.
Com relação ao pedido de redução da pena, o Acórdão
salientou que "as circunstâncias judiciais dispostas no art. 59 do
Código Penal, a bem de sua individualização, foram corretamente
observadas pelo Juízo a quo, que, apesar de reconhecer a
primariedade e os bons antecedentes deles, ponderou acerca da
intensidade do dolo na conduta dos acusados e ao grau de
censurabilidade de suas atitudes, concluindo, irretocavelmente, pela
estipulação da pena-base em dois anos e três meses de reclusão
(pouca acima do mínimo legal)".
Em face da reprovação social mais intensa de sua
conduta, não ha equívocos na sentença ou no acórdão rescindendo ao
considerar o dolo como desfavorável ao Revisionado, sendo correto o
aumento da pena em 03 (três) meses acima do mínimo legal de 02
(dois) anos, devido à presença de um requisito desfavorável (o dolo)
entre os 08 (oito) previstos no art. 59, do CP (fls. 107/108).

Logo, não houve sentença condenatória contrária ao texto expresso de


lei penal, pois a exasperação da pena-base, na forma do art. 59 do CP, está
justificada de forma idônea, na quantidade de atos temerários praticados e no
benefício aos parentes. Ainda, a referida justificativa não é inerente ao tipo penal,
pois o que não se admite para o delito de gestão temerária é a exasperação da
pena-base em razão de desrespeito a regras da instituição financeira. Cito
precedente:

PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE


RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. CRIMES
CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. GESTÃO
TEMERÁRIA. DOSIMETRIA DA PENA. PLEITO DE REDUÇÃO DA
PENA-BASE. CULPABILIDADE. ADMINISTRADOR COM EXTENSA
EXPERIÊNCIA NO SETOR FINANCEIRO E NA GESTÃO PÚBLICA.
ELEMENTOS QUE DESBORDAM AO SUJEITO ATIVO NORMAL DO
TIPO. JUSTIFICAÇÃO IDÔNEA. DESCASO AO PATRIMÔNIO DA
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, COM RISCO, INCLUSIVE, DE
"QUEBRA" DO BANCO. AGRAVAMENTO VÁLIDO.
CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. INOBSERVÂNCIA ÀS NORMAS DE
CONCESSÃO DE CRÉDITO. CONDUTA INERENTE AO DELITO.
FUNDAMENTO INVÁLIDO. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME.
PREJUÍZO EXPRESSIVO. DELITO QUE SEQUER EXIGE
RESULTADO NATURALÍSTICO PARA A CONSUMAÇÃO.
MOTIVAÇÃO LEGÍTIMA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
[...]
4. O agir contrário a normas que regulamentam as
concessões de crédito é elemento ínsito do crime de gestão temerária,
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não se prestando tal conduta a fundamentar a exasperação da
pena-base pelas circunstâncias do crime.
[...]
6. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a
ordem de ofício para reduzir as penas do paciente a 4 anos e 3 meses
de reclusão, em regime semiaberto, e 135 dias-multa (HC 317.330/SP,
Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 03/02/2017).

Por fim, dois aspectos constantes do voto vencedor do acórdão


proferido pelo Tribunal de origem não afastam a idoneidade da exasperação da
pena-base. A afirmativa de que o delito de gestão temerária pressupõe a ocorrência
de dolo eventual não encontra respaldo em precedentes desta Corte, motivo pelo
qual a incompatibilidade com o dolo intenso mencionada pelo recorrente fica
afastada. Cito:
PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL.
CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
CONDENAÇÃO EMBASADA EM PROCESSOS ADMINISTRATIVOS
SANCIONADORES DA ANTIGA BOVESPA E DO BANCO CENTRAL.
CONTRADITÓRIO DIFERIDO. COTEJO COM PROVAS
PRODUZIDAS EM JUÍZO. VIABILIDADE. GESTÃO TEMERÁRIA.
CRIME DOLOSO. TEMERIDADE COMO ELEMENTO VALORATIVO
GLOBAL DO FATO. DOLO COMO CONSCIÊNCIA E VONTADE DE
VIOLAÇÃO DAS REGRAS REGENTES DA ATIVIDADE FINANCEIRA.
DOSIMETRIA. PENA-BASE. CULPABILIDADE. VALORAÇÕES
NEGATIVAS COM BASE EM ELEMENTARES DO TIPO. RECURSO
ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
[...]
4. O crime de gestão temerária (Lei nº 7.492/1986, art. 4º,
p. ún.) somente admite a forma dolosa. Precedentes.
5. A temeridade da gestão é elemento valorativo global
do fato (Roxin) e, como tal, sua valoração é de competência exclusiva
da ordem jurídica e não do agente. Para a caracterização do elemento
subjetivo do delito não é necessária a vontade de atuar
temerariamente; o que se exige é que o agente, conhecendo as
circunstâncias de seu agir, transgrida voluntariamente as normas
regentes da sua condição de administrador da instituição financeira.
[...]
9. Recurso especial parcialmente provido (REsp
1613260/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA,
SEXTA TURMA, DJe 24/08/2016).

Ainda, sobre ter constado do acórdão recorrido que houve excessivo


prejuízo da instituição financeira, tal fato também se mostra indiferente, pois não foi
o que constou da sentença, logo também não foi considerado para afastar a
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violação ao art. 59 do CP.
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo
regimental.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA

AgRg no
Número Registro: 2016/0025416-0 REsp 1.579.289 / RN
MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 00008549020154050000 200484000090781 8549020154050000


EM MESA JULGADO: 05/06/2018

Relator
Exmo. Sr. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO AUGUSTO BRANDÃO DE ARAS
Secretário
Me. MARCELO PEREIRA CRUVINEL
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : FRANCISCO DE ASSIS SOUSA
ADVOGADO : CAIO GRACO PEREIRA DE PAULA E OUTRO(S) - RN001244
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ASSUNTO: DIREITO PENAL

AGRAVO REGIMENTAL
AGRAVANTE : FRANCISCO DE ASSIS SOUSA
ADVOGADO : BRENO YASSER PACHECO PEREIRA DE PAULA E OUTRO(S) - RN007835
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental."
Os Srs. Ministros Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro
Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator.

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