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Tratamento do transtorno de ansiedade generalizada

Lucas Gandarela
Thiago Pacheco de Almeida Sampaio
Fábio Moraes Corregiari
Márcio Antonini Bernik

Sumário
Introdução
Tratamento farmacológico
Visão geral
Principais medicamentos utilizados no tratamento do TAG
Tratamentos medicamentosos combinados
Comparação e combinação entre psicoterapia e farmacoterapia
Tratamento sequencial do paciente com TAG
Tratamento psicoterápico do TAG
Considerações finais
Vinheta clínica
Para aprofundamento
Referências bibliográficas

INTRODUÇÃO
O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) é uma condição comum, crônica e debilitante. Estima­se
que 3,7% das pessoas apresentem esse diagnóstico ao longo da vida e 1,8% no último ano1.
O TAG tem como principal característica a preocupação excessiva, generalizada e de difícil controle em
um período mínimo de 6 meses, associada a outros sintomas ansiosos como tensão muscular, insônia e
dificuldade de concentração. Por suas semelhanças com a ansiedade normal, o prejuízo e o sofrimento
relacionados a esse transtorno costumam ser subestimados. Sabe­se hoje que indivíduos com TAG
apresentam um prejuízo funcional semelhante àquele de portadores de doenças médico­sistêmicas crônicas2.
O TAG é muitas vezes subdiagnotiscado e subtratado. Wittchen et al.3mostraram que 44% dos pacientes
com TAG, sem comorbidade com depressão, não receberam nenhum tipo de intervenção para essa condição
em serviços de atenção primária de saúde.

Pontos­chave
O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) é um transtorno prevalente, crônico e incapacitante que tem
opções seguras e eficazes de tratamento.
Os tratamentos farmacológico e psicoterápico são opções igualmente eficazes.
Os antidepressivos das classes inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) e inibidores de recaptação
de serotonina e noradrenalina (IRSN) são os tratamentos farmacológicos de primeira escolha. Outras opções
como a pregabalina e a agomelatina também possuem boas evidências.
Recomenda­se que o tratamento medicamentoso seja mantido por pelo menos 6 meses após a fase aguda,
podendo ser prolongado de acordo com a particularidade de cada paciente.
A terapia cognitivo­comportamental e o relaxamento aplicado são as intervenções psicológicas com maior
evidência de eficácia.

Alguns indivíduos com sintomas ansiosos de intensidade leve e por curta duração associados a eventos
estressantes podem apresentar melhora sem nenhuma intervenção. No entanto, a maioria dos indivíduos que
preenchem critérios para os transtornos de ansiedade tende a apresentar sintomas de forma persistente e
incapacitante. A necessidade de tratamento é determinada pela intensidade e duração dos sintomas, o impacto
nas atividades cotidianas e a presença de sintomas depressivos e outras comorbidades4.
As principais formas de tratamento para o TAG são o medicamentoso, a psicoterapia ou a combinação de
ambos. Deve­se escolher a modalidade de tratamento de acordo com a preferência do paciente, os efeitos
adversos das medicações, a história de resposta ao tratamento, a latência do efeito do tratamento, a gravidade
do quadro clínico, a presença de comorbidades e a disponibilidade da intervenção proposta5.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

Visão geral

Desde o reconhecimento da categoria diagnóstica do TAG, diversos fármacos foram testados em ensaios
clínicos controlados com uma taxa de resposta que varia entre 44 e 81%5.
No entanto, uma análise no Reino Unido revelou que 46% dos pacientes com TAG descontinuavam o
medicamento prescrito após uma média de 3,7 meses6, sendo a intolerância aos seus efeitos colaterais uma
das possíveis razões.
É importante lembrar que o paciente com TAG tende a preocupar­se e sentir­se apreensivo com possíveis
riscos, podendo apresentar dúvidas sobre o tratamento e seus possíveis efeitos adversos. Assumir uma
postura empática e colocar­se à disposição para responder dúvidas e explicar os efeitos colaterais mais
comuns dos medicamentos, principalmente no início do tratamento, pode reduzir essa apreensão.
As características gerais dos fármacos com maior nível de evidência para o tratamento do TAG estão
resumidas na Tabela 1.

Tabela 1 Características gerais dos medicamentos para o tratamento do transtorno de ansiedade generalizada

Dosagens
Medicamento Vantagens Desvantagens
(mg/dia)

ISRS Perfil seguro Latência de 2 semanas para efeito


Paroxetina 20­50 Boa Efeitos adversos, como disfunção
Sertralina 50­200 tolerabilidade sexual, insônia, aumento transitório
Escitalopram 10­20 Não geram da ansiedade, sintomas
dependência gastrintestinais
Indicado para
comorbidades
depressivas e
ansiosas
Dosagens
Medicamento Vantagens Desvantagens
(mg/dia)

IRSN Perfil seguro Latência de 2 semanas para efeito


Venlafaxina 75­225 Boa Efeitos adversos, como disfunção
Duloxetina 60­120 tolerabilidade sexual, insônia, efeitos
Não geram gastrintestinais, aumento transitório
dependência da ansiedade, aumento da pressão
Indicado para arterial
comorbidades
depressivas e
ansiosas
Agomelatina 25­50 Boa Menos evidência do que os inibidores
tolerabilidade seletivos
Atua na Risco de alteração de enzimas
insônia hepáticas
Não gera Não tem indicação para outros
dependência transtornos ansiosos
Menor efeito
adverso
sexual
Pregabalina 200­600 Boa Efeitos adversos, como sonolência,
tolerabilidade tontura, ganho de peso
Atua na Não tem indicação para transtornos
insônia e em depressivos
sintomas Dosagem fracionada ao longo do dia
dolorosos
Início de ação
em 1 semana
Imipramina 25­200 Age também Perfil de efeitos colaterais mais
nos sintomas intolerável: boca seca, sedação,
depressivos obstipação, tontura, visão turva,
Não gera ganho de peso
dependência Risco de superdosagem
Latência de 2 semanas para início de
efeito
Ausência de estudos de longo prazo
Benzodiazepínicos Alívio rápido Risco de sintomas de retirada de
Alprazolam 1­6 dos sintomas difícil manejo, ansiedade rebote e
Diazepam 5­40 ansiosos dependência física com seu uso
Lorazepam 2­8 crônico
Não é indicado para transtornos
depressivos
Dosagem fracionada ao longo do dia
Quetiapina XR 50­300 Início da ação Risco de efeitos metabólicos de longo
em 1 semana prazo como síndrome metabólica e
Não gera diabetes
dependência
Buspirona 15­60 Não gera Menor efetividade na clínica
dependência Não é indicado para outros
transtornos ansiosos ou depressão
Dosagem fracionada ao longo do dia
Latência de 2 semanas para início de
efeito
Sem estudos de longo prazo
Hidroxizina 37,5­50 Não gera Evidência menos robusta que outros
dependência agentes
Rápido início Relatos imprecisos sobre
de efeito tolerabilidade
Ausência de estudos de longo prazo
Dosagens
Medicamento Vantagens Desvantagens
(mg/dia)

Outros
medicamentos 50­400 Menor efeito Pouca evidência ou resultados
Trazodona 5­10 adverso inconsistentes
Vortioxetina sexual Latência para início de efeito
Não geram
dependência
IRSN: inibidor de recaptação de serotonina e noradrenalina; ISRS: inibidor seletivo de recaptação de serotonina.

Principais medicamentos utilizados no tratamento do TAG

Antidepressivos
Os antidepressivos da classe dos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) e dos inibidores
de recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSN) são tratamentos de primeira escolha para o TAG em
diferentes diretrizes de recomendação clínica4,7­9.
Além da eficácia demonstrada em diversos ensaios clínicos controlados, os ISRS e os IRSN costumam
ser seguros e bem tolerados. Outra vantagem dessas classes de medicamentos é sua indicação para o
tratamento da depressão, uma vez que aproximadamente 67% dos indivíduos com TAG apresentam um
episódio depressivo ao longo da vida10 e, frequentemente, os sintomas depressivos já estão presentes quando
o paciente busca tratamento.
Apesar da boa tolerabilidade, orientar o paciente quanto aos efeitos colaterais mais comuns dos
antidepressivos (como sintomas gastrintestinais, insônia, disfunção sexual, aumento transitório da ansiedade,
cefaleia), assim como o tempo de latência comum de 2 a 4 semanas para início da resposta clínica pode
auxiliar na adesão ao tratamento.

Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS)


Diversos ensaios clínicos placebo­controlados demonstraram a eficácia e a tolerabilidade da paroxetina,
da sertralina e do escitalopram no tratamento da fase aguda (entre 8 e 12 semanas) do TAG7.
Não foram encontrados ensaios clínicos randomizados placebo­controlados com citalopram ou fluoxetina
específicos para tratamento de pacientes com TAG. No entanto, dada a semelhança de mecanismo de ação
com outros ISRS, também costumam ser considerados tratamento de primeira escolha.

Inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSN)


Com evidência favorável em ensaios clínicos controlados, a venlafaxina e a duloxetina foram incluídos
nas principais diretrizes de tratamento desse transtorno4,7,8.
Em uma metanálise, a venlafaxina e a duloxetina demonstraram eficácia em grandes amostras
cumulativas (2.275 participantes fizeram uso de venlafaxina e 1.355 fizeram uso de duloxetina) sem uma
descontinuação aumentada em relação ao placebo11.
Em comparações entre medicamentos, a venlafaxina se mostrou tão eficaz quanto o escitalopram12 e a
duloxetina13. Quando comparado à pregabalina em estudo placebo­controlado, apenas a pregabalina
demonstrou eficácia na melhora dos sintomas ansiosos14. A pregabalina e o escitalopram obtiveram melhor
tolerabilidade dos seus efeitos colaterais do que a venlafaxina.
Segundo o National Institute for Health and Care Excellence (NICE)9, a venlafaxina está recomendada
apenas após falha do tratamento com a sertralina, devendo­se considerar sua tendência a produzir síndrome
de retirada e risco aumentado de toxicidade na superdosagem.

Agomelatina
A agomelatina age como agonista dos receptores melatoninérgicos (MT1 e MT2), além de ter
propriedades antagonistas do receptor serotoninérgico 5­HT2C.
A agomelatina (25 a 50 mg/dia) teve efeito nos sintomas ansiosos em pacientes com TAG em ensaio
clínico controlado por placebo com duração de 12 semanas15. Quando comparada ao escitalopram,
apresentou­se superior ao placebo na fase aguda do tratamento, porém com menor incidência de efeitos
adversos que o escitalopram16.
Uma desvantagem da agomelatina é seu potencial para alterar os níveis das enzimas hepáticas, sendo a
sua monitoração necessária antes e durante o tratamento.

Antidepressivos tricíclicos
Entre os tricíclicos, a imipramina é o agente farmacológico com mais evidência na fase aguda do
tratamento do TAG. Além de ter demonstrado eficácia superior ao placebo nos sintomas ansiosos, a
imipramina obteve melhor resultado do que o alprazolam na redução de sintomas psíquicos do TAG17. No
entanto, após a descoberta dos ISRS, essa classe de medicamentos deixou ser considerada tratamento de
primeira linha, em razão de seu perfil de tolerabilidade e segurança.

Pregabalina
A pregabalina é o anticonvulsivante com maior evidência para o tratamento do TAG. Atribui­se seu
mecanismo ansiolítico à sua ligação com alta afinidade à subunidade alfa­2­delta (α2δ) dos canais de cálcio
voltagem­dependente do sistema nervoso central, reduzindo o influxo de cálcio pré­sináptico e,
consequentemente, a liberação de neurotransmissores pelas vesículas pré­sinápticas18.
No tratamento da fase aguda do TAG, a pregabalina mostrou­se eficaz em diversos ensaios clínicos
controlados por placebo4. Apresentou também um efeito semelhante ao lorazepam19, à venlafaxina20 e ao
alprazolam21. Em geral, a pregabalina foi bem tolerada pelos participantes e teve início de ação clínica após
apenas 1 semana de tratamento.
Diversas dosagens da pregabalina foram utilizadas nos estudos de tratamento, variando entre 150 e 600
mg/dia. As dosagens entre 400 e 600 mg/dia foram associadas a maior benefício na redução da ansiedade,
porém com maior relato de efeitos adversos, principalmente sonolência e tontura22. O uso de maiores doses
da pregabalina também foi associado a um maior ganho de peso em estudo controlado por placebo de 4
semanas21.

Quetiapina
A quetiapina é o único antipsicótico atípico com boa evidência de eficácia no tratamento do TAG. Seu
efeito foi observado já na 1ª semana de tratamento nas dosagens de 50 e 150 mg/dia na formulação XR23. Em
outros estudos de fase aguda, teve efeito semelhante ao escitalopram (10 mg/dia)24 e à paroxetina (20
mg/dia)25. Nesses últimos, a quetiapina XR foi usada entre 50 e 300 mg/dia, com início do efeito perceptível
a partir do 4º dia de tratamento.
A despeito da eficácia demonstrada nos estudos, o perfil de efeitos colaterais de curto e longo prazo dessa
classe medicamentosa (como risco de desenvolvimento de síndrome metabólica, diabetes e, mais
recentemente, discinesia tardia) desaconselha seu uso como estratégia de tratamento de primeira linha no
manejo do TAG.

Benzodiazepínicos
Apesar de vasta evidência sobre a eficácia dessa classe de medicamentos em estudos de curto prazo no
tratamento do TAG, os benzodiazepínicos não fazem parte do tratamento de primeira linha desse transtorno.
Isso porque há risco de desenvolvimento de sintomas de retirada de difícil manejo e ansiedade rebote
associado ao seu uso crônico. Como os sintomas do TAG são crônicos, há uma maior chance de problemas
associados ao uso prolongado dessa classe medicamentosa. Além disso, os benzodiazepínicos não são
indicados para tratamento da depressão, comorbidade frequente nos pacientes que sofrem de TAG.
Dessa forma, a prescrição dos benzodiazepínicos nesses pacientes seria adequada apenas para uso de
curto prazo no alívio rápido dos sintomas agudos e intensos de ansiedade e nos pacientes que não
responderam a outros tratamentos de primeira linha e apresentam sintomas de intensidade grave, persistente e
prejudicial4.

Buspirona
A buspirona é um agente serotoninérgico da classe das azapironas que atua como agonista parcial dos
receptores 5­HT1A. Na década de 1980, 2 estudos controlados por placebo observaram eficácia da buspirona
no TAG, comparável àquela dos benzodiazepínicos. Na mesma época, dois estudos não publicados não
demonstraram diferença em relação ao placebo.
Uma desvantagem do uso da buspirona é sua falta de eficácia para outros transtornos de ansiedade
frequentemente comórbidos com o TAG, como transtorno de pânico, transtorno de ansiedade social e
depressão. Em vista destes fatos, não é um tratamento de primeira escolha para o TAG7.

Hidroxizina
A hidroxizina atua como antagonista do receptor histamínico H1 e leve antagonista do receptor de
serotonina 5­HT2. Alguns ensaios clínicos demonstraram seu efeito ansiolítico em comparação com o
placebo e semelhante aos benzodiazepínicos e a buspirona em períodos de até 3 meses7. No entanto, dados os
efeitos sedativos, deve ser apenas usado quando outros medicamentos não obtiveram resposta ou foram mal
tolerados. Sedação e efeitos anticolinérgicos em doses mais elevadas (visão turva, confusão, delirium, entre
outros) estão entre os possíveis efeitos adversos8.

Outros medicamentos
A trazodona teve eficácia semelhante ao diazepam e superior ao placebo em um ensaio clínico de 8
semanas na dose média de 255 mg/dia, porém menor tolerabilidade pelos efeitos colaterais como tontura e
confusão. A vortioxetina, nas dosagens entre 2,5 e 10 mg/dia, apresentou resultados contraditórios quando
comparada ao placebo em três estudos de fase aguda26.

TRATAMENTOS MEDICAMENTOSOS COMBINADOS


Existem poucos estudos que avaliaram a adição de algum medicamento após falta de resposta com ISRS.
A pregabalina (150 a 600 mg/dia) foi mais eficaz do que o placebo em estudo de 8 semanas em 356 pacientes
com histórico de falta de resposta ao tratamento27. A quetiapina, apesar dos resultados positivos como
monoterapia, teve resultados inconsistentes ou negativos quando utilizada como estratégia de aumento no
tratamento do TAG28­30.
Outros antipsicóticos atípicos como risperidona31, olanzapina32, ziprasidona33 e aripiprazol34 também vêm
sendo estudados para pacientes que não responderam a antidepressivos. No entanto, são estudos com
amostras pequenas, com resultados negativos ou inconsistentes e maior índice de descontinuação por causa
dos efeitos adversos nos pacientes em uso dos antipsicóticos.

TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DE MANUTENÇÃO E DURAÇÃO DO TRATAMENTO


Estudos de manutenção são necessários, atualmente, para registro de novas indicações de medicamentos.
Apesar da cronicidade do curso do TAG, ainda não existe consenso sobre o tempo de duração ideal para seu
tratamento. Estudos farmacológicos após resposta ou remissão na fase aguda do TAG têm servido como
direção para determinar a duração do tratamento.
Pacientes com TAG que obtiveram resposta na fase aguda com paroxetina, escitalopram, venlafaxina,
duloxetina, agomelatina, pregabalina, quetiapina XR ou vortioxetina e mantiveram uso dessas medicações na
mesma dosagem de melhora dos sintomas tiveram desfechos melhores (menor frequência ou maior latência
para recaída) do que aqueles que tiveram seus medicamentos substituídos por placebo35.
A maioria desses estudos teve duração de 24 a 26 semanas, porém 3 avaliaram períodos maiores: entre 48
e 76 semanas. Um estudo demonstrou um resultado importante: os pacientes que mantiveram a venlafaxina
por 12 meses tiveram menos recaídas do que os que interromperam o medicamento aos 6 meses36.
Sendo assim, em casos de eficácia e boa tolerabilidade, recomenda­se manutenção do tratamento por pelo
menos 6 meses e, idealmente 12 meses, após a fase aguda do tratamento, devendo esse período ser
prolongado de acordo com as particularidades de cada paciente.

COMPARAÇÃO E COMBINAÇÃO ENTRE PSICOTERAPIA E FARMACOTERAPIA


Apesar de geralmente usarem critérios de inclusão e medidas de eficácia diferentes, os tratamentos
medicamentosos e a psicoterapia, isoladamente, apresentam eficácia semelhante após tratamentos de curta
duração9. Não está bem definido se existem diferenças de longo prazo entre estas modalidades de tratamento.
De qualquer modo, quando existe comorbidade com depressão, é importante o tratamento com
antidepressivos ou o tratamento combinado37.
Uma proporção significativa de pacientes com TAG não apresenta resposta satisfatória com terapia
cognitivo­comportamental (TCC) ou farmacoterapia. Apesar da combinação de psicoterapia e farmacoterapia
ser frequentemente usada na prática clínica, existem poucos estudos que compararam a eficácia do
tratamento combinado com psicoterapia ou farmacoterapia isoladamente.
Um estudo não mostrou ganhos ao se combinar buspirona e TCC38. No entanto, o poder do estudo foi
baixo. Sessenta pacientes foram randomizados para receber: (1) buspirona mais treinamento de manejo da
ansiedade; ou (2) buspirona e terapia não diretiva; ou (3) placebo e treinamento de manejo de ansiedade; ou
(4) placebo e terapia não diretiva. Não houve diferenças entre os quatro grupos, sendo que todos
apresentaram melhora. Outro estudo mostrou que a combinação de diazepam e TCC foi mais eficaz do que
diazepam sozinho39. Os resultados mostraram que a combinação teve um resultado melhor, com 90,5% dos
pacientes no grupo de tratamento combinado mostrando melhora clinicamente significante. Este estudo é
difícil de interpretar porque as amostras foram pequenas, o diagnóstico não era estabelecido por entrevista
estruturada, foram usados critérios do DSM­III e não foi avaliado se a TCC foi implementada corretamente.
Crits­Christoph et al.40 não encontraram benefícios adicionais da combinação de TCC e venlafaxina XR em
comparação com venlafaxina XR sozinha no tratamento do TAG. Os pacientes haviam participado de um
ensaio clínico e foram aleatorizados para receber ou não tratamento adicional com TCC. Os autores
avaliaram que a boa resposta à venlafaxina havia deixado pouco espaço para benefícios adicionais, inclusive
por um menor engajamento dos pacientes nas técnicas oferecidas.
Em uma série de casos, Wetherell et al.41 encontraram que a adição de TCC ao tratamento com ISRS
aumentou a resposta ao tratamento e diminuiu a frequência de recaída quando o medicamento foi retirado.
Três quartos dos pacientes que receberam TCC foram capazes de interromper a medicação e permanecer
bem. O mesmo grupo42 observou que adicionar TCC a um ISRS pode ser útil em indivíduos com 60 anos ou
mais. A combinação com TCC reduziu a gravidade das preocupações, especialmente quando os ISRS não
foram eficazes nesse sentido. Neste estudo, tanto o ISRS como a TCC foram capazes de prevenir recaídas e
75% dos pacientes em TCC conseguiram interromper a medicação e permanecer bem versus 57% daqueles
que interromperam o ISRS sem tratamento psicoterápico, porém o poder baixo do estudo não permitiu que a
significância estatística fosse alcançada.
Assim, o tratamento combinado é pouco estudado e não deve ser oferecido rotineiramente como
tratamento de primeira escolha. Por outro lado, pode ser uma boa opção em pacientes com resposta parcial a
um ISRS ou venlafaxina ou para evitar a recaída quando se pretende retirar a medicação.

TRATAMENTO SEQUENCIAL DO PACIENTE COM TAG


O tratamento sequencial do TAG é apresentado na Figura 1. O tratamento do TAG deve ser iniciado com
um tratamento de primeira lin ha, que pode ser psicoterápico (TCC e o relaxamento aplicado) ou
medicamentoso (ISRS e IRSN), conforme principais diretrizes internacionais7,9. Dentre os medicamentos
dessas categorias, a paroxetina, o escitalopram, a venlafaxina e a duloxetina são aprovados pelo Food and
Drug Administration (FDA). A sertralina também demonstrou eficácia em ensaios clínicos controlados e
pode ser considerada tratamento de primeira linha. Pacientes sem resposta ou com resposta parcial à TCC
devem receber um medicamento de primeira linha como segundo passo e vice­versa. Quando não há resposta
ao primeiro medicamento de primeira linha, outra medicação de primeira linha deve ser tentada. Em
pacientes que não responderam inicialmente a um ISRS, um IRSN ou a pregabalina podem ser tentados.
Caso não haja resposta, pode­se tentar uma medicação de terceira linha ou a combinação de medicamentos.
São opções de tratamento medicamentoso para paciente sem resposta às medicações de primeira linha os
benzodiazepínicos, a buspirona, a quetiapina, a hidroxizina e a agomelatina. A adição da pregabalina a um
antidepressivo (ISRS ou IRSN) é superior a continuar o tratamento apenas com o antidepressivo27. Estudos
pequenos controlados com placebo sugerem a potencialização de antidepressivos com antipsicóticos
(olanzapina, quetiapina, risperidona)29,31,32, mas as evidências para potencialização com quetiapina são
inconsistentes23,30. A trazodona e a vortioxetina, apesar dos resultados inconsistentes, podem ser utilizadas
em pacientes que não responderam bem a outros tratamentos.
Em todos os pontos de decisão, reavaliar o diagnóstico diferencial e o diagnóstico de comorbidades
clínicas e psiquiátricas.

TRATAMENTO PSICOTERÁPICO DO TAG


O primeiro tratamento não farmacológico para o TAG a ter sua eficácia demonstrada em ensaios clínicos
aleatorizados foi o relaxamento aplicado (RA), desenvolvido na década de 1980 pelo pesquisador clínico
sueco Lars­Göran Öst43. A premissa teórica que sustentava essa intervenção era a de que pessoas com TAG
apresentavam dificuldades para relaxar por falta de repertório adequado e, portanto, necessitavam de uma
intervenção que as ensinassem a fazê­lo. O RA baseia­se em técnicas de relaxamento bastante conhecidas,
como o relaxamento controlado por sinal (RCE)44, o relaxamento diferencial (RD)45 e, especialmente, o
relaxamento muscular progressivo (RMP), desenvolvido ainda na segunda década do século passado pelo
psiquiatra norte americano Edmund Jacobson45. O RMP parte da compreensão de que a ansiedade é um
estado psicofisiológico antagônico ao relaxamento, estando estes respectivamente relacionados à ativação
simpática e parassimpática do sistema nervoso autônomo. Ao ser incorporada pelos protocolos de RA, tal
compreensão passou a considerar a ansiedade como um fenômeno envolvendo processos cognitivos, afetivos
e comportamentais, além dos fisiológicos, em uma relação de influência mútua. Portanto, ao aprender a
reduzir a ansiedade em um desses sistemas (no caso, a tensão muscular), o indivíduo conseguiria atenuar
também a ativação dos demais, resultando em uma redução holística, em cadeia, da resposta ansiosa.
Figura 1 Tratamento sequencial do transtorno de ansiedade generalizada.
*Caso haja comorbidade com depressão moderada a grave, dar preferência para o tratamento medicamentoso (antidepressivos) como
opção inicial.
**Iniciar preferencialmente com ISRS, em razão do melhor perfil de efeitos colaterais. Caso não haja resposta satisfatória, avaliar substituir
por IRSN ou pregabalina.
ATD: antidepressivo; BDZ: benzodiazepínicos; IRSN: inibidores de recaptura de serotonina e noradrenalina; ISRS: inibidores seletivos de
recaptura de serotonina; TCC: terapia cognitivo­comportamental.

Nota­se que o RA se diferencia de outras técnicas de relaxamento por caracterizar­se como uma
habilidade de enfrentamento, que pode ser aplicada em qualquer contexto, sempre que o indivíduo perceber­
se ansioso. Para isso, deve­se ensinar o paciente a identificar sinais de ansiedade e a aplicar, rapidamente,
técnicas breves de relaxamento (de 20 a 30 segundos) previamente treinadas. O uso regular do RA resultaria
em uma mudança duradoura no padrão de resposta (ansioso) habitual do indivíduo com TAG e,
consequentemente, na redução dos sintomas.
O RA é considerado até hoje um tratamento de primeira linha para o TAG9. O protocolo tem entre 10 e
12 sessões, e pode ser dividido em 8 etapas, demonstradas no Quadro 1 e também na Figura 243.
Vale ressaltar que alguns pacientes apresentam reação paradoxal ao RA, fenômeno que ficou conhecido
como ansiedade induzida por relaxamento (AIR). Entretanto, estudos recentes indicam que a AIR não
impede a melhora clínica daqueles que seguem o tratamento. Há indícios de que, nesses casos, a melhora
clínica ocorra via processamento emocional46. Nesses casos, os exercícios de RA funcionariam mais como
uma exposição à vulnerabilidade, ao risco de uma ameaça inesperada ou de experimentar um contraste
emocional negativo do que como treino de autoindução de relaxamento.
Essa questão torna evidente a necessidade de identificar, com maior clareza, como se relacionam os
processos psicológicos e fisiológicos envolvidos na sintomatologia do TAG e na melhora clínica produzida
por intervenções psicológicas. O psicólogo da Universidade da Pensilvânia, Thomas Borkovec, foi pioneiro
no estudo dos mecanismos psicológicos do TAG, comparando especialmente três populações: (a) pessoas
pouco preocupadas; (b) pessoas muito preocupadas, mas sem TAG; e (c) pessoas com TAG. Nessa linha de
pesquisa, ele observou que as preocupações se apresentavam de formas diferentes, com padrões funcionais
específicos nessas três populações, e elaborou a teoria da preocupação como esquiva (Figura 3)47,48, que se
tornou paradigmática para os principais modelos teóricos cognitivo­comportamentais do TAG que o
sucederam.

Quadro 1 As 8 etapas do protocolo de relaxamento aplicado (RA)

1. Auto­observação e monitoramento: identificando desencadeantes de ansiedade e aprendendo a discriminar reações


fisiológicas, afetivas, cognitivas e comportamentais.
2. Relaxamento muscular progressivo: ensinado durante as sessões e praticado diariamente (idealmente 2 vezes/dia),
os exercícios consistem em tensionar moderadamente pequenos grupos musculares por 3 a 4 segundos e relaxar,
em sequência, até que o corpo todo esteja livre de tensões. A atenção no contraste com a sensação de tensão
muscular ajuda no atingimento de níveis mais profundos de relaxamento. A técnica de respiração diafragmática é
ensinada previamente e aplicada nos momentos de relaxamento.
3. Relaxamento passivo: conforme o paciente avança, a prática vai sendo encurtada, aplicando a técnica a vários
grupos musculares em conjunto até que a tensão muscular não seja mais necessária e o indivíduo consiga relaxar
apenas soltando a musculatura de todo o corpo.
4. Relaxamento controlado por sinal44: uma palavra (em geral “relaxe”) é associada ao estado de relaxamento ao
repeti­la durante toda a prática, no momento em que o paciente solta a respiração e a musculatura. Após praticar
sistematicamente por algum tempo, a palavra associada poderá evocar sozinha o estado de relaxamento.
5. Relaxamento diferencial: quando o paciente estiver conseguindo relaxar com mais facilidade, o terapeuta o ensina a
relaxar os músculos não recrutados para a atividade em curso (p. ex., soltar os ombros enquanto digita no teclado
do computador). O paciente passa a praticar a técnica em ambiente natural, durante suas atividades cotidianas,
utilizando também o relaxamento controlado por sinal.
6. Relaxamento rápido: em 20 a 30 s, paciente deverá (a) fazer entre 1 e 3 respirações profundas, soltando
lentamente o ar, (b) pensar “relaxe” antes de cada expiração e (c) identificar partes do corpo tensas e relaxá­las ao
máximo. O paciente é orientado a praticar diariamente (15 a 20 vezes/dia) em situações pouco ansiogênicas e
previamente estabelecidas.
7. Treino para aplicação: 2 a 3 sessões são dedicadas a exposições breves (10­15 minutos) aos mais variados
contextos ansiogênicos, nos quais o paciente aplica o relaxamento rápido.
8. Manutenção: orienta­se o paciente a praticar a técnica pelo menos 1 vez/dia e em quaisquer situações nas quais
sentir­se ansioso.
Figura 2 Os diferentes componentes do RA com a duração aproximada de cada etapa.

Em síntese, a teoria propõe que, como parte de um sistema comportamental de defesa, as preocupações
seriam mantidas pela eliminação, atenuação ou adiamento de estimulações aversivas; ou seja, seria um tipo
de esquiva cognitiva, que ocorreria fundamentalmente de três maneiras: (a) para evitar desfechos
indesejáveis pela evocação de um encadeamento de processos orientados a soluções de problemas potenciais;
(b) para manter a ansiedade tônica elevada, atenuando o impacto emocional de estímulos ansiogênicos
inesperados; e (c) como uma estratégia de controle emocional, usando o efeito inibitório das preocupações
(enquanto processo verbal/linguístico) nas reações autonômicas frente a imagens relacionadas à ameaça, e
distraindo o indivíduo de conteúdos imagéticos mais aversivos.
Borkovec observou que, enquanto o primeiro tipo de preocupação é ubíquo e não distingue pessoas com
e sem TAG, os outros dois são bastante característicos de pessoas com o transtorno e estariam associados a
um padrão patológico de funcionamento. De modo geral, ao atenuar a resposta somática de ansiedade aguda,
a preocupação impediria a extinção das respostas de ansiedade frente a estímulos ansiogênicos (i. e.,
processamento emocional49). Sendo a preocupação mantida pelo alívio de um desconforto subjetivo (i. e.,
resposta ansiosa aguda), a consequente falha de processamento emocional levaria à cronificação dessa forma
de esquiva cognitiva, mantendo constantemente elevados os níveis de ansiedade tônica.
Nas décadas de 1970 e 1980, terapias que integravam o modelo cognitivo de Aaron Beck e técnicas de
TCC começaram a acumular evidências de eficácia no tratamento do TAG e passaram a incorporar o RA aos
seus protocolos, sendo até hoje o tratamento psicológico de escolha para o transtorno9. Entretanto, no TAG, a
TCC apresenta eficácia inferior à obtida no tratamento dos outros transtornos de ansiedade51, o que
incentivou a busca por intervenções clínicas mais eficazes e ensejou o surgimento de novos protocolos de
TCC, sustentados por modelos teóricos elaborados a partir de achados experimentais mais recentes. Embora
todos esses modelos compartilhassem, em grande medida, suas bases teóricas cognitivo­comportamentais e,
muitas vezes, se apoiassem em um mesmo conjunto de estudos, cada um articulou esses achados de modo a
privilegiar processos específicos, cujo comprometimento constituiria­se, em tese, no mecanismo
psicopatológico central do transtorno: as preocupações como esquiva, a metacognição, a intolerância às
incertezas, a esquiva experiencial, a desregulação emocional ou a esquiva do contraste emocional negativo26.
Cada um desses modelos sustenta um protocolo específico de TCC para o TAG, com eficácia demonstrada
em ensaios clínicos controlados50,52.

Figura 3 Modelo da preocupação como esquiva50.

Apesar de a última metanálise Cochrane não ter demonstrado superioridade da TCC sobre terapias de
apoio ativas53, ensaios clínicos aleatorizados mais recentes têm demonstrado a superioridade de protocolos
baseados nesses novos modelos, comparados com terapias de apoio (i. e., modelo baseado em aceitação26) e
com protocolos de TCC tradicional (i. e., modelo de intolerância às incertezas54; e modelo metacognitivo55).
Isso indica que a emergência de novos modelos e a atualização e o refinamento de seus protocolos têm
representado um avanço da abordagem cognitivo­comportamental no tratamento do TAG. Uma descrição
mais detalhada desses modelos e de seus respectivos protocolos de intervenção pode ser encontrada em
Behar et al.50 e Sampaio et al.26.
Apesar dessa diversidade de modelos, a Tabela 2 apresenta alguns elementos comuns, ou muito
frequentemente presentes, nos diferentes protocolos de intervenção cognitivo­comportamentais para o TAG.
Apesar de o processo terapêutico cognitivo­comportamental seguir, tradicionalmente, protocolos
estruturados e orientados por diagnósticos psiquiátricos específicos, perspectivas mais recentes têm proposto
mudanças em diferentes aspectos desse formato. A perspectiva transdiagnóstica do protocolo unificado (PU)
de Barlow et al.56 focam em processos supostamente comuns a diferentes transtornos de ansiedade, podendo
ser aplicado em grupos mais heterogêneos de pacientes ansiosos. No ensaio clínico aleatorizado citado, o PU
mostrou eficácia equivalente e menor taxa de abandono, quando comparado com protocolo de TCC
específico para o TAG.
Outra proposta recente é o que Hoffman e Hayes57 chamaram de TCC baseada em processo, uma
abordagem mais idiográfica, focada na identificação dos processos envolvidos especificamente no
funcionamento de cada indivíduo, em vez de seguir protocolos com passos pré­definidos a partir do
diagnóstico formal. Para a modificação desses processos, o terapeuta cognitivo­comportamental utiliza
intervenções e técnicas empiricamente validadas, de acordo com a necessidade particular de cada caso,
definida a partir de uma avaliação clínica sustentada em um dos dois pilares teóricos da TCC (i. e., o
comportamentalismo e o cognitivismo). Ensaios clínicos controlados e conduzidos em diferentes centros de
pesquisa são necessários para confirmar a eficácia dessas propostas no TAG.

Tabela 2 Etapas da terapia cognitivo­comportamental para o transtorno de ansiedade generalizada


1. Avaliação clínica Elabora um entendimento do caso clínico, toma a análise
funcional ou a conceituação cognitiva como base (a depender do
embasamento teórico do terapeuta) e utiliza modelos clínicos do
TAG.
2. Psicoeducação Apresenta ao paciente, de forma didática, os processos
envolvidos em seu quadro clínico e como a terapia pode
promover as mudanças necessárias para sua melhora.
3. Automonitoramento Treina o paciente a observar, relatar e registrar os episódios de
preocupação e ansiedade, aumentando seu autoconhecimento e
possibilitando uma avaliação mais objetiva da evolução do
tratamento.
4. Exercícios e Normalmente são ensinados durante as sessões e praticados
práticas específicas como tarefas de casa. Visam a ampliar um repertório de
autorregulação, de acordo com o que é proposto em cada
modelo (treino em relaxamento, reestruturação cognitiva,
exposição a cenários catastróficos imaginados, práticas formais
de atenção plena [mindfulness], entre outros).
5. Aplicação Na vida cotidiana e em situações mais desafiadoras (p. ex.,
atenção plena informal e/ou relaxamento aplicado durante as
atividades do dia a dia, ou quando a pessoa se expõe a
contextos particularmente ansiogênicos).
6. Avaliação dos Além do relato da experiência pessoal do paciente e das
resultados impressões do terapeuta, utilizam­se os dados obtidos nos
registros de auto­observação, escalas e questionários, sempre
relacionando com as metas traçadas para a terapia.
7. Prevenção de O paciente é orientado a como utilizar as ferramentas
recaída aprendidas na terapia quando houver lapsos (ressurgimento ou
piora pontual dos sintomas).

No Quadro 2, são apresentadas algumas das principais técnicas de TCC para o TAG conforme
apresentadas por Borkovec e Sharpless47, que devem ser aplicadas a partir da avaliação clínica de cada caso
particular.

Quadro 2 Algumas técnicas da TCC

Dessensibilização por autocontrole: é uma variação da técnica de dessensibilização sistemática58 proposta por
Goldfried59. Por meio da exposição a conteúdos ansiogênicos imaginados e do treino em relaxamento, a técnica não
tem como objetivo a produção de inibição recíproca (como na dessensibilização sistemática), mas a aquisição ativa
de um repertório de enfrentamento das próprias reações proprioceptivas da ansiedade, via técnicas de relaxamento,
que deverá ser treinada e depois aplicada em situações ansiogênicas reais.
Controle de estímulos: alcançado pelo estabelecimento de um momento e um local específicos para se preocupar
voluntariamente, todos os dias, enquanto posterga para esta hora as preocupações que ocorrerem ao longo do dia –
tão logo sejam notadas – voltando a atenção para o momento presente (as preocupações devem ser gravadas ou
registradas numa lista e são checadas no momento e local designados). O objetivo da técnica é diminuir a frequência
de preocupações ao longo do dia. Isso ocorreria porque (a) ao registrar a preocupação, a pessoa garante que esta
terá a devida atenção, facilitando a retomada do foco da atenção na atividade em curso, e (b) com o tempo, o local
e o horário escolhidos adquirem controle sobre o ato de se preocupar.
Zonas livres de preocupação: uma variação mais simples da estratégia de controle de estímulos, que consiste em
estabelecer um espaço particular (p. ex., carro, sala de estar, banheiro) em que se postergará a preocupação para
qualquer momento em que a pessoa estiver fora dessa área e, após ter sido bem­sucedida nessa primeira área,
novas “zonas livres” são gradativamente incluídas.
Restruturação cognitiva: por meio do questionamento socrático e do desafio de pensamentos e crenças, visando à
aquisição de perspectivas interpretativas variadas e mais flexíveis em relação a situações e desfechos negativos
imaginados.
Monitoramento do resultado das preocupações: envolve o registro diário das preocupações, descrevendo os
desfechos temidos, e a revisão dos acontecimentos passados para checar se, e em que medida, estes realmente
ocorreram.
Valores intrínsecos e o foco atencional no momento presente (ou foco no processo): realizado no momento em que
se posterga as preocupações ou em que se engaja em comportamentos associados a desfechos incertos e
importantes (p. ex., ao se preparar para uma prova) e, atualmente, também, por meio de práticas meditativas,
especialmente a atenção plena/mindfulness.
Valores intrínsecos e vida livre de expectativas: visa a atenuar a expectativa ansiosa ensinando o paciente a motivar­
se mais pelo processo do que pelo resultado (p. ex., fazer 1 hora de caminhada, 3 vezes/semana, em vez de
motivar­se para perder 5 quilos; ou comprometer­se com o aumento do número de horas diárias de estudo, em vez
de motivar­se pela aprovação em um concurso). O terapeuta discute com o paciente como a valorização excessiva
do resultado e do reconhecimento social atrelado ao sucesso (valores extrínsecos) podem gerar ansiedade,
preocupações e comportamentos de esquiva, na medida em que desfechos incertos adquirem função legitimadora do
valor do indivíduo enquanto pessoa. Após a identificação de princípios, que descrevem formas de agir cujo valor é
intrínseco, o paciente aprende a medir a si mesmo e a seus comportamentos mais por seu alinhamento a esses
princípios do que pelos resultados obtidos. Paradoxalmente, ao diminuir a importância relativa do resultado, o
desempenho tende a melhorar, por reduzir a ansiedade e os comportamentos de esquiva.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Todo médico deve estar familiarizado com os sintomas do TAG, uma vez que, frequentemente, os
pacientes se apresentam com queixas somáticas em unidades de atenção primária. Na avaliação destes
pacientes, é muito importante pesquisar por sintomas depressivos e abuso de substâncias, especialmente
álcool e sedativos. O tratamento inicial pode ser psicoterápico (TCC) ou medicamentoso. O tratamento
medicamentoso é preferível quando há comorbidade com depressão. São opções de tratamento
medicamentoso de primeira linha os ISRS, os IRSN e a pregabalina.

Vinheta clínica
M.J.L., 47 anos, sexo feminino, é advogada e mãe de uma filha de 16 anos. Considera que sempre foi muito
preocupada com tudo e sofreu com o estresse, mas via isso como algo natural. Apesar de períodos de insônia e da
dificuldade para relaxar mesmo em períodos de lazer com a família (“tinha uma sensação de que estava perdendo
tempo, apesar de saber que aquele tempo era importante”), nunca procurara um tratamento. Há 2 anos, o marido de
M. faleceu em decorrência de um câncer que evoluiu rapidamente. Ela passou por um período de luto e fez
psicoterapia nessa época e considerava que tinha ficado bem. Contudo, M. viu­se como a única responsável por
sustentar a casa e cuidar da filha. Apesar de, nesse período, ter conseguido uma promoção no escritório em que
trabalha, as preocupações foram piorando progressivamente.
No momento da consulta inicial, tinha a sensação de que estava “esperando algo ruim acontecer o tempo todo”.
Preocupa­se particularmente com “pendências” do trabalho, que poderiam ser coisas simples como um e­mail que
precisaria mandar, e com a filha. “Estou atormentando a vida dela. Toda hora quero saber se está tudo bem.” Os
sintomas foram piorando ao longo destes 2 anos, mas se tornaram mais intensos há 6 meses. Neste período, passou
a ter dificuldade para iniciar o sono (“a cabeça não desliga”), tem se sentido fadigada, com dores nas costas, mais
irritada e cometendo erros básicos no trabalho por desatenção. Após o período de luto, não voltou a ter sintomas
depressivos, mas estava sentindo que as coisas estavam “perdendo um pouco a graça”. Sentia­se um pouco culpada
nestes últimos meses, pois tinha começado a namorar (“Um rapaz um pouco mais jovem. Nada sério.”). Recebeu o
diagnóstico de transtorno de ansiedade generalizada. Achava que não havia espaço na sua vida para psicoterapia
naquele momento e optou por iniciar escitalopram 10 mg/dia. A paciente também foi orientada quanto à natureza da
ansiedade, sobre seu caráter adaptativo em níveis normais e seu caráter disfuncional em níveis desproporcionais. Foi
orientada quanto ao efeito esperado com a medicação, inclusive, quanto à demora nos efeitos benéficos e aos
efeitos colaterais. Optou por não usar medicação para o sono porque tinha “medo de ficar dependente”.
Após 1 mês, retornou bem melhor, conseguindo administrar suas preocupações, com melhora do padrão do sono
e buscando incluir atividades de lazer e atividades físicas na sua rotina. No entanto, queixava­se de disfunção sexual:
“perdi completamente o desejo”. Diante da boa resposta ao medicamento, optou­se por manter a medicação e iniciar
TCC com o objetivo de retirar a medicação o mais rápido possível. Depois de 2 meses, ela mantinha a melhora e
estava engajada na terapia. Como mantinha diminuição importante da libido, dificuldade de excitação e anorgasmia,
optou­se por reduzir a dose para 5 mg/dia. Houve uma melhora parcial destes efeitos colaterais, o que permitiu
continuar o tratamento de manutenção da medicação até completar 6 meses. A paciente optou por não retirar
precocemente a medicação por receio da piora dos sintomas, apesar do bom efeito da terapia. Depois disso, a
medicação foi retirada com sucesso, e a paciente permaneceu bem fazendo sessões de manutenção de TCC.

Para aprofundamento
Gandarela L, Bernik MA. Tratamento farmacológico do transtorno de ansiedade generalizada. In: Bernik M,
Savoia M, Lotufo Neto F. A clínica dos transtornos ansiosos e transtornos relacionados: a experiência do Projeto
AMBAN. São Paulo: Edimédica; 2019. p.201­18.
Capítulo publicado recentemente que aborda de forma mais detalhada os ensaios clínicos de cada
medicamento, além de incluir informações sobre outras drogas com menor evidência.
Sampaio T, Martins D, Pimenta G, Jorge RC. Terapias cognitivo­comportamentais do transtorno de ansiedade
generalizada. In: Bernik M, Savoia M, Lotufo Neto F. A clínica dos transtornos ansiosos e transtornos
relacionados: a experiência do Projeto AMBAN. São Paulo: Edimédica; 2019. p.219­32.
O capítulo aborda com mais profundidade cada um dos principais modelos cognitivo­
comportamentais atuais de TAG, descrevendo os protocolos de atendimento desenvolvidos a partir
deles.
Katzman MA, Bleau P, Blier P, Chokka P, Kjernisted K, Van Ameringen M, et al. Canadian clinical practice
guidelines for the management of anxiety, posttraumatic stress and obsessive­compulsive disorders. BMC
Psychiatry. 2014;14 Suppl 1(Suppl 1):S1.
Diretrizes clínicas para o tratamento de transtornos relacionados à ansiedade, baseadas em uma
extensa revisão atualizada das evidências disponíveis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Diretrizes clínicas para tratamento dos transtornos relacionados à ansiedade da Associação Britânica de
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