Você está na página 1de 5

AÇÃO PENAL

1. Conceito

Direito público [modelo do Estado de resolução de conflitos], subjetivo, autônomo, abstrato e


instrumentalmente vinculado a um caso penal. O Estado precisa monopolizar o controle da
violência [passa-se de um período em que a vítima tinha um protagonismo sobre a pena e a
persecução penal, para um período em que o Estado toma para si os conflitos – quebra do pacto
coletivo, interesse público]. Há, nos últimos 20 anos, discussões sobre reemponderar a vítima,
como os debates da justiça restaurativa. Hoje, o processo penal é de, basicamente, ações penais
públicas.

Direito de movimentar a jurisdição penal para a resolução do conflito no caso concreto. A


jurisdição é inerte, sobretudo num sistema acusatório.

Direito subjetivo: se refere a alguém especificamente, a ação sempre tem um titular.

D. Autônomo: não se confunde com o direito material.

D. Abstrato: Independente da procedência ou improcedência do direito material, ele existe.

Instrumentalmente vinculado a um caso penal: O direito de ação é autônomo e abstrato, porém


ele é um instrumento para se chegar ao direito material. Então o direito material e o processual
estão bem relacionados, porque este é instrumento daquele. O direito de ação, assim, necessita
de alguma probabilidade do direito material, uma fumaça (não certeza total). Se não há nenhum
resquício do fato ou da autoria, não se pode entrar com o processo. A autonomia e abstração do
direito não são absolutas. Não se pode acionar o Estado do nada. Isso é discutido quando se fala
das condições da ação.

2. Condições da ação

*Genéricas [se aplicam a todo e qualquer crime]:

Legitimidade “ad causam”: Ativa => quem é o titular da ação penal, quem pode exercer o
direito. Passiva => o indiciado, qualquer pessoa indicada à prática do crime (mas algumas não
podem de qualquer maneira, como os inimputáveis).

Interesse de agir (necessidade/adequação/utilidade): quando a intervenção da jurisdição for


imprescindível. O interesse é praticamente um pressuposto (o processo penal é estruturado para
que o Estado intervenha). Porém, pode-se fazer leituras acerca da necessidade, há situações em
que a intervenção não e necessária e mesmo assim o conflito se resolve (ex.: transação penal).
Quando é útil a jurisdição intervir? A rigor, sempre (já que é necessário sempre). Mas há
situações em que pode ser que não (ex.: situações em que o juiz percebia que, no caso concreto,
a pretensão punitiva vai prescrever). Para Aury, o interesse é um pressuposto.

Possibilidade jurídica do pedido: quando um pedido é possível no âmbito criminal.


Possibilidade pedir condenação ou não [a natureza da sanção demandada, ainda que imprópria,
não enseja rejeição da denúncia, ex.: promotor que pede pena de morte não vai ter a denúncia
automaticamente rejeitada, vai ser emendada, pois esse pedido não vincula o juiz, o fato, esmo
não existindo pena de morte no Brasil, o fato denunciado é passível de condenação, então não
cabe rejeição por impossibilidade jurídica]. Se o fato é atípico, o pedido é impossível, pois não é
possível condenação [essa é praticamente a única hipótese].

Justa causa: O juiz quem recebe ou rejeita a denúncia e ele pode achar que a justa causa não
existe. A rejeição ocorre quando falta qualquer condição da ação, inclusive a justa causa. Em
todos os casos, só pode existir o processo se a denúncia estiver lastreada com indícios de autoria
e prova da materialidade delitiva.
*Específicas [apenas para alguns crimes]

Condição de procedibilidade: Atrelada ao âmbito processual. Casos de alguns procedimentos


de natureza processual que precisam acontecer antes de a denúncia acontecer. Ex. 1: A
representação da vítima. O MP não pode exercer o direito de ação sem que a vítima autorize.
Ex. 2: Crime de induzimento a erro essencial no casamento. A vítima só pode entrar com a
queixa se o casamento for anulado na jurisdição civil. Ex. 3: Crimes praticados por brasileiros
fora do território. Só se pode proceder com a ação quando a agente voltar ao território brasileiro
e a conduta tem que ser crime no Brasil e no país em que foi praticado. Condição de
prosseguibilidade (lei 9099/95): Representação da vítima no curso do processo nos crimes de
lesão corporal, quando o crime passou a ser de ação penal condicionada à representação.
Chama-se prosseguibilidade porque a ação já foi proposta, mas agora se exige a representação.

Condição objetiva de punibilidade: Atrelada ao âmbito material. Quando o fato é típico,


antijurídico e culpável, mas não punível. Ex.: extinção da punibilidade, escusa absolutória, etc.

=> Súmula vinculante 24, STF: específica para os crimes contra ordem tributária [lei 8137].
Condição objetiva de punibilidade para esses crimes: lançamento do tributo.

=> Para alguns autores, essas condições específicas estão dentro das condições genéricas, então
essa classificação em condições específicas não deveria existir [Ex.: a representação da vítima
está dentro de legitimidade]. Essa classificação em genérica e específica, portanto, não é a
única, mas é a mais didática, por ser mais ampla. Discussão meramente doutrinária.

3. Espécies de ação e principiologia

 Ação Pública

 Titularidade
A titularidade pública passou a ser uma regra. Na maioria dos crimes, a ação é de titularidade do
MP.

 Incondicionada ou condicionada

Quando é condicionada, é necessária a representação. O MP só procede se a vítima anuir. Não


há formalidade para a representação, pode ser oral [sendo reduzida a termo], não exige
capacidade postulatória, apenas a manifestação do desejo. Quando a representação não é
exigível, a ação é incondicionada (regra geral).

- Princípios:

*Obrigatoriedade: O MP, estando diante de justa causa, ele é obrigado a denunciar. Não pode
exercitar um juízo de discricionariedade [conveniência e oportunidade], a justa causa vincula.
Em nem todos os ordenamentos são assim, no sistema anglo-saxão, por exemplo, o promotor
pode fazer esse juízo de discricionariedade [justiça negocial], inclusive no Brasil há institutos
que permitem essa negociação, como a delação premiada, o acordo de não persecução penal e a
transação penal [influência do direito estrangeiro].

*Indisponibilidade: O MP não pode desistir, deixar de praticar os atos processuais pertinentes


ou abandonar a ação. Ele não é obrigado a pedir condenação, ele pode participar de tudo e ao
final pedir absolvição, mas ele tem que ir até o final.

*Indivisibilidade: Se há concurso de agentes, havendo justa causa contra todos, deve-se


denunciar todos. STF e STJ: a ação pública é divisível, porque o MP pode denunciar um agente
em um tempo e outro em outro tempo depois. Se o MP silencia sobre um deles (não denuncia e
não pede arquivamento), não é arquivamento implícito.
 Ação privada

Apesar de ser privada, ela tem natureza pública, todo direito de ação é um direito público
[alguns autores falam em ação pública de iniciativa privada].

- Titularidade: vítima (a vítima tem que desejar e tomar a iniciativa para processar, perseguir o
autor do crime; é necessário advogado, um representante processual com capacidade
postulatória).

Em caso de morte ou declaração de ausência: legitimidade passa para, nesta ordem,


cônjuge/companheiro, ascendente, descendente e irmão.

- Princípios

*Oportunidade: A vítima decide se quer ou não quer entrar com a ação, pelos motivos que
cabem somente a ela. É permitido o juízo de conveniência e oportunidade, ao contrário da
obrigatoriedade que norteia as ações públicas.

*Disponibilidade: Pode-se renunciar, não dar seguimento ou abandonar a ação.

*Indivisibilidade: Se há concurso de agentes, a queixa tem que ser ofertada contra todos, no
mesmo momento (não há essa discussão de querer ofertar a ação contra um em outro momento,
etc., é imperiosa a indivisibilidade).

=> Cabe ao MP velar pela indivisibilidade. O que ele pode fazer?

O MP, na ação privada, é custos legis. Como fiscal da lei, ele tem quer zelar pela
indivisibilidade. Diante de uma queixa incompleta (ofertada apenas contra um agente, no
concurso), o MP deve:

O art. 45 do CPP permite o aditamento e o art. 49 diz que a renúncia em relação a um se estende
aos outros.

Corrente 1: o MP deve aditar, com base no art. 45 (crítica: o MP não tem legitimidade).

Corrente 2: Com base no art. 49, ele deve pedir a rejeição da denúncia (pois a renúncia em
relação ao faltante se estendeu ao agente presente na queixa).

Corrente 3: o MP deve intimar a vítima para esclarecer a ausência do agente que faltou.
Provocar a vítima, para ela inserir o faltante.

- Aditamento (somar informações na peça)

- Próprio: Inserir pessoas ou inserir novos crimes (aumenta-se a pretensão punitiva).

Pessoal: pessoas / Real: crimes

- Impróprio: Adicionar novas circunstâncias, sem ampliar a pretensão punitiva. Para as


correntes 2 e 3, quando o art. 45 permite o aditamento, ele se refere a um aditamento apenas
impróprio, pois ele não tem legitimidade para ampliar a pretensão punitiva.

4. Queixa-crime e representação

- Ao contrário da representação, a queixa exige uma forma própria e capacidade postulatória.

- Ambas, em caso de morte ou ausência têm legitimidade cônjuge/companheiro, ascendente,


descendente e irmão.
- No caso de crianças/adolescentes: o adulto (parente) deve representar; ofertar a denúncia ou
entrar com a representação. No caso de conflito de interesses entre o representante e a criança:
Alguns autores dizem que se deve nomear um curador. Para outros, o prazo para a
queixa/representação só corre quando o menor completar 18 anos.

- Prazo para ambas (decadencial): 6 meses, a partir data em que conhecer o autor. Exceção: ação
privada subsidiária da pública, pois nesta, conta-se o prazo do dia em que o MP é considerado
inerte. Quando o MP é considerado inerte? Após o prazo de 5 dias que tem para denunciar réus
presos (prazo corre a partir do 6º dia) ou 15 dias para réus soltos (prazo corre a partir do 16º
dia). O prazo decadencial é um prazo penal, então ele se conta incluindo o dia do início e
excluindo o dia do final (art. 10, CP). Se o último dia for um fim de semana/feriado, considera-
se como o ultimo dia o dia útil anterior. O prazo decadencial não se prorroga, não se suspense e
não se interrompe.

5. Classificação da ação penal privada

- Exclusiva

- Personalíssima

- Subsidiária da pública [quando o MP não faz nada, fica inerte e a vítima entra com a ação, só
existe nos casos que tem vítima direta; não cabe em caso de arquivamento de inquérito, porque
arquivamento não é inércia; abandono da queixa: o MP assume imediatamente, se fosse uma
queixa comum, o processo seria extinto].

6. Retratação da representação

A vítima expõe o desejo de processar, mas desiste da representação depois. É possível? Sim,
mas somente até o oferecimento da denúncia. Se o MP já ofertou, não é mais possível a
retratação. Exceção: Lei Maria da Penha, na qual o prazo para retratação é o recebimento da
denúncia e só pode ocorrer em uma audiência designada especificamente para tal. Art. 16, lei
11340 (Lei Maria da Penha). Formalizou-se a retratação, para que a mulher exponha os motivos
da retratação (já que esta pode ter vindo de uma nova violência). Essa audiência é um rito
obrigatório ou só acontece se a mulher quiser retratar? Divergência jurisprudencial. Pela letra da
lei, não é um rito, a mulher precisa manifestar o desejo de retratação. Há postulações dizendo
que essa audiência é necessária, pois a mulher não sabe sobre a retratação, para fazer com que a
mulher saiba que tenha essa possibilidade (evitar que a mulher chegue à audiência de instrução
querendo desistir, momento em que ela não pode mais).

7. Ação Penal na Lei Maria da Penha

- Art. 16.

- ADIN 4424, STF: Nas lesões corporais leves, a mulher precisa representar sempre? A ADIN
julga inconstitucional essa previsão, para que haja a devida proteção à vítima. Assim, na lesão
corporal leve, na Lei Maria da Penha, a ação é pública incondicionada. Não existe, assim,
retratação/conciliação. A discussão da ADIN foi exclusivamente para a lesão leve (a grave e a
gravíssima não tem discussão, a ação é incondicionada de qualquer maneira, em qualquer
situação). Há ações públicas condicionadas na LMP, mas a lesão leve não mais (então o Art. 16
continua fazendo sentido, mas não para lesão corporal).

8. Formas de extinção de punibilidade relacionadas à ação

*Renúncia: Abrir mão direito de queixa ou representação. A renúncia pode ser expressa ou
tácita (um acordo cível, por exemplo). Existe retratação da retratação? Corrente I: não, pode a
retratação é hipótese de renúncia (e extinção da punibilidade não se discute mais). Corrente II:
Sim, a vítima pode representar, retratar e representar de novo. Ela pode entrar nesse ciclo
quantas vezes ela quiser, desde que esteja dentro do prazo decadencial de 6 meses.

*Decadência: Escoamento do prazo 6 meses para queixa ou representação.

*Perempção: Abandono na ação privada. Na privada subsidiária da pública não existe isso (a
ação é originariamente pública, então se a pessoa abandonar, o MP retoma). Ler art. 60 CPP
(hipóteses de perempção).

*Perdão do ofendido: Quando o ofendido decide oferecer o perdão e o réu aceita


(exclusivamente para a ação privada).

9. Requisitos da denúncia ou da queixa

Denúncia e queixa são peças, petições iniciais.

*Requisitos para ambas: Art. 41. Sem os requisitos, a peça estará inepta (rejeição da
denúncia/queixa – art. 395, I, CPP). Não há oportunidade de emenda à PI.

- Começa com o endereçamento. Após, a denúncia e a queixa devem obrigatoriamente a


qualificação de quem é acusado – querelado ou denunciado (informações que individualizem o
máximo aquela pessoa).

- Circunstanciação dos fatos que são criminosos: O que aconteceu e porque é um crime. O
número máximo de informações que se tem deve estar na peça, com boa e detalhada descrição
dos fatos – hora, local, características do local, etc. – o número máximo de circunstâncias
possíveis (para que o direito de defesa se efetive, para permitir que o réu se defenda com todos
os meios e de todos os elementos).

- Qualificação jurídica dos fatos: porque tais fatos são criminosos? Demonstrar que o que está
descrito é uma conduta delituosa.

- Pedido: Requerer recebimento, citação, provas e condenação/indenização à vítima...

*Denúncia ou queixa genérica: descreve um fato criminoso, qualifica pessoas, mas não faz um
nexo entre conduta e indivíduo(s), não individualiza [geralmente nos crimes societários, de
colarinho branco e relacionados ao consumo]. Denúncia genérica é denúncia inepta.

*STF traz o conceito de denúncias gerais: Denúncia que traz uma série de pessoas que
contribuíram para o crime [“todo mundo fez tudo”], a conduta será individualizada na instrução
processual. Em tese, a geral é permitida, mas a genérica não [o difícil é dizer quando a denúncia
geral e quando é genérica, é muito nebuloso].

Você também pode gostar