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Os direitos reais são direitos sobre coisas, ou seja, na essência não são direitos contra outras pessoas.
De acordo com a teoria realista, o direito real é qualquer direito que incida sobre uma coisa, na medida em que
implicaria o que se chama de poder material sobre a coisa (no sentido de que quem tem direito sobre alguma
coisa tem direito de a manipular).
Esta teoria foi criticada e chegou-se à conclusão de que há uma série de direitos que geralmente são
classificados como reais que não cabem nesta qualificação, como é o caso da hipoteca que não implica
poderes materiais para o credor, sobre a coisa hipotecada.
Ex.: A, para comprar uma casa, pede um empréstimo ao banco. O banco empresta o dinheiro mas com uma
garantia – a hipoteca sobre o imóvel comprado. Constituída a hipoteca a favor do banco, o banco não fica com
nenhum poder material sobre o apartamento. O que foi comprado com aquele empréstimo bancário continua
a pertencer a quem comprou e essa pessoa é que dispõe o imóvel (A). Só do ponto de vista jurídico é que se
pode dizer que a casa está hipotecada porque, materialmente, não há diferença nenhuma entre estar
hipotecada ou não. Externamente, o proprietário continua a usar o imóvel sem qualquer limitação, ainda que
esteja hipotecado.
No que toca a direitos de preferência, sabemos que estes podem ter eficácia real. Nessa situação, o promitente-
comprador que tiver este contrato tem o direito de impor a aquisição, contra o promitente-comprador e contra
terceiros.
Ex.: A prometeu vender a B o apartamento e essa promessa tem eficácia real. Se A vender o apartamento a
C, violando a promessa que fez a B, B pode exercer o seu direito de aquisição contra A e contra C. tem-se
entendido que este também é um direito real (de aquisição) que não implica qualquer poder de utilização sobre
coisas.
Se entendermos o conceito de direito real, em termos materialistas, o resultado é o de um conceito de direito
real extremamente restrito.
A teoria realista torna impossível admitir os direitos reais de garantia e de aquisição.
Surge, então, a teoria personalista. Para esta, todos os fenómenos jurídicos integram-se dentro de uma relação
jurídica, ou seja, sempre que se atribui um direito a alguém, isso implica a existência de uma relação jurídica.
Ex.: A é proprietário de um computador. Quem está obrigado a respeitar a sua propriedade? Qualquer pessoa.
O direito vale contra qualquer pessoa.
Assim, a diferença entre um direito real e um direito de crédito estaria do lado passivo: nos direitos de crédito,
os devedores são determinados e nos direitos reais os devedores são toda a gente (indeterminados). Em
termos formais isto está bem pensado e construído, mas em termos materiais isto não faz sentido – dizer que
todas as pessoas do mundo estão obrigadas a respeitar o direito levaria à necessidade de estabelecer
centenas de milhões de relações jurídicas.
Assim e para evitar a discussão doutrinária, o direito real é o direito que permite ao seu titular exercer o
direito de atua autonomamente sobre uma certa coisa, nos moldes que esse direito permite. O que
importa em qualquer caso é que os poderes concedidos sejam poderes de atuação autónoma, isto é, são
poderes que não estão dependentes da colaboração de outra pessoa para serem exercidos.
Ex.: um credor hipotecário, para hipotecar um imóvel que lhe foi dado em hipoteca, não precisa que o devedor
colabore.
Ex.: o promitente-comprador pode executar a promessa, independentemente de o promitente vendedor ou
terceiro quererem ou não. A execução obtém.se por vontade do titular do direito.
Ex.: A é proprietário de um automóvel. Para poder tirar desse automóvel os benefícios que este lhe pode
proporcionar, A não depende de outra pessoa. Em termos práticos, podem haver exceções: se a pessoa sofre
de alguma deficiência que a impede de conduzir o automóvel, para o fazer precisa de outra pessoa, depende
de outra pessoa.
Nos direitos absolutos, para que o titular do direito obtenha a execução da sua pretensão, não depende da
cooperação de outra pessoa.
Nesse sentido, pode dizer-se que, nos direitos reais, existe um poder direto e imediato sobre a coisa. Ou seja,
o proprietário, o titular, etc. não dependem da colaboração/cooperação de outra pessoa para exercerem o
direito de que beneficiam, nos termos em que esse direito lhe está concedido.
É um direito imediato, no sentido de que não depende da cooperação de outra pessoa.
O credor que beneficia de uma hipoteca nunca tem o objeto hipotecado em seu poder.
Ex.: A (banco) emprestou 300 mil euros a B para B comprar uma casa. O banco não empresa sem a garantia
de que o dinheiro será restituído acrescido dos respetivos juros. B compra a casa e fica hipotecado por A. Em
termos práticos não acontece nada de especial (B torna-se proprietário e utiliza a casa) – o imóvel comprado
não é entregue ao banco. O poder que A tem, caso B não restitua o dinheiro, é de promover a penhor o imóvel
hipotecado e fazê-lo vender.
O poder direto imediato deve ser visto, não como um poder físico, mas sim como poder de autonomia.
Um comprador não tem o direito imediato sobre o objeto que comprou sem que o vendedor colabore porque o
vendedor tem que entregar o objeto.
Para se estabelecer a diferenciação entre direitos reais e direitos não reais, tem que se recorrer a um critério
suplementar: oponibilidade erga omnes (para ser direito real, o poder direto imediato vale perante terceiros).
Ex.: A empresta uma casa a B. Ainda que o contrato de empréstimo tenha um prazo de utilização, o direito de
utilização só vale entre B e A, não vale fora desta relação. Se A vende o imóvel a C (sem que o prazo esteja
verificado) o comodato não é aplicável a C. ou seja, C pode exigir a restituição do imóvel em causa porque,
com o facto de A ter vendido a C sem respeitar o prazo, faz com que B possa invocar responsabilidade civil
perante A mas não perante C.
Se A, em vez de ter comodato a favor de B se tivesse dado em usufruto a B, quando A vendesse a C, C iria
adquirir a propriedade, mas teria que suportar a existência do usufruto porque o usufruto é oponível perante
terceiros.
Assim sendo, concluímos que o Código Civil concebeu um certo conceito de direito real e esse conceito supõe
a existência da oponibilidade perante terceiros.
De um modo geral, a oponibilidade erga omnes pressupõe a publicidade. Isto é, só faz sentido dizer que um
direito é oponível a terceiros, no pressuposto que esses terceiros podiam conhecer a existência do referido
direito e, precisamente porque podiam conhecer, são afetados pela tal existência desse direito, conheçam ou
não.
A publicidade de direitos sobre imóveis é assegurada pelo registo predial.
Ex.: Quando A constituiu o usufruto a B, do tal imóvel, foi inscrito no registo predial e C, quando compra, mesmo
não sabendo efetivamente, deveria saber que existia um usufruto – deveria estar inscrito no registo.
Para que haja oponibilidade, pressupõe-se a publicidade. Só aquilo que for público é que é oponível. Há, no
entanto, exceções (situações em que se garante a oponibilidade, não obstante a falta de publicidade).
O adquirente de direitos sobre imóveis é chamado de sujeito ativo. Estabeleceu-se que não é o sujeito ativo
que deve inscrever o bem, e sim a entidade que veio na formalização do ato sujeito a registo.
Supondo a compra e venda de um imóvel – esta deve ser feita por escritura pública ou documento autenticado,
e o que se estabeleceu foi: quando a partes recorrem a uma destas entidades para realizar a compra e venda,
essa entidade é que fica com o dever de fazer o registo para esse sujeito ativo – quem deve recorrer ao registo
para o comprador, é o notário.
Este dever, do notário, resulta da sanção a que está associado o pedido de registo – está sujeito a um preço.
Ex.: A pretende registar o seu imóvel, que comprou de B. O registo custa 150 euros. Se, porventura, o notário
não inscrever a aquisição do imóvel no registo, dentro do prazo de que dispõe (30 dias, geralmente), o notário
deve entregar 300 euros (o dobro do valor do registo), a título de castigo por não ter cumprido a obrigação do
registo dentro do prazo.
Deste modo, num certo sentido, temos um registo obrigatório – é obrigatório para o intermediário, para quem
faz a formalização e deve pedir o registo a favor do interessado.
O interessado pode sempre registar (ele próprio), mas não está obrigado a fazê-lo.
Descrição e inscrição
Qualificação
Esta presumível veracidade que as inscrições têm está fundamentada no que se designa a qualificação, no
código de registo predial.
Isto é, o registo faz-se a pedido (seja do próprio interessado ou da entidade que formalizou o ato sujeito a
registo, por exemplo, o notário). Cabe à conservatória apreciar o pedido de registo em todos os seus aspetos
– no que respeita à legalidade registal (averiguar se o ato sujeito a registo consta do documento exigido por
lei, se está assinado pelo notário que a elaborou, se está assinado pelo comprador e pelo devedor, se os
emolumentos de registo foram pagos, etc.); e no que respeita à validade substantiva (apreciar a legitimidade
das partes, a possibilidade do objeto, algum vício da vontade de contratação) – artigo 68º Código do Registo
Predial.
Diz-se que a atuação do conservador, neste capítulo, é parecida com a do tribunal: com uma forte limitação. A
apreciação faz-se em função dos documentos apresentados (o único meio de prova a que a conservatória
pode decorrer é o documental) – isto acaba por limitar muito o alcance da qualificação, porque há uma série
de eventuais defeitos/vícios que o ato não pode apresentar.
A qualificação garante alguma veracidade (não garante a veracidade integral) e, por isso, não é de estranhar
que estejam inscritos no registo atos inválidos, se o conservador não tiver mais para averiguar acerca dessa
invalidade (se não for possível identificar alguma validade).
Ainda que sofrendo estas limitações, a verdade +e que a apreciação do pedido de registo é feita por um jurista
qualificado (um jurista cuja função é verificar pedidos de registo).
Assim, onde o conservador não encontrou impedimentos para o registo, o público que acede ao registo não
pode duvidar.
O fundamento da república está na codificação – é substancial – e pode partir-se do princípio que o contrato
que o conservador mandou registar não tem vícios, aparentemente. E é por isso que se pode afirmar que o
registo contém informação, em princípio, fidedigna (FÉ PÚBLICA).
Modalidades de registo
Verificada alguma das situações do artigo 69º do Código do Registo Predial, o conservador deve recusar o
registo. Parte-se do princípio que os casos de recusa são taxativamente enumerados e que, portanto, só se
pode recusar nos casos em que a lei estabelece a possibilidade dessa recusa. Não estando em causa um caso
de recusa, o registo tem que ser feito – não é exatamente uma situação em que se dá ao conservador a
possibilidade de optar.
A tal fé pública (confiança que o registo pode merecer perante terceiros) só se produz em relação ao registo
definitivo, não se produz em relação aos registos provisórios.
Nunca poderia produzir-se em relação ao provisório por dúvidas – se o conservador expressa dúvidas por algo,
o terceiro não pode confiar totalmente no registo provisório. Enquanto estiverem como provisórios, os registos
não são confiáveis.
Como têm prazo de renovação, ao fim do prazo são convertidos em definitivos; ou, ao caducarem, o problema
da fé pública não se põe.
2 Ex.: artigo 5º/Nº2/b) Código do Registo Predial – REGISTO DE SERVIDÕES APARENTES – são aquelas
que se revelam em sinais visíveis e permanentes (1548ºCC). Portanto, a inscrição no registo, em termos de
publicidade não adianta porque a publicidade já resulta dos sinais. Não é o registo que publicita.
3 Ex.: artigo 1295º/Nº2 CC – REGISTO DA MERA POSSE – a mera posse não é posse pela usucapião mas,
fazendo-se o registo da mera posse, os prazos da usucapião podem tornar-se mais curtos. Portanto, o registo
em si mesmo tem um efeito acessório (tornar o prazo da usucapião mais curto), mas continua a ser um registo
enunciativo porque, para se poder registar a mera posse, supõe-se que ela seja pública – é necessário
demonstrar que a posse que se pretende inscrever no registo é pública.
A inscrição refere-se a um facto que, por si mesmo, já tem publicidade mesmo sem registo – por isso é que é
enunciativo: limita-se a, quanto muito, aumentar o conhecimento.
2. Efeito constitutivo
É constitutivo quando faz parte dos requisitos de constituição de um certo direito. Nesta situação, não basta
que exista um contrato a dar origem a um certo direito, é necessário que esse contrato seja inscrito no registo
– só quando estiver inscrito é que o facto aquisitivo está completo. Portanto, só quando o registo seja lavrado
é que o beneficiário do efeito o obtém.
1 Ex.: HIPOTECA – quando se constitui uma hipoteca (quando um devedor, para garantir o cumprimento das
suas obrigações perante o credor, dá em hipoteca um imóvel), a posse do imóvel hipotecado permanece com
o autor da hipoteca – o credor não obtém a posse sobre a coisa hipotecada (não há transferência sucessória).
Se é um qualquer imóvel que produz rendimento ao devedor e esse imóvel for entregue ao credor, o rendimento
deixa de ser obtido pelo devedor e haverá mais um motivo pra não conseguir cumprir as obrigações.
Desde sempre, na hipoteca, parte-se do princípio que a coisa hipotecada não se transmite e, é justamente por
este motivo que apareceu o registo predial: dado que não há transferência sucessória, só através do registo é
que se publicita a hipoteca. No caso da hipoteca, se não houver registo, não há maneira de publicitar a
existência da mesma, por isso, a lei colocou a existência do registo como facto constitutivo – a hipoteca começa
por nascer através de um contrato e exige-se o registo desse contrato (enquanto não houver registo, não há
hipoteca).
2 Ex.: podemos acrescentar as situações em que estamos perante um contrato promessa com eficácia real e
pacto de preferência com eficácia real – parece que o registo também é constitutivo – enquanto não houver
registo, não têm eficácia real.
Uma coisa é ser constitutivo e outra coisa é ser obrigatório. O registo ser obrigatório significa que se alguém
tem o dever de o requerer ou não, sujeita-se a sanções. A lei pode qualificar a ausência do registo como crime
de desobediência. No caso do registo constitutivo, é perfeitamente concebível que não seja obrigatório (o
interessado pode ou não fazer) – se não faz não tem a vantagem que deveria ter e o efeito do registo não se
produz.
O registo constitutivo é um ónus – é livre de registar e de não registar.
3. Efeito consolidativo/confirmativo
Está presente no artigo 5º/Nº1 do Código do Registo Predial.
É o efeito normal do registo, o efeito regra. Se o caso não é de registo enunciativo, nem constitutivo, é
consolidativo.
O efeito do registo é consolidativo quando o registo se limita a confirmar os efeitos de um facto que já estão
produzidos, mesmo sem registo – por isso é que o registo é confirmativo, vem apenas tornar inatacáveis os
efeitos que já estavam produzidos precariamente antes do registo.
Ex.: A vendeu um apartamento a B. Se a compra e venda está devidamente realizada (Escritura pública ou
documento autenticado) e não há vícios que impeçam os efeitos de compra e venda, B é proprietário do
apartamento, desde que a escritura foi feita (artigo 408º/Nº1 CC). O registo, aqui, não é necessário para nada
– não altera minimamente os efeitos que daqui resultam, ou seja, quer B registe ou não, B é proprietário. O
que acontece é que esses efeitos resultantes da compra e venda são precários/instáveis porque pode dar-se
o caso de, entretanto, aparecer uma outra pessoa a registar um facto incompatível com o de B, antes de B ter
registado.
B não registou de imediato. Entretanto, aproveitando-se da situação, A vendeu a C (situação
triangular). Aparentemente, A é o proprietário antes de vender ao C (não há razões para C desconfiar
de que A não é proprietário). Numa situação destas, a falta de registo por parte de B pode proporcionar
a aquisição do direito por C (C poderá estar nas condições do 291ºCC) e, nesta situação, se isso
acontecer, os efeitos da compra e venda a B cessam (B perde a propriedade para C).
Se o registo de B estivesse efetuado atempadamente, isto não aconteceria – o que estaria a produzir
efeitos a título precário passaria a ter efeitos definitivos e, nesse instante, se tivesse feio o registo, uma
situação como esta não podia sequer acontecer (o registo de C, nesta hipótese, não poderia ser
lavrado; nem mesmo a compra e venda poderia ser feita). Diz-se então que o registo tem efeitos
consolidativo porque, se B tivesse lavrado o registo, nada disto teria acontecido. Não tendo lavrado
registo, deixou aberta a possibilidade de isto acontecer.
Tudo o que não estiver no enunciativo e no constitutivo, está no consolidativo.
O que o registo pretende dar aqui é a oponibilidade para terceiros – os efeitos do facto registado produzem-se
para qualquer pessoa.
4. Efeito atributivo
Se alguém estiver a inscrever um facto, em si mesmo inválido, mas dada a situação, o registo é capaz de dar
a essa pessoa o direito que não obtiver pelo facto.
Ex.: A venda A-C é uma venda inválida, em virtude de a venda A-B ter produzido os efeitos normais de uma
compra e venda (não foi imediatamente inscrita mas é válida e produziu os seus efeitos entre A e B). Quando
A vende a C, para todos os efeitos, leva a compra e venda a registo – para todos os efeitos, está a ser inscrito
no registo um facto inválido (a conservatória não tem meios para saber que o bem era de B porque,
aparentemente, não há objeções à venda A-C). Está a ser registado um facto que não tem efeitos, que não
pode valer.
Contudo, se C estiver nas condições do 291ºCC, isso atribui-lhe um direito que a compra e venda não
lhe atribuiu. Uma dessas condições é o registo e só com o registo é que a aquisição do C está completa
– por isso, podemos dizer que o registo, nesta hipótese, é atributivo.
Numa situação deste género, para proteção do terceiro, teoricamente são concebíveis duas disposições legais:
Artigo 291ºCC ou Artigo 17º/Nº2 código do registo predial.
O artigo 17º/Nº2 supõe que a pessoa a quem se está a referir, ainda que apenas aparentemente, tenha registo
a seu favor.
Ex.: Para aplicar o 17º/Nº2, temos que supor que A teria registo a seu favor, antes de a compra e venda A-C
ser celebrada. Supõe-se que há registo prévio a favor do causante (pessoa de quem o terceiro adquiriu), ao
passo que o 291ºCC não pressupõe isto (não pressupõe que o causante tenha registo a seu favor). Pode
colocar-se a possibilidade de C, para efeitos do 291ºCC, ser o primeiro a registar. Se assim é, se aceitarmos
este critério, o 291ºCC quase nunca pode funcionar porque a hipótese de um terceiro ser o primeiro a registar
algo em relação a certo bem, na prática é quase impossível – tem que haver uma sequência de registos que
faça sentido e, de um modo geral, o que transmite não pode celebrar o ato de transmissão, se não tiver o
registo em favor.
Quem defende este critério pode simplesmente aceitar essa consequência e admitir apenas a aplicação do
291ºCC e nunca do 17º/Nº2.
É verdade que, em qualquer um dos casos, se pressupõe alguma invalidade anterior, mas o 17º/Nº2 está
referido ao 16º e o registo só é nulo nos casos deste artigo (casos de nulidade do ato do registo e não nulidade
do facto registado – se se regista uma compra e venda, uma coisa é a compra e venda e outra coisa é a
validade da compra e venda no registo). Os casos que o 16º estabelece são os casos em que o ato de registo
da compra e venda é inválido (não a compra e venda).
Ex.: Foi lavrado o registo da compra e venda A-B. O conservador, por desleixo, não assinou o registo. O registo
é nulo. A compra e venda não é nula.
É para situações deste género e para dar proteção a terceiros que existe o 17º/Nº2 – proteger terceiros da
nulidade do ato do registo.
Ao contrário, o 291ºCC existe para dar proteção a terceiros da invalidade do próprio facto sujeito a registo
(Compra e venda – se a compra e venda tiver vícios, o 291ºCC dá proteção ao terceiro contra essas
invalidades, no ato de transmissão – não dá proteção de vícios/invalidades do ato de registo).
Temos um efeito que resulta do registo para terceiros (REPÚBLICA) – é sempre idêntico, resulta sempre da fé
pública.
Fé pública
A Fé pública consiste no efeito do registo pelo qual se presume que o que está registado corresponde
exatamente àquilo que na realidade sucedeu. Autoriza terceiros a depositar confiança no conteúdo do registo
e a atuar com fundamento nas expectativas nele alicerçadas.
De acordo com o artigo 7º Código do Registo Predial, pode inferir-se que a presunção de fidelidade do registo
à realidade extra registal apenas se forma quando ele tenha caráter definitivo. O registo provisório (por dúvidas
e por natureza) não dá assento suficiente para se conjeturar tanto a completude como a exatidão.
Coincidência entre a realidade substantiva (fora do registo) com a realidade registal (inscrita no registo). Pode
ser um de dois sentidos/significados.
O sentido negativo é aquele onde o público pode partir do princípio de que o registo está completo, logo, tudo
o que aconteceu, do ponto de vista substantivo, está refletido no registo. Nada aconteceu substantivamente
que não esteja integrado no registo.
“Presume-se a completude do registo”.
Ex.: SITUAÇÃO TRIANGULAR – A, proprietário inscrito, vende a B um imóvel. B não registou. Passados 15
dias, B pediu o registo do imóvel, em seu favor. Durante esse período de tempo, A vendeu o mesmo imóvel a
C.
C pode partir do princípio que A é o proprietário do imóvel, apesar de substantivamente não o ser. Ou seja, C
pode assumir que a informação que obteve através do registo é verídica, assumindo que A é titular do direito.
C adquiriu direitos sobre o mesmo imóvel (que não foi inscrito a favor de B). O direito de C é incompatível com
o de B.
Não existindo registo a favor de B, C deve beneficiar da presunção de boa-fé. No entanto, essa presunção é
iuris tantum, podendo demonstrar-se o contrário (artigo 350º/Nº2 CC).
O sentido negativo é aquele onde se presume que todos os factos inscritos no registo aconteceram mesmo e
são válidos. Designam-se por situações lineares – pressupõem a existência de 3 pessoas, como nas situações
triangulares, mas aqui existe uma sequência. São 3 pessoas envolvidas e a fé pública é a favor da última sub
adquirente.
“Presume-se a exatidão do registo”.
Ex.: B é adquirente de A. C é adquirente de C e, por consequência, sub adquirente de A.
Descobre-se que a venda A-B tem uma invalidade (era uma simulação absoluta, ou seja, a compra e venda
não tem efeitos). Provando-se a simulação, a primeira venda não tem efeitos. Aqui, a prova de que a primeira
venda é simulada sucede depois de C ter adquirido e registado o imóvel. Assim sendo, C é beneficiário da fé
pública, podendo partir do princípio que B era titular do direito quando vendeu o imóvel e que a compra e venda
A-B era válida. C parte do princípio de que está a comprar ao legítimo proprietário que, por seu turno, comprou
legitimamente a A.
Do contrato promessa não resulta nenhum efeito real, não transmite nenhum direito real, não constitui nem
modifica nenhum direito real. Pode, no entanto, ter eficácia real.
O contrato promessa tem efeitos obrigacionais – a celebração do contrato definitivo – se o contrato promessa
for bilateral vincula ambas as partes à celebração do contrato definitivo. Se o contrato definitivo não foi feito,
há um incumprimento contratual que dá lugar à responsabilidade civil.
Todo o contrato promessa com eficácia real deve ser registado, mas nem todo o contrato promessa registado
tem eficácia real.
Tanto a doutrina quanto a jurisprudência apresentam dois conceitos de terceiros, para efeitos de registo
Conceito restrito – entende-se que só é terceiro, para efeitos de registo, quem tenha adquirido a
partir de um transmitente que seja comum a outro adquirente (para o terceiro e para a parte), no
pressuposto de a aquisição do terceiro ser incompatível com a de outro adquirente. Com este
conceito, ao dizer-se “transmitente” está a pressupor-se que a aquisição do terceiro é uma aquisição
pelo negócio jurídico, ou seja, assenta-se no pressuposto de que, para haver um transmitente, tem que
haver intervenção da vontade dessa pessoa – pressupõe-se que a transmissão é voluntária e para a
transmissão ser voluntária, supõe-se um negócio jurídico.
Ex.: B e C adquiriram (aparentemente), a partir da mesma pessoa (A). Assim, A é transmitente comum porque
é transmitente para o B e é transmitente para o C.
Conceito amplo – só se percebe definindo o conceito restrito. Pelo conceito amplo, é terceiro quem
tiver adquirido através de um facto sujeito a registo, não importando se esse facto aquisitivo é um
negócio jurídico ou não – o que importa é que seja um facto qualquer que é suscetível de fazer adquirir.
1 Ex.: A vende a B, B não regista de imediato. A vende a C – tanto pelo conceito amplo como pelo conceito
restrito, C é sempre terceiro.
2 Ex.: A vende a B, B não regista de imediato. C, que é credor de A, intenta uma ação executiva contra
este e nessa ação penhora o imóvel que A tinha, anteriormente vendido a B, mas que B não tinha
registado. O conflito é criado porque B comprou mas não registou esse negócio de imediato e, quando foi lavrar
o registo, já havia um registo de uma penhora, a pedido de C. Para todos os efeitos, é um direito real de
garantia porque não nasce por contrato – o facto jurídico, que leva à aquisição do direito real de garantia
por C, não é a vontade, não é o negócio jurídico (C adquire por outro facto qualquer – desde que não seja
um facto voluntário a partir de A, ou seja, desde que não seja um negócio jurídico).
É introduzido um novo conceito: Terceiro registal – é qualquer pessoa que não seja parte, a quem interesse a
informação que consta do registo (acaba por ser um conceito normal de terceiro). É terceiro que não for parte,
a quem interesse a informação.
O artigo 17º/Nº2 não atribui direitos, o 17º protege o terceiro contra vícios do registo.
Ex.: A vende a B validamente. B vende a C validamente, depois de C ter registado a sua aquisição, descobre-
se que o registo de B sofre de uma invalidade qualquer, nos termos do 16ºCódigo do Registo Predial (o registo
não foi assinado pelo conservador, o registo é nulo). Normalmente, a nulidade do registo de B iria prejudicar o
registo de C (não prejudica a aquisição, prejudica o registo – se o registo é inválido, os registos subsequentes
são inválidos). Contudo, se C estiver nas condições do 17º/Nº2, o seu registo mantém-se, mesmo que o registo
de B seja declarado nulo – a vantagem que o 17º/Nº2 oferece ao terceiro é a de permitir manter um registo que
não poderia ser mantido. Ao dizer-se que C pode invocar 17º/Nº2, estamos a dizer que mantém em vigor o seu
registo – não tem que se sujeitar às consequências de um novo pedido de registo. O registo não é afetado.
Quando falamos em efeito atributivo, pelo 291ºCC, estamos a dizer que é por esta via que se vai dar ao terceiro
o direito que ele não tinha adquirido subjetivamente.
Ex.: A venda a B é nula (simulação), mas antes de se darem conta de isso, B vendeu a C. Só depois da vende
de B a C é que alguém consegue comprovar que a compra e venda a B é nula, logo, a venda B-C também é
nula, por falta de legitimidade. Portanto, nesta hipótese, C não pode ser protegido e teria que restituir o imóvel
a A e depois entender-se com B, no que toca à restituição do preço e, portanto, logo se vê se B está em
condições de restituir o preço. Se o efeito atributivo estiver verificado pelo C, C torna-se proprietário – beneficia
do efeito atributivo.
Este artigo está, no fundo, concebido para a chamada situação linear (situação de dupla venda) – trata de
tutelar a posição do sub adquirente, que celebra o negócio jurídico, sem saber que o negócio jurídico anterior
padece de um vício.
Ex.: A vende a B e B vende C – todos os factos foram registados. Perante a situação da invalidade do negócio
entre A e B, se ele for declarado nulo, essa invalidade vai entrar também no negócio de B e C (venda de bem
alheio) – ou seja, se se tratar de bens móveis não sujeitos a registo, a proteção de C não ocorre e o bem
regressa a A.
Mas, estando em causa bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo, nesse caso aplicamos o artigo 291ºCC,
que estabelece que, em certas situações, a invalidade do primeiro negócio não afeta o direito real adquirido
por C, se se verificarem todos os requisitos deste artigo. Se o efeito atributivo estiver verificado para C, então
C passa a ser proprietário.
Se está protegido pelo 291ºCC, está protegido pelo 17ºCódigo do Registo Predial.
Se está protegido pelo 17ºCódigo do Registo Predial, não está protegido pelo 291ºCC, a não ser que cumpra
os restantes pressupostos.
Estes requisitos são cumulativos – têm de estar todos verificados para que o efeito atributivo se produza.
Verificados todos os requisitos, o terceiro adquire o efeito atributivo – C passa a ser titular do direito que estava
em causa, pelo 291ºCC (a compra e venda A-B é nula e, consequentemente a compra e venda B-C também,
mas C adquire o direito de propriedade por ter preenchidos todos os requisitos do 291ºCC).
Titularidade efetiva.
Quando alguém exerce um direito real, supomos que essa pessoa tem o direito correspondente à sua atuação
– atua como sendo proprietário e é mesmo proprietário. Esta é a titularidade real.
Depois, há outras situações, onde uma pessoa aparenta exercer algum destes dreitos sem o ter – aparenta
ser proprietário e não o é. Esta é a titularidade aparente.
Daqui decorre a sobreposição de direitos – sempre que esteja constituído um direito real menor, supõe-se que
sobre essa coisa (objeto desse direito) existirão, pelo menos, 2 direitos (propriedade + direito real menor em
causa). Ex.: se a propriedade estiver hipotecada, há 2 direitos sobre a mesma coisa (propriedade + hipoteca).
Nestas duas últimas, os direitos em concorrência são de qualidade diferente e, portanto, um dos direitos há-de
prevalecer sobre o outro. Quando se diz que um prevalece sobre o outro, não se analisa em termos de
importância – é uma questão de saber, no exercício dos direitos, qual é o que se exerce primeiro e qual é o
que se exerce depois.
Ex.: A é devedor de B e de C. Em relação a B, tem uma dívida de 200 mil euros e, em relação a C, tem uma
dívida de 400 mil euros. Para dar em hipoteca, A é proprietário de um imóvel que vale 300 mil euros. A pode
dar ao B uma hipoteca pelo valor daquele imóvel e pode dar a C uma segunda hipoteca pelo valor dos 400 mil
euros de que C é credor. Supondo que o imóvel vale mesmo os 300 mil, este valor chega para cobrir a
obrigação com B (200 mil), em relação a C só chega para cobrir uma parte, não a totalidade.
Dos 300 mil que esse imóvel vale, B vai retirar o seu dinheiro e o que sobrar vai para C – o exercício por parte
do primeiro credor hipotecário já acaba, na prática, por excluir o exercício pelo segundo – o exercício por um,
geralmente, não exclui o exercício por outro.
PROPRIEDADE TEMPORÁRIA:
Quando se fala em propriedade temporária, há duas hipóteses:
Objetivamente temporária – quando esteja sujeita a um prazo de duração
No código civil, diretamente, não há nenhuma hipótese prevista, deste género – há uma situação em que isso
pode acontecer: o direito de superfície (artigo 1524º e ss. CC) – é o direito de construir ou plantar em solo
alheio, mas é sobretudo o direito de, depois, manter essa construção/plantação em solo alheio.
Ou seja, constituindo o direito de superfície, dá-se uma separação jurídica entre a propriedade do solo e a
propriedade das plantações/edificações no solo (uma pessoa é proprietário do chão e outra é proprietária das
plantações incorporadas nesse chão).
O titular da plantação é designado de superficiário – o direito de superfície, em si, é um direito real menor, logo,
não coloca problemas em termos de definição da propriedade; mas, o direito de superfície apenas permite
manter a edificação em solo alheio (é o direito de usar o solo de outra pessoa, para aí manter uma edificação).
Falta, assim, saber qual é o direito que existe a favor do superficiário sobre a própria edificação: tem-se
entendido que esse direito é direito de propriedade.
O superficiário tem 2 direitos – direito de superfície (direito de usar o solo de outra pessoa para aí manter
uma edificação) e tem o direito de propriedade (sobre essa edificação).
Vendo assim, quando o direito de superfície seja temporário (tenha um prazo), forçosamente, a
propriedade sobre a edificação também tem um prazo – logo, a propriedade aqui é temporária. Chegando
o termo do prazo, a edificação é adquirida pelo proprietário do solo.
Subjetivamente temporária
O artigo 62º do Código do Registo Predial, a propósito da propriedade privada, além de garantir o direito à
indemnização, garante também o direito à sucessão mortis causa. Portanto, os titulares da propriedade
privada têm o direito de fazer com que o que lhe pertenceu em vida, em termos de propriedade, depois se
transfira para as pessoas que lhe devam suceder.
A propriedade nunca é perpétua (nós não duramos para sempre), logo, se a propriedade se extinguisse pela
morte do proprietário, toda a propriedade seria temporária (por definição, a morte é certa). Ao assegurar-
se o direito à sucessão mortis causa, no plano constitucional, está a dizer-se também que a propriedade é
perpétua para esta vida – com a morte do titular, os objetos da propriedade privada são transferidos para
quem o proprietário entender e assim sucessivamente.
Há uma hipótese, prevista a propósito das sucessões: substituição fideicomissária – é uma situação em que
o proprietário, por testamento, designe um sucessor para um certo bem mas, ao mesmo tempo, nesse
testamento, estabeleça que, por morte do primeiro sucessor, o direito deixado pelo testamento passa para
outra pessoa.
Ex.: A (proprietário) deixa a B. A já estabelece que, com a morte de B, o bem vai ser entregue a C. Por morte
do primeiro sucessor não sucede uma pessoa qualquer, sucede aquele que A decidiu. O primeiro
sucessor (B) é chamado fiduciário e o outro é fideicomissário – como ambos estão pré designados pelo A, o
fideicomissário é sucessor de A e não de B. Ou seja, ambos são sucessores de A mas, em vez de sucederem
ao mesmo tempo, sucedem sucessivamente. Por morte de B, o bem não vai para sucessores mortis causa do
fiduciário, mas sim para outra pessoa que está designada pelo proprietário (A). B (primeiro sucessor) não tem
sucessão – segue a via que foi definida pelo autor do testamento.
O primeiro sucessor é proprietário? Este tem menos poderes dos que são, normalmente, concedidos ao
proprietário – em geral, não pode dispor (não pode vender, doar, permutar, etc.) porque a lógica é a de que o
bem passe para outra pessoa que está determinada – poderá dispor, muito limitadamente, porque o único
titular que poderá dispor desta forma é o proprietário (o fiduciário é um proprietário com muitas limitações).
Embora a lei regule muita coisa a propósito da propriedade, uma grande parte das regras que se aplicam à
propriedade aplicam-se, também, a outros direitos reais. O Código civil não tem uma parte geral aos direitos
reais. Portanto, há a necessidade de aplicar muitas regras da propriedade a outros direitos reais, que não são
de propriedade.
No que toca à defesa da generalidade dos direitos reais, temos que distinguir:
Ações possessórias – são ações em que apenas está em discussão a posse, saber quem tem a
posse ou quem tem melhor posse sabendo que ambos a têm. A posse é protegida através de ações
possessórias, por si própria, mesmo que não haja o direito real que justifique a posse.
Ações petitórias – o que está em causa é a defesa do próprio direito real que esteja legitimado a
fundamentar a posse. A ação destina-se, sobretudo, à defesa do próprio direito e, por
consequência, acaba por defender também a posse. Isto supõe que nestas ações, o autor da ação
tenha possibilidade de provar que é titular do direito.
Tem legitimidade ativa quem for proprietário ou titular de outro direito real.
Tem legitimidade passiva quem tiver a coisa objeto da reivindicação em seu poder, não a devendo ter.
Não tem prazo – enquanto houver direito de propriedade há direito a obter a reivindicação.
“Salvo que terceiro possa invocar usucapião” – se aquele que deve fazer a restituição puder invocar
usucapião, não tem que restituir. Assim que o réu estiver em condições de invocar a usucapião e o
fizer, o direito de propriedade do autor extingue-se. Não é caducidade direta, mas é caducidade indireta
– graças ao prazo que decorreu a favor do réu.
Em princípio não tem prazo – existirá o direito de intentar esta ação, enquanto o direito que o autor alega ter
existir.
Não pode haver caducidade porque, enquanto o direito de propriedade existir, o direito de praticar esta
ação persistirá.
Não tem prazo – enquanto a propriedade existir pode recorrer-se a esta ação.
Não é ação de condenação mas sim ação de arbitramento, no sentido de que, no ponto de vista processual,
nestas ações não há autor nem réu – alguém terá tido iniciativa de iniciar o processo e, ao ter iniciativa, força
os demais a intervir no processo. Não há autor nem réu porque os próprios confinantes têm o dever de contribuir
para esclarecer a dúvida relativamente à linha divisória.
Feito o pedido, o tribunal irá analisar se aquele pedido deve ou não ser indeferido.
Numa ação de arbitramento, o tribunal não pode tomar esta atitude – não conseguem provar, sendo assim, o
pedido é indeferido. É objetivamente importante que se comece a divisória e se uma prova apresentada por
uma parte não for tida como suficiente, o tribunal tem que estabelecer uma localização para a linha divisória.
Em última análise, não havendo prova suficiente, o tribunal terá que dividir a parcela em litígio ao meio.
O tribunal tem que sempre demarcar – se a prova efetuada pelas partes não chega, o tribunal tem que tomar
uma decisão.
Porventura se entende que a linha divisória situa-se mais aquém ou mais além e isso significa que aquele que,
desta maneira, perder uma parcela do seu terreno, vai ter que entregar ao outro – terá que haver restituição
de uma parcela (faz-se o mesmo que se faz numa ação de reivindicação).
Ao faltar uma parte geral relativa aos direitos reais, isso faz com que a lei tenha entrado logo na regulamentação
do direito de propriedade plural, mas tem que se afirmar depois que as regras da compropriedade são aplicadas
à contitularidade de outros direitos reais.
Embora a lei tenha formulado as regras relativamente à compropriedade, são extensivas à contitularidade de
outros direitos reais.
A compropriedade distingue-se, à partida, em comunhão de mão comum (germânica) e comunhão por quotas
(romana):
1. Comunhão de mão comum (germânica)
Não há distinção de medidas de participação – cada comproprietário é participante na comunhão por razões
que transcendem a compropriedade, ou seja, ali, a compropriedade é só uma manifestação de uma comunhão
qualquer que é mais profunda.
Ex.: “Os terrenos baldios não são de ninguém” – são de alguém, não são de alguém determinado. O baldio
pertence a uma certa comunidade local e, portanto, todos os membros dessa comunidade (todos os que
residem na freguesia e pertencem à freguesia) podem utilizar o baldio porque o baldio está ao serviço daquela
comunidade. A razão principal para serem comproprietários do baldio é por ser moradores daquela freguesia
– cada um usa na medida do necessário para si, desde que não exclua o usufruto pelos outros (a menos que
se tenham estabelecido regras de utilização). A compropriedade, ali, estabelece-se por razões instrumentais.
Assim que a pessoa deixa de pertencer à freguesia, deixa de ser comparte do baldio. Um comparte não pode
tirar partes específicas do baldio. O objeto pertence a todos enquanto todo – há um direito de propriedade que
incide sobre o baldio e esse direito pertence a todos os compartes.
No entanto, quando falamos de imóveis (principalmente terrenos), esta ideia fica diluída:
1 Ex.: A e B são comproprietários de um terreno. É vulgar que dividam a utilização (A fica com o lado direito e
B com o lado esquerdo) – isto vai perdurando. Com o tempo, aquilo que era uma divisão passa a ser visto
como coisas individuais (o lado direito é de A e o lado esquerdo é de B). Não são terrenos diferentes, é o
mesmo terreno com dois proprietários.
2 Ex.: duas pessoas são comproprietárias de terrenos grandes (100 hectares) e resolvem lotear (fazer parcelas
de terreno). Puseram os lotes À venda – alguém, perto do terreno, ia vendendo os lotes – esse terreno não foi
juridicamente dividido. Partir um terreno implica que sejam cumpridas diversas regras. Quem comprava os
lotes achava que o lote era seu e construía. Estas pessoas, que compraram os lotes e construíram, são
comproprietários porque aquilo que não foi dividido devidamente – há um terreno que foi dividido e onde cada
pessoa utiliza uma parcela desse terreno, como se fosse apenas dela (não é) – todos podem usar tudo porque,
para que haja divisão, tem que se pôr termo à compropriedade. Enquanto houver uma coisa comum, tudo é de
todos.
Qualquer divisão que se faça sem extinção da compropriedade, é divisão entre as partes mas,
juridicamente, a coisa continua a ser comum – cada comproprietário tem o direito de propriedade sobre o
todo (todos são proprietários de tudo), mesmo que em termos quantitativos os direitos não sejam todos iguais
(podem as respetivas quotas não ser idênticas – no 1403º/Nº2 CC, a lei presume que as quotas são iguais
mas podem não ser). A percentagem que cada um tem não se protege no todo (não há parcelas especificadas).
Esta quota só dá a medida de participação – as quotas ideais que cada um tenha definem a respetiva
participação nas vantagens, nos benefícios e nas desvantagens que a coisa possa proporcionar (Se houverem
rendimentos a dividir, dividem-se pela quota; as despesas são calculadas pela quota, mas não há direitos sobre
partes especificadas/individualizadas). As partes especificadas são de todos – se cada um é dono do todo,
juntamente dos outros, cada um é dono de cada parte desse todo.
Enquanto permanecer a compropriedade, o objeto está indiviso.
A lei, quando usa o conceito de parte especificada, é para dizer o que é que os comproprietários não tê.
Na comunhão normal, o comproprietário não tem direitos sobre a parte especificada.
Este conceito serve para dizer que o comproprietário não pode atuar sobre parte especificada da coisa, porque
é parte da coisa comum.
O conceito de quota ideal serve para definir o que é que cada um pode – cada comproprietário pode o que
entender, na medida da sua quota.
Daqui decorre o PRINCÍPIO DA PARIDADE – os comproprietários, em termos qualitativos, são iguais (pares)
– têm todos o mesmo direito, da mesma espécie.
Daqui decorre que, como regra geral, quaisquer decisões devem ser unânimes (há muitas exceções) – em
princípio, sendo todos igualmente proprietário, se existem questões que afetam a propriedade, são decisões
que respeitam a todos.
Este princípio (regra) tem exceções, há situações em que não é necessária a unanimidade.
1. Há situações em que basta a maioria – para que uma decisão seja tomada, basta que a maioria dos
comproprietários tome a decisão.
É, fundamentalmente, a hipótese que está contemplada no 1407ºCC – em princípio, cada comproprietário pode
administrar a coisa comum individualmente, ou seja, sem intervenção dos outros.
Este artigo, em parte, remete para o 985ºCC – contrato de sociedade,
Ex.: se a casa é comum e o vidro da janela se partiu, basta que um deles tome a decisão – toma a decisão em
benefício de todos.
Se houver oposição – se algum se opuser a que um deles se decida quanto à administração, então a maioria
deve decidir. Essa maioria é dupla (no sentido de que é uma maioria de pessoas – mais do dobro – e é
necessário que essa maioria de pessoas represente, também, a maioria de quotas).
2. No que diz respeito à utilização da coisa comum, cada qual pode usar a coisa objeto de
compropriedade livremente, mas tendo em atenção que os outros comproprietários têm também direito
de utilização.
Assim, o exercício do direito de utilização por um não pode prejudicar os demais. Por isso, deve ser feito um
acordo de utilização da coisa comum (artigo 1408ºCC) – os comproprietários podem estabelecer as regras que
entenderem, do modo que entenderem, desde que isso seja apenas relativo à utilização. Entende-se que essas
regras de utilização apenas valem internamente e não são oponíveis a terceiro. Dando-se a entrada de novos
comproprietários, estes não são abrangidos por essas regras.
Ex.: a utilização do terreno que é objeto de compropriedade, através da repartição por frações é perfeitamente
legítimo, desde que se trate apenas de uma divisão de utilização.
3. Cada comproprietário tem o poder de dispor/onerar livremente o seu direito, na medida da sua quota
(artigo 1408ºCC).
O que está neste artigo é um conjunto de redundâncias – se, na compropriedade, cada comproprietário tem
um direito de propriedade distinto dos demais, cada qual pode fazer o que entender com o seu direito (vender,
doar, hipotecar, etc.), desde que o esteja a fazer na medida do seu direito, na medida da sua quota.
Isso não afeta os direitos dos demais comproprietários.
Cada comproprietário não pode alienar/onerar alguma parte especificada da coisa comum, porque a
parte especificada é uma parte física/material da coisa comum e, portanto, pertence a todos. Na
compropriedade pro indiviso, nenhum dos comproprietários tem direitos exclusivos sobre partes
especificadas, tal qual não têm direitos exclusivos sobre a coisa comum.
Qualquer divisão que haja é divisão de utilização e, por isso, se no terreno que está em compropriedade
algum dos comproprietários demarcar uma parcela de terreno e a vender, essa venda equivale a venda
de bem alheio porque o que está a ser alienado é só parcialmente próprio
4. Para haver uma limitação do poder de disposição de cada comproprietário, na medida em que nos
termos do 1409ºCC, quando o comproprietário proceda à venda ou à dação em cumprimento do seu
direito (só nestas duas hipóteses – não é qualquer ato de alienação), os demais comproprietários têm
preferência na alienação do direito daquele que quer vender.
O comproprietário que pretende vender deve dar conhecimento aos demais comproprietários, para que estes
decidam se querem ou não querem preferir. Não sendo cumprido este procedimento, os outros
comproprietários podem recorrer a ação de preferência para obterem a respetiva substituição no lugar do
adquirente. Isto não impede a alienação, nem constitui um obstáculo – o comproprietário deve apenas dar
conhecimento do que pretende fazer.
A divisão far-se-á havendo acordo entre os comproprietários e far-se-á judicialmente na falta de acordo, sendo
necessário o tribunal decidir. A decisão voluntária, tratando-se de imóveis, fica sujeita a escritura pública ou
documento autenticado.
Acrescenta-se que os comproprietários, contudo, podem convencionar a indivisão, ou seja, pode haver uma
cláusula pela qual os comproprietários (unanimemente) tenham decidido excluir-se a si próprios do direito de
impor a divisão (a lei estabelece um prazo máximo de duração dessa cláusula – 5 anos – podendo ser
renovada), independentemente da sua quota.
Com esta cláusula, seja como for ou quem for, fica impedido de impor a divisão por aquele prazo, no máximo,
ainda que se admita a renovação por período idêntico. Esta cláusula é suscetível de registo – mesmo que
algum dos comproprietários tenha alienado a sua quota a terceiro, o novo comproprietário terá que respeitar a
cláusula de indivisão.
Quando a divisão seja material, aplicam-se as regras da partilha da herança (2119ºCC), o que significa que a
divisão tem caráter retroativo. Portanto, ficciona-se que nunca houve compropriedade e que cada um dos
comproprietários existiu (em que foi constituída). A ideia central é a de que se eram comproprietários de um
terreno com 15 hectares e o dividiram em 3 parcelas com 5 hectares cada – cada um é proprietário exclusivo
da sua parcela com 5 hectares.
Isso significa que, se algum deles hipotecou o seu direito, hipotecou na medida de um terço e não sobre uma
certa parcela de terreno porque o terreno é de todos.
Perante a divisão formal, a parcela que vier a caber àquele proprietário que hipotecou o seu direito, é a parte
que fica hipotecada.