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Direitos Reais

Conceito de direito real

Os direitos reais são direitos sobre coisas, ou seja, na essência não são direitos contra outras pessoas.

De acordo com a teoria realista, o direito real é qualquer direito que incida sobre uma coisa, na medida em que
implicaria o que se chama de poder material sobre a coisa (no sentido de que quem tem direito sobre alguma
coisa tem direito de a manipular).
Esta teoria foi criticada e chegou-se à conclusão de que há uma série de direitos que geralmente são
classificados como reais que não cabem nesta qualificação, como é o caso da hipoteca que não implica
poderes materiais para o credor, sobre a coisa hipotecada.
Ex.: A, para comprar uma casa, pede um empréstimo ao banco. O banco empresta o dinheiro mas com uma
garantia – a hipoteca sobre o imóvel comprado. Constituída a hipoteca a favor do banco, o banco não fica com
nenhum poder material sobre o apartamento. O que foi comprado com aquele empréstimo bancário continua
a pertencer a quem comprou e essa pessoa é que dispõe o imóvel (A). Só do ponto de vista jurídico é que se
pode dizer que a casa está hipotecada porque, materialmente, não há diferença nenhuma entre estar
hipotecada ou não. Externamente, o proprietário continua a usar o imóvel sem qualquer limitação, ainda que
esteja hipotecado.
No que toca a direitos de preferência, sabemos que estes podem ter eficácia real. Nessa situação, o promitente-
comprador que tiver este contrato tem o direito de impor a aquisição, contra o promitente-comprador e contra
terceiros.
Ex.: A prometeu vender a B o apartamento e essa promessa tem eficácia real. Se A vender o apartamento a
C, violando a promessa que fez a B, B pode exercer o seu direito de aquisição contra A e contra C. tem-se
entendido que este também é um direito real (de aquisição) que não implica qualquer poder de utilização sobre
coisas.
Se entendermos o conceito de direito real, em termos materialistas, o resultado é o de um conceito de direito
real extremamente restrito.
A teoria realista torna impossível admitir os direitos reais de garantia e de aquisição.

Surge, então, a teoria personalista. Para esta, todos os fenómenos jurídicos integram-se dentro de uma relação
jurídica, ou seja, sempre que se atribui um direito a alguém, isso implica a existência de uma relação jurídica.
Ex.: A é proprietário de um computador. Quem está obrigado a respeitar a sua propriedade? Qualquer pessoa.
O direito vale contra qualquer pessoa.
Assim, a diferença entre um direito real e um direito de crédito estaria do lado passivo: nos direitos de crédito,
os devedores são determinados e nos direitos reais os devedores são toda a gente (indeterminados). Em
termos formais isto está bem pensado e construído, mas em termos materiais isto não faz sentido – dizer que
todas as pessoas do mundo estão obrigadas a respeitar o direito levaria à necessidade de estabelecer
centenas de milhões de relações jurídicas.

Assim e para evitar a discussão doutrinária, o direito real é o direito que permite ao seu titular exercer o
direito de atua autonomamente sobre uma certa coisa, nos moldes que esse direito permite. O que
importa em qualquer caso é que os poderes concedidos sejam poderes de atuação autónoma, isto é, são
poderes que não estão dependentes da colaboração de outra pessoa para serem exercidos.
Ex.: um credor hipotecário, para hipotecar um imóvel que lhe foi dado em hipoteca, não precisa que o devedor
colabore.
Ex.: o promitente-comprador pode executar a promessa, independentemente de o promitente vendedor ou
terceiro quererem ou não. A execução obtém.se por vontade do titular do direito.

Os direitos reais são uma espécie de direitos absolutos.


De um modo geral, os direitos absolutos são aqueles que existem por si, ou seja, são absolutos no sentido de
que existem por si próprios, não dependendo de outra situação jurídica de outra pessoa, que seja simétrica.
Nos direitos absolutos, a relação entre duas pessoas não é necessária porque o direito, que o respetivo titular
beneficia, incide diretamente sobre o bem que o afeta e, por isso, outras pessoas são irrelevantes.
Neste sentido pode dizer-se que, nos direitos absolutos, o titular do direito tem autonomia na forma como
utiliza/dá uso ao bem que lhe está afetado.

Ex.: A é proprietário de um automóvel. Para poder tirar desse automóvel os benefícios que este lhe pode
proporcionar, A não depende de outra pessoa. Em termos práticos, podem haver exceções: se a pessoa sofre
de alguma deficiência que a impede de conduzir o automóvel, para o fazer precisa de outra pessoa, depende
de outra pessoa.

Nos direitos absolutos, para que o titular do direito obtenha a execução da sua pretensão, não depende da
cooperação de outra pessoa.
Nesse sentido, pode dizer-se que, nos direitos reais, existe um poder direto e imediato sobre a coisa. Ou seja,
o proprietário, o titular, etc. não dependem da colaboração/cooperação de outra pessoa para exercerem o
direito de que beneficiam, nos termos em que esse direito lhe está concedido.
É um direito imediato, no sentido de que não depende da cooperação de outra pessoa.

É tradicional aceitar que os direitos reais obedecem a uma de 3 categorias:


1. Gozo – são aqueles que possibilitam a utilização, a fruição (obtenção de rendimentos) a partir de uma
coisa sob a qual o seu direito incide.
Existem direitos reais e direitos pessoais de gozo (407ºCC).
Ex.: Direito do comodatário – supondo que há um contrato pelo qual o proprietário de uma coisa cede a sua
utilização a outra pessoa, o comodatário tem um direito de utilização decorrente do contrato de empréstimo
mas, segundo a própria lei, este direito não é real, é pessoal.
A diferença já não se consegue estabelecer através do poder direto imediato, porque o comodatário, para
utilizar a coisa que lhe foi emprestada, não precisa da colaboração de ninguém.
Este poder direto imediato verifica-se nos direitos reais de gozo, mas também nos direitos pessoais de gozo.
2. Garantia – são direitos acessórios de um direito de crédito (supõem um direito de crédito) e servem
para garantir/assegurar que, caso o devedor não cumpra, o credor pode executar (penhorar e vender)
o bem/coisa/objeto/garantia.
3. Aquisição – são aqueles que permitem a aquisição de outro direito, como os direitos legais de
preferência com eficácia real.

O credor que beneficia de uma hipoteca nunca tem o objeto hipotecado em seu poder.
Ex.: A (banco) emprestou 300 mil euros a B para B comprar uma casa. O banco não empresa sem a garantia
de que o dinheiro será restituído acrescido dos respetivos juros. B compra a casa e fica hipotecado por A. Em
termos práticos não acontece nada de especial (B torna-se proprietário e utiliza a casa) – o imóvel comprado
não é entregue ao banco. O poder que A tem, caso B não restitua o dinheiro, é de promover a penhor o imóvel
hipotecado e fazê-lo vender.
O poder direto imediato deve ser visto, não como um poder físico, mas sim como poder de autonomia.
Um comprador não tem o direito imediato sobre o objeto que comprou sem que o vendedor colabore porque o
vendedor tem que entregar o objeto.

Na distinção entre direitos reais e direitos pessoais, há implicações:


De um modo geral, o decurso do tempo de inatividade (o facto de alguém ter um direito e não o exercer durante
um período de tempo) pode provocar a extinção.
Nos direitos reais já uma forma própria de extinção, através do não uso (298º/Nº3CC).
A lei circunscreve a usucapião apenas a constituição dos direitos reais de gozo.
Ex.: Se alguém utiliza alguma coisa que não lhe pertence, sem a oposição do proprietário e utiliza-a como se
fosse proprietário dessa coisa, ao fim de 20 anos pode invocar usucapião e ver-lhe concedida a propriedade
da coisa por usufruto, através do usucapião.
Oponibilidade erga omnes

Para se estabelecer a diferenciação entre direitos reais e direitos não reais, tem que se recorrer a um critério
suplementar: oponibilidade erga omnes (para ser direito real, o poder direto imediato vale perante terceiros).
Ex.: A empresta uma casa a B. Ainda que o contrato de empréstimo tenha um prazo de utilização, o direito de
utilização só vale entre B e A, não vale fora desta relação. Se A vende o imóvel a C (sem que o prazo esteja
verificado) o comodato não é aplicável a C. ou seja, C pode exigir a restituição do imóvel em causa porque,
com o facto de A ter vendido a C sem respeitar o prazo, faz com que B possa invocar responsabilidade civil
perante A mas não perante C.
Se A, em vez de ter comodato a favor de B se tivesse dado em usufruto a B, quando A vendesse a C, C iria
adquirir a propriedade, mas teria que suportar a existência do usufruto porque o usufruto é oponível perante
terceiros.
Assim sendo, concluímos que o Código Civil concebeu um certo conceito de direito real e esse conceito supõe
a existência da oponibilidade perante terceiros.

De um modo geral, a oponibilidade erga omnes pressupõe a publicidade. Isto é, só faz sentido dizer que um
direito é oponível a terceiros, no pressuposto que esses terceiros podiam conhecer a existência do referido
direito e, precisamente porque podiam conhecer, são afetados pela tal existência desse direito, conheçam ou
não.
A publicidade de direitos sobre imóveis é assegurada pelo registo predial.
Ex.: Quando A constituiu o usufruto a B, do tal imóvel, foi inscrito no registo predial e C, quando compra, mesmo
não sabendo efetivamente, deveria saber que existia um usufruto – deveria estar inscrito no registo.
Para que haja oponibilidade, pressupõe-se a publicidade. Só aquilo que for público é que é oponível. Há, no
entanto, exceções (situações em que se garante a oponibilidade, não obstante a falta de publicidade).

Publicidade espontânea e provocada.

De um ponto de vista jurídico, a publicidade distingue-se em publicidade espontânea e provocada.


A publicidade provocada/intencional dá-se quando se faz usufruto de um instrumento ou meio especificamente
instituído para dar a conhecer. É provocada porque aquele que recorre a esse instrumento ou meio tem em
vista dar a conhecer através da publicidade.
A publicidade espontânea é aquela que não é feita mediante instrumentos ou processos que estejam
destinados a dar a conhecer, embora indiretamente seja dado a conhecer. É espontânea porque se obtém a
publicitação, embora através de um meio não concebido para esse efeito.
Ex.: Quando divulgamos o nosso nome, estamos a identificar-nos, ou seja, estamos a dar publicidade a cada
um de nós. Indiretamente acabamos por dar publicidade, mesmo que essa não seja a intenção principal.
Ex.: A posse, juridicamente, consiste no domínio factual sobre uma coisa. Com a utilização, por exemplo, de
um automóvel, aparenta ser proprietário do mesmo, ainda que não seja. Isto é, a finalidade que leva à utilização
não é dada a conhecer, mas indiretamente acaba por ser publicitado. Ou seja, acaba por existir uma aparência
de que o bem pertence à pessoa.
Tratando-se de coisas imóveis, a publicidade não é importante porque essa publicidade já é realizada através
do registo predial.
No que toca a coisas móveis não registáveis, o único meio de as publicitar é a posse. Assim sendo, a
publicidade espontânea é pouco, ou nada, fidedigna pois não se pode confiar em tudo o que seja publicidade
espontânea.

Publicidade registal e não registal.

Dentro da publicidade provocada, existem 2 tipos de publicidade: registal e não registal.


A publicidade registal é aquela que está obrigada a conexionar factos, de modo que, quando alguém pede
informação, por exemplo, a uma conservatória, a conservatória possa dar essa informação total ou
integralmente.
A publicidade não registal é aquela que apenas dá a conhecer um certo facto, sem conexionar esse facto com
outros. À conta da não conexão, a publicidade é provocada mas não é registal.
Registo Predial

É obrigatório escrever/registar as aquisições?


O sistema tradicional era no sentido de a inscrição no registo não ser obrigatória, isto é, cada adquirente que
entendesse que deveria registar a ação poderia registá-la. Eventualmente, a falta de registo poderia acarretar
desvantagens/perdas de benefícios, sempre que outra pessoa tivesse inscrito factos incompatíveis.
Assim, a tradição foi no sentido de estabelecer o registo predial como um ónus – o adquirente de qualquer
sobre o imóvel podia optar licitamente entre registar ou não registar esse bem, sujeitando-se a consequências
negativas caso não registasse.

O adquirente de direitos sobre imóveis é chamado de sujeito ativo. Estabeleceu-se que não é o sujeito ativo
que deve inscrever o bem, e sim a entidade que veio na formalização do ato sujeito a registo.
Supondo a compra e venda de um imóvel – esta deve ser feita por escritura pública ou documento autenticado,
e o que se estabeleceu foi: quando a partes recorrem a uma destas entidades para realizar a compra e venda,
essa entidade é que fica com o dever de fazer o registo para esse sujeito ativo – quem deve recorrer ao registo
para o comprador, é o notário.
Este dever, do notário, resulta da sanção a que está associado o pedido de registo – está sujeito a um preço.
Ex.: A pretende registar o seu imóvel, que comprou de B. O registo custa 150 euros. Se, porventura, o notário
não inscrever a aquisição do imóvel no registo, dentro do prazo de que dispõe (30 dias, geralmente), o notário
deve entregar 300 euros (o dobro do valor do registo), a título de castigo por não ter cumprido a obrigação do
registo dentro do prazo.
Deste modo, num certo sentido, temos um registo obrigatório – é obrigatório para o intermediário, para quem
faz a formalização e deve pedir o registo a favor do interessado.
O interessado pode sempre registar (ele próprio), mas não está obrigado a fazê-lo.

Descrição e inscrição

O registo predial tem duas espécies de assentos: a descrição e a inscrição.


A Descrição traduz-se na identificação do prédio. A descrição não é fiável sobre a própria lei porque contém
elementos puramente factuais (localização do prédio, área do prédio, etc.). A informação constante na
descrição não tem significado, não tem valor – quem pede a informação não pode fazer fé do conteúdo da
descrição.
A Inscrição são os assentos pelos quais se registam os factos jurídicos (compra e venda, doação, hipoteca).
Em relação às inscrições, qualquer terceiro pode fazer fé no seu conteúdo porque considera-se que a
informação constante na inscrição é verídica (artigo 7ºCódigo do Registo Predial).
Ex.: Se consta no registo que A vendeu ao B, parte-se do princípio que isso é verdade, ainda que tenha
ocorrido, por exemplo, uma simulação.

Qualificação

Esta presumível veracidade que as inscrições têm está fundamentada no que se designa a qualificação, no
código de registo predial.
Isto é, o registo faz-se a pedido (seja do próprio interessado ou da entidade que formalizou o ato sujeito a
registo, por exemplo, o notário). Cabe à conservatória apreciar o pedido de registo em todos os seus aspetos
– no que respeita à legalidade registal (averiguar se o ato sujeito a registo consta do documento exigido por
lei, se está assinado pelo notário que a elaborou, se está assinado pelo comprador e pelo devedor, se os
emolumentos de registo foram pagos, etc.); e no que respeita à validade substantiva (apreciar a legitimidade
das partes, a possibilidade do objeto, algum vício da vontade de contratação) – artigo 68º Código do Registo
Predial.
Diz-se que a atuação do conservador, neste capítulo, é parecida com a do tribunal: com uma forte limitação. A
apreciação faz-se em função dos documentos apresentados (o único meio de prova a que a conservatória
pode decorrer é o documental) – isto acaba por limitar muito o alcance da qualificação, porque há uma série
de eventuais defeitos/vícios que o ato não pode apresentar.
A qualificação garante alguma veracidade (não garante a veracidade integral) e, por isso, não é de estranhar
que estejam inscritos no registo atos inválidos, se o conservador não tiver mais para averiguar acerca dessa
invalidade (se não for possível identificar alguma validade).
Ainda que sofrendo estas limitações, a verdade +e que a apreciação do pedido de registo é feita por um jurista
qualificado (um jurista cuja função é verificar pedidos de registo).
Assim, onde o conservador não encontrou impedimentos para o registo, o público que acede ao registo não
pode duvidar.
O fundamento da república está na codificação – é substancial – e pode partir-se do princípio que o contrato
que o conservador mandou registar não tem vícios, aparentemente. E é por isso que se pode afirmar que o
registo contém informação, em princípio, fidedigna (FÉ PÚBLICA).

Modalidades de registo

Verificada alguma das situações do artigo 69º do Código do Registo Predial, o conservador deve recusar o
registo. Parte-se do princípio que os casos de recusa são taxativamente enumerados e que, portanto, só se
pode recusar nos casos em que a lei estabelece a possibilidade dessa recusa. Não estando em causa um caso
de recusa, o registo tem que ser feito – não é exatamente uma situação em que se dá ao conservador a
possibilidade de optar.

A opção registo tem 3 modalidades:


 Registo definitivo – só é definitivo se não for provisório. Quando não haja fundamento para recusar,
quando não se trate de um caso provisório por natureza e quando o conservador não tenha dúvidas,
pode ser lavrado o registo definitivo. Este registo não tem dúvidas.
 Registo provisório por dúvidas (artigo 7º Código do Registo Predial) – dá-se quando a conservatório
tenha dúvidas/alguma incerteza quanto ao registo que lhe pede para efetuar. Podem ser coisas tão
simples como uma desconformidade na identificação do prédio objeto de registo. Nestas
circunstâncias, lavra-o por dúvidas.
 Registo provisório por natureza – é a própria lei que identifica quais são as situações em que o
conservador deve permitir o registo provisório. São situações em que o facto aquisitivo (ou modificativo)
de um direito ainda não está completo e, portanto, os efeitos que estão associados a esse facto ainda
não se produziram. Só que, para os antecipar (prevenir a possibilidade de esses efeitos se verificarem)
permite-se o registo provisório.
Ex.: Com base num contrato promessa de compra e venda pode fazer-se o registo provisório da coisa a obter.
Como há uma possibilidade de a compra e venda ocorrer, permite-se que se inscreva a aquisição, ainda que
provisoriamente, à espera que a promessa seja cumprida.
O registo provisório tem um prazo de duração (6 meses). Ainda que, normalmente, seja renovável, desde que
não se deixe caducar, pode ser renovável.

A tal fé pública (confiança que o registo pode merecer perante terceiros) só se produz em relação ao registo
definitivo, não se produz em relação aos registos provisórios.
Nunca poderia produzir-se em relação ao provisório por dúvidas – se o conservador expressa dúvidas por algo,
o terceiro não pode confiar totalmente no registo provisório. Enquanto estiverem como provisórios, os registos
não são confiáveis.
Como têm prazo de renovação, ao fim do prazo são convertidos em definitivos; ou, ao caducarem, o problema
da fé pública não se põe.

Efeitos do registo para o sujeito ativo: enunciativo, constitutivo, consolidativo e


atributivo.

Os efeitos do registo são, na essência, as vantagens/consequências que podem resultar da realização do


registo, para terceiros ou para o próprio sujeito ativo (aquele que beneficia dos efeitos do registo).
Para o sujeito ativo (aquele que beneficia do registo que foi lavrado), o registo pode ter 1 de 4 efeitos:
enunciativo, constitutivo, consolidativo, atributivo.
1. Efeito enunciativo
Produz-se sendo que o facto que se regista seja um facto que já é público por outra via qualquer e, portanto,
o registo não acrescenta nada, em termos de publicidade. Em termos publicidade é um ato inútil. Por isso é
que só residualmente/excecionalmente é que se admitem registos com este efeito.
1 Ex.: artigo 5º/Nº2/a) Código do Registo Predial – AQUISIÇÃO POR USUCAPIÃO – a lei refere expressamente
que um dos requisitos da usucapião é a de que a posse que leva ao usucapião seja pública (1297ºCC). Só
está em condições de invocar a usucapião aquele que tenha possuído, durante X anos, de forma pública. Isto
significa que quando se invoca a usucapião e quando se vai inscrever a aquisição de usucapião, está a
proceder-se ao registo de um facto que já é público. Trata-se de um registo que deve ser promovido pela
entidade que o formaliza.

2 Ex.: artigo 5º/Nº2/b) Código do Registo Predial – REGISTO DE SERVIDÕES APARENTES – são aquelas
que se revelam em sinais visíveis e permanentes (1548ºCC). Portanto, a inscrição no registo, em termos de
publicidade não adianta porque a publicidade já resulta dos sinais. Não é o registo que publicita.

3 Ex.: artigo 1295º/Nº2 CC – REGISTO DA MERA POSSE – a mera posse não é posse pela usucapião mas,
fazendo-se o registo da mera posse, os prazos da usucapião podem tornar-se mais curtos. Portanto, o registo
em si mesmo tem um efeito acessório (tornar o prazo da usucapião mais curto), mas continua a ser um registo
enunciativo porque, para se poder registar a mera posse, supõe-se que ela seja pública – é necessário
demonstrar que a posse que se pretende inscrever no registo é pública.

A inscrição refere-se a um facto que, por si mesmo, já tem publicidade mesmo sem registo – por isso é que é
enunciativo: limita-se a, quanto muito, aumentar o conhecimento.

2. Efeito constitutivo
É constitutivo quando faz parte dos requisitos de constituição de um certo direito. Nesta situação, não basta
que exista um contrato a dar origem a um certo direito, é necessário que esse contrato seja inscrito no registo
– só quando estiver inscrito é que o facto aquisitivo está completo. Portanto, só quando o registo seja lavrado
é que o beneficiário do efeito o obtém.
1 Ex.: HIPOTECA – quando se constitui uma hipoteca (quando um devedor, para garantir o cumprimento das
suas obrigações perante o credor, dá em hipoteca um imóvel), a posse do imóvel hipotecado permanece com
o autor da hipoteca – o credor não obtém a posse sobre a coisa hipotecada (não há transferência sucessória).
Se é um qualquer imóvel que produz rendimento ao devedor e esse imóvel for entregue ao credor, o rendimento
deixa de ser obtido pelo devedor e haverá mais um motivo pra não conseguir cumprir as obrigações.
Desde sempre, na hipoteca, parte-se do princípio que a coisa hipotecada não se transmite e, é justamente por
este motivo que apareceu o registo predial: dado que não há transferência sucessória, só através do registo é
que se publicita a hipoteca. No caso da hipoteca, se não houver registo, não há maneira de publicitar a
existência da mesma, por isso, a lei colocou a existência do registo como facto constitutivo – a hipoteca começa
por nascer através de um contrato e exige-se o registo desse contrato (enquanto não houver registo, não há
hipoteca).

2 Ex.: podemos acrescentar as situações em que estamos perante um contrato promessa com eficácia real e
pacto de preferência com eficácia real – parece que o registo também é constitutivo – enquanto não houver
registo, não têm eficácia real.

Uma coisa é ser constitutivo e outra coisa é ser obrigatório. O registo ser obrigatório significa que se alguém
tem o dever de o requerer ou não, sujeita-se a sanções. A lei pode qualificar a ausência do registo como crime
de desobediência. No caso do registo constitutivo, é perfeitamente concebível que não seja obrigatório (o
interessado pode ou não fazer) – se não faz não tem a vantagem que deveria ter e o efeito do registo não se
produz.
O registo constitutivo é um ónus – é livre de registar e de não registar.

3. Efeito consolidativo/confirmativo
Está presente no artigo 5º/Nº1 do Código do Registo Predial.
É o efeito normal do registo, o efeito regra. Se o caso não é de registo enunciativo, nem constitutivo, é
consolidativo.
O efeito do registo é consolidativo quando o registo se limita a confirmar os efeitos de um facto que já estão
produzidos, mesmo sem registo – por isso é que o registo é confirmativo, vem apenas tornar inatacáveis os
efeitos que já estavam produzidos precariamente antes do registo.
Ex.: A vendeu um apartamento a B. Se a compra e venda está devidamente realizada (Escritura pública ou
documento autenticado) e não há vícios que impeçam os efeitos de compra e venda, B é proprietário do
apartamento, desde que a escritura foi feita (artigo 408º/Nº1 CC). O registo, aqui, não é necessário para nada
– não altera minimamente os efeitos que daqui resultam, ou seja, quer B registe ou não, B é proprietário. O
que acontece é que esses efeitos resultantes da compra e venda são precários/instáveis porque pode dar-se
o caso de, entretanto, aparecer uma outra pessoa a registar um facto incompatível com o de B, antes de B ter
registado.
 B não registou de imediato. Entretanto, aproveitando-se da situação, A vendeu a C (situação
triangular). Aparentemente, A é o proprietário antes de vender ao C (não há razões para C desconfiar
de que A não é proprietário). Numa situação destas, a falta de registo por parte de B pode proporcionar
a aquisição do direito por C (C poderá estar nas condições do 291ºCC) e, nesta situação, se isso
acontecer, os efeitos da compra e venda a B cessam (B perde a propriedade para C).
 Se o registo de B estivesse efetuado atempadamente, isto não aconteceria – o que estaria a produzir
efeitos a título precário passaria a ter efeitos definitivos e, nesse instante, se tivesse feio o registo, uma
situação como esta não podia sequer acontecer (o registo de C, nesta hipótese, não poderia ser
lavrado; nem mesmo a compra e venda poderia ser feita). Diz-se então que o registo tem efeitos
consolidativo porque, se B tivesse lavrado o registo, nada disto teria acontecido. Não tendo lavrado
registo, deixou aberta a possibilidade de isto acontecer.
Tudo o que não estiver no enunciativo e no constitutivo, está no consolidativo.
O que o registo pretende dar aqui é a oponibilidade para terceiros – os efeitos do facto registado produzem-se
para qualquer pessoa.

4. Efeito atributivo
Se alguém estiver a inscrever um facto, em si mesmo inválido, mas dada a situação, o registo é capaz de dar
a essa pessoa o direito que não obtiver pelo facto.
Ex.: A venda A-C é uma venda inválida, em virtude de a venda A-B ter produzido os efeitos normais de uma
compra e venda (não foi imediatamente inscrita mas é válida e produziu os seus efeitos entre A e B). Quando
A vende a C, para todos os efeitos, leva a compra e venda a registo – para todos os efeitos, está a ser inscrito
no registo um facto inválido (a conservatória não tem meios para saber que o bem era de B porque,
aparentemente, não há objeções à venda A-C). Está a ser registado um facto que não tem efeitos, que não
pode valer.
 Contudo, se C estiver nas condições do 291ºCC, isso atribui-lhe um direito que a compra e venda não
lhe atribuiu. Uma dessas condições é o registo e só com o registo é que a aquisição do C está completa
– por isso, podemos dizer que o registo, nesta hipótese, é atributivo.

O QUE DISTINGUE O EFEITO ATRIBUTIVO DO EFEITO CONSTITUTIVO?


Em qualquer dos casos, só se adquire quando se regista. O registo é o ato que culmina a aquisição porque é
o ato que completa.
Supõe-se que, no registo constitutivo, o facto que se inscreve é válido, ao passo que no registo atributivo
supõe-se que o facto que está registado é inválido – não é por se ter registado que é válido.
Ex.: não é porque C registou a compra A-C é válida. O que dá a aquisição a C é o facto de preencher os
requisitos do 291ºCC – C não adquire porque comprou, adquire porque está nas condições do 291ºCC.

Numa situação deste género, para proteção do terceiro, teoricamente são concebíveis duas disposições legais:
Artigo 291ºCC ou Artigo 17º/Nº2 código do registo predial.
O artigo 17º/Nº2 supõe que a pessoa a quem se está a referir, ainda que apenas aparentemente, tenha registo
a seu favor.
Ex.: Para aplicar o 17º/Nº2, temos que supor que A teria registo a seu favor, antes de a compra e venda A-C
ser celebrada. Supõe-se que há registo prévio a favor do causante (pessoa de quem o terceiro adquiriu), ao
passo que o 291ºCC não pressupõe isto (não pressupõe que o causante tenha registo a seu favor). Pode
colocar-se a possibilidade de C, para efeitos do 291ºCC, ser o primeiro a registar. Se assim é, se aceitarmos
este critério, o 291ºCC quase nunca pode funcionar porque a hipótese de um terceiro ser o primeiro a registar
algo em relação a certo bem, na prática é quase impossível – tem que haver uma sequência de registos que
faça sentido e, de um modo geral, o que transmite não pode celebrar o ato de transmissão, se não tiver o
registo em favor.
Quem defende este critério pode simplesmente aceitar essa consequência e admitir apenas a aplicação do
291ºCC e nunca do 17º/Nº2.

É verdade que, em qualquer um dos casos, se pressupõe alguma invalidade anterior, mas o 17º/Nº2 está
referido ao 16º e o registo só é nulo nos casos deste artigo (casos de nulidade do ato do registo e não nulidade
do facto registado – se se regista uma compra e venda, uma coisa é a compra e venda e outra coisa é a
validade da compra e venda no registo). Os casos que o 16º estabelece são os casos em que o ato de registo
da compra e venda é inválido (não a compra e venda).
Ex.: Foi lavrado o registo da compra e venda A-B. O conservador, por desleixo, não assinou o registo. O registo
é nulo. A compra e venda não é nula.
É para situações deste género e para dar proteção a terceiros que existe o 17º/Nº2 – proteger terceiros da
nulidade do ato do registo.
Ao contrário, o 291ºCC existe para dar proteção a terceiros da invalidade do próprio facto sujeito a registo
(Compra e venda – se a compra e venda tiver vícios, o 291ºCC dá proteção ao terceiro contra essas
invalidades, no ato de transmissão – não dá proteção de vícios/invalidades do ato de registo).

Temos um efeito que resulta do registo para terceiros (REPÚBLICA) – é sempre idêntico, resulta sempre da fé
pública.

Fé pública

A Fé pública consiste no efeito do registo pelo qual se presume que o que está registado corresponde
exatamente àquilo que na realidade sucedeu. Autoriza terceiros a depositar confiança no conteúdo do registo
e a atuar com fundamento nas expectativas nele alicerçadas.
De acordo com o artigo 7º Código do Registo Predial, pode inferir-se que a presunção de fidelidade do registo
à realidade extra registal apenas se forma quando ele tenha caráter definitivo. O registo provisório (por dúvidas
e por natureza) não dá assento suficiente para se conjeturar tanto a completude como a exatidão.
Coincidência entre a realidade substantiva (fora do registo) com a realidade registal (inscrita no registo). Pode
ser um de dois sentidos/significados.

Sentido positivo e sentido negativo da fé pública.

O sentido negativo é aquele onde o público pode partir do princípio de que o registo está completo, logo, tudo
o que aconteceu, do ponto de vista substantivo, está refletido no registo. Nada aconteceu substantivamente
que não esteja integrado no registo.
“Presume-se a completude do registo”.
Ex.: SITUAÇÃO TRIANGULAR – A, proprietário inscrito, vende a B um imóvel. B não registou. Passados 15
dias, B pediu o registo do imóvel, em seu favor. Durante esse período de tempo, A vendeu o mesmo imóvel a
C.
C pode partir do princípio que A é o proprietário do imóvel, apesar de substantivamente não o ser. Ou seja, C
pode assumir que a informação que obteve através do registo é verídica, assumindo que A é titular do direito.
C adquiriu direitos sobre o mesmo imóvel (que não foi inscrito a favor de B). O direito de C é incompatível com
o de B.
Não existindo registo a favor de B, C deve beneficiar da presunção de boa-fé. No entanto, essa presunção é
iuris tantum, podendo demonstrar-se o contrário (artigo 350º/Nº2 CC).

O sentido negativo é aquele onde se presume que todos os factos inscritos no registo aconteceram mesmo e
são válidos. Designam-se por situações lineares – pressupõem a existência de 3 pessoas, como nas situações
triangulares, mas aqui existe uma sequência. São 3 pessoas envolvidas e a fé pública é a favor da última sub
adquirente.
“Presume-se a exatidão do registo”.
Ex.: B é adquirente de A. C é adquirente de C e, por consequência, sub adquirente de A.
Descobre-se que a venda A-B tem uma invalidade (era uma simulação absoluta, ou seja, a compra e venda
não tem efeitos). Provando-se a simulação, a primeira venda não tem efeitos. Aqui, a prova de que a primeira
venda é simulada sucede depois de C ter adquirido e registado o imóvel. Assim sendo, C é beneficiário da fé
pública, podendo partir do princípio que B era titular do direito quando vendeu o imóvel e que a compra e venda
A-B era válida. C parte do princípio de que está a comprar ao legítimo proprietário que, por seu turno, comprou
legitimamente a A.

Registo de contrato promessa

Do contrato promessa não resulta nenhum efeito real, não transmite nenhum direito real, não constitui nem
modifica nenhum direito real. Pode, no entanto, ter eficácia real.
O contrato promessa tem efeitos obrigacionais – a celebração do contrato definitivo – se o contrato promessa
for bilateral vincula ambas as partes à celebração do contrato definitivo. Se o contrato definitivo não foi feito,
há um incumprimento contratual que dá lugar à responsabilidade civil.

Todo o contrato promessa com eficácia real deve ser registado, mas nem todo o contrato promessa registado
tem eficácia real.

Conceito amplo e conceito restrito de terceiro para efeitos de registo.

Tanto a doutrina quanto a jurisprudência apresentam dois conceitos de terceiros, para efeitos de registo
 Conceito restrito – entende-se que só é terceiro, para efeitos de registo, quem tenha adquirido a
partir de um transmitente que seja comum a outro adquirente (para o terceiro e para a parte), no
pressuposto de a aquisição do terceiro ser incompatível com a de outro adquirente. Com este
conceito, ao dizer-se “transmitente” está a pressupor-se que a aquisição do terceiro é uma aquisição
pelo negócio jurídico, ou seja, assenta-se no pressuposto de que, para haver um transmitente, tem que
haver intervenção da vontade dessa pessoa – pressupõe-se que a transmissão é voluntária e para a
transmissão ser voluntária, supõe-se um negócio jurídico.
Ex.: B e C adquiriram (aparentemente), a partir da mesma pessoa (A). Assim, A é transmitente comum porque
é transmitente para o B e é transmitente para o C.

 Conceito amplo – só se percebe definindo o conceito restrito. Pelo conceito amplo, é terceiro quem
tiver adquirido através de um facto sujeito a registo, não importando se esse facto aquisitivo é um
negócio jurídico ou não – o que importa é que seja um facto qualquer que é suscetível de fazer adquirir.
1 Ex.: A vende a B, B não regista de imediato. A vende a C – tanto pelo conceito amplo como pelo conceito
restrito, C é sempre terceiro.
2 Ex.: A vende a B, B não regista de imediato. C, que é credor de A, intenta uma ação executiva contra
este e nessa ação penhora o imóvel que A tinha, anteriormente vendido a B, mas que B não tinha
registado. O conflito é criado porque B comprou mas não registou esse negócio de imediato e, quando foi lavrar
o registo, já havia um registo de uma penhora, a pedido de C. Para todos os efeitos, é um direito real de
garantia porque não nasce por contrato – o facto jurídico, que leva à aquisição do direito real de garantia
por C, não é a vontade, não é o negócio jurídico (C adquire por outro facto qualquer – desde que não seja
um facto voluntário a partir de A, ou seja, desde que não seja um negócio jurídico).

No sentido amplo do conceito amplo, C é terceiro para efeitos de registo.


No sentido restrito do conceito restrito, C não é terceiro. Se não é terceiro para efeitos de registo, não pode ter
a seu favor o efeito atributivo. O efeito atributivo só se produz a favor de quem seja terceiro para efeitos
de registo (cria-se uma divisão para os terceiros – terceiros em geral e terceiros para efeitos de registo).
- Os terceiros em geral podem obter as informações que quiserem do registo que quiserem
- Os terceiros para efeitos de registo podem invocar a seu favor o terceiro atributivo.
Na hipótese de dupla venda, usando o conceito restrito, C pode invocar o efeito atributivo e pode tornar-se
proprietário pelo efeito atributivo, em prejuízo de B.
Do mesmo conceito restrito, C, mesmo que cumpra os requisitos do 291ºCC, não interessa porque não é
terceiro (pelo efeito atributivo), ou seja, a penhora não subsiste (a penhora sobre aquele bem alienado não
pode manter-se, tem de ser levantada).
No conceito amplo, C é terceiro em qualquer uma das situações – tendo C adquirido por contrato ou por outra
qualquer circunstância que não seja voluntária, é sempre terceiro e pode beneficiar do efeito atributivo. Se
cabe no conceito de terceiro, para efeitos de registo, C pode beneficiar do efeito atributivo com eficácia.

É introduzido um novo conceito: Terceiro registal – é qualquer pessoa que não seja parte, a quem interesse a
informação que consta do registo (acaba por ser um conceito normal de terceiro). É terceiro que não for parte,
a quem interesse a informação.

Condições de que depende a verificação do efeito atributivo.

Aplicamos o artigo 291ºCC e não o 17º/Nº2 CC.

O artigo 17º/Nº2 não atribui direitos, o 17º protege o terceiro contra vícios do registo.
Ex.: A vende a B validamente. B vende a C validamente, depois de C ter registado a sua aquisição, descobre-
se que o registo de B sofre de uma invalidade qualquer, nos termos do 16ºCódigo do Registo Predial (o registo
não foi assinado pelo conservador, o registo é nulo). Normalmente, a nulidade do registo de B iria prejudicar o
registo de C (não prejudica a aquisição, prejudica o registo – se o registo é inválido, os registos subsequentes
são inválidos). Contudo, se C estiver nas condições do 17º/Nº2, o seu registo mantém-se, mesmo que o registo
de B seja declarado nulo – a vantagem que o 17º/Nº2 oferece ao terceiro é a de permitir manter um registo que
não poderia ser mantido. Ao dizer-se que C pode invocar 17º/Nº2, estamos a dizer que mantém em vigor o seu
registo – não tem que se sujeitar às consequências de um novo pedido de registo. O registo não é afetado.

Quando falamos em efeito atributivo, pelo 291ºCC, estamos a dizer que é por esta via que se vai dar ao terceiro
o direito que ele não tinha adquirido subjetivamente.
Ex.: A venda a B é nula (simulação), mas antes de se darem conta de isso, B vendeu a C. Só depois da vende
de B a C é que alguém consegue comprovar que a compra e venda a B é nula, logo, a venda B-C também é
nula, por falta de legitimidade. Portanto, nesta hipótese, C não pode ser protegido e teria que restituir o imóvel
a A e depois entender-se com B, no que toca à restituição do preço e, portanto, logo se vê se B está em
condições de restituir o preço. Se o efeito atributivo estiver verificado pelo C, C torna-se proprietário – beneficia
do efeito atributivo.

Este artigo está, no fundo, concebido para a chamada situação linear (situação de dupla venda) – trata de
tutelar a posição do sub adquirente, que celebra o negócio jurídico, sem saber que o negócio jurídico anterior
padece de um vício.
Ex.: A vende a B e B vende C – todos os factos foram registados. Perante a situação da invalidade do negócio
entre A e B, se ele for declarado nulo, essa invalidade vai entrar também no negócio de B e C (venda de bem
alheio) – ou seja, se se tratar de bens móveis não sujeitos a registo, a proteção de C não ocorre e o bem
regressa a A.
Mas, estando em causa bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo, nesse caso aplicamos o artigo 291ºCC,
que estabelece que, em certas situações, a invalidade do primeiro negócio não afeta o direito real adquirido
por C, se se verificarem todos os requisitos deste artigo. Se o efeito atributivo estiver verificado para C, então
C passa a ser proprietário.

Se está protegido pelo 291ºCC, está protegido pelo 17ºCódigo do Registo Predial.
Se está protegido pelo 17ºCódigo do Registo Predial, não está protegido pelo 291ºCC, a não ser que cumpra
os restantes pressupostos.

Requisitos do artigo 291ºCC

1. Estamos sempre a supor a existência de um registo, inválido.


Ex.: A compra e venda B-C sofre de uma invalidade – no instante que o registo é feito, o facto é inválido.
2. O facto inválido de que beneficia o terceiro é de caráter oneroso. Se estivermos perante uma doação,
o efeito atributivo é excluído de imediato.
Ex.: compra e venda, permuta, etc.
3. Ao falar de efeito atributivo, falamos de uma situação em que um terceiro adquire o que normalmente
não teria adquirido nem deveria adquirir. Esse terceiro, ao beneficiar do efeito atributivo, é protegido
contra invalidades que são anteriores mas têm repercussão para os negócios posteriores (a venda B-
C é inválida porque a venda A-B era inválida). Portanto, só tem sentido dar proteção ao terceiro, no
pressuposto de que os vícios de que o seu ato aquisitivo sofre, são defeitos que aparecem por
repercussão (não são defeitos próprios). Ao contrário, se o ato aquisitivo favorece o terceiro e tiver
vícios próprios, já não há proteção porque, para esses vícios, ele não é terceiro, é parte.
Ex.: se além de a venda B-C ser nula (venda de bem alheio), há falta de capacidade de C (maior acompanhado
e não se fez acompanhar na celebração da compra e venda) – este vício está sempre presente. Mesmo que a
compra e venda B-C não fosse inválida, o vício existe sempre. É um vício próprio do ato aquisitivo de terceiro,
logo, não há efeito atributivo.
4. O terceiro tem de estar de boa-fé subjetiva, ou seja, terá de ignorar (no sentido de não saber)
desculpavelmente que a sua aquisição está viciada. Não faz sentido dar-se proteção a quem esteja de
má-fé. Vem prevista no nº3 e diz respeito ao sujeito que, no momento da aquisição, desconhecia sem
culpa o vício do negócio inválido.
5. Supõe-se (implicitamente) que quando o terceiro regista a aquisição, está já efetuado o registo a favor
da pessoa de quem o terceiro está a adquirir.
Ex.: C está de boa-fé porque B tinha registo (C vai confiar no registo e assumir que B é o titular). Estamos a
supor que há registo a favor de B.
6. Tem que decorrer um prazo de 3 anos para que o terceiro obtenha o efeito atributivo. Esse prazo
começa a contar a partir da data em que a compra e venda B-C é feita.
Ex.: há um período de 3 anos em que C está sujeito a que alguém instaure uma ação de declaração de nulidade
da compra e venda A-B e, consequentemente, da compra e venda B-C.

Estes requisitos são cumulativos – têm de estar todos verificados para que o efeito atributivo se produza.
Verificados todos os requisitos, o terceiro adquire o efeito atributivo – C passa a ser titular do direito que estava
em causa, pelo 291ºCC (a compra e venda A-B é nula e, consequentemente a compra e venda B-C também,
mas C adquire o direito de propriedade por ter preenchidos todos os requisitos do 291ºCC).

Titularidade efetiva.

Quando alguém exerce um direito real, supomos que essa pessoa tem o direito correspondente à sua atuação
– atua como sendo proprietário e é mesmo proprietário. Esta é a titularidade real.
Depois, há outras situações, onde uma pessoa aparenta exercer algum destes dreitos sem o ter – aparenta
ser proprietário e não o é. Esta é a titularidade aparente.

TITULARIDADE REAL – DIREITO DE PROPRIEDADE


O direito de propriedade é chamado o direito real máximo. Isso significa que o direito de propriedade é o direito
real com o maior conteúdo possível e concebível. Isto implica dizer que este direito não se consegue definir,
consegue-se apenas descrever aproximadamente.
Normalmente, o proprietário há-de ter os poderes de uso; no entanto, existem situações em que é concebível
existir propriedade sem existirem estes poderes e situações onde há propriedade com poderes diferentes.
Ao ser o direito real máximo, daí decorre que todos os outros direitos reais se constroem por referência à
propriedade, isto é, os outros direitos reais todos são direitos sobre bens alheios (direitos sobre objeto que é
propriedade de outra pessoa).
Os outros direitos reais, em comparação com a propriedade, serão direitos reais menores – menores porque
o maior é a propriedade, logo, todos os outros (por muito amplo que seja o seu conteúdo) serão muito menores.

Daqui decorre a sobreposição de direitos – sempre que esteja constituído um direito real menor, supõe-se que
sobre essa coisa (objeto desse direito) existirão, pelo menos, 2 direitos (propriedade + direito real menor em
causa). Ex.: se a propriedade estiver hipotecada, há 2 direitos sobre a mesma coisa (propriedade + hipoteca).

Propriedade: características, perpetuidade (casos de propriedade temporária)

Nestes casos de sobreposição de direitos, podem ser admitidas 3 modalidades:


1. Paralela – quando os dois ou mais direitos que incidem sobre a mesma coisa são de igual qualidade
(não importa o conteúdo) e, portanto, nenhum prevalece sobre o outro.
Ex.: compropriedade – cada comproprietário é proprietário, mesmo tendo percentagens de comparticipação
diferentes. A situação fica subordinada à regra da colisão de direitos – regra pela qual se estabelece que,
quando haja colisão de direitos, cada qual dos titulares deve ceder, na medida do necessário para que o outro
também possa exercer.
2. Hierarquia – no âmbito da colisão (onde haja colisão de direitos), o exercício por um dos titulares exclui
o exercício pelo outro – onde um exerce, o outro não exerce.
1 Ex.: compropriedade – no que toca ao uso e fruição, prevalece o uso frutuário – a situação é de sobreposição
hierárquica, no sentido de que, enquanto existir o usuário para ter propriedade e frui do imóvel, o outro
proprietário não exerce o seu direito.
2 Ex.: as hipotecas são hierarquizadas pela data do registo.
3. Prevalente – um dos direitos prevalece sobre o outro, mas sem excluir totalmente o outro. Tudo
dependerá das necessidades.
Ex.: uma vez que a constituição de hipoteca não implica que a coisa objeto da hipoteca seja transferida para a
posse do credor (basta o registo), é concebível que possam existir duas ou mais hipotecas sobre a mesma
coisa.

Nestas duas últimas, os direitos em concorrência são de qualidade diferente e, portanto, um dos direitos há-de
prevalecer sobre o outro. Quando se diz que um prevalece sobre o outro, não se analisa em termos de
importância – é uma questão de saber, no exercício dos direitos, qual é o que se exerce primeiro e qual é o
que se exerce depois.
Ex.: A é devedor de B e de C. Em relação a B, tem uma dívida de 200 mil euros e, em relação a C, tem uma
dívida de 400 mil euros. Para dar em hipoteca, A é proprietário de um imóvel que vale 300 mil euros. A pode
dar ao B uma hipoteca pelo valor daquele imóvel e pode dar a C uma segunda hipoteca pelo valor dos 400 mil
euros de que C é credor. Supondo que o imóvel vale mesmo os 300 mil, este valor chega para cobrir a
obrigação com B (200 mil), em relação a C só chega para cobrir uma parte, não a totalidade.
Dos 300 mil que esse imóvel vale, B vai retirar o seu dinheiro e o que sobrar vai para C – o exercício por parte
do primeiro credor hipotecário já acaba, na prática, por excluir o exercício pelo segundo – o exercício por um,
geralmente, não exclui o exercício por outro.

PROPRIEDADE TEMPORÁRIA:
Quando se fala em propriedade temporária, há duas hipóteses:
 Objetivamente temporária – quando esteja sujeita a um prazo de duração
No código civil, diretamente, não há nenhuma hipótese prevista, deste género – há uma situação em que isso
pode acontecer: o direito de superfície (artigo 1524º e ss. CC) – é o direito de construir ou plantar em solo
alheio, mas é sobretudo o direito de, depois, manter essa construção/plantação em solo alheio.
Ou seja, constituindo o direito de superfície, dá-se uma separação jurídica entre a propriedade do solo e a
propriedade das plantações/edificações no solo (uma pessoa é proprietário do chão e outra é proprietária das
plantações incorporadas nesse chão).
O titular da plantação é designado de superficiário – o direito de superfície, em si, é um direito real menor, logo,
não coloca problemas em termos de definição da propriedade; mas, o direito de superfície apenas permite
manter a edificação em solo alheio (é o direito de usar o solo de outra pessoa, para aí manter uma edificação).
Falta, assim, saber qual é o direito que existe a favor do superficiário sobre a própria edificação: tem-se
entendido que esse direito é direito de propriedade.
O superficiário tem 2 direitos – direito de superfície (direito de usar o solo de outra pessoa para aí manter
uma edificação) e tem o direito de propriedade (sobre essa edificação).
Vendo assim, quando o direito de superfície seja temporário (tenha um prazo), forçosamente, a
propriedade sobre a edificação também tem um prazo – logo, a propriedade aqui é temporária. Chegando
o termo do prazo, a edificação é adquirida pelo proprietário do solo.

 Subjetivamente temporária
O artigo 62º do Código do Registo Predial, a propósito da propriedade privada, além de garantir o direito à
indemnização, garante também o direito à sucessão mortis causa. Portanto, os titulares da propriedade
privada têm o direito de fazer com que o que lhe pertenceu em vida, em termos de propriedade, depois se
transfira para as pessoas que lhe devam suceder.
A propriedade nunca é perpétua (nós não duramos para sempre), logo, se a propriedade se extinguisse pela
morte do proprietário, toda a propriedade seria temporária (por definição, a morte é certa). Ao assegurar-
se o direito à sucessão mortis causa, no plano constitucional, está a dizer-se também que a propriedade é
perpétua para esta vida – com a morte do titular, os objetos da propriedade privada são transferidos para
quem o proprietário entender e assim sucessivamente.
Há uma hipótese, prevista a propósito das sucessões: substituição fideicomissária – é uma situação em que
o proprietário, por testamento, designe um sucessor para um certo bem mas, ao mesmo tempo, nesse
testamento, estabeleça que, por morte do primeiro sucessor, o direito deixado pelo testamento passa para
outra pessoa.
Ex.: A (proprietário) deixa a B. A já estabelece que, com a morte de B, o bem vai ser entregue a C. Por morte
do primeiro sucessor não sucede uma pessoa qualquer, sucede aquele que A decidiu. O primeiro
sucessor (B) é chamado fiduciário e o outro é fideicomissário – como ambos estão pré designados pelo A, o
fideicomissário é sucessor de A e não de B. Ou seja, ambos são sucessores de A mas, em vez de sucederem
ao mesmo tempo, sucedem sucessivamente. Por morte de B, o bem não vai para sucessores mortis causa do
fiduciário, mas sim para outra pessoa que está designada pelo proprietário (A). B (primeiro sucessor) não tem
sucessão – segue a via que foi definida pelo autor do testamento.
O primeiro sucessor é proprietário? Este tem menos poderes dos que são, normalmente, concedidos ao
proprietário – em geral, não pode dispor (não pode vender, doar, permutar, etc.) porque a lógica é a de que o
bem passe para outra pessoa que está determinada – poderá dispor, muito limitadamente, porque o único
titular que poderá dispor desta forma é o proprietário (o fiduciário é um proprietário com muitas limitações).

Defesa da propriedade: ações de reivindicação, negatória e de demarcação.

Embora a lei regule muita coisa a propósito da propriedade, uma grande parte das regras que se aplicam à
propriedade aplicam-se, também, a outros direitos reais. O Código civil não tem uma parte geral aos direitos
reais. Portanto, há a necessidade de aplicar muitas regras da propriedade a outros direitos reais, que não são
de propriedade.
No que toca à defesa da generalidade dos direitos reais, temos que distinguir:
 Ações possessórias – são ações em que apenas está em discussão a posse, saber quem tem a
posse ou quem tem melhor posse sabendo que ambos a têm. A posse é protegida através de ações
possessórias, por si própria, mesmo que não haja o direito real que justifique a posse.
 Ações petitórias – o que está em causa é a defesa do próprio direito real que esteja legitimado a
fundamentar a posse. A ação destina-se, sobretudo, à defesa do próprio direito e, por
consequência, acaba por defender também a posse. Isto supõe que nestas ações, o autor da ação
tenha possibilidade de provar que é titular do direito.

AÇÕES PETITÓRIAS PARA DEFESA DO DIREITO REAL


Nas ações petitórias, os pedidos assentam na titularidade de um direito real – as ações petitórias servem para
muita coisa, mesmo que não seja para proteção dos direitos reais.
Nas ações petitórias, para defesa dos direitos reais, temos 3 espécies:

1. Ação de reivindicação (1311º e ss. CC)


Pressupõe que o proprietário (ou titular de qualquer outro direito real) não tenha a posse da coisa (objeto
do seu direito) mas deva ter.
Reivindicar significa pedir de volta.
Não interessa por que é que não tem a posse da coisa – se não tem porque nunca teve, se não tem porque
lhe foi retirada essa posse ou se não tem por outra razão qualquer, é indiferente – o autor apenas pede o
reconhecimento de que é titular do direito e que, na sequência, o tribunal proceda à condenação do réu
à entrega da coisa.
Convém dar nome à coisa – havendo nome, o tribunal recebe, de imediato, a ideia daquilo que se vem pedir.

Tem legitimidade ativa quem for proprietário ou titular de outro direito real.
Tem legitimidade passiva quem tiver a coisa objeto da reivindicação em seu poder, não a devendo ter.

Não tem prazo – enquanto houver direito de propriedade há direito a obter a reivindicação.
 “Salvo que terceiro possa invocar usucapião” – se aquele que deve fazer a restituição puder invocar
usucapião, não tem que restituir. Assim que o réu estiver em condições de invocar a usucapião e o
fizer, o direito de propriedade do autor extingue-se. Não é caducidade direta, mas é caducidade indireta
– graças ao prazo que decorreu a favor do réu.

2. Ação negatória (não está diretamente prevista no CC)


É uma ação de condenação mas que começa ao contrário – a ação de reivindicação pressupõe, antes de mais
nada, que o seu autor consegue provar que é titular do direito que está a invocar na ação (tem que conseguir
demonstrar para que o tribunal, ao reconhecer a existência do direito, depois condene o réu).
Na ação negatória, o que o autor da ação pretende é que seja negado ao réu um direito o réu alega ter.
Ex.: A é proprietário de um terreno. B é proprietário de um terreno contíguo (vizinho) e B alega ter o direito de
passar sobre o prédio de A – aquilo que A fundamentalmente pretende, quando intenta a ação, é negar a B o
direito de passagem. Declarando-se que o réu não tem o direito de passar, então que seja condenado, no
futuro, a abster-se de praticar os atos que tem vindo a praticar ao abrigo do direito que alega ter. B não terá o
direito de passagem, mas está a fazê-lo; se o autor conseguir provar que o réu não tem o direito de passar,
pede ao tribunal que condene o réu.

O proprietário ou titular do direito real tem legitimidade ativa.


Aquele que praticar os atos que perturbarem o direito do autor tem legitimidade passiva.

Em princípio não tem prazo – existirá o direito de intentar esta ação, enquanto o direito que o autor alega ter
existir.
Não pode haver caducidade porque, enquanto o direito de propriedade existir, o direito de praticar esta
ação persistirá.

3. Ação de demarcação (Artigo 1353º e ss. CC)


Não é extensível À titularidade de outros direitos reais – apenas ao direito de propriedade.
Pressupõe que entre 2 prédios haja incerteza, no que toca à respetiva linha divisória.
Supõe que os proprietários saibam que existe uma linha divisória mas que haja dúvidas quanto à localização
da mesma.

Não tem prazo – enquanto a propriedade existir pode recorrer-se a esta ação.

Não é ação de condenação mas sim ação de arbitramento, no sentido de que, no ponto de vista processual,
nestas ações não há autor nem réu – alguém terá tido iniciativa de iniciar o processo e, ao ter iniciativa, força
os demais a intervir no processo. Não há autor nem réu porque os próprios confinantes têm o dever de contribuir
para esclarecer a dúvida relativamente à linha divisória.
 Feito o pedido, o tribunal irá analisar se aquele pedido deve ou não ser indeferido.
Numa ação de arbitramento, o tribunal não pode tomar esta atitude – não conseguem provar, sendo assim, o
pedido é indeferido. É objetivamente importante que se comece a divisória e se uma prova apresentada por
uma parte não for tida como suficiente, o tribunal tem que estabelecer uma localização para a linha divisória.
Em última análise, não havendo prova suficiente, o tribunal terá que dividir a parcela em litígio ao meio.
O tribunal tem que sempre demarcar – se a prova efetuada pelas partes não chega, o tribunal tem que tomar
uma decisão.

Porventura se entende que a linha divisória situa-se mais aquém ou mais além e isso significa que aquele que,
desta maneira, perder uma parcela do seu terreno, vai ter que entregar ao outro – terá que haver restituição
de uma parcela (faz-se o mesmo que se faz numa ação de reivindicação).

Em tese, é fácil distinguir:


 A ação de demarcação só se aplica nos casos em que está em causa a área dos prédios em discussão
– quando está em litígio apenas a área de cada um dos prédios confinantes, o problema é de
demarcação.
 Quando estiver em litígio saber quem é que tem um título suficiente para afirmar que determinada
parcela, com determinada área, já está em discussão saber quem é que adquiriu validamente – já está
em causa a reivindicação.
Contitularidade – compropriedade.

Ao faltar uma parte geral relativa aos direitos reais, isso faz com que a lei tenha entrado logo na regulamentação
do direito de propriedade plural, mas tem que se afirmar depois que as regras da compropriedade são aplicadas
à contitularidade de outros direitos reais.
Embora a lei tenha formulado as regras relativamente à compropriedade, são extensivas à contitularidade de
outros direitos reais.

Comunhão de mão comum e comunhão por quotas.

A compropriedade distingue-se, à partida, em comunhão de mão comum (germânica) e comunhão por quotas
(romana):
1. Comunhão de mão comum (germânica)
Não há distinção de medidas de participação – cada comproprietário é participante na comunhão por razões
que transcendem a compropriedade, ou seja, ali, a compropriedade é só uma manifestação de uma comunhão
qualquer que é mais profunda.
Ex.: “Os terrenos baldios não são de ninguém” – são de alguém, não são de alguém determinado. O baldio
pertence a uma certa comunidade local e, portanto, todos os membros dessa comunidade (todos os que
residem na freguesia e pertencem à freguesia) podem utilizar o baldio porque o baldio está ao serviço daquela
comunidade. A razão principal para serem comproprietários do baldio é por ser moradores daquela freguesia
– cada um usa na medida do necessário para si, desde que não exclua o usufruto pelos outros (a menos que
se tenham estabelecido regras de utilização). A compropriedade, ali, estabelece-se por razões instrumentais.
Assim que a pessoa deixa de pertencer à freguesia, deixa de ser comparte do baldio. Um comparte não pode
tirar partes específicas do baldio. O objeto pertence a todos enquanto todo – há um direito de propriedade que
incide sobre o baldio e esse direito pertence a todos os compartes.

2. Comunhão por quotas (romana)


A compropriedade existe por si própria – há propriedade porque os comproprietários querem ser
comproprietários.
Não importa se têm algum tipo de relação – não é relevante para o regime.
Nessas situações (regra geral – comunhão que o CC regulou no 403º e ss. CC), cada participante
(comproprietário) tem uma quota (medida de participação).
São todos comproprietários, desde que sejam pelo menos 2.
Do ponto de vista qualitativo, os direitos são todos iguais, mas cada qual pode ter medidas diferentes de
participação – o normal é que, se existirem 3 comproprietários, cada um tenha 1 terço.
 As quotas são medidas de comparticipação
Ex.: Um automóvel: A tem 70% e B tem 30% - quando dizemos que têm medidas de participação, dizemos
que, em termos de utilização/fruição, um tem 70% e o outro tem 30%. Se conseguirem tirar rendimentos do
automóvel, 70% são para o A e 30% são para o B.

Comunhão pro indiviso e comunhão pro diviso.

3. Comunhão pro indiviso (para a indivisão) – artigos 1403ºCC


Em geral, a compropriedade supõe que exista uma coisa comum, sobre a qual incidem direitos de propriedade
de duas ou mais pessoas.
É compropriedade sobre uma coisa, sem identificação de partes especificadas.
Há coisas em que é fácil identificar:
Ex.: A e B são comproprietários de um automóvel. Não se pode permutar quem é proprietário da parte da frente
e quem é proprietário da parte de trás. São comproprietários do todo.

No entanto, quando falamos de imóveis (principalmente terrenos), esta ideia fica diluída:
1 Ex.: A e B são comproprietários de um terreno. É vulgar que dividam a utilização (A fica com o lado direito e
B com o lado esquerdo) – isto vai perdurando. Com o tempo, aquilo que era uma divisão passa a ser visto
como coisas individuais (o lado direito é de A e o lado esquerdo é de B). Não são terrenos diferentes, é o
mesmo terreno com dois proprietários.
2 Ex.: duas pessoas são comproprietárias de terrenos grandes (100 hectares) e resolvem lotear (fazer parcelas
de terreno). Puseram os lotes À venda – alguém, perto do terreno, ia vendendo os lotes – esse terreno não foi
juridicamente dividido. Partir um terreno implica que sejam cumpridas diversas regras. Quem comprava os
lotes achava que o lote era seu e construía. Estas pessoas, que compraram os lotes e construíram, são
comproprietários porque aquilo que não foi dividido devidamente – há um terreno que foi dividido e onde cada
pessoa utiliza uma parcela desse terreno, como se fosse apenas dela (não é) – todos podem usar tudo porque,
para que haja divisão, tem que se pôr termo à compropriedade. Enquanto houver uma coisa comum, tudo é de
todos.

Qualquer divisão que se faça sem extinção da compropriedade, é divisão entre as partes mas,
juridicamente, a coisa continua a ser comum – cada comproprietário tem o direito de propriedade sobre o
todo (todos são proprietários de tudo), mesmo que em termos quantitativos os direitos não sejam todos iguais
(podem as respetivas quotas não ser idênticas – no 1403º/Nº2 CC, a lei presume que as quotas são iguais
mas podem não ser). A percentagem que cada um tem não se protege no todo (não há parcelas especificadas).
Esta quota só dá a medida de participação – as quotas ideais que cada um tenha definem a respetiva
participação nas vantagens, nos benefícios e nas desvantagens que a coisa possa proporcionar (Se houverem
rendimentos a dividir, dividem-se pela quota; as despesas são calculadas pela quota, mas não há direitos sobre
partes especificadas/individualizadas). As partes especificadas são de todos – se cada um é dono do todo,
juntamente dos outros, cada um é dono de cada parte desse todo.
Enquanto permanecer a compropriedade, o objeto está indiviso.

4. Comunhão pro diviso (para a divisão)


Esta é excecional – só muito limitadamente é que está prevista na lei e para situações muito particulares.
A única hipótese mais ou menos aceitável é a compropriedade em paredes ou muros de meação (1370º e ss.
CC).
Ex.: suponho dois terrenos vizinhos, há uma divisória que os separa. Para definir com exatidão a linha divisória,
um dos proprietários constrói um muro para separar. Se fizer o muro, não encostado à linha divisória, o muro
será exclusivamente da pessoa que o fez e o terreno subjacente a mesma coisa. Se o muro for construído
exatamente na linha divisória, o vizinho do lado pode impor a aquisição de metade do muro. O muro, no entanto,
é só uma coisa – há, então, duas pessoas que são comproprietários porque se o muro precisar da reparação
pagam os dois, mas os seus direitos incidem sobre uma parte da coisa e não sobre o todo (aquela parte que
está idealmente dividida pela linha divisória).
A comunhão será pro diviso porque existem partes especificadas.

A lei, quando usa o conceito de parte especificada, é para dizer o que é que os comproprietários não tê.
Na comunhão normal, o comproprietário não tem direitos sobre a parte especificada.
Este conceito serve para dizer que o comproprietário não pode atuar sobre parte especificada da coisa, porque
é parte da coisa comum.
O conceito de quota ideal serve para definir o que é que cada um pode – cada comproprietário pode o que
entender, na medida da sua quota.

Administração da coisa comum.

Na contitularidade temos um direito para vários titulares.


Bate certo com a comunhão de mão comum. Não bate certo com a comunhão por quotas.
Isto porque se existir um direito para dois ou mais titulares, não se consegue conceber como é que cada qual
pode praticar, individualmente, atos de alienação ou oneração.
Ex.: a lei permite que cada comproprietário faça hipoteca sobre a sua quota. Se um comproprietário, para
garantir uma obrigação que tem com terceiro, permitir constituir hipoteca, para fazer isto precisaria do
consentimento do outro comproprietário.

O QUE É QUE SE ENTENDE POR ATOS DE ADMINISTRAÇÃO?


O sentido normal da expressão é ato destinado à conservação ou à fruição da coisa – ou à preservação ou
então à obtenção de rendimentos.
Decisões nesse teor são decisões de administração – o que exceder a administração ordinária, carece de
unanimidade.
Se o ato de administração ordinária (de conservação ou fruição) implicar despesas, a regra (1411ºCC) é a de
que todos os comproprietários devem participar nessa despesa (mesmo aqueles que integram a minoria,
aqueles que se opuseram), na proporção das suas quotas.
Há situações em que cada comproprietário pode atuar sozinho, sem necessidade de intervenção dos outros.

QUAL É O OBJETO DE CADA COMPROPRIETÁTIO? QUOTA OU COISA?


Este é um problema muito formal.
Supondo que comproprietário é proprietário de uma quota: segundo o CC, os direitos reais só podem incidir
sobre coisas corpóreas (1302ºCC) e a quota ideal não é uma coisa corpórea. Se o direito de cada qual incide
sobre a quota, então parece que a coisa não tem proprietário (cada um é proprietário de uma quota, então a
coisa comum fica sem proprietário).
 Os direitos incidem diretamente sobre a coisa e como estão em colisão, daí resulta que estamos
perante uma hipótese de sobreposição de direitos paralela – todos são proprietários da coisa, todos
concorrem uns com os outros, logo, todos se limitam reciprocamente.

Daqui decorre o PRINCÍPIO DA PARIDADE – os comproprietários, em termos qualitativos, são iguais (pares)
– têm todos o mesmo direito, da mesma espécie.
Daqui decorre que, como regra geral, quaisquer decisões devem ser unânimes (há muitas exceções) – em
princípio, sendo todos igualmente proprietário, se existem questões que afetam a propriedade, são decisões
que respeitam a todos.

Este princípio (regra) tem exceções, há situações em que não é necessária a unanimidade.
1. Há situações em que basta a maioria – para que uma decisão seja tomada, basta que a maioria dos
comproprietários tome a decisão.
É, fundamentalmente, a hipótese que está contemplada no 1407ºCC – em princípio, cada comproprietário pode
administrar a coisa comum individualmente, ou seja, sem intervenção dos outros.
 Este artigo, em parte, remete para o 985ºCC – contrato de sociedade,
Ex.: se a casa é comum e o vidro da janela se partiu, basta que um deles tome a decisão – toma a decisão em
benefício de todos.
Se houver oposição – se algum se opuser a que um deles se decida quanto à administração, então a maioria
deve decidir. Essa maioria é dupla (no sentido de que é uma maioria de pessoas – mais do dobro – e é
necessário que essa maioria de pessoas represente, também, a maioria de quotas).

2. No que diz respeito à utilização da coisa comum, cada qual pode usar a coisa objeto de
compropriedade livremente, mas tendo em atenção que os outros comproprietários têm também direito
de utilização.
Assim, o exercício do direito de utilização por um não pode prejudicar os demais. Por isso, deve ser feito um
acordo de utilização da coisa comum (artigo 1408ºCC) – os comproprietários podem estabelecer as regras que
entenderem, do modo que entenderem, desde que isso seja apenas relativo à utilização. Entende-se que essas
regras de utilização apenas valem internamente e não são oponíveis a terceiro. Dando-se a entrada de novos
comproprietários, estes não são abrangidos por essas regras.
Ex.: a utilização do terreno que é objeto de compropriedade, através da repartição por frações é perfeitamente
legítimo, desde que se trate apenas de uma divisão de utilização.

3. Cada comproprietário tem o poder de dispor/onerar livremente o seu direito, na medida da sua quota
(artigo 1408ºCC).
O que está neste artigo é um conjunto de redundâncias – se, na compropriedade, cada comproprietário tem
um direito de propriedade distinto dos demais, cada qual pode fazer o que entender com o seu direito (vender,
doar, hipotecar, etc.), desde que o esteja a fazer na medida do seu direito, na medida da sua quota.
Isso não afeta os direitos dos demais comproprietários.
 Cada comproprietário não pode alienar/onerar alguma parte especificada da coisa comum, porque a
parte especificada é uma parte física/material da coisa comum e, portanto, pertence a todos. Na
compropriedade pro indiviso, nenhum dos comproprietários tem direitos exclusivos sobre partes
especificadas, tal qual não têm direitos exclusivos sobre a coisa comum.
 Qualquer divisão que haja é divisão de utilização e, por isso, se no terreno que está em compropriedade
algum dos comproprietários demarcar uma parcela de terreno e a vender, essa venda equivale a venda
de bem alheio porque o que está a ser alienado é só parcialmente próprio

4. Para haver uma limitação do poder de disposição de cada comproprietário, na medida em que nos
termos do 1409ºCC, quando o comproprietário proceda à venda ou à dação em cumprimento do seu
direito (só nestas duas hipóteses – não é qualquer ato de alienação), os demais comproprietários têm
preferência na alienação do direito daquele que quer vender.
O comproprietário que pretende vender deve dar conhecimento aos demais comproprietários, para que estes
decidam se querem ou não querem preferir. Não sendo cumprido este procedimento, os outros
comproprietários podem recorrer a ação de preferência para obterem a respetiva substituição no lugar do
adquirente. Isto não impede a alienação, nem constitui um obstáculo – o comproprietário deve apenas dar
conhecimento do que pretende fazer.

5. Cada comproprietário dispõe também individualmente do direito potestativo de extinguir/pôr termo à


compropriedade através da divisão da coisa comum (artigo 209ºCC).
Aqui já não é só divisão em termos de utilização, é divisão para extinguir a compropriedade.
De um modo geral, a divisão pode fazer-se materialmente ou apenas juridicamente.
 A divisão material (fracionamento da coisa comum) supõe: (1) que a coisa é divisível (se for indivisível
já não é possível – além dos critérios de indivisibilidade que resultam do 209ºCC, tem que se
acrescentar as situações em que a própria lei proíbe a divisão, como é o caso de os prédios rústicos
não poderem ser fracionados, abaixo da unidade mínima em rutura, nos termos gerais do artigo
1376ºCC); (2) as partes pretendem. Quando esta não é possível ou quando os proprietários não a
pretendem, passamos para a divisão jurídica – extingue-se a compropriedade.
 Nas hipóteses de divisão jurídica, o que se fará é a venda a terceiro de coisa comum com a
consequente repartição do preço obtido pelos comproprietários, em função das respetivas quotas; ou
pela adjudicação da coisa comum a um dos comproprietários, ficando este com a obrigação de compor
as quotas do restante em dinheiro (em vez de se vender a terceiro, “vende-se” a um dos
comproprietários que fica apenas com a obrigação de compensar os restantes comproprietários com
o valor equivalente às respetivas quotas).

Divisão da coisa comum.

A divisão far-se-á havendo acordo entre os comproprietários e far-se-á judicialmente na falta de acordo, sendo
necessário o tribunal decidir. A decisão voluntária, tratando-se de imóveis, fica sujeita a escritura pública ou
documento autenticado.
Acrescenta-se que os comproprietários, contudo, podem convencionar a indivisão, ou seja, pode haver uma
cláusula pela qual os comproprietários (unanimemente) tenham decidido excluir-se a si próprios do direito de
impor a divisão (a lei estabelece um prazo máximo de duração dessa cláusula – 5 anos – podendo ser
renovada), independentemente da sua quota.
Com esta cláusula, seja como for ou quem for, fica impedido de impor a divisão por aquele prazo, no máximo,
ainda que se admita a renovação por período idêntico. Esta cláusula é suscetível de registo – mesmo que
algum dos comproprietários tenha alienado a sua quota a terceiro, o novo comproprietário terá que respeitar a
cláusula de indivisão.

Quando a divisão seja material, aplicam-se as regras da partilha da herança (2119ºCC), o que significa que a
divisão tem caráter retroativo. Portanto, ficciona-se que nunca houve compropriedade e que cada um dos
comproprietários existiu (em que foi constituída). A ideia central é a de que se eram comproprietários de um
terreno com 15 hectares e o dividiram em 3 parcelas com 5 hectares cada – cada um é proprietário exclusivo
da sua parcela com 5 hectares.
Isso significa que, se algum deles hipotecou o seu direito, hipotecou na medida de um terço e não sobre uma
certa parcela de terreno porque o terreno é de todos.

Perante a divisão formal, a parcela que vier a caber àquele proprietário que hipotecou o seu direito, é a parte
que fica hipotecada.

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