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Para haver uma obrigação supõe-se uma relação entre duas pessoas. Para haver uma obrigação
tem que haver alguém obrigado (o devedor), mas também tem que haver alguém com o direito
de exigir o cumprimento das obrigações (o credor).
Ao contrário, os direitos reais são direitos sobre coisas, ou sejam, na essência não são direitos
contra outras pessoas, mas são direitos sobre coisas. Este é o conceito intuitivo de direito real.
Real no fundo aparece a partir da designação rege.
Qualquer direito que incidisse sobre uma coisa seria um direito real, na medida em que
implicaria um poder material sobre a coisa (no sentido de que quem tem direito sobre certa
coisa tem direito de manipular essa certa coisa). Mas se dizemos que o direito real é só o direito
de dispor materialmente sobre uma coisa, há uma série de direitos que geralmente são
qualificados como reais que não cabem nesta qualificação. Mas esta não é a opinião majoritária.
Exemplo 1: uma hipoteca não implica, para o credor que tem a hipoteca, poderes materiais
sobre a coisa hipotecada. O A para comprar uma casa pede empréstimo ao banco de €
40.000,00. 0 banco empresta, mas com uma garantia, a hipoteca sobre o imóvel comprado.
Constituída a hipoteca a favor do banco, o banco não fica com nenhum poder material sobre a
casa. Ou seja, a casa continua a pertencer a quem comprou e essa pessoa é que dispõe do imóvel
só do ponto de vista jurídico é que se pode dizer que a casa está hipotecada. Então nas hipotecas
não há poderes materiais sobre a coisa hipotecada e a hipoteca em Portugal é tida com um
direito real.
Exemplo 2: quanto aos direitos de preferência, sabe-se que o contrato promessa pode ter
eficácia real, nos termos do art.413º, nessa situação o promitente comprador que tiver promessa
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com eficácia real tem o direito de impor a aquisição, não só contra o promitente vendedor, mas
também contra terceiro. Ou seja, o A prometeu vender ao B um apartamento e atribuíram
eficácia real a esse apartamento. Se por ventura o A vender o apartamento a C, violando a
promessa, o B pode exercer o seu direito de aquisição não só contra o A, mas também contra o
C. Tem-se entendido que isto é um direito real de aquisição que não implica qualquer direito
real de utilização sobre a coisa.
Isto era a chamada Teoria Realista, que concebia o direito real como a qualificação jurídica
correspondente à atribuição de um poder material sobre uma coisa, ou numa versão mais
evoluída, de um poder jurídico que autorizava o seu titular a praticar atos materiais sobre uma
coisa – são direitos sobre coisas, não são direitos contra outras pessoas (conceito intuitivo). Por
oposição surge a chamada Teoria Personalista, para esta todos os fenómenos jurídicos (direito
real ou não) se integram dentro de uma relação jurídica. Portanto, sempre que se atribuiu a
alguém um direito necessariamente isso implica uma relação jurídica. A diferença entre as
modalidades de relação jurídica estaria no lado passivo, nos direitos de crédito o sujeito passivo
é determinado, ou seja, o devedor ou devedores são pessoas previamente identificadas. Ao
contrário, a relação jurídica correspondente ao direito real teria sujeito passivo indeterminado, à
partida não se sabe quem é.
Exemplo: Se eu sou proprietário de um telemóvel, todas as outras pessoas que não sejam eu,
têm que respeitar a minha propriedade, o meu direito vale contra qualquer pessoa, seja uma
pessoa próxima ou não. Eu não sou proprietária de um telemóvel para estar a dizer às pessoas
que aquilo é meu. Quando construímos uma relação jurídica o que estamos a dizer é “sou
proprietário do telemóvel logo pode exigir a todos os outros que não se intrometam na minha
propriedade sobre este objeto”. Se a lógica é esta, então a razão para eu ser proprietário, não é
usar o telemóvel seja para que fim for, é dizer aos outros para não se meterem com o meu
telemóvel. Eu compro o telemóvel para usar como eu quero, e não para mostrar aos outros que é
meu.
1. O direito real é aquele direito que concede ao seu titular o direito de atuar autonomamente
sobre uma certa coisa, nos moldes que esse direito permite. O seguro e a hipoteca é um
direito real. Tem que ser poderes de atuação autónoma, ou seja, para exercer esses poderes,
o titular do direito real, não depende da colaboração, da atuação de outra pessoa. Pode ter
mas não depende disso. Voltamos à distinção entre direito real e direito de crédito:
Direito de crédito – o credor tem direito a 5.000 €, se o devedor não colaborar com
isto, este direito não se executa. Enquanto o devedor não entregar o dinheiro, o
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credor não recebe. Ter direito a algo, significa apenas que pode exigir. Se
efetivamente os consegue ou não, depende da colaboração do outro. Se o devedor
não colabora (ele não colabora por favor, é uma obrigação) o efeito do credor não
se consegue executar
Em todos os direitos de crédito, a existência do direito, e sobretudo a sua
eficácia, depende da colaboração de outra pessoa.
Direito real – existe o poder de atuação autónoma e portanto, o titular do direito real
para o exercer não depende da colaboração de outra pessoa, pode tê-la mas não é
essencial.
A ideia geral é de que: sempre que existam poderes de atuação autónoma (que não dependem de
atuação de terceiro) sobre uma coisa, em princípio o direito é real. Há no entanto situação em
que existe esse poder de atuação autónoma mas, segundo a opinião comum, o direito mesmo
assim não é real.
Então que outra característica pode existir mais para diferenciar um direito real de todos os
outros direitos, em que este poder de atuação autónoma também existe, mas que não são tidos
como reais? A ideia é: há vários tipos de direito sobre coisas, em que existe um poder de
atuação autónoma, mas nem sempre estamos perante direitos reais. Tem que haver outra
característica:
2. oponibilidade ergo omnes (eficácia real) – há direitos com poderes de atuação autónoma
que valem entre as partes, como também para terceiros e há direitos, que atribuem essa
atuação autónoma, mas que não valem perante terceiros, só valem perante as partes. No
primeiro caso existe oponibilidade ergo omnes, estamos perante direitos reais e no segundo
não.
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Exemplo 1: se o A proprietário de um apartamento concedeu a B o usufruto do mesmo, mesmo
que haja mudança de proprietário, o B permanece como usufrutuário. O usufruto do B deixa de
estar estreitamente ligado ao ato constitutivo e passa a ter uma existência absoluta, ou seja, que
vale independentemente de quem seja o proprietário.
Então o direito do arrendatário é real ou não? Porque passou a estar dotado desta oponibilidade
perante terceiros. A opinião maioritária é no sentido de que não é real.
1. que haja uma atuação autónoma sobre uma coisa – o titular do direito não pode estar
dependente da colaboração de outra pessoa.
2. e que esse poder de atuação autónoma, tenha eficácia perante terceiros, ou seja, que
valha não apenas na relação entre os intervenientes que deram origem a esse direito,
mas também perante terceiros.
Publicidade
No caso de móveis, por exemplo o meu telemóvel, que eu uso todos os dias, a
publicidade do mesmo pode-se assegurar pela posse.
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No caso dos imóveis, por necessidades históricas existem instrumentos específicos
designados para esse efeito, como é o caso do registo predial.
Exemplo: o A vendeu o prédio ao B. Faz-se uma inscrição de compra conexionada com aquela
descrição. O B deu o prédio de hipoteca a favor de C, e o contrato é inscrito em conexão com a
descrição. O que se pretende é que haja uma continuidade de inscrições relativas aquela
descrição, de modo que haja uma história jurídica daquele imóvel.
Traço sucessivo – é o conjunto de inscrições relativas a um certo imóvel, que mantenha uma
conexão lógica. Não é só no sentido que esteja lá tudo, tem que estar inscrito com coerência.
Exemplo: o A vendeu ao B. E o C constitui hipoteca sobre esse imóvel. Quem devia ter
constituído a hipoteca era o B, porque de acordo com a história que está no registo, tem que ser
o B a fazê-lo porque é o atual proprietário.
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Portanto a grande diferença entre publicidade provocada registal e não registal é que:
a registal oferece uma informação centralizada e global, ou seja, que pede a informação
sobre o prédio obtém a informação sobre todos os factos que sucederam em relação ao
prédio em vigor, ou não. Mas não é uma informação qualquer, é uma informação fidedigna.
Está informação é obtida nas inscrições. Temos a chamada fé pública registal – art.7º C.
Registo Predial – se foi inscrito que o A vendeu ao B, está inscrito que o B comprou, a lei
presume que o facto é válido e presume que o B é o titular.
Registo predial
Definição geral: tem em vista dar publicidade à situação jurídica dos bens imóveis – art.1º - a
ideia é que existe um assento principal chamado descrição onde se faz a identificação do imóvel
e depois, em relação a essa inscrição tem diversas inscrições. Portanto, cada facto que sucede
relativamente aquele imóvel é objeto da inscrição. O conjunto das inscrições dá conhecimento
sobre a situação jurídica do prédio.
1. obrigatoriedade de registo (art.8º -A) – significa que a falta de inscrição, quando ela deva
ser requerida, implica que a pessoa que devia pedir o registo fique sujeita a uma pena, que
em geral consiste no pagamento do dobro emolumento (para todos os efeitos, a
conservatória presta um serviço, o pagamento desse serviço faz-se mediante o pagamento
do emolumento).
Se a pessoa que devia pedir esse registo o não pedir dentro do prazo que tem para
pedir – normalmente o prazo é 30 dias – o pedido fica fica sujeito ao dobro do
emolumento.
Ao pedido de registo chamasse apresentação, ou seja, quem pede o registo
apresenta os documentos para o registo.
2. Sujeitos da obrigação de registar – Não é a pessoa que tem interesse no registo que em geral
está obrigada a pedir o registo. O que adquire direitos sobre determinado prédio, aquele que
é beneficiário da inscrição em causa, é o sujeito ativo, o outro é o sujeito passivo. Não é
em geral o sujeito ativo que está obrigado a pedir o registo. Quem está obrigado a pedir o
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registo é a entidade que formaliza o facto sujeito a registo, (exemplo: o notário que
formaliza a compra e venda feita por escritura pública. Ou um advogado).
O sujeito ativo tem legitimidade para pedir o registo, naqueles casos em que não existe
entidade para formalizar o facto, ou então naqueles casos em que essa entidade que
formaliza, não o fez.
Deve apreciar a legalidade registal, ou seja, deve apreciar se as regras próprias do registo
estão a ser cumpridas por aquela apresentação (exemplo: verificar se o emolumento foi
pago, verificar se o registo pode ser feito tal qual como está a ser pedido, de acordo com os
registos anteriores).
Mas o conservador deve também apreciar a legalidade substantiva → deve apreciar se o ato
(exemplo: compra e venda) apresentado a registo respeita as regras de validade que a lei
exige para esse mesmo ato, tanto quanto possível.
Exemplo 1: o conservador consegue perceber que o ato é inválido, mas o defeito
que gera essa invalidade determina anulabilidade, o conservador não pode recusar o
registo neste fundamento, porque isto não é fundamento de recusa porque a pessoa
em cujo interesse a lei estabelecer a anulabilidade é que pode anular.
Exemplo 2: se quem vendeu é maior acompanhado, em princípio o ato é anulável,
mas se o respetivo acompanhante ou o próprio não pediram a anulação, não é o
conservador que se vai substituir, nem pode. Numa hipótese destas, tem que aceitar
o registo.
Por outro lado – art.69º – mesmo quando se trate de defeito que conduza à nulidade,
o conservador só pode recusar no pressuposto de que é nulidade manifesta, ou seja
que evidentemente o ato é nulo. Se não houver esta evidencia não pode recusar
(nº1, al.d)).
A conservatória pode recorrer a meios de prova para apreciar acerca de validade do ato
praticado e do ato que se pretende registar, mas somente em função dos documentos
apresentados. Ou seja, se avaliar se um ato é válido ou não, essa avaliação só pode ser feita
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em função dos documentos apresentados, ou eventualmente de outros documentos que
estejam arquivados no próprio conservatório.
Ou faz o registo;
Ou recusa o registo;
Só excepcionalmente é que pode recusar. Só pode recusar nos casos identificados no art.69º do
C. Registo Predial. Ou se verifica um desses casos previstos ou tem que registar.
Exemplo: a última pessoa inscrita é o A, e agora há uma escritura apresentada a registo em que o
A vende ao B. O conservador pode legitimamente levantar a dúvida de saber se o A, que
aparece como vendedor naquela escritura de compra e venda é o A que está registado como
último titular inscrito.
De acordo com o art.7º C. Registo Predial, a fé pública registal só se produz para o registo
definitivo. Só se pode assumir que a informação constante do registo corresponde à realidade,
tratando-se de registo definitivo. Claro que se o registo é provisório por dúvidas não pode fazer
fé, porque se o próprio conservador tem dúvidas sobre a viabilidade, o público não pode fazer fé
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daquilo que o próprio conservador tem dúvidas. Ao contrário, se o registo provisório for feito
por natureza, que é muito semelhante ao registo definitivo, onde a diferença é apenas formal – é
o prazo de vigência – este registo ultrapassou a marca das dúvidas.
Estar dotado de fé pública é poder tirar-se a presunção de que os efeitos correspondentes aquele
acontecimento registo, sucederam mesmo.
Qualquer registo tem ao mesmo tempo efeitos para terceiros (público) e tem efeitos para o
sujeito ativo (aquele que beneficia da inscrição). Para terceiros, o efeito do registo é sempre o
mesmo:
Fé pública.
Enunciativo;
Constitutivo;
Consolidativo;
Atributivo.
A fé publica significa que terceiros podem partir do princípio de que aquilo que está inscrito no
registo corresponde à realidade. A fé pública tem 2 significados, conforme a figuração da
situação, podem pôr-se duas hipóteses:
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Exemplo 1: o A vendeu a B, mas o registo do B não foi logo efetuado. Até que
o B efetue o registo, presume-se, por aplicação do art.7º que o A é o
proprietário apesar de não o ser. Se o A vender a C, o C pode partir do princípio
que está a comprar ao proprietário. Mas a compra e venda não é válida, o B é
proprietário. Só que isto tem que ser provado, até se fazer prova o A é
aparentemente proprietário. Tem que ser o B a fazer prova. Presume-se que
tudo o que aconteceu foi a registo.
Exemplo 2: o A vendeu ao B e o registo a favor do B não foi de imediato
efetuado. Entretanto o C, que era credor do A, registou uma penhora do imóvel
que o A vendeu ao B. Não havendo registo a favor do B, presume-se que o
imóvel continua a pertencer ao A e por isso o C pode penhorar aquele imóvel.
Se o C prevalecer sobre o B, o A não tem responsabilidade.
Sentido positivo – presume-se a exatidão do registo, presume-se que os factos inscritos
no registo, realmente aconteceram e em segundo lugar, que são válidos, presume-se que
produziram os respetivos efeitos.
Neste sentido está pressuposto uma situação linear.
Exemplo: o A vendeu um imóvel ao B e o B vendeu esse mesmo imóvel ao C –
pressupõe três pessoas em sucessão. O C é adquirente do B e é subadquirente
do A. Quer o B, quer o C efetuaram o registo. O que sucede é que se comprova
que o negócio entre A e B é inválida – erro, simulação, incapacidade de registo,
etc... – a invalidação deste ato, implica a invalidação dos atos subsequentes. Se
a venda A/B é nula por falta de legitimidade, comprova-se então que o B não
tinha legitimidade para vender a C. A venda de B/C é venda de bens alheios.
Nesta situação o que é que a fé pública justifica para o C? Até prova disto tudo,
o C pode presumir que o B é o proprietário, e que todos os atos inscritos no
registo são válidos e eficazes. É uma presunção legal que pode ser ilidida, mas é
preciso que se prove o contrário. É necessário que A ou B comprove que a
venda A/B não vale porque tem um vício, comprove que esse vício existe e que
por isso o negócio B/C não pode produzir efeitos, porque o B não tem
legitimidade para transmitir. Esta é a regra, a menos que o C esteja em
condições para se produzir o efeito atributivo.
Efeito triangular:
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Efeito linear:
Efeito enunciativo
É um efeito excecional que se dá quando o facto que se regista, já é por si próprio um facto
público. Estamos no pressuposto de que o que está a ser publicitado já é público. O registo é um
ato inútil, e por isso mesmo, o efeito só se produz nos casos especialmente previstos na lei, só
sucede quando a lei estabeleça que ele tem efeito enunciativo.
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Registo da mera posse – não é usucapião, mas pode ser registada para efeitos de
usucapião para abreviar o prazo do mesmo. O que registo só se pode fazer no
pressuposto que ela dura à pelo menos 5 anos de forma pública.
Efeito constitutivo
É um efeito excecional, não é o que geralmente sucede. Verifica-se sempre que o registo seja
um elemento indispensável para a produção de todos os efeitos do facto sujeito a registo.
Enquanto o registo não for feito, esse facto não tem quaisquer efeitos:
Efeito consolidativo
Efeito normal do registo – art.5º, nº1 do C. Registo Predial – significa que na falta de indicação
legal em sentido contrário, quando alguém procede ao registo o efeito do registo é este.
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instante o efeito dá-se de imediato ainda que a coisa não seja logo entregue, ainda que o preço
não seja de imediatamente pago, e ainda que o registo não seja efetuado de imediato.
Exemplo: se o A vende a B, supondo que a venda é válida, quando o contrato de compra e venda
estiver formalizado pela escritura pública, nesse instante o B é proprietário, mesmo que o
imóvel não tenha logo sido entregue ao B, mesmo que o B não tenha pago a totalidade do preço
e MESMO que o registo a favor do B não tenha sido imediatamente efetuado.
Por isto pode-se dizer que o registo não é constitutivo, e que os efeitos normais associados
aquele contrato produziram-se. O registo é irrelevante e por isso tem efeito enunciativo, que é
praticamente um ato inútil.
O que está implícito neste efeito, é que o registo quando não seja feito ou que não seja feito
atempadamente pode acarretar consequências negativas para o titular do direito em causa. Isto é,
o registo não dá direitos, mas a falta de registo pode tirar direitos, quando designadamente outra
pessoa se constitua numa situação incompatível. A ideia é:
Enquanto o registo não tiver efetuado, a situação do adquirente é precária, não porque os efeitos
não estejam produzidos, mas porque está sujeito à eventualidade de um terceiro adquirir um
direito incompatível e colocar-se numa situação, também ela incompatível. Enquanto o
adquirente estiver sem registo, está nessa situação precária. Assim que regista deixa de estar
nessa situação precária porque já ninguém pode registar um facto prioritário em relação ao seu.
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Quando é que o terceiro se coloca em situação de incompatibilidade, ou seja alguém que não
devia adquirir pelas regras normais e acaba por prevalecer sobre aquele que pelas regras
normais deveria ter adquirido? Nas situações em que o terceiro beneficie do efeito atributivo.
Efeito atributivo
Quando alguém se coloca numa situação que em princípio não mereceria proteção, em que os
efeitos jurídicos não deveriam produzir-se, mas preenchem-se a seu favor uma série de
requisitos que permitem dar-lhe prevalência sobre o legitimo titular, que adquiriu de acordo
com as regras substantivas.
Na situação triangular, o C terá efeito atributivo quando a sua posição prevaleça sobre a do
B (legítimo titular).
Na situação linear, quem pode beneficiar do efeito atributivo é o C, prevalecendo sobre o A,
no pressuposto que a venda A/B não vale porque tem um vício qualquer e antes dessa
invalidade ser declarada o B vende a C. A venda B/C também não vale, dado que o B não
tem legitimidade para vender a C, e o A ainda é o atual titular. Só que se o C estiver nas
condições do efeito atributivo, irá prevalecer sobre A e adquirir. O A perde o direito em
favor do C.
Quando é que se verifica o efeito atributivo? Quais são a s condições de que depende o efeito
atributivo? Temos 2 possibilidades, ou aplicamos o art.291º CC ou aplicamos o art.17, nº2 do C.
Registo Predial. Ambos estão escritos a pensar na situação linear, ainda que se possam estender
à situação triangular.
Exemplo: na situação linear, para que o C (terceiro de boa fé) possa gozar de proteção, supõe-se
que regista e que a pessoa de quem o C adquiriu (o B) tenha também registo.
O art.17º, nº2 diz que a nulidade do registo não prejudica os direitos adquiridos por terceiro que
tenha registo, isto quer dizer que se eventualmente o registo do B for nulo, isso não prejudica C,
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se este tiver registo a seu favor. Se o C está de boa fé, adquire a título oneroso e regista, a
nulidade do registo do B não o prejudica.
Ao contrário, o art.291º só faz depender a sua aplicação do facto do C ter registo. Não se
pressupõe que o B também tenha registo. Se vamos aplicar este artigo nestas circunstâncias, o
que estamos a dizer é: neste entendimento, tanto podemos aplicar para o C o art.17º, nº2, como
o art.291º, dependendo apenas disto:
Ou seja, se há registo prévio a favor da pessoa a quem o terceiro adquire, aplicamos o art.17º,
nº2. Se não há registo prévio aplicamos o art.291º. Em termos objetivos isto seria muito fácil.
Só que para o C registar sem que o B tenha registo anterior, estamos perante uma situação quase
impossível, porque uma regra essencial do registo é o traço sucessivo, ou seja que haja uma
coerência na sucessão de factos. Então o art.291º muito poucas vezes se aplicará. O art.17º, nº2
está ligado ao art.16º do C. Registo Predial, o que o art.17º, nº2 protege é o terceiro de boa fé
contra nulidades do ato de registo, não é contra nulidades do facto registado.
Na situação linear, uma coisa é que a compra e venda A/B tenha um defeito qualquer que
impeça os seus direitos, como a coação, o dolo, etc.., outra coisa é que o registo desta compra e
venda tenha um defeito. Uma coisa são defeitos ou vícios do facto sujeito a registo, outra coisa é
defeitos ou vícios do próprio ato de registo. O ato de registo é um ato diferente do facto que se
regista. São acontecimentos diferentes e por isso pode haver defeitos próprios de cada um.
Exemplo: uma coisa é o notário não assinar a escritura da compra e venda de um imóvel, outra
coisa é o conservador não assinar o ato de registo dessa compra e venda. Se a escritura não foi
assinada pelo notário, no fundo não é escritura, porque ela tem que ser assumida pelo seu autor,
que é o notário, tudo se passa como se não houvesse escritura e a sua consequência é nulidade
da compra e venda por falta de forma. Outra coisa é a escritura de compra e venda ter sido
assinada pelo o notário e por isso não haver defeito na compra e venda, e o conservador do
registo não o ter registado. O ato do registo, não tendo sido assinado pelo oficial em causa não
vale enquanto ato de registo e por isso o ato é nulo (art.16º), a compra e venda cujo registo é
nulo não é inválida, o facto do registo ser nulo não pode implicar a nulidade da compra e venda.
O art.17º, nº2 protege contra este género de invalidades (do ato de registo). Se a compra e venda
de A para B é válida e o registo dessa compra e venda é que é inválido, no critério que
estávamos a seguir aplicamos o art.17º, nº2 para proteger o C contra uma nulidade de registo e
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não de compra e venda, porque no art.17º, nº2 só estão as nulidades do registo, que são as
nulidades do art.16º.
Se o art.17º, nº2 tem em vista proteger o terceiro contra nulidades do ato de registo, só o art.219º
é que se pode aplicar quando a invalidade seja não do ato do registo, mas do próprio facto
registado.
Exemplo: se da compra e venda A/B o vício é do registo dessa compra e venda (ato exterior), o
C pode invocar o art.17º, nº2 a seu favor. Mas se o vício está na própria compra e venda (foi
celebrada sobre coação moral e por causa disso foi anulada), estamos perante uma invalidade
substantiva, ou seja da própria compra e venda e nesse caso o C para ser protegido deve invocar
o art.291º.
Exemplo: se o A vende a B e o B vende a C e depois se vem a descobrir que a venda A/B não
valer porque tem um direito qualquer, então a venda B/C também não vale. Normalmente o C
não deveria adquirir, mas se o C estiver nas condições do art.291º, esse artigo dá-lhe o direito
que ele não adquiriu por via da compra e venda. No fundo é uma forma alternativa e sucedânea
em relação ao meio normal de aquisição. Só excepcionalmente é que o artigo funciona.
Resumo:
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Ambos os artigos estão concebidos a pensar nas situações lineares. As situações triangulares
diretamente não estão previstas. Hoje em dia pode-se dizer que a opinião maioritária é estender
o art.291º às situações triangulares. A situação do C é idêntica em ambos os casos neste sentido:
Situação linear – A vendeu a B e B vendeu a C e depois descobre-se que a venda A/B não é
válida. Portanto a venda de B para C fica venda viciada por ilegitimidade do B. O C está
pretensamente a adquirir de quem não tem legitimidade para lhe dar.
Situação triangular – A vendeu a B, e este não registou de imediato e A aproveitasse da
situação e vende a C. O C está a adquirir de quem não tem legitimidade para lhe dar.
Em ambas as situações o C está a adquirir de uma pessoa que não legitimidade para lhe
transmitir e daí dizer-se que o art.291º é extensível para as situações triangulares.
Problema suplementar: questão de saber quem é que é terceiro nas situações triangulares:
Conceito restrito → Há quem entenda que só são terceiros aqueles que adquiram de
um autor comum (B e C adquirem de A) com intervenção da vontade desse autor
comum (implica que haja negócio jurídico de A para B e de A para C) – se algum
destes adquiriu pretensamente direitos por outra via qualquer que não seja por negócio,
esse que adquiriu por essa outra via não é terceiro. Ao não ser terceiro não pode invocar
o efeito atributivo.
Exemplo: o B não registou de imediato e, entretanto, o C, que é credor do A,
registou uma penhora sobre o imóvel que o A tinha vendido a B. Como o B
não tinha inscrito ainda, presumivelmente o imóvel pertencia ao A. O C
(presumivelmente) pode registar penhora sobre o imóvel. Nós sabemos que o
imóvel já não pertence ao A mas sim ao B – art.408º, nº1 CC – mas o C não
sabe, o C só tem informação segundo o registo. Nestas condições o C não
pode beneficiar do efeito atributivo, não preenche as condições do art.291º,
não o pode invocar na medida em que o direito que o C adquire (direito de
garantia) não foi adquirido por negócio jurídico. A penhora resulta apenas da
vontade do C e não do A.
Conceito amplo → São terceiros todos aqueles que adquiram direitos incompatíveis,
sem importar como é que os adquirem. Se adquirem por intervenção do autor comum
(A) ou não. Este problema só se coloca nas situações triangulares.
Exemplo: se adotássemos o conceito amplo no exemplo anterior, o C já seria
terceiro, porque não importa como o C adquire. O A não tinha legitimidade
para dar, só que uma vez que o B ainda não tem registo, presumivelmente o
imóvel ainda pertence ao A e presumivelmente o C pode registar penhora. Se
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o consideramos terceiro, daí resulta que está em condições do efeito atributivo
ser invocado a seu favor. Falta saber (posteriormente) se os requisitos do
art.291º estão preenchidos ou não.
No conceito restrito, se o C não cabe nesse conceito nem vale a pena ir verificar se os requisitos
do art.291º estão preenchidos, é irrelevante. Mas no conceito amplo o C já seria terceiro e por
isso já se podia colocar a hipótese do art.219º estar preenchido. Na lei foi inserido um nº4 no
art.5º do C. Registo Predial em que aparentemente se consagrou o conceito restrito. O professor
Gonzáles concorda que o conceito amplo deva ser adotado, porque se este conceito não se
adota, o registo acaba por servir para muito pouco, porque isso significa que estamos a reduzir o
campo das pessoas que pode confiar no registo.
Requisitos do art.291º:
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para o B e na sequência para si (C). Para que este requisito esteja verificado, é necessário
que o registo a favor da pessoa de quem o terceiro adquire, esteja feito no momento em que
ele adquire, porque isso é que é o fundamento da boa fé. Exemplo: na situação linear quando
o C regista, supõe-se para que o art.291º esteja verificado, que o B já tem registo nessa
altura, porque é esse facto que permite dizer que o C está de boa fé. O C tem fundamente
sério para presumir que o B é titular do direito e, portanto, para poder partir do princípio
que o C está de boa fé. Exemplo: na situação triangular, supõe-se que quando o C regista o
registo do A ainda está em vigor.
6. É necessário que decorra um prazo de 3 anos sem que durante esse período, seja intentada
qualquer ação de nulidade ou de anulação do registo do causante – quando é que começa a
contar os 3 anos? Há duas hipóteses:
3 anos a contar da data em que a venda originalmente inválida foi celebrada;
ou 3 anos a contar a partir da celebração da venda B/C.
Se assumirmos a primeira hipótese, isso significa que este requisito estará preenchido por
natureza, se o C comprar ao B já decorridos estes 3 anos. Mas o professor concorda que o
prazo devia começar a contar a partir da venda B/C. Só quando o C adquire ao B, supondo
que todos os outros requisitos estão preenchidos, é que começa a contar o prazo de 3 anos, o
que significa que durante esse período, mesmo que os outros requisitos todos estejam
preenchidos a situação do C é instável, sujeita-se que alguém intente ação de nulidade ou de
anulação da venda A/B tirando depois recupersões que isso produz ao C e se isso suceder
dentro desse prazo, não há nada que o C possa fazer.
Verificados todos estes requisitos, produzem-se para o terceiro os mesmos exatos efeitos que se
produziriam como se o facto que ele registou fosse válido. O art.291º é um sucedâneo do facto
inválido. Se as coisas tivessem decorrido sem defeitos, o C teria adquirido por efeito da compra
feita ao B. Para o C tudo se passa como se o negócio de aquisição fosse válido, mas não é, os
efeitos serão os mesmos. Em termos de direito real, se o C iria adquirir a propriedade por via da
compra e venda, ele vai adquirir essa mesma propriedade por via do art.291º.
O que vai implicar que na situação triangular que o B perde a sua propriedade – poderá
eventualmente exigir responsabilidade por danos causa dos ao A, não ao C.
Na situação linear, o C vai adquirir a propriedade que deveria ter adquirido pela compra
e venda e que não adquiriu por ela ser inválida e vai adquirir a partir de quem a tinha,
ou seja o A. O C teria que pagar ao B o preço combinado. O B vai ter que restituir ao A
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aquilo que obteve indevidamente (o valor correspondente), dado que a compra e venda
A/B não vale.
Titularidade efetiva – situações em que o titular do direito, aquele que aparenta o ser, tem
efetivamente essa titularidade, tem efetivamente o direito que exerce.
Titularidade aparente – situações em que a pessoa aparenta exercer um certo direito sobre uma
coisa, mas realmente não o tem. Está titularidade em direitos reais dá o mesmo que posse, que
são as situações em que alguém aparenta exercer um direito real, quando realmente essa
aparência não corresponde à realidade e portanto a pessoa não tem o direito em causa.
Titularidade Efetiva:
Direito de propriedade:
O direito de propriedade é o direito real máximo, como sinónimo de direito sobre uma coisa
com o maior conteúdo possível e concebível.
art.1305º – tem um conteúdo que não se consegue definir, apenas se consegue enunciar as
características principais. A ideia central é que o proprietário tem todos os poderes sobre a
coisa, que não lhe tenham sido retirados. Portanto, não se consegue identificar o que têm, mas
consegue-se apenas identificar o que não têm. Tudo o que não lhe tiver sido retirado, pertence-
lhe. Apesar da lei tentar uma definição de direito de propriedade, na verdade não é uma
definição, é só uma aproximação – o proprietário normalmente tem os poderes de uso, fruição e
disposição da forma mais plena que for concebível, portanto tem tudo aquilo a menos que esses
poderes ou parte desses poderes lhe tenham sido retirados.
Exemplo: art.409º, quando alguém reserva propriedade até que a parte contrária cumpra certas
obrigações, nesta situação o direito de propriedade está a ser usado como garantia, não é direito
para usar, fruir e dispor, mas é para assegurar o cumprimento de obrigações.
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Por outro lado, a propriedade é um modelo dos demais direitos reais. A ideia central é: por um
lado o direito de propriedade é o mais amplo que há, mas por outro lado é um modelo para os
outros direitos todos que só se conseguem compreender por contraposição, por comparação. O
direito de propriedade é a matriz dos outros direitos reais todos, todos os outros são fundados na
propriedade e ao mesmo tempo, todos os outros direitos reais que não sejam propriedade são,
regra geral, direitos sobre coisa alheia. Todos os outros direitos reais incidem sobre uma coisa
que pertence a outra pessoa.
Então o direito de propriedade é o direito real maior, os outros direitos reais todos são menores,
porque em comparação com a propriedade oferecem menos poderes ao respetivo titular. E ao
mesmo tempo, todos os outros direitos reais menores são em geral direitos sobre coisa alheia.
Se a existência de um direito real menor supõe a existência para outra pessoa de um direito real
maior (de propriedade), isso significa que sempre que há um direito real menor há mais do que
um direito a incidir sobre a mesma coisa. Isso significa que sempre que exista um direito menor
haverá uma situação de sobreposição.
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Exemplo: se sobre o mesmo imóvel incidem duas hipotecas, uma é
necessariamente a primeira hipoteca e outra é necessariamente a segunda. De
um modo geral a propriedade é dada pela ordem do registo. A primeira
hipoteca foi constituída para garantir um crédito de € 100.000,00 ao A. A
segunda hipoteca constituída sobre o mesmo imóvel serve para garantir €
50.000,00 a favor do segundo credor hipotecário, o B. Se a coisa hipotecada
tiver valor superior a € 150.000,00 e for vendido judicialmente por valor
superior a este, ambos os credores conseguem a satisfação do seu crédito. Se ao
contrário, não se consegue obter na venda judicial valor superior, supondo que
o valor que se tira são € 120.000,00 o primeiro credor hipotecário vai buscar os
seus € 100.000,00 e o segundo credor hipotecário vai buscar o que sobra. Se o
imóvel for só vendido por € 90.000,00 o segundo hipotecário não consegue ir
buscar parte do seu crédito. O A prevalece, mas isso não excluí
necessariamente o B.
O direito de propriedade tem garantia constitucional, isso significa dizer que é um direito
equiparado ao direito, liberdade e garantia – isso significa que nos termos do art.17º CRP, fica
submetido à mesma garantia fornecida pelo art.18º aos direitos, liberdades e garantias.
Na origem, o direto de propriedade é um direito que tem por objecto coisas corpóreas. O CC
não faz esta limitação, aceita uma qualificação que distingue as coisas corpóreas – tangidas,
sensíveis – das incorpóreas – intangíveis, não são sensíveis, não se conseguem capturar pelos
sentidos –, o CC aceita que existam direitos de propriedade sobre coisas incorpóreas, só que,
logo a seguir ao art.1303º, estabelece que quanto ao que toca aos principais exemplos de coisas
incorpóreas, os bens objeto de propriedade industrial e propriedade intelectual, quanto a esses,
remete para legislação especial – código dos direitos de autor, código da propriedade industrial.
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Na prática tem pouca relevância dizer que o direito de propriedade pode incidir sobre coisas
corpóreas como coisas incorpóreas. Temos que partir do princípio que do CC, as regras dos
direitos reais menores são extensíveis aos direitos de propriedade sobre coisas corpóreas.
Self-ownership:
Contudo, há partes do corpo que podem ser extraídos sem que a vida da pessoa fique em perigo
– células, sangue, alguns orgão, etc.., essas partes, para todos os efeitos, essas são coisas
corpóreas e estão sujeitas ao direito de propriedade normal, mas tem limitações particulares.
Não é vulgar quando se retira uma parte do fígado, que essas partes do corpo que foram
retiradas sejam preservadas, normalmente são destruídas, mas enquanto não o são, para todos os
efeitos são coisas autónomas. Uma coisa é dizer que essas partes possam ser objecto de
propriedade, outra coisa é dizer que essas partes pertencem ao dono do corpo, não é assim
necessariamente. O sangue depois de extraído é direito de propriedade, mas deixa de pertencer à
pessoa que foi extraído.
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estabelecerem é um direito perpétuo, mas podem estabelecer durante um
determinado tempo. No termo do prazo o direito de superfície extingue-se. Porque é
que isto pode configurar uma hipótese de propriedade temporária? Porque no
entendimento do professor o superficiário tem 2 direitos: tem o direito de superfície
sobre o solo alheio (que é o que lhe permite manter a construção) e tem o direito de
propriedade sobre essa construção ou plantação. Se o direito de superfície for
temporário, o direto sobre a propriedade da plantação ou construção também é
temporário.
Subjetivamente temporária – quando por morte do proprietário não haja um continuador,
o direito de propriedade permanece, mas não tem um continuador. Dizer que a propriedade
é perpétua é uma contradição porque os proprietários são pessoas e sendo pessoas
singulares morrem e sendo pessoas coletivas acabaram por se extinguir mais cedo ou mais
tarde. Do ponto de vista haurido entende-se que, no caso do ser humano, os herdeiros da
pessoa falecida são seus continuadores. Não há uma nova aquisição cada vez que um
herdeiro sucede, por isso é que se pode sustentar que o direito de propriedade em geral é
perpétuo, não porque o seu titular seja perpétuo mas através do fenómeno da sucessão
mortis causa, umas pessoas vão continuando outras e assim sucessivamente. Há no entanto
situações em que a lei admite que um proprietário não tenha continuador, e se não o tem a
propriedade é temporária no sentido que não tem continuação – substituição
fideicomissária, art.2286º – nesta substituição o autor do testamento (A) designa uma certa
pessoa como seu herdeiro (B), mas também estabelece no seu testamento que quando o B
falecer o bem que foi atribuído ao B passa para C. Tem dois herdeiros em sucessão, o
primeiro chama-se fiduciário e o segundo chama-se fideicomissário. O C é herdeiro do A,
não é herdeiro do B. Neste sentido a propriedade do B é subjetivamente temporária na
medida em que não tem continuador. Agora a questão é se o B é proprietário → de um
modo geral, o fiduciário só tem direitos de uso e fruição, só que (art.2290º), ainda que
excecionalmente, o fiduciário tem poderes de disposição. Em caso de necessidade para
preservação do próprio bem ou em caso de necessidade do próprio fiduciário ele pode
promover por exemplo a venda do bem entregue a título fiduciário e por causa disso o
fiduciário tem sido tido como proprietário. E é proprietário subjetivamente temporário.
Defesa da propriedade:
Esta defesa de propriedade também se aplica a outros direitos reais de gozo por força da
disposição do art.1315º.
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Distinguimos ações em:
Ações Possessórias – são ações em que apenas está em litígio saber quem tem posse
entre dois litigantes, e supondo que os dois têm, quem tem melhor posse. A prova que
está a ser apreciada diz apenas respeito a saber quem é que tem a posse ou quem tem a
melhor posse, não está em litígio a titularidade do direito correspondente a essa posse.
Embora idealizadas para defesa da posse, acarretam a defesa do direito correspondente,
a posse corresponde sempre ao exercício de um certo direito, aquele que tem posse atua
como se tivesse um certo direito. Art.1251º - a posse está sempre referida a um direito
real e, portanto, dizer que uma ação tutela a posse é dizer que essa ação protege o
direito correspondente.
Ações Petitórias – são aquelas que se destinam especificamente à defesa da
propriedade e são, portanto, aquelas ações em que o está em litígio, não é só a posse,
mas é saber quem é proprietário entre os dois litigantes.
Exemplo: se alguém é proprietário de uma casa e alguém sem
consentimento do proprietário ocupa essa casa, juridicamente aquele que
ocupou tem posse, é uma posse ilícita. Quem não tem a posse é o
proprietário e é por isso que ele vai intentar uma ação para reaver a posse.
Nessa situação, o que se discute não é a posse, o que se discute é saber se o
proprietário é aquele que foi vítima da ocupação ou se o proprietário foi
aquele que ocupou. Se o A intenta ação a pedir para afirmarem que é
proprietário, isso supõe que é proprietário.
Legitimidade ativa (quem pode intentar a ação) – é o proprietário que o consiga provar
ou o titular de outro direito real de gozo que o consiga provar;
Legitimidade passiva – qualquer pessoa que indevidamente tenha a coisa a seu poder,
não importa se a tem a título de posse ou a título de detenção, não importa se está de
boa ou de má fé.
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Não há prazo para intentar ação, porque a propriedade é um direito tendencialmente
perpétuo. Pode eventualmente existir um prazo, porque o réu pode estar em condições de
invocar usucapião e isso implica extinção de propriedade do reivindicante.
Ação negatória – não está diretamente prevista na lei mas é unanimemente aceite. Pressupõe
que o autor mantenha a posse da coisa objeto do seu direito, mas pressupõe-se tambem que
outra pessoa (terceiro) pratique atos que perturbem o exercício normal da propriedade.
Não tem prazo, porque a propriedade é um direito tendencialmente perpétuo, sem prejuízo de o
réu estar em condições de invocar a usucapião.
Se o que está em causa for não saber onde é que está a linha divisória, porque um alega que
certa parcela do terreno é sua e o outro alega que essa mesma parcela é sua, o problema aí já não
é saber onde é que está a linha divisória, mas é saber quem é que adquiriu aquela parcela.
Deixamos de estar numa ação de demarcação e passamos a estar numa ação de reivindicação.
Na ação de demarcação está apenas em causa a localização da linha divisória. Tem de particular
de que em rigor não se consegue separar o autor do réu. Todos são autores e todos são réus,
porque a decisão do tribunal não pode ser a de atender ou desatender ao pedido. O tribunal tem
que tomar uma decisão e se a prova apresentada por todos os intervenientes não for suficiente,
portanto se deixar dúvidas quanto à posição da linha divisória, o tribunal deve-a dividir,
dividindo a parcela do terreno em litígio, em partes iguais.
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Continuação da defesa da propriedade:
Contitularidade:
Distinção entre:
Comunhão de mão por quotas (comunhão romana) – cada contitular tem um direito
de participação no bem comum com uma quantidade que lhe está associada, neste
sentido, cada qual tem uma quota sobre a coisa comum.
Comunhão de mão comum (comunhão germânica) – a divisão por quotas, feita na
comunhão romana não existe aqui, a separação por quotas não existe e portanto, não há
medidas de participação.
A comunhão por quotas existe por casualidade. Constituiu-se uma situação de compropriedade
porque calhou, porque duas pessoas compraram ao mesmo tempo um terreno, é por causa de
casualidades que são comproprietários. Ao contrário, na comunhão de mão comum, a razão de
ser da comunhão, radica noutra razão qualquer que é mais importante, como é o exemplo da
situação em que ficam os bens em comum do casal, havendo casamento, a razão para haver
comunhão dos bens não é casual, as pessoas tem comunhão de bens porque estão em comunhão
de vida. Enquanto o casamento se mantiver, cada cônjuge não tem medidas de participação. Se
duas pessoas são comproprietárias de um automóvel, porque o compraram em conjunto, vão ter
que arranjar uma maneira qualquer de o usar, ao paço que os bens comuns do casal, não há
qualquer regra que imponha uma disciplina de utilização, utiliza-se conforme as necessidades.
A comunhão típica é a comunhão por quotas e não a comunhão por mão comum, esta última
utiliza-se em situações muito particulares.
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que tenham quotas diferentes, o direito de cada qual incide na sua
totalidade.
Exemplo: alguém tinha uma enorme quantidade de terreno e dividi-o e
“vendeu-os” a quem estivesse interessado, e cada um construía nessas
parcelas. Não foi feita a divisão nos termos que a lei exige (escritura
pública ou documento autenticado – art.1413º – e tem que ser precedida de
autorização camarária para aquela divisão se faça e supõe para ser aprovado
um projeto de mantimento). Mesmo que a divisão seja respeitada por
aqueles que adquiriram, não são divisões e para todos os efeitos continuam
em compropriedade.
A regra é de que cada comproprietário tem um direito sobre a totalidade da coisa, a regra é que
a comunhão é pro indiviso, assenta sobre uma coisa que está indivisa. Fazendo-se a divisão
deixa de haver compropriedade.
A primeira hipótese afasta-se logo a partir do instante em que se diga que a comunhão é a
comunhão por quotas, esta supõe que cada contitular tem um direito próprio, individual sobre a
coisa comum. Na comunhão de mão comum pode pensar-se num direito para vários, na
comunhão por quotas, cada qual tem uma medida de comparticipação e isso é incompatível com
a ideia de existir um direito para todos.
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Em tese, pode ver-se que cada qual tem um direito sobre a coisa comum ou um direito sobre a
sua quota (a sua participação). Entender-se que o direito que cada qual tem incide sobre a quota
que lhe pertence arranja mais problemas do que resolve porque uma quota não é uma coisa.
Cada comproprietário é dono de uma quota, então ninguém é proprietário da coisa, isto não tem
sentido. Mas isto permite dizer que cada comproprietário tem um direito e esse direito de cada
qual incide sobre a coisa. Assim sentido a compropriedade supõe tantos direitos sobre a coisa
comum quantos forem os comproprietários e assim sendo há uma colisão de direitos, cada
direito de cada contitular limita o direito dos demais e vise-versa. Pode definir-se a situação
como sendo sobreposição paralela. Na compropriedade há dois ou mais direitos de igual
qualidade que incidem sobre a coisa ao mesmo tempo limitando-se cada um, a sobreposição é
paralela porque são todos da mesma espécie.
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implica que aquele que se opôs tenha que suportar as despesas – a lei só impõe a
obrigação de participar na despesa, havendo oposição daquele que não quer
participar, mesmo assim fica vinculado tratando-se de despesas de conservação ou
de frutificação (art.1411º).
Sempre que o ato de administração implique realização de despesas, a lei impõe a
obrigação de participar nessas despesas mesmo aqueles que não aprovem a despesa
desde que se trate de ato de conservação ou de ato de frutificação.
Exemplo: imagine-se que os 4 comproprietários são proprietários de um terreno
no qual está plantada vinha, e querem deixar de utilizar como tal como vinha e
quer passar a plantar laranjeiras. Isto já excede a administração ordinária. Não é
frutificação normal. Se disséssemos que bastaria outra vez a maioria, ou seja 3
contra 1, nada adiantava porque em termos de participação na despesa o
art.1411º não impõe essa obrigação de participar na despesa aquele que se
opusesse. Por esta razão, no art.1407º cabem apenas os atos de administração
ordinária.
Situações em que se admite a atuação individual – não necessita de aprovação por parte
dos demais – art.1406º – casos de utilização. A utilização da coisa comum pode ser feita
individualmente por cada qual, desde que isso não prejudique a utilização que os outros
façam. Para evitar conflitos admite-se (nº1) que façam uma convenção de uso, ou seja,
que estabeleçam um acordo através do qual fixam as regras a que o uso à de observar.
Isso é só uma convenção de utilização, a compropriedade permanece, ou seja, isto não é
divisão da coisa comum.
Para efeitos de uso não interessa a quota que cada qual tenha.
Exemplo: se tem 4 comproprietários e cada qual tem 25‰, teoricamente
deveríamos repartir o uso também assim, mas o próprio art.1406º estabelece
que não é assim. Nada impede que um utilize na totalidade, se isso não for
impedimento para os demais e se ninguém se opuser a isso.
Contudo, o facto de um estar a utilizar em medida superior à sua participação não
tem implicações.
Exemplo: se um dos comproprietários está a usar o imóvel à mais de 25 anos,
isso não permite que ele, que está a usar o imóvel exclusivamente, invocar
usucapião para se tornar proprietário exclusivo.
Cada comproprietário pode alienar ou onerar, individualmente, o seu direito na
medida da sua quota. Cada comproprietário tem um direito sobre a coisa, não há um
direito para todos, mas cada qual tem o seu. Se esse direito de propriedade dá uma
medida de participação em função da quota que lhe for atribuída, então se é
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proprietário exclusivo, naquela medida pode fazer o que entender – pode alienar ou
onerar – mas só o pode fazer na medida da quota.
Exemplo: pode vender o seu direito de participação da compropriedade, mas só
pode vender nos seus 25%. Vender significa que vende um direito sobre a
totalidade da coisa, mas que concede a quem comprar 25% participação nessa
coisa. Não é vender um pedaço. Vamos supor que os 4 são comproprietários de
um terreno onde está plantada uma vinha e um deles vende a sua parte, ele
vende 25%, só que a sua parte não está concretizada no terreno, ele não pode
delimitar uma parcela de terreno. A sua parte não é essa, mas é uma
participação na totalidade.
Cada comproprietário não pode alienar nem onerar partes especificadas da coisa
comum – art.1408º – cada qual pode onerar o seu direito na medida da sua quota,
cada qual não pode alienar nem onerar uma parte determinada da coisa comum
porque enquanto houver comunhão cada um não tem direitos sobre partes
especificadas, tem apenas direito sobre a totalidade. Para este efeito utilizam-se dois
conceitos:
Quota ideal – medida de participação que cada qual tem;
Parte especificada – é uma parte da coisa comum que está concretizada.
Enquanto houver compropriedade ninguém pode concretizada porque cada parte
concretizada da coisa comum, é coisa comum, continua a pertencer a todos.
Se eventualmente suceder um ato de oneração ou alienação sobre uma parte
especificada, o nº2 do art.1408º manda equiparar essa alienação ou oneração a
alienação de coisa alheia, que é em princípio nula.
Exemplo: se os 4 comproprietários dividiram o uso de forma que cada qual
utiliza uma parte do terreno comum, se por ventura um deles vende aquela parte
que ele está a utilizar está a vender algo que é dele, mas está também a vender
algo que não é dele. Não é à letra venda de bem alheio, mas dá para equiparar.
Não tem efeito a não ser que todos aceitem.
Cada contitular tem o direito de por termo à comunhão quando entender. O direito
de por fim à comunhão é um direito potestativo. Os demais contitulares sujeitam-se
à extinção por divisão dado que o direito de por tempo à compropriedade por
divisão é cumprido por lei, sem necessidade do consentimento – art.1412º – a lei
admite que se estabeleçam cláusulas de indivisão, portanto que se convencione que
durante x tempo a coisa continue em comunhão e por isso não possa ser imposta a
sua divisão, contudo essas cláusulas podem durar no máximo 5 anos, ainda que
sejam renováveis, e vinculam apenas aqueles que convencionaram.
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Exemplo: alguém alienou a terceiro e como este não convencionou esta
cláusula não é atingido por essa cláusula.
Não importa se 1 quer a divisão e os outros 3 não querem, de todo o modo faz-se a
divisão.
Divisão não tem que ser dividir no sentido exato do termo, dividir significa extinguir a
compropriedade. Deixa de existir uma situação de compropriedade e, portanto, deixam de
existir comproprietários. Mas depende de saber se a coisa é divisível. A divisão pode ser:
Amigavelmente;
Judicialmente – supõe que alguém intenta uma ação de divisão de coisa comum para
que o tribunal decida conforme o que lhe pareça mais adequado;
Extrajudicialmente – faz-se por acordo, através de um contrato que deve observar a
forma (art.1413º) da alienação onerosa, ou seja, escritura pública ou documento
autenticado.
A divisão material tem efeito retroativo, aplicam-se as mesmas regras da partilha da herança e
de acordo com o art.2119º, feita a divisão material tudo se passa como se nunca tivesse existido
compropriedade. Cada comproprietário passa a ser tido como proprietário início exclusivo da
parte que lhe couber na divisão desde data da constituição da compropriedade.
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Primeiro, este regime consta dos art.1403º ate ao art.1413º e está previsto para estar escrito para
a compropriedade. Mas de acordo com o art.1404º, é extensível a todos os casos de
contitularidade, pelo menos é extensível a todos os casos de contitularidade em direitos reais.
Segundo, cada contitular pode alienar ou onerar o seu direito na medida da sua quota –
art.1408º, nº1 – ou seja não precisa do consentimento dos demais para efetuar a alienação. Mas,
segundo o art.1409º, no caso de venda ou dação em cumprimento os outros contitulares tem
direito de preferência, significa que quando um contitular queira alienar o seu direito por venda
ou dação em cumprimento tem que fazer comunicação aos outros para saber se estão
interessados na aquisição, nos termos do art.416º, desde que essa alienação esteja a ser efetuada
a terceiros. Se a venda ou dação esteja a ser feita a outro contitular, havendo mais contitulares
esse não tem preferência.
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