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PROCESSO

HIGIENE
Fatores limitantes à proliferação
de microorganismos em alimentos
Fernando Leite Hoffmann (*)

A qualidade microbiológica dos alimentos


está condicionada, primeiro, à quan-
tidade e ao tipo de microrganismos ini-
cialmente presentes (contaminação ini-
cial) e depois à multiplicação destes ger-
mes no alimento.
A qualidade das matérias - primas e a
higiene (de ambientes, manipuladores e
superfícies) representam a contaminação
inicial. O tipo de alimento e as condições
ambientais regulam a multiplicação.
Os fatores inerentes ao alimento podem
ser também chamados de parâmetros in-
trínsecos, como por exemplo, o pH e a
atividade de água (Aa) e aqueles ineren-
tes ao ambiente de parâmetros extrínsecos,
como a temperatura, a umidade relativa
(UR ) e a presença de gases.
Tais fatores podem ser ótimos ou
limitantes, interferindo sobremaneira na
multiplicação de microrganismos, inclusive
os patogênicos transmitidos por alimentos,
causadores principalmente de infecções e
intoxicações de origem alimentar, tais como:

Campylobacter jejuni Importância: um dos causadores de di- Máxima % de NaCl para multiplicação:
arréia mais importante no mundo. Não se provavelmente 6,0-8,0 ( geral para E. coli).
Coloração de Gram / morfologia: Gram multiplica bem nos alimentos. Habitat: trato intestinal de bovinos.
negativo, bacilo curvo. Dose de infecção / período de incuba- Principais alimentos envolvidos: hambúr-
Exigência de oxigênio: microaerófilo ção: baixa (5 x 102/g ), 48 - 120 horas. guer, leite cru e cidra de maçã.
obrigatório. Sintomas: diarréia abundante (às vezes, Importância: provoca colite hemorrá-
Temperatura de crescimento: 30oC (mí- sanguinolenta ), dores abdominais, enxa- gica, síndrome urêmica hemolítica.
nima), 42-45oC (ótima) e 47oC (máxima). queca, fraqueza e febre. Dose de infecção/período de incubação:
pH para multiplicação: 4,9 (mínimo), desconhecida, 3 - 9 dias.
6,5-7,5 (ótimo) e 9,5 (máximo). Escherichia coli O157:H7 Sintomas: diarréia sanguinolenta.
Aa mínima para crescimento: > 0,97.
Máxima % de NaCl para multiplicação: 2,0. Coloração de Gram / morfologia: Gram Listeria monocytogenes
Habitat: trato intestinal de animais do- negativo, bacilo reto.
mésticos de sangue quente. Exigência de oxigênio: facultativo. Coloração de Gram/morfologia: Gram
Principais alimentos envolvidos: carne de Temperatura de crescimento: 10oC (mí- positivo, bacilo curto.
aves, ovos, carne bovina, moluscos crus, nima), 37oC (ótima) e 45oC (máxima). Exigência de oxigênio: aeróbio ou
mexilhões, ostras e leite cru. pH para multiplicação: provavelmente microaerófilo.
4,4-9,5 ( geral para E. coli ). Temperatura de crescimento: 0oC (míni-
Aa mínima para crescimento: provavel- ma), 25-30oC (ótima) e 45oC (máxima).
(*) Unesp – São José do Rio Preto mente 0,95 ( geral para E. coli ). pH para multiplicação: 4,3 (mínimo),

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7,0-7,5 (ótimo) e 9,6 (máximo).


Aa mínima para crescimento: 0,83.
Máxima % de NaCl para multiplicação:
10-20.
Habitat: solo, vegetação, água e sedi-
mentos marinhos.
Principais alimentos envolvidos: queijos,
produtos cárneos, pescado e vegetais.
Importância: pode se multiplicar lenta-
mente sob refrigeração, apresentando taxa
de mortalidade de 30% nos infectados.
Dose de infecção/período de incubação:
desconhecida, 8 dias - 3 meses.
Sintomas: desde enfermidade similar à gripe
até meningite, podendo provocar aborto.

Salmonella sp

Coloração de Gram/morfologia: Gram


negativo, bacilo curto.
Exigência de oxigênio: facultativo.
Temperatura de crescimento: 0 2,0oC (mí-
Cuidados na manipulação reduzem contaminação
nima), 37oC (ótima) e 45-46oC (máxima).
pH para multiplicação: 3,7 (mínimo), do, leite cru, produtos de laticínios, prin- Dose de infecção/período de incubação:
6,5-7,5 (ótimo) e 9,5 (máximo). cipalmente queijos, produtos cárneos, mas- desconhecida, provavelmente alta ( > 106
Aa mínima para crescimento: 0,95. sas, produtos de confeitaria, preparações / g ), 1 - 10 dias.
Máxima % de NaCl para multiplicação: 8,0. à base de frango, ovos e outros, especial- Sintomas: diarréia, febre, vômitos, dor
Habitat: trato intestinal de mamíferos, mente muito manipulados. aguda na parte inferior direita do
pássaros, anfíbios, répteis, homens e insetos. Importância: contamina os alimentos abdomen, simulando apendicite em cri-
Principais alimentos envolvidos: leite cru, por manipulações incorretas e produz to- anças em idade escolar.
produtos de laticínios, carne de aves, suí- xina termorresistente. As bactérias, os bolores e as levedu-
nos, bovinos, vegetais e pescado, ovos, Dose de infecção/período de incubação: ras apresentam exigências nutricionais
água e moluscos. células - 105 a 108/g são necessárias para muito variadas mas, geralmente, encon-
Importância: causa infecções devido à produzir toxina suficiente e toxina - 1 g de tram nos alimentos condições propícias
falta de higiene ou elaboração incorreta toxina/g de alimento, 2 - 6 horas. para a sua multiplicação.
de alimentos, permitindo a multiplicação Sintomas: náuseas, vômitos e diarréia aquo- Em condições ideais, as bactérias são
desta bactéria. sa, dor de cabeça, muscular e prostração. os microrganismos com maior velocidade
Dose de infecção/período de incubação: de crescimento, podendo apresentar um
baixa ou alta concentração, dependendo Yersinia enterocolitica tempo de geração (tg) em média de 20
do sorotipo, horas a 3 dias. minutos. Por isso, mesmo naqueles casos
Sintomas: náuseas, vômitos, dores ab- Coloração de Gram/morfologia: Gram em que a contaminação inicial de um ali-
dominal e de cabeça, calafrios, diarréia, negativo, bacilo curto. mento é pequena, altas contagens pode-
febre, com duração de 2 - 3 dias (ou mais). Exigência de oxigênio: facultativo. rão ser alcançadas em um breve espaço de
Temperatura de crescimento: -1,3oC (mí- tempo. Entretanto, tal velocidade não é
Staphylococcus aureus nima), 32-34oC (ótima) e 44oC (máxima). constante, havendo acentuadas variações,
pH para multiplicação: 3,0 (mínimo), que vão depender da fase de crescimento
Coloração de Gram/morfologia: Gram 7,0-8,0 (ótimo) e 9,5 (máximo). em que se encontram e das condições do
positivo, coco. Aa mínima para crescimento: 0,95. ambiente. Os parâmetros intrínsecos e os
Exigência de oxigênio: facultativo. Máxima % de NaCl para multiplicação: extrínsecos, por conseguinte, determinam
Temperatura de crescimento: 5,6 oC (mí- 5,0-8,0. também a velocidade de multiplicação.
nima), 37oC (ótima) e 50oC (máxima). Habitat: água, pequenos roedores, ani- As leveduras, por sua vez, possuem um
pH para multiplicação: 4,0 (mínimo), mais de estimação e suínos. tempo de geração de 2 a 3 horas; portan-
6,0-7,0 (ótimo) e 9,8 (máximo). Principais alimentos envolvidos: leite cru, to, superior ao das bactérias, sendo que
Aa mínima para crescimento: 0,83. achocolatado, sorvetes, vegetais, carne de os bolores (fungos filamentosos), multi-
Máxima % de NaCl para multiplicação: 20,0. suínos e seus derivados e pescado. plicam-se mais lentamente que as levedu-
Habitat: mucosas nasais e oral, pele e Importância: aumento do número de ras. Desta maneira, em um alimento que
cabelo. casos declarados, pode se multiplicar sob apresente condições para o desenvolvimen-
Principais alimentos envolvidos: pesca- refrigeração. to dos três grupos de microrganismos, as

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bactérias serão dominantes e, portanto, restrita apenas aos bolores e leveduras e,


serão as causadoras da deterioração. Por por vezes, bactérias lácticas e acéticas.
outro lado, leveduras e bolores serão im- Temos, a seguir, alguns exemplos de ali-
portantes na deterioração daqueles alimen- mentos de origem animal e vegetal e seu pH
tos que não ofereçam condições ao rápido aproximado: atum (5,2 - 6,1), presunto (5,9
crescimento das bactérias. - 6,1), queijo (4,9 - 5,9), ameixa (2,8 - 4,6),
batata (5,3 - 5,6) e tomate (4,2 - 4,3).
Fatores inerentes ao alimento A Indústria de Alimentos utiliza o
efeito do pH sobre os microrganismos
pH para a preservação dos alimentos. As-
O pH mede a concentração de H + de sim, são processados os alimentos fer-
um alimento ou solução e é geralmente mentados, onde o ácido produzido pe-
representado pela equação: pH = log 1 / [ los microrganismos causa o abaixamen-
H+ ]. De acordo com a mesma, observa- to do pH (ex.: leites, carnes e vegetais
se que quanto mais elevada a concentra- fermentados); ou ainda utilizando
ção de H+ (caráter ácido), menor é o pH. acidulantes como ácido cítrico, láctico,
Assim, o pH é menor em alimentos áci- acético e outros, para, com isso, evitar
dos. O pH varia de 0 a 14, sendo 7 o valor o risco de deterioração ou atenuar os
que expressa a neutralidade. tratamentos térmicos, no caso de picles,
É um fator de fundamental importância chucrute, champignon e palmitos.
na limitação dos diferentes microrganis- Produção de massas: etapa crítica
mos capazes de se desenvolver no alimen- Atividade de água ( Aa, aw )
to, sendo proposta uma classificação prá- A microbiota de alimentos pouco áci-
tica dos alimentos em função do pH, divi- dos (pH > 4,5) é muito variada, havendo A atividade de água é também um
dindo-os em três grupos: condições para o desenvolvimento da maio- parâmetro muito importante para o desen-
1. Alimentos pouco ácidos: apresentam ria das bactérias, inclusive as patogênicas, volvimento microbiano.
pH 4,5, bolores e leveduras. Ela pode ser calculada pelas seguintes
2. Alimentos ácidos: possuem pH entre Nos alimentos ácidos (pH 4,0 a 4,5), a fórmulas:
4,0 e 4,5, e microbiota é bem mais restrita, representa- Aa = ( P1 ) / ( Po ), onde
3. Alimentos muito ácidos: apresentam da por bactérias lácticas e algumas P1 = pressão de vapor d’água da solu-
pH 4,0. esporuladas dos gêneros Bacillus e Clos- ção ( alimento) e
tridium. A grande maioria dos patógenos não Po = pressão de vapor do solvente puro
O pH = 4,5 é muito importante em se multiplica. Nesta faixa de pH, os bolores e ( água ).
Microbiologia de Alimentos, pois abaixo as leveduras encontram-se em condições óti- Ou Aa = UR / 100, onde UR = umidade
desse valor não há o desenvolvimento de mas para seu desenvolvimento. relativa do alimento.
Clostridium botulinum bem como, de for- E em alimentos muito ácidos (pH < 4,0), Ou Aa = n2 / n1 + n2, onde
ma geral, das bactérias patógenas. a microbiota capaz de se desenvolver é n1 = número de moles do soluto e

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n2 = número de utilizar a exaus-


moles do solvente, tão, embalagens
considerando-se impermeáveis ao
uma solução ideal. oxigênio, uso de
vácuo, atmosfera
O valor absoluto com gases inertes,
da atividade de água de aeração e car-
dá uma indicação bonatação para se
segura do conteúdo controlar os mi-
de água livre do ali- crorganismos ae-
mento, sendo esta a róbios. Estes recur-
única forma de água sos são usados pa-
utilizada por parte ra queijos, vege-
dos microrganismos. tais, produtos
As bactérias são cárneos e outros, a
normalmente mais fim de evitar os
exigentes quanto à mofos superficiais.
Linha de produção de frangos
disponibilidade de No caso dos enla-
água livre, seguidas pelos bolores e leve- Potencial Redox ( Eh, O / R ) tados, o ambiente anaeróbio favorece a
duras, sendo que, dentre estes últimos, multiplicação de bactérias esporuladas,
algumas espécies se destacam pela eleva- O potencial redox de um ambiente é anaeróbias ou facultativas.
da tolerância a baixa Aa. A possibilidade medido em milivolts, podendo ser afetado
de alteração microbiana em alimentos aca- por uma série de compostos. O oxigênio é Conteúdo de nutrientes
ba naqueles que apresentam Aa abaixo de o fator que mais contribui para o aumento
0,60, embora isso não signifique a des- do potencial redox de um alimento. Os microrganismos variam as suas
truição dos microrganismos. Os microrganismos variam no grau exigências quanto aos fatores de multi-
Há alguns grupos de microrganismos de sensibilidade ao potencial redox do plicação e à capacidade de usar os di-
particularmente resistentes a baixas Aa, meio de multiplicação e podem, de versos substratos que constituem os ali-
como os: acordo com o Eh requerido, ser dividi- mentos. Por exemplo:
Microrganismos osmofílicos: para se dos em grupos, como: a. Fonte de carbono: pode muitas ve-
desenvolver precisam de ambiente com Aeróbios: exigem Eh positivo (presen- zes limitar a multiplicação dos micror-
baixa Aa (como aquele proporcionado por ça de oxigênio) e são representados pe- ganismos. Os polissacarídeos (carboi-
produtos açucarados). los bolores, bactérias como a Pseudo- dratos complexos), como o amido e a
monas, Acinetobacter, Moraxella, Micro- celulose, são utilizados diretamente por
Microrganismos osmodúricos: suportam, coccus, algumas espécies de Bacillus e um número restrito de microrganismos.
mas não exigem ambientes com elevada leveduras oxidativas. Os bolores são de particular interesse na
concentração de açúcar. Anaeróbios: requerem Eh negativo (au- deterioração de matérias - primas que
sência de oxigênio). O oxigênio chega a contenham esses substratos.
Microrganismos halofílicos: necessitam, ser tóxico para a célula, porque gera Os óleos e as gorduras são “atacados”
para se desenvolver, de ambientes com ele- peróxidos letais ao microrganismo. Os gê- por microrganismos lipolíticos representados
vada concentração salina. neros Clostridium e Desulfotomaculum com- por muitos bolores, leveduras e bactérias
preendem espécies anaeróbias. (Pseudomonas, Achromobacter, Alcaligenes e
Microrganismos halodúricos: suportam Facultativos: multiplicam-se em Eh outros); entretanto, um número elevado de
ambientes com alta concentração de sal. positivo e negativo, sendo representados microrganismos não posssui a capacidade de
pelas leveduras (fermentativas , entero- se multiplicar nestes substratos.
Microrganismos xerofílicos: possuem bactérias e Bacillus. b. Fonte de nitrogênio: além de outros
afinidade a ambientes secos. Microaerófilas: multiplicam-se melhor compostos nitrogenados, é normalmente
em Eh baixo. As bactérias lácticas são en- constituída pelos aminoácidos, nucleo-
A maioria das bactérias se desenvolve contradas neste grupo. tídeos, peptídeos e proteínas.
em Aa mínima de 0,91 - 0,88; das levedu- Apresentam os seguintes Eh: carne mo- c. Fonte de vitamina: os alimentos
ras, em 0,88 e dos bolores, em 0,80. ída (+ 300), queijo tipo Suíço (+ 300 a + possuem geralmente as quantidades ne-
A atividade de água nos alimentos pode 400) e suco de limão (+ 383). cessárias para o crescimento dos mi-
variar de > 0,98 (carnes e pescados frescos, Verifica-se, portanto, que este é um crorganismos; entretanto, as frutas,
leite e outras bebidas, frutas e hortaliças fres- fator de importância a ser utilizado na pobres em vitaminas do complexo B,
cas, hortaliças em salmoura enlatadas e fru- preservação de alimentos e que deter- desfavorecem a multiplicação de algu-
tas em calda enlatadas) a < 0,60 (doces, mina também quais tipos de microrga- mas bactérias.
chocolate, mel, macarrões, batatas fritas, nismos irão se desenvolver em determi- d. Sais minerais: não são fatores
verduras desidratadas, ovos e leite em pó ). nados alimentos. Por exemplo, pode-se limitantes nos alimentos.

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Embutidos são sensíveis aos microorganismos

Constituintes antimicrobianos Microbiota do alimento

Devido à presença de constituintes A competição da microbiota do alimen-


antimicrobianos, a estabilidade de alguns to também atua favorecendo ou inibindo
produtos de origem animal e vegetal, como algumas espécies ou grupos de microrga-
os citados a seguir, ocorre na natureza. nismos. As bactérias lácticas podem pro-
a. Ovo: além de apresentar a proteção duzir ácido láctico, ou mesmo bacte-
da casca, a clara possui a lisozima riocinas, que inibem ou eliminam certos
(muramidase), que destrói a parede celu- microrganismos patógenos do alimento. De
lar das bactérias Gram positivas. uma outra maneira, alguns tipos de leve-
b. Amora: possui o ácido benzóico, que duras podem consumir os ácidos orgânicos
atua principalmente contra os fungos. dos alimentos ácidos, fornecendo condi-
c. Cravo da Índia: possui óleos essenci- ções para a multiplicação daqueles micror-
ais (principalmente o eugenol) e lipídeos ganismos, que anteriormente tinham sua
com ação antimicrobiana. multiplicação inibida pela acidez.
d. Canela: possui o aldeído cinâmico. O Staphylococcus aureus e o Clostridium
e. Leite: mesmo sendo um produto botulinum, são maus competidores e não
altamente perecível, possui em sua se desenvolvem adequadamente em ali-
composição substâncias antimicro- mentos que apresentem elevadas contagens
bianas (lactenina e fator anti-co- de outros microrganismos (alimentos crus
liformes), que mantém a estabilidade como carnes, pescados, etc).
microbiana do produto nas 2 primeiras
horas depois da ordenha. Fatores inerentes ao ambiente

Estruturas biológicas Temperatura


Dentre os fatores relacionados ao ambien-
Constituem também uma barreira ou te que podem atuar positiva ou negativamen-
obstáculo para o acesso dos microrga- te sobre o crescimento dos microrganismos, a
nismos às partes perecíveis de alguns temperatura é um dos que mais afetam a via-
alimentos, ou seja, aquela que apre- bilidade e a multiplicação microbiana. Apesar
senta nutrientes, e portanto, que per- do crescimento microbiano ser possível em
mite a multiplicação dos microrganis- uma faixa de temperatura de - 8 até + 90C, a
mos e que são teoricamente estéreis. ótima da maioria dos patógenos é de 35C. A
Tais estruturas podem ser representa- temperatura afeta a duração do período ou
das por cascas de sementes, nozes, ar- fase de latência, a velocidade de multiplica-
roz, peles e pelos de animais e ainda ção, as exigências nutricionais e a composi-
cascas ou películas de frutas. ção química e enzimática das células.

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Os efeitos letais do congelamento e


do resfriamento (preservação pelo frio)
dependem do microrganismo consi-
derado e das condições de tempo e tem-
peratura de armazenamento. Alguns micror-
ganismos permanecem viáveis durante lon-
gos períodos de tempo em alimentos con-
gelados.
A resistência a temperaturas mais ele-
vadas depende, fundamentalmente, da
característica do microrganismo. O
Staphylococcus aureus é encontrado den-
tre os microrganismos patogênicos mais
resistentes, visto que suas células resis-
tem a 60C por 15 minutos. Os microrga-
nismos, de acordo com sua temperatura
ótima de crescimento, classificam-se em:
termófilos (55-75 oC), mesófilos (30-
45 o C), psicrotróficos (25-30 o C ) e
Processos artesanais têm maiores riscos
psicrófilos (12-15oC).
tas, são preservados em atmosfera con- T.J. eds. Food microbiology: fun-
Umidade relativa ( UR ) tendo ozônio (2 - 3 p.p.m.), não sendo damentals and frontiers. Washington,
recomendado a sua utilização em alimen- D.C., ASM Press, 1997. 768 p.
A umidade relativa interfere diretamente tos com elevado teor lipídico, pois pode-
na atividade de água do alimento. Se ar- rá acelerar a rancidez. Tanto o ozônio JAY, J.M. Microbiologia moderna de los
mazenarmos um alimento de baixa Aa em como o gás carbônico são eficientes para alimentos. Zaragoza, Acribia, 1992. 804 p.
ambiente com alta UR, a atividade de água retardar as alterações superficiais em car-
do alimento aumentará, podendo sofrer nes estocadas por período longo. LEITÃO, M.F.F. Microbiologia de alimen-
deterioração por microrganismos. tos. In: Tratado de microbiologia. São
O binômio UR/temperatura não pode Teoria dos obstáculos ou barreiras Paulo, Manole, 1987. 186 p.
ser desprezado, sendo que, no geral, quan-
to mais elevada a temperatura de A estabilidade e a segurança da maio- LEVINE, M.M. Escherichia coli that causes
estocagem, menor deverá ser a UR, sendo ria dos alimentos estão baseadas em mui- diarhoea enterotoxigenic, enteropathogenic,
o inverso verdadeiro. tos fatores, que têm como objetivo evitar enteroinvasive, enterohaemorragic and
a multiplicação dos microrganismos, im- enteroadherent. Journal Infections Disease,
Presença de gases no meio - pedindo a deterioração e a veiculação de U.S.A., v. 155, p. 377 - 389, 1987.
influência do dióxido de carbono diferentes moléstias. As interações entre
os fatores intrínsecos e os extrínsecos ori- MORTIMORE, S. & WALLACE, C. HACCP:
A armazenagem de alimentos em atmos- ginaram, portanto, o conceito dos obstá- enfoque prático . Zaragoza, Acribia,
fera contendo dióxido de carbono é conhe- culos (barreiras) de Leistner. Os obstácu- 1996. 291 p.
cida também como estocagem em “atmos- los normalmente considerados na conser-
fera controlada”, sendo utilizada, em mui- vação dos alimentos, são: temperatura (ele- PRICE, R.J. Compendium of fish and
tos países, para frutas (maçãs e peras), vada ou baixa), atividade de água (Aa), fishery product processing methods,
provocando o retardo da putrefação, cau- pH (acidificação), potencial redox, hazards and controls. National Seafood
sada por fungos filamentosos. Tal efeito conservantes (nitritos, sorbatos e sulfitos), HACCP Alliance for Training and Education.
se deve, provavelmente, à inibição do atmosfera modificada e microrganismos University of California Davis, 1997.
etileno (que atua nas frutas como fator de competitivos (bactérias lácticas e produtos
envelhecimento) pelo gás carbônico. A de seu metabolismo). A atuação sinérgica RYAN, K.J. & FALKOW, S. Enterobacte-
concentração de dióxido de carbono não desses fatores melhora a estabilidade (au- riaceae. In: Sherris Medical Microbiology:
excede geralmente a 10%. mento da vida útil) e, consequentemente, a a introduction to infections diseases. 3a.
Tais atmosferas têm sido também mui- qualidade do alimento, tornando-o inócuo à ed. U.S.A., Prentice Hall, 1994. 890 p.
to utilizadas para estender o armaze- saúde do consumidor.
namento de carnes, sendo as bactérias SENAI - DN. Elementos de apoio
Gram negativas (Pseudomonas) mais sen- Bibliografia para o sistema APPCC. Brasília, SENAI
síveis ao gás carbônico do que as Gram - Departamento Nacional, 1999. 371 p.
positivas, ou seja, as bactérias lácticas e DOYLE, M.P. Foodborne bacterial ( Série Qualidade e Segurança Alimen-
as anaeróbias são mais resistentes. pathogens. New York, Marcel Dekker, 1989. tar ). Projeto APPCC. Convênio CNI /
Certos vegetais, principalmente as fru- DOYLE, M.P., BEUCHAT, L.R., MONTVILLE, SENAI / SEBRAE. v
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