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CURSO DE USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL DESCOMPLICADA

PROFESSOR MARCOS SALOMÃO

Material feito por Taciana Rocha baseado nas aulas do prof. Salomão

ASPECTOS INICIAIS
Parte 01
A usucapião é uma das formas que o Código Civil traz de aquisição da
propriedade e precisa ir ao registro.
Em uma escritura pública de compra e venda, a propriedade é adquirida com o
registro, nos termos do artigo 1.245 do Código Civil:

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o


registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1 o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante


continua a ser havido como dono do imóvel.

§ 2 o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a


decretação de invalidade do registro, e o respectivo
cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do
imóvel.

Já a propriedade pela usucapião é adquirida pelo tempo e outros requisitos a


depender da espécie. Dessa forma, a partir de uma sentença declaratória de
usucapião ou pelo procedimento extrajudicial realizado no cartório de registro de
imóveis, o título advindo de qualquer um desses processos será registrado no
cartório do local do imóvel.

O registro, nesse caso, é apenas declaratório, para eficácia erga omnes (para
todos).

POSSE

Posse e propriedade são distintas.


O proprietário possui direitos sobre a coisa, como o uso, gozo, fruição e
disposição da coisa (alienar, dar em garantia, doar). O proprietário possui direito
de sequela, que consiste em buscar a coisa de quem indevidamente a detenha,
é o direito de perseguir o bem.

→ Domínio – é quem tem o direito de usar, gozar, dispor, mas não está
registrado na matrícula e, assim, não possui o direito de sequela. O
Código Civil traz a palavra domínio e propriedade como sinônimos muitas
vezes.

Posse segundo o artigo 1.196 do CC:

Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato


o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à
propriedade.

Para ser possuidor é preciso estar na coisa, usando-a, tendo um dos elementos
da propriedade ou todos eles. É preciso fazer um caminho através da posse para
chegar à propriedade, com registro no registro de imóveis. O tempo irá depender
do tipo de usucapião.

A posse não vai para a matrícula, posse é fato. EXCEÇÕES: quando o Estado
desapropria um bem particular; procedimento de REURB, com o título CRF
(certidão de regularização fundiária).

Parte 02

Cessão da posse - que pode ser cessão onerosa (equivale a compra e venda)
ou gratuita (equivale a doação). Pode ser feita por documento particular ou
escritura pública (alguns tabeliães fazem e outros não). Uma solução é pedir ao
tabelião para fazer uma ata notarial da posse, atestando esse fato, para depois
ceder.

Essa cessão pode ser somada ao tempo da posse para o novo posseiro.

Sucessão da posse – falece o pai e o filho continua no imóvel, somando o tempo


da posse pela herança. É possível usucapir direto ou é preciso inventariar a
posse? Polêmica! Se o pai já tinha o tempo de posse, poderia usucapir direto.
Outros fazem o inventário do tempo do pai e depois soma o tempo restante e faz
a usucapião. Ainda, sobre a posse do pai faz usucapião no nome dele ou espólio
e depois inventaria a propriedade para o filho.

Enunciado 492, V Jornada de Direito Civil: A posse constitui direito autônomo


em relação à propriedade e deve expressar o aproveitamento dos bens para o
alcance de interesses existenciais, econômicos e sociais merecedores de tutela.

Atos de mera detenção NÃO CONFIGURAM POSSE. Exemplo: caseiro que está
cuidando do bem a pedido do proprietário.

A posse violenta e clandestina, enquanto não são transformadas, também não


são passiveis de usucapião.

CC, Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão


ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos
violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência
ou a clandestinidade.

Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em


relação de dependência para com outro, conserva a posse em
nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.

Da mesma forma, locação e mera permissão para estar no imóvel não


configuram posse para fins de usucapião. Entretanto, caso o locatário deixe de
pagar aluguel e o locador não se oponha, a posse é transformada, podendo ser
válida para usucapião.

A posse para fins de usucapião deve ter o animus domini (intenção de ser dono
e se comportar como tal).

Bens públicos NÃO PODEM SER USUCAPIDOS (art. 102, CC; arts.191,
parágrafo único e 183, § 3º da Constituição Federal).

"Configurada a ocupação indevida de bem público, não há falar


em posse, mas em mera detenção, de natureza precária, o que
afasta o direito à indenização por benfeitorias. Precedentes do
STJ."(RESP 1.310.458/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
Segunda Turma, DJE 9/5/2013)

Súmula 340 STF: Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como
os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.
Súmula 619 do STJ: A ocupação indevida de bem público configura mera
detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por
acessões e benfeitorias.

Parte 03
Lembrando que permissão e tolerância não induzem posse (art. 1.208, CC) para
usucapião e no caso de usucapião de herdeiros fica difícil saber se há apenas
tolerância ou permissão.
Existe a possibilidade? SIM, quando há posse exclusiva e ele rompe com os
outros herdeiros. Resp. 10978/RJ:
USUCAPIÃO. CONDOMINIO. PODE O CONDOMINO
USUCAPIR, DESDE QUE EXERÇA POSSE PROPRIA SOBRE
O IMOVEL, POSSE EXCLUSIVA. CASO, PORÉM, EM QUE O
CONDOMINO EXERCIA A POSSE EM NOME DOS DEMAIS
CONDOMINOS.
IMPROCEDENCIA DA AÇÃO (COD. CIVIL, ARTS. 487 E 640).
2. ESPÉCIE EM QUE NÃO SE APLICA O ART. 1.772,
PARAGRAFO 2. DO COD. CIVIL.
3. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.
(REsp n. 10.978/RJ, relator Ministro Nilson Naves, Terceira
Turma, DJ de 9/8/1993, p. 15228.)

Ainda sobre bem público – que não pode ser usucapido – há o Resp. 556271/DF:
EMBARGOS DE TERCEIRO - MANDADO DE
REINTEGRAÇÃO DE POSSE - OCUPAÇÃO IRREGULAR DE
ÁREA PÚBLICA - INEXISTÊNCIA DE POSSE - DIREITO DE
RETENÇÃO NÃO CONFIGURADO.
1. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como
proprietário. Posse e propriedade, portanto, são institutos que
caminham juntos, não havendo de ser reconhecer a posse a
quem, por proibição legal, não possa ser proprietário ou não
possa gozar de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.
2. A ocupação de área pública, quando irregular, não pode ser
reconhecida como posse, mas como mera detenção.
3. Se o direito de retenção depende da configuração da posse,
não se pode, ante a consideração da inexistência desta, admitir
o surgimento daquele direito advindo da necessidade de se
indenizar as benfeitorias úteis e necessárias, e assim impedir o
cumprimento da medida imposta no interdito proibitório.
4. Recurso provido.
(REsp n. 556.721/DF, relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda
Turma, DJ de 3/10/2005, p. 172.)

E quando o imóvel não tem matrícula? Não quer dizer que o imóvel seja público.
Resp. 674558/RS:

RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO. FAIXA DE FRONTEIRA.


POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE REGISTRO ACERCA DA
PROPRIEDADE DO IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE
PRESUNÇÃO EM FAVOR DO ESTADO DE QUE A TERRA É
PÚBLICA.

1. O terreno localizado em faixa de fronteira, por si só, não é


considerado de domínio público, consoante entendimento
pacífico da Corte Superior.

2. Não havendo registro de propriedade do imóvel, inexiste, em


favor do Estado, presunção iuris tantum de que sejam terras
devolutas, cabendo a este provar a titularidade pública do bem.
Caso contrário, o terreno pode ser usucapido.

3. Recurso especial não conhecido.

(REsp n. 674.558/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão,


Quarta Turma, DJe de 26/10/2009.)

A usucapião, assim, é aquisição de um direito novo, através do caminho pela


posse, tempo e outros requisitos a depender do tipo. Assim, a usucapião é, em
regra, aquisição originária.

O procedimento para usucapião sempre foi judicial e com o Provimento 65 do


CNJ há também o procedimento nas vias administrativas, no registro de imóveis.

O REGISTRO DE IMÓVEIS
É no cartório de registro de imóveis do local do imóvel que ocorre todo o
procedimento da usucapião extrajudicial – não é no tabelionato de notas. No
tabelionato de notas será lavrada a ata de posse para fins da usucapião, que
será um dos documentos apresentados ao registrador, mas não é o título. Da
mesma forma, o tabelião competente é o do local do imóvel (exceção à livre
escolha do tabelião).

O tabelião de notas verifica a vontade, a declaração das partes e instrumentaliza


em um documento: a escritura pública. O tabelião representa o Estado e possui
fé pública.

Já no registro de imóveis, o registrador irá qualificar todos os títulos que chegam


e são protocolados, analisando-os sob o aspecto legal e a luz dos princípios
registrais.

Assim, o tabelião de notas lavra a ata atestando a posse, o interessado e seu


advogado anexa essa ata junto com outros documentos - poderá ter um título ou
não (promessa de compra e venda, por exemplo) e leva ao registro de imóveis
para ser analisado e qualificado.

USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL

REGISTRO DE IMÓVEIS ADVOGADO

TABELIÃO

*** Não confundir registro de imóveis com prefeitura – na prefeitura há um


cadastro do imóvel e no registro de imóveis há a matrícula ou transcrição com
os registros e averbações, que constituem direitos. O cadastro é facilmente
alterado, já no registro de imóveis é necessário observar o princípio da
legalidade, continuidade e uma análise mais rigorosa dos títulos para se
preservar a segurança jurídica.

O advogado, que é indispensável no procedimento, apresenta um requerimento


ao registrador, junto com a ata notarial de posse e outros documentos a
depender do caso, que serão protocolados e qualificados. O registrador pode ser
o titular ou interino. O titular é o que prestou concurso público de provas e títulos
após a Constituição de 1988 e tomou posse. O titular é agente público, mas de
forma privada exerce a função pública. Assim, cartório não é pessoa jurídica, é
no CPF do titular que sai os recibos de emolumentos, declara imposto de renda
como pessoa física etc. Já o interino é nomeado pelo Estado nos casos em que
não há o titular no cartório porque se aposentou, faleceu ou foi afastado.

ONDE SE PROCESSA A USUCAPIÃO – ART. 2, PROV. 65/17 CNJ

O procedimento é instruído por advogado ou defensor público no registro de


imóveis do local do imóvel.
A usucapião é da propriedade, mas poderá ser de outros direitos reais como a
servidão, a enfiteuse (domínio útil), laje, usufruto, uso, superfície.
Exemplo: escritura pública de instituição de usufruto para alguém e não foi
registrada por algum motivo, pode fazer a usucapião com base nessa escritura,
tempo, posse sobre aquele direito real.
Se o procedimento está tramitando no Judiciário, é preciso desistir para que se
inicie no extrajudicial. No sentido inverso, se estiver tramitando o procedimento
na via extrajudicial e o interessado quiser ir para a via judicial, haverá a
suspensão do procedimento pelo prazo de trinta dias.
É possível, também, aproveitar as provas em qualquer das vias escolhidas.
Por fim, como já mencionado, não é possível a usucapião de bens públicos
(vide decisões acima).

Art. 2º Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de


reconhecimento extrajudicial da usucapião formulado pelo
requerente – representado por advogado ou por defensor
público, nos termos do disposto no art. 216-A da LRP –, que
será processado diretamente no ofício de registro de imóveis
da circunscrição em que estiver localizado o imóvel
usucapiendo ou a maior parte dele.
§ 1º O procedimento de que trata o caput poderá abranger a
propriedade e demais direitos reais passíveis da usucapião.
§ 2º Será facultada aos interessados a opção pela via judicial
ou pela extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer
momento, a suspensão do procedimento pelo prazo de trinta
dias ou a desistência da via judicial para promoção da via
extrajudicial.
§ 3º Homologada a desistência ou deferida a suspensão,
poderão ser utilizadas as provas produzidas na via judicial.
§ 4º Não se admitirá o reconhecimento extrajudicial da
usucapião de bens públicos, nos termos da lei.

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