Você está na página 1de 24

BIOQUÍMICA

Adriana Dalpicolli Rodrigues


O metabolismo dos estados
pré e pós-absortivo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar os principais tecidos que atuam durante o período pré e


pós-absortivo.
„„ Reconhecer as funções de alguns hormônios que regulam o fluxo
metabólico.
„„ Enumerar algumas doenças relacionadas à falta e ao excesso de
substratos energéticos.

Introdução
O metabolismo é composto por inúmeras vias metabólicas, ricas em
enzimas, que apresentam capacidade tanto de degradar substâncias
quanto de sintetizá-las nos diferentes tecidos do organismo. Essas vias
são controladas pelas próprias enzimas ou por hormônios que regulam
as ações que devem ser realizadas pelas enzimas ou por outras proteínas.
Em geral, os hormônios atuam de acordo com o estado que o indivíduo
se encontra, pré ou pós-absortivo, que, em outras palavras, se referem aos
estados de jejum ou alimentado. Quando há alguma alteração metabólica
que desencadeia a diminuição ou o excesso de determinado substrato,
pode-se instalar uma patologia.
Neste capítulo, você aprenderá quais são os tecidos que atuam nos
estados pré e pós-absortivos, reconhecerá as funções de alguns hor-
mônios que regulam o fluxo metabólico e, também, algumas doenças
relacionadas à falta e ao excesso de substratos energéticos.
2 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Tecidos atuantes nos períodos pré e


pós-absortivo
Os períodos pré e pós-absortivos do organismo se referem aos estados de jejum
(inicia de 2 a 4 horas após a última refeição e permanece até a inanição) e
alimentado, respectivamente, nos quais as vias metabólicas anabólicas (síntese
de moléculas), catabólicas (degradação de moléculas) e anfibólicas (síntese e
degradação) são constantemente ativadas e desativadas nos diferentes teci-
dos, conforme as necessidades energéticas. Além disso, há tecidos que não
apresentam organelas celulares suficientes para a ocorrência de algumas vias,
o que limita consequentemente alguns processos. Um bom exemplo disso
são os eritrócitos (células da série vermelha do sangue, também chamadas
de hemácias), que carecem de mitocôndrias e, desse modo, realizam apenas
glicólise anaeróbica e via das pentoses fosfato. O tecido nervoso (mais espe-
cificamente o sistema nervoso central) também depende muito de glicose.
O encéfalo pode metabolizar corpos cetônicos (resultantes do catabolismo
dos lipídeos) para suprir em torno de 20% das necessidades energéticas do
tecido, mas obrigatoriamente o restante deve ser fornecido pela glicose.
As reservas de glicose, principalmente na forma de glicogênio durante o
estado alimentado, são importantes para uso pelo encéfalo e pelos eritrócitos,
e para fornecer combustíveis metabólicos alternativos para outros tecidos
(RODWELL et al., 2017).
Durante várias horas após o indivíduo ter se alimentado, enquanto os
produtos da digestão estão sendo absorvidos pelo organismo, há um forneci-
mento abundante de combustíveis metabólicos (abundância em energia). Nesse
estado, a glicose está disponível para uso, constituindo a principal fonte de
energia para a oxidação na maioria dos tecidos. Esse fato pode ser observado
na forma de aumento do quociente respiratório (a razão entre dióxido de
carbono produzido e oxigênio consumido) de cerca de 0,8 no estado de jejum
para quase 1 no estado alimentado (RODWELL et al., 2017).
A captação de glicose no músculo e no tecido adiposo é controlada por
um hormônio peptídico, a insulina, secretado pelas células beta das ilho-
tas pancreáticas em resposta ao aumento de glicose no sangue. No jejum,
os níveis de insulina são baixos, e o transportador de glicose do músculo e do
tecido adiposo (GLUT-4) encontra-se em vesículas intracelulares. Já no estado
alimentado, a resposta à insulina consiste na migração dessas vesículas para
a superfície da célula, onde se fundem com a membrana plasmática, expondo
os transportadores ativos de glicose. Dessa forma, os tecidos sensíveis à in-
sulina captam glicose da corrente sanguínea. Ao entrar em jejum novamente,
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 3

a secreção de insulina diminui, e os receptores são novamente internalizados,


reduzindo a captação de glicose (RODWELL et al., 2017).
No tecido muscular esquelético, em resposta à estimulação nervosa,
há aumento na concentração citoplasmática de íons cálcio, que provoca a mi-
gração das vesículas para a superfície celular e a exposição dos transportadores
ativos de glicose, independentemente da insulina. O fígado também apresenta
essa independência. O tecido hepático tem uma isoenzima da hexocinase ou
hexoquinase (glicocinase ou glicoquinase), que, conforme a concentração de
glicose que entra no fígado se eleva, também aumenta a velocidade de síntese
de glicose-6-fosfato. O excesso dessa produção resulta na síntese de glico-
gênio. Tanto no fígado quanto no músculo esquelético, a insulina estimula a
glicogênio-sintase e inibe a glicogênio-fosforilase. Um resumo desse processo
pode ser verificado na Figura 1.

Figura 1. Controle da síntese de glicogênio.


Fonte: Nelson e Cox (2019, p. 588).
4 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Parte da glicose que entra nas células hepática também pode ser utilizada
para a lipogênese (síntese de triacilglicerol). A insulina inibe a lipólise intrace-
lular e a liberação de ácidos graxos não esterificados. Os produtos da digestão
dos lipídeos entram na circulação como quilomícrons (maior lipoproteína
plasmática, rica em triacilglicerol, os triglicerídeos) (RODWELL et al., 2017).

A existência de quilomícrons pode ser observada em soro pacientes que tiveram


uma refeição e, em seguida, coletaram sangue (embora também possa ser vista em
pacientes que coletam em jejum por algum problema metabólico). A amostra sérica
do paciente fica lipêmica, ou seja, leitosa.

No tecido adiposo e no músculo esquelético, a lipase lipoproteica extracelular


é sintetizada e ativada em resposta à insulina. Assim, os ácidos graxos não
esterificados resultantes são capturados pelo tecido e utilizados para a síntese de
triacilglicerol. O glicerol permanece na corrente sanguínea, sendo captado pelo
fígado e utilizado para a gliconeogênese, síntese de glicogênio ou lipogênese.
Os ácidos graxos que permanecem na corrente sanguínea são captados pelo
fígado e reesterificados. Os remanescentes de quilomícrons com menor quan-
tidade de lipídeos são depurados pelo fígado, e o triacilglicerol remanescente
é exportado, com aquele sintetizado no fígado, na lipoproteína de densidade
muito baixa (VLDL). Os ácidos graxos livres plasmáticos aumentam durante o
jejum, mas ocorre pouca elevação adicional deles na inanição. Quando o jejum
é prolongado, a concentração plasmática de corpos cetônicos (acetacetato e
3-hidroxibutirato) aumenta acentuadamente (RODWELL et al., 2017).
Em condições normais, a velocidade do catabolismo proteico tecidual é
mais ou menos constante. Há catabolismo proteico líquido no jejum, quando
a taxa de síntese de proteínas cai, e uma síntese líquida de proteínas no estado
alimentado, quando a taxa de síntese aumenta. A velocidade aumentada da
síntese em resposta à maior disponibilidade de aminoácidos e combustível
metabólico também decorre da ação da insulina. Esse processo consome
energia, sendo responsável por até 20% do gasto energético em repouso após
a refeição, mas 9% no jejum. Observam-se uma pequena queda da glicose
plasmática no estado de jejum e também pouca alteração à medida que o jejum
se prolonga até o estado de inanição (RODWELL et al., 2017).
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 5

No jejum, à medida que a concentração de glicose no sangue, absorvida no


intestino delgado, diminui, a secreção de insulina consequentemente também
diminui, e o músculo esquelético e o tecido adiposo captam menos glicose.
Desse modo, há aumento na secreção de glucagon pelas células alfapancreá-
ticas que inibe a glicogênio-sintase e ativa a glicogênio-fosforilase no fígado.
A glicose-6-fosfato é hidrolisada pela glicose-6-fosfatase, e glicose é liberada
na corrente sanguínea para ser utilizada pelo encéfalo e pelos eritrócitos.
O glicogênio muscular não pode contribuir diretamente para aumento da gli-
cemia, pois os músculos são carentes de glicose-6-fosfatase e o principal uso
do glicogênio muscular consiste em fornecer energia para o próprio músculo.
Então, a acetil-CoA formada pela oxidação dos ácidos graxos nesse tecido inibe
a piruvato-desidrogenase, resultando no acúmulo de piruvato. A maior parte
desse piruvato sofre transaminação no aminoácido alanina, à custa de outros
aminoácidos provenientes da degradação da proteína muscular. A alanina e
grande parte dos cetoácidos resultantes são exportadas do músculo e captadas
pelo fígado, no qual a alanina é transaminada novamente para a produção de
piruvato. A maioria dos aminoácidos resultantes é exportada de volta para o
músculo para fornecer grupamentos amino para a formação de mais alanina.
O músculo não pode suprir todas as necessidades energéticas pela betaoxidação;
contudo, o fígado apresenta maior capacidade de betaoxidação do que precisa
para suas necessidades. Assim, conforme o jejum se prolonga, o fígado forma
mais acetil-CoA do que pode ser oxidada. Esse metabólito é utilizado na síntese
de corpos cetônicos, que constituem os principais combustíveis metabólicos
para os músculos esquelético e cardíaco, em pequena parcela para o encéfalo.
Na inanição prolongada, a glicose pode chegar a representar menos de 10%
do metabolismo gerador de energia. Se não houvesse nenhuma outra fonte
de glicose, o glicogênio hepático e muscular estaria esgotado após cerca de
18 horas de jejum (RODWELL et al., 2017).
No tecido adiposo, o jejum provoca a diminuição da insulina e o aumento do
glucagon resultando em inibição da lipogênese, inativação e internalização da
lipase lipoproteica e ativação da lipase sensível ao hormônio intracelular. Isso
libera quantidades aumentadas de glicerol (substrato para a gliconeogênese no
fígado) e de ácidos graxos livres, utilizados pelo fígado, pelo coração e pelo
músculo esquelético como seus substratos energéticos metabólicos, mantendo
a glicose preservada. No Quadro 1, você pode observar as principais vias
metabólicas que ocorrem nos principais órgãos e tecidos metabólicos e, na
Figura 2, a variação dos substratos metabólicos e hormônios nos estados pré
e pós-absortivos (RODWELL et al., 2017).
6 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Quadro 1. Principais vias metabólicas atuantes em órgãos e tecidos

Principais
Principais Enzimas es-
Órgão Principais vias produtos
substratos pecializadas
exportados

Fígado Glicólise, Ácidos Glicose, Glicocinase,


gliconeogênese, graxos livres, triacilglicerol glicose-6-
lipogênese, be- glicose em fosfatase,
taoxidação, ciclo (no estado VLDL*, glicerol-cinase,
do ácido cítrico, alimentado), corpos fosfoenol-
cetogênese, lactato, cetônicos, piruvato-
metabolismo das glicerol, ureia, ácido -carbo-
lipoproteínas, frutose, úrico, sais xicinase,
metabolismo aminoácidos, biliares, frutocinase,
de fármacos, álcool colesterol, arginase,
síntese de proteínas HMG-CoA-
sais biliares, plasmáticas -sintase,
ureia, ácido HMG-
úrico, colesterol, -CoA-liase,
proteínas álcool-desi-
plasmáticas drogenase

Encéfalo Glicólise, ciclo Glicose, Lactato, pro- Enzimas para


do ácido cítrico, aminoácidos, dutos finais a síntese e
metabolismo de corpos do metabo- para o cata-
aminoácidos, cetônicos lismo dos bolismo dos
síntese de neu- na inanição neurotrans- neurotrans-
rotransmissores prolongada missores missores

Coração β-oxidação e Corpos — Lipase


ciclo do ácido cetônicos, lipoproteica,
cítrico ácidos cadeia de
graxos livres, transporte
lactato, de elétrons
quilomícrons muito
e ativa
triacilglicerol
das VLDL,
alguma
glicose

(Continua)
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 7

(Continuação)

Quadro 1. Principais vias metabólicas atuantes em órgãos e tecidos

Principais
Principais Enzimas es-
Órgão Principais vias produtos
substratos pecializadas
exportados

Tecido Lipogênese, Glicose, Ácidos Lipase


adiposo esterificação de quilomícrons graxos não lipoproteica,
ácidos graxos, e esterificados, lipase
lipólise (no triacilglicerol glicerol sensível a
jejum) das VLDL hormônio,
enzimas
da via das
pentoses-
-fosfato

Con- Glicólise Glicose, Lactato —


tração glicogênio (alanina e
mus- cetoácidos
cular em jejum)
rápida

Con- Betaoxidação e Corpos — Lipase


tração ciclo do ácido cetônicos, lipoproteica,
mus- cítrico quilomícrons cadeia de
cular e transporte
lenta triacilglicerol de elétrons
das VLDL muito
ativa

Rins Gliconeogênese Ácidos Glicose Glicerol-cinase,


graxos não fosfoenol-
esterificados, piruvato-
lactato, -carboxicinase
glicerol,
glicose

Hemá- Glicólise Glicose Lactato Hemoglobina,


cias anaeróbia, enzimas
via das da via
pentoses-fosfato das pentoses-
fosfato
*VLDL, lipoproteína de densidade muito baixa.

Fonte: Adaptado de Rodwell et al. (2017).


8 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Figura 2. Variação dos substratos metabólicos e hormônios nos


estados pré e pós-absortivos.
Fonte: Rodwell et al. (2017, p. 149).

Hormônios reguladores do fluxo metabólico


A coordenação do metabolismo nos mamíferos é realizada pelo sistema neuro-
endócrino. Grande parte dos hormônios tem origem hipotalâmica. O hipotálamo
é uma pequena região do encéfalo que tem como função principal controlar o
sistema endócrino, ou seja, estimular ou inibir a produção hormonal. Os hor-
mônios são substâncias químicas que possibilitam a comunicação celular para
a regulação de inúmeras funções metabólicas, produzidos em determinadas
glândulas, órgãos ou tecidos e com a capacidade de exercer ação no local em
que foram produzidos ou bem distantes da origem. As principais glândulas
e tecidos endócrinos são hipófise (adeno-hipófise e neuro-hipófise), pineal,
tireoide (maior glândula endócrina do organismo), paratireoides, suprarrenais,
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 9

pâncreas, tecido adiposo, ovários e testículos (NELSON; COX, 2019; ZIERI,


2014).
O hipotálamo recebe e integra mensagens (fome, refeição recente, medo,
etc.) do sistema nervoso, e, em resposta, produz hormônios que estimularão
a hipófise. A hipófise divide-se em neuro-hipófise — que secreta os hormô-
nios vasopressina (hormônio antidiurético [ADH]) e ocitocina (estimula o
trabalho de parto e cria sensações reconfortantes — “hormônio do amor”) —
e adeno-hipófise, que produz e secreta diversos hormônios (Figura 3), como
os descritos a seguir (NELSON; COX, 2019).

„„ Hormônio do crescimento (GH — somatotrofina): atuará em diversas


células do organismo e estimulará o desenvolvimento de um indivíduo,
mantendo-se em altas concentrações, por exemplo, na infância (todas
as fases de crescimento).
„„ Prolactina: atua sobre as glândulas mamárias para a produção de leite
na gestação.
„„ Hormônio folículo-estimulante (FSH) e hormônio luteinizante (LH):
atuam sobre as gônadas e estimulam a produção de outros hormônios
associados a características sexuais e funções reprodutivas, como tes-
tosterona e estradiol.
„„ Hormônio adrenocorticotrófico (ACTH): estimula o córtex das glân-
dulas suprarrenais (localizadas logo em cima do rim) a liberarem cortisol
e a medula dessas glândulas a liberarem aldosterona (manutenção do
equilíbrio eletrolítico).
„„ Cortisol (“hormônio do estresse”): age em muitas células, alterando o
metabolismo celular. Está muito envolvido no metabolismo dos carboi-
dratos. Nos hepatócitos, por exemplo, ativa a gliconeogênese. Em casos
de liberação de cortisol com altos níveis de insulina, ocorre síntese de
lipídeos e o indivíduo acaba tendo dificuldades de emagrecer.

Os hormônios corticosteroides (adrenocortical) e os hormônios sexuais são con-


siderados hormônios esteroides, pois derivam do colesterol, que se deslocam até
suas células-alvo pela corrente sanguínea, ligados a proteínas carregadoras. No córtex
da glândula suprarrenal, são produzidos mais de 50 hormônios corticosteroides, por
reações que removem a cadeia lateral do anel D do colesterol e introduzem oxigênio,
10 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

formando grupos cetona e hidroxila. Os corticosteroides são de dois tipos gerais,


definidos por suas ações: glicocorticoides, como o cortisol; e mineralocorticoides,
como a aldosterona. Dois tipos de hormônios sexuais, os androgênios (incluindo a
testosterona) e estrogênios (incluindo o estradiol), são sintetizados nos testículos e
nos ovários. Todos os hormônios esteroides atuam por meio de receptores nucleares
e alteram o nível de expressão de genes específicos, e também podem ter efeitos
mais rápidos, mediados por receptores na membrana plasmática.

„„ Hormônio tireoestimulante (TSH): tem ação sobre a tireoide, estimu-


lando-a a secretar três hormônios, T4 (tiroxina), T3 (triiodotironina) e
calcitonina (atua no metabolismo do cálcio). Os dois primeiros estimu-
lam o metabolismo energético, principalmente no fígado e no músculo.
Não apresentam ações apenas sobre o baço, os testículos e o útero.
Quando há diminuição na produção desses hormônios, chamamos essa
condição de hipotireoidismo, quando se observa que o metabolismo fica
mais lento e, entre outras consequências, o indivíduo apresenta aumento
do peso corporal; já quando a produção desses hormônios aumenta,
tem-se o hipertireoidismo, quando o metabolismo fica acelerado.

Além da hierarquia de sinalização hormonal do hipotálamo à hipófise e das


demais glândulas como citado anteriormente e que você pode visualizar na
Figura 3, alguns hormônios são produzidos no sistema digestório, no sistema
muscular e no tecido adiposo. Esses hormônios apresentam a capacidade de
comunicar o estado metabólico atual do indivíduo ao hipotálamo, quando
uma resposta neuronal ou hormonal apropriada é induzida. A ação da enzima
proteína-cinase ativada por AMP (adenosina monofosfato) no hipotálamo
representa um dos mecanismos integradores desse processo (NELSON; COX,
2019). A seguir, são apresentados alguns desses hormônios.

„„ Adipocinas: produzidas no tecido adiposo, sinalizam a adequação das


reservas de gordura, ou seja, quando há esgotamento das reservas de
gordura, elas estimulam a alimentação (sentir fome).
„„ Leptina: produzida pelo tecido adiposo, é liberada quando esse tecido
está repleto de triacilgliceróis, atuando, assim, no cérebro para inibir
o comportamento alimentar (indica saciedade). Esse hormônio está
envolvido no metabolismo da glicose, dos lipídeos e ósseo, além da
reprodução e da imunidade.
Figura 3. Hierarquia de secreção hormonal associada ao sistema nervoso.
Fonte: Nelson e Cox (2019, p. 916).
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo
11
12 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

„„ Grelina: produzida quando o estômago está vazio, atua no hipotálamo


para estimular o comportamento alimentar. Quando o estômago está
cheio, a liberação de grelina cessa.
„„ Incretinas: produzidas no intestino após a ingestão de uma refeição,
provocam aumento da secreção de insulina e diminuição da secreção
de glucagon pelo pâncreas. As incretinas mais estudadas são o peptídeo
tipo glucagon 1 (GLP-1) e o polipeptídeo insulinotrófico dependente de
glicose (GIP), também conhecido como polipeptídeo inibidor gástrico.
„„ Insulina: trata-se de um dos principais hormônios que atuam no metabo-
lismo em estado alimentado (como você viu no título anterior). Consiste
em uma proteína pequena com duas cadeias polipeptídicas, sintetizada
no pâncreas como um precursor inativo de uma cadeia única, a pré-pró-
-insulina, com uma porção amino-terminal que direciona sua passagem
para as vesículas secretoras. A remoção proteolítica dessa porção e a
formação de três ligações dissulfeto produzem pró-insulina, armazenada
em grânulos secretores nas células betapancreáticas. Quando a glicose
sanguínea se eleva consideravelmente, desencadeia-se a secreção da
insulina. A pró-insulina é convertida em insulina ativa por proteases
específicas, que hidrolisam duas ligações peptídicas e formam a mo-
lécula de insulina madura e o peptídeo C, liberados por exocitose no
sangue. A insulina estimula a captação de glicose e a síntese de gor-
dura, e o peptídeo C age por meio de receptores acoplados à proteína
G em vários tecidos para abrandar os efeitos da redução da síntese de
insulina. Todos os hormônios peptídicos agem pela ligação aos recep-
tores na membrana plasmática, e muitos hormônios são regulados por
retroalimentação. Na Figura 4, você pode ver a relação dos hormônios
associados ao controle do apetite.
„„ Glucagon: também é um hormônio peptídico sintetizado pelas células
alfapancreáticas. Sua atuação é oposta à da insulina, ou seja, é secretado
em situações de baixo nível de glicose (hipoglicemia) sérica, normal-
mente em estado de jejum. Estimula a gliconeogênese e a glicogenólise,
além de inibir a síntese de glicogênio e a glicólise.
„„ Neuropeptídeo Y (NPY): produzido no hipotálamo e nas glândulas
suprarrenais, sua liberação estimula a alimentação e reduz o gasto de
energia para atividades não essenciais.
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 13

Figura 4. Hormônios do estado alimentado de controle do apetite.


Fonte: Voet e Voet (2013, p. 1100).

„„ Peptídeo YY (PYY3-36): produzido no intestino, sinaliza saciedade.


„„ Irisina: produzida no músculo como resultado do exercício, age para
converter o tecido adiposo branco em tecido adiposo marrom ou bege.
Esses tecidos são responsáveis por dissipar a energia como calor.
14 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Outra categoria de hormônios refere-se aos catecolamínicos. A adrenalina


(epinefrina) e a noradrenalina (norepinefrina) são catecolaminas produzidas
no cérebro e em outros tecidos neurais que atuam como neurotransmissores
e hormônios, sendo sintetizadas e secretadas pelas glândulas suprarrenais.
As catecolaminas também se estão altamente concentradas nas vesículas
secretoras, são liberadas por exocitose e atuam por meio de receptores de
superfície para gerar segundos-mensageiros intracelulares. Elas controlam
uma ampla variedade de respostas fisiológicas ao estresse agudo. A adrena-
lina age principalmente nos tecidos muscular, adiposo e hepático, ativando
a glicogênio-fosforilase e inativando a glicogênio-sintase, estimulando a
conversão do glicogênio hepático em glicose sanguínea. A adrenalina promove
a degradação anaeróbica do glicogênio muscular pela fermentação em ácido
láctico, estimulando a formação glicolítica de ATP, estimula a mobilização de
gordura no tecido adiposo, ativando a lipase sensível a hormônios, e a secreção
de glucagon, além de inibir a secreção de insulina.
Como hormônios derivados de lipídeos, além dos esteroides, têm-se os
eicosanoides, como prostaglandinas, tromboxanos, leucotrienos e lipoxinas,
derivados do ácido graxo poli-insaturado de 20 carbonos araquidonato e
ácido eicosapentanoico. São produzidos apenas quando necessário, ou seja,
não ficam armazenados. As enzimas da via que leva às prostaglandinas e
aos tromboxanos estão amplamente distribuídas nos tecidos; a maioria das
células pode produzir esses sinais hormonais e muitas podem responder a
eles por meio de receptores específicos na membrana plasmática da célula.
Esses hormônios são parácrinos (agem em células próximas) e são secretados
no líquido intersticial (não no sangue). Algumas prostaglandinas promovem
a contração da musculatura lisa, incluindo a do intestino e do útero, além de
mediar dor e inflamação em alguns tecidos. Os tromboxanos regulam a função
das plaquetas. Os leucotrienos estimulam a contração da musculatura lisa no
intestino, nas vias respiratórias pulmonares e na traqueia. São mediadores
da anafilaxia, resposta imune exagerada que pode incluir constrição das
vias respiratórias, frequência cardíaca alterada, choque e até mesmo morte.
As lipoxinas são derivados eicosanoides de vida curta com efeitos potentes
na função imune (aparecem na circulação no final da inflamação).
Um dos hormônios que tem sido bastante estudado é o calcitriol (1-alfa,25-
-di-hidroxicalcitriol), produzido a partir da vitamina D por hidroxilação ca-
talisada por enzimas no fígado e nos rins. A vitamina D é obtida da dieta ou
por fotólise do 7-desidrocolesterol na pele exposta à radiação solar (principal
fonte de vitamina D). O calcitriol atua com o hormônio paratireóideo (PTH)
na homeostasia do cálcio, regulando a concentração desse íon no sangue e o
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 15

equilíbrio entre o armazenamento e a mobilização do tecido ósseo. O calcitriol,


agindo por receptores nucleares, ativa a síntese da proteína intestinal ligadora
de cálcio para a captação desse íon na alimentação. Ingestão inadequada da
vitamina e defeitos na biossíntese de calcitriol resultam em doenças graves,
como o raquitismo (NELSON; COX, 2019).

Principais doenças relacionadas à falta e ao


excesso de substratos energéticos
Quando ocorrem desequilíbrios no metabolismo provocados por alterações
hereditárias ou hormonais, surgem as doenças. A partir de agora, você co-
nhecerá as principais doenças associadas à falta ou ao excesso de substratos.

Diabetes melito
Trata-se de uma doença bastante prevalente na população mundial, na qual o
organismo do indivíduo não consegue captar de forma eficiente a glicose sérica
por algum problema associado à secreção de insulina (insuficiência, ausência,
resistência). Como a insulina tem a função de provocar o deslocamento dos
transportadores de glicose (GLUT-4) para a membrana plasmática no mús-
culo e no tecido adiposo, defeitos em qualquer etapa relacionada resultam
em excesso de glicose sérica por não poder ser metabolizada pelas células.
Sem a metabolização da glicose, os ácidos graxos tornam-se o combustível
principal para uso pelo organismo, o que leva a outra alteração metabólica
característica: a oxidação excessiva, mas incompleta, dos ácidos graxos no
fígado. A acetil-CoA produzida pela betaoxidação não pode ser completamente
oxidada pelo ciclo do ácido cítrico (acaba sendo acumulada), pois há alta
relação [NADH]/[NAD1] produzida por essa via, inibindo o ciclo. O acúmulo
de acetil-CoA leva à produção aumentada de corpos cetônicos, acetoacetato e
beta-hidroxibutirato, que não podem ser usados pelos tecidos extra-hepáticos
na mesma velocidade de produção. Ainda, forma-se a cetona, que é volátil
e exalada pelo diabético, especialmente nos casos não controlados (hálito
cetônico, às vezes confundido com etanol). Em geral, a produção dos corpos
cetônicos (cetose) resulta em uma concentração muito aumentada desses
compostos no sangue (cetonemia) e na urina (cetonúria). Por isso, no diabetes
não controlado, pode ocorrer redução no pH sanguíneo, chamada de acidose,
ou, em combinação com a cetose, cetoacidose. Nessa situação, o diabético
pode entrar em coma, e algumas situações são letais (NELSON; COX, 2019).
16 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Os sintomas principais da diabetes são polidipsia e poliúria, em razão da


excreção de grande quantidade de glicose na urina, condição conhecida como
glicosúria. O termo “diabetes melito” significa “excreção excessiva de urina
doce”, uma doença que pode ser classificada em: diabetes tipo 1, também
denominada diabetes melito insulina-dependente (DMID), e diabetes tipo 2,
ou diabetes melito não insulina-dependente (DMNID) ou diabetes resistente
à insulina. O tipo 1 geralmente se manifesta cedo na vida do indivíduo com
sintomas que rapidamente podem se tornar graves, exigindo tratamento por
aplicação de insulina por toda a vida, pois o defeito metabólico se caracteriza
pela destruição autoimune das células betapancreáticas e pela consequente
incapacidade na produção de insulina suficiente. O diabetes tipo 2 apresenta
desenvolvimento lento e geralmente surge em indivíduos com mais idade e
sobrepeso/obesos, com sintomas mais brandos e, frequentemente, não reconhe-
cidos no início da doença. A atividade reguladora da insulina está perturbada,
ou seja, a insulina é produzida pelas células pancreáticas, porém o sistema de
resposta ao hormônio está defeituoso; consequentemente, os indivíduos são
resistentes à insulina (NELSON; COX, 2019; OLIVEIRA; MONTENEGRO
JUNIOR; VENCIO, 2017).
Em relação ao diagnóstico do diabetes melito com utilização da glicemia,
há três critérios principais aceitos pela Sociedade Brasileira de Diabetes
(OLIVEIRA; MONTENEGRO JUNIOR; VENCIO, 2017):

1. Sintomas de poliúria, polidipsia e perda ponderal acrescidos de glicemia


casual ≥ 200 mg/dL. Glicemia casual é aquela realizada a qualquer
hora do dia.
2. Glicemia de jejum ≥ 126 mg/dL. Em caso de pequenas elevações da
glicemia, o diagnóstico deve ser confirmado pela repetição do exame
em outro dia.
3. Glicemia de 2 h pós-sobrecarga de 75 g de glicose ≥ 200 mg/dL.

Após uma refeição ou ingestão de 75 g de glicose, uma pessoa saudável


assimila a glicose rapidamente, e o aumento no sangue não é limitado; pouca
ou nenhuma glicose aparece na urina. Já no diabetes, o indivíduo assimila
muito pouco de glicose, o nível do açúcar no sangue aumenta exageradamente
e o retorno ao nível do jejum é muito lento. Uma vez que os níveis sanguíneos
de glicose excedem o limiar do rim, ela aparece também na urina (NELSON;
COX, 2019).
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 17

Segundo Sumita e Pimazoni-Netto (2016), a determinação da hemoglobina


glicada (HbA1c) também constitui um dos aspectos mais importantes no con-
trole do diabetes e na avaliação de risco das complicações crônicas, podendo
também ser utilizada para fins diagnósticos. Esse teste avalia a quantidade
de açúcares ligados à hemoglobina A, considerando-se:

„„ menor que 5,7% (normal): valor esperado para não diabéticos;


„„ 5,7% a 6,5% (pré-diabetes): risco aumentado para o desenvolvimento
de diabetes;
„„ maior que 6,5% (diagnóstico de diabetes): necessidade de confirmação
em uma segunda dosagem;
„„ maior que 7% (controle do diabetes): meta a ser atingida pelos diabéticos.

No link a seguir, você tem acesso ao material sobre diabetes melito organizado pela
Sociedade Brasileira de Diabetes.

https://qrgo.page.link/j7gAV

Diabetes insípido
Ocasionado pela deficiência do ADH ou pela insensibilidade dos rins a esse hor-
mônio, caracteriza-se por sede pronunciada e excreção de grandes quantidades
de urina muito diluída. Nessa doença, a diluição da urina não diminui quando a
ingestão de líquidos é reduzida, denotando a incapacidade renal de concentrar
a urina. Para a confirmação diagnóstica desse tipo de diabetes, pode-se fazer
a avaliação da glicemia, mais como critério de exclusão do diabetes melito,
visto que, no insípido, a glicemia é normal, além de determinação do volume
urinário, do ADH e de eletrólitos (sódio e potássio principalmente) séricos
em urina de amostra ou de 24 horas e ressonância magnética (MCPHERSON;
PINCUS, 2012).
18 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

Síndrome metabólica e obesidade


A síndrome metabólica (SM), conhecida também como síndrome X, é um
distúrbio do metabolismo caracterizado por resistência à insulina (determinada
a partir do índice de HOMA — cálculo realizado pela dosagem da glicemia e
da insulina) e alterações nas proteínas sanguíneas, associadas a coagulação
anormal (alta concentração de fibrinogênio), inflamação (alta concentração
de peptídeo C reativo, que aumenta com a resposta inflamatória), alterações
no perfil lipídico e uma predisposição a várias doenças, como diabetes tipo 2,
hipertensão, aterosclerose e demais doenças cardiovasculares. A obesidade, o
sedentarismo e possivelmente determinantes genéticos têm sido implicados
no desenvolvimento dessa síndrome (NELSON; COX, 2019; VOET; VOET,
2013). As manifestações iniciam na idade adulta ou na meia-idade e aumentam
muito com o envelhecimento, é mais frequente em homens, embora mulheres
com a síndrome dos ovários policísticos, pela associação com a resistência
à insulina, estejam sujeitas a desenvolver a SM, mesmo não sendo obesas.
Segundo a Oliveira, Montenegro Junior e Vencio (2017), os critérios diagnós-
ticos estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) são:

„„ obesidade central (relação cintura/quadril) > 0,90 cm para homens e


> 0,85 para mulheres;
„„ índice de massa corpórea (IMC) > 30 kg/m 2;
„„ triglicérides > 150 mg/dL;
„„ colesterol HDL < 35 em homens e < 39 em mulheres;
„„ pressão arterial > 140 × 90 mmHg;
„„ glicemia > 110 mg/dL ou diabetes diagnosticado.

Exercícios, redução das calorias e do peso, adiponectina, leptina e metfor-


mina têm sido utilizados com sucesso no tratamento da síndrome metabólica
(VOET; VOET, 2013).
A obesidade é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo excessivo
de gordura corporal no indivíduo. Para o diagnóstico em adultos, o parâmetro
utilizado mais comumente é o do IMC, calculado dividindo-se o peso do
indivíduo por sua altura elevada ao quadrado. Valores de IMC entre 30 e
39 classificam o indivíduo como obesidade, e valores acima de 40 indicam
obesidade grave. As prováveis causas dessa doença são o excesso de peso,
que pode estar ligado ao patrimônio genético da pessoa e a maus hábitos
alimentares (ingestão de mais calorias nas refeições do que as gastas pelas
atividades corporais), ou disfunções endócrinas (hipotireoidismo, resistên-
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 19

cia a leptina, altos níveis de cortisol, etc.). O organismo lida de três formas
com o excesso de calorias administradas nas refeições: converte o excesso
em gordura e a armazena no tecido adiposo; precisa queimar o excesso em
exercício extra; e dissipa os excessos para a produção de calor (termogênese)
pelas mitocôndrias desacopladas. O indivíduo obeso tem mais propensão a
desenvolver problemas como hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes
tipo 2, câncer, etc. (NELSON; COX, 2019).

Síndrome de Cushing
Surge pela secreção exagerada de ACTH e, consequentemente, de cortisol,
apresentando sintomas e complicações sérias, como obesidade centrípeta, isto
é, ocorre na face e no abdome, mas não nos membros, que, ao contrário, são
finos e com atrofia da musculatura, o que causa fraqueza muscular. Aparecem
estrias largas e de cor violeta (geralmente no abdome e na raiz dos membros)
e equimoses (manchas roxas). Pode levar ao diabetes e à hipertensão e ser
causada por uso excessivo de corticosteroide, via oral, injetável ou mesmo
tópica, como nasal ou pela pele, embora também possa decorrer de produção
excessiva de cortisol (corticoide produzido nas suprarrenais), seja por tumor das
adrenais, seja por tumor produtor de ACTH (MCPHERSON; PINCUS, 2012).

Erros inatos do metabolismo


Geralmente, são distúrbios que correspondem a um defeito enzimático capaz
de acarretar a interrupção de uma via metabólica dos carboidratos, lipídeos ou
aminoácidos e afetam o organismo como um todo. Podem ocorrer por alguma
falha de síntese, degradação, armazenamento ou transporte de moléculas no
organismo. De modo geral, consistem em casos raros, mas podem promover
dano cerebral irreversível e mortalidade precoce se não detectados logo no
início da vida do indivíduo (no pré-natal, pela análise do líquido amniótico, ou,
no pós-natal, pelo teste do pezinho) em virtude da toxicidade dos substratos
em excesso (RODWELL et al., 2017).
O teste do pezinho, bastante utilizado para detectar essas alterações, con-
siste na coleta de algumas gotas de sangue do recém-nascido, normalmente
do calcanhar, com papel-filtro específico e análise de alterações genéticas,
infecciosas e de catabólitos sugestivos de determinado defeito metabólico,
por atividade reduzida ou ausente de determinada enzima. Mutações de um
gene ou de regiões reguladoras do DNA associadas podem resultar tanto em
falha na síntese da enzima codificada quanto na síntese de uma enzima parcial
20 O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo

ou completamente não funcional. Algumas mutações não afetam a atividade


enzimática de maneira negativa, entretanto as mutações que comprometem
a estrutura tridimensional da enzima ou que perturbam sítios catalíticos
ou reguladores dela podem ter consequências metabólicas graves. A baixa
eficiência catalítica de uma enzima mutante pode resultar do posicionamento
inadequado de resíduos envolvidos na catálise ou na ligação de um substrato,
uma coenzima ou um íon metálico. As mutações também podem comprometer
a capacidade de determinadas enzimas responder apropriadamente aos sinais
que modulam sua atividade, alterando a afinidade da enzima por um regulador
alostérico. Diferentes mutações podem produzir efeitos semelhantes sobre
qualquer um dos fatores já mencionados, e várias mutações são capazes de
promover os mesmos sinais e sintomas clínicos. O tratamento da maioria dos
distúrbios consiste, basicamente, em dietas com baixo teor do aminoácido
cujo catabolismo está comprometido (RODWELL et al., 2017).

A seguir, você pode conferir alguns exemplos de erros inatos do metabolismo.


„„ Fenilcetonúria: decorrente do defeito na enzima fenilalanina hidroxilase, responsável
por converter fenilalanina em tirosina. Como consequência, tem-se um aumento
elevado de fenilalanina no organismo do indivíduo afetado.
„„ Doença da urina de xarope de bordo: deficiência do complexo da desidrogrenase
dos alfacetoácidos de cadeia ramificada em que não possível o processamento
correto de certos aminoácidos, como leucina, isoleucina e valina. Esses aminoácidos
não metabolizados passam para a urina, conferindo-lhe um odor semelhante a
xarope de bordo.
„„ Deficiência de biotinidase: consiste na deficiência da enzima biotinidase, responsável
pela absorção e a regeneração orgânica da biotina, uma vitamina existente nos
alimentos que compõem a alimentação normal, indispensável para a atividade
de diversas enzimas.
„„ Hipoadrenocorticismo: também chamado de síndrome de Addison, resultante
da secreção hormonal adrenocortical insuficiente para manter as necessidades
fisiológicas básicas do organismo.
„„ Hipotireoidismo congênito: causado pela incapacidade da tireoide do recém-
-nascido em produzir quantidades adequadas de hormônios tireoidianos, resultando
na redução generalizada dos processos metabólicos.
O metabolismo dos estados pré e pós-absortivo 21

Acesse o link a seguir e saiba mais sobre as doenças metabólicas que podem ser
detectadas pelo teste do pezinho.

https://qrgo.page.link/LyV4J

MCPHERSON, R. A.; PINCUS, R. M. Diagnósticos clínicos e tratamento por métodos labo-


ratoriais de Henry. 21. ed. Barueri: Manole, 2012.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 7. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2019.
OLIVEIRA, J. E. P.; MONTENEGRO JUNIOR, R. M.; VENCIO, S. (org.). Diretrizes da Socie-
dade Brasileira de Diabetes 2017-2018. São Paulo: Clannad, 2017. Disponível em: https://
www.diabetes.org.br/profissionais/images/2017/diretrizes/diretrizes-sbd-2017-2018.
pdf. Acesso em: 29 jul. 2019.
RODWELL, V. W. et al. Bioquímica ilustrada de Harper. 30. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017.
SUMITA, N. M.; PIMAZONI-NETTO, A. Hemoglobina glicada: aspectos clínicos e labora-
toriais. 2016. Disponível em: https://www.labnetwork.com.br/noticias/hemoglobina-
-glicada-aspectos-clinicos-e-laboratoriais/. Acesso em: 29 jul. 2019.
VOET, D.; VOET, J. G. Bioquímica. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013.
ZIERI, R. Anatomia humana I. São Paulo: Pearson, 2014.

Você também pode gostar