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Pega-Pega. (criado entre 00:20 e 01:58 de 03/01/2024) Por Marcus Baikal – Ed.

Jotun

É um jogo (solo ou em grupo) de criar histórias caóticas em que um monte de coisa está
acontecendo e as personagens na história mal tem tempo para se preparar e precisa improvisar
sua forma de sair do buraco, às vezes literalmente.

O jogo precisa de dois dados, iguais, mas diferentes. Quanto mais faces o dado, maior o drama,
na minha opinião. Se não tiver dados de cores diferentes você vai precisar de duas superfícies
para lançar os dados, salvando a mais estável para seu “alvo”.

Para começar a jogar também é recomendável ter papel e caneta ou um arquivo de texto para
lembrar do que está anotando. Você não precisa criar uma personagem ainda. O que precisa é
criar uma cena se apuros. Um agente especial está infiltrado no meio da organização criminosa
e se depara com um velho conhecido que já o colocou na cadeia. Um jovem recentemente
empregado como zelador descobre que o cachorro da madame está desaparecido e falta pouco
tempo para os patrões chegarem. Um meteoro acabou de cair e dinossauros estouram pela selva
assustados pela explosão e sua onda de choque. Um avião sobre o oceano tem um passageiro
que parecia doente virando um zumbi e mordeu quem estava ao lado e logo irá avançar sobre o
próximo passageiro. Ao criar a cena mais ou menos já fica claro quem é sua personagem no rolê.
É hora de reagir.

Ao reagir você diz o que sua personagem pretende fazer. Você pode descrever melhor a
personagem agora e isso pode ser útil mais tarde. Pode tentar bolar um plano maior ou
simplesmente dar no pé. É importante ter uma ideia clara, ou pelo menos uma ideia vaga, se a
sua decisão implica algo de vida ou morte nesse primeiro momento, depende da cena tanto
quanto do que você decide fazer. Se for de vida ou morte, é hora de pensar em outra coisa: quão
forte é a sua armadura de plot. Armaduras de plot salvam protagonistas do perigo mortal graças
a uma bela conveniência do roteiro, pois a história ainda não está madura para a morte delas,
ou incapacitação para seguir na história (como ficar hospitalizado gravemente ferido). O jogo e
a história que ele conta não acaba com a morte da personagem, necessariamente. Por isso é
importante definir o poder da armadura de plot e anotar isso nessa hora é recomendável. Um
número médio é 3. Por três vezes as personagens podem escapar de uma morte certa quando
os dados disserem o contrário, nesse caso. Menos que isso ou 0, a história será mais letal e
provavelmente terá múltiplos pontos de vista de personagens, trocados à força pela morte
antecipada de um deles, ou uma história de mais pé no chão, pois suas decisões devem ser
menos arriscadas. Mais que isso e temos uma história mais leve que dá segurança para fazer
coisas mais heroicas e escapar vivo.

Feita sua decisão, role os dois dados iguais, porém diferentes. Um representa a reação da sua
personagem e a outra o “alvo” da ação. Se o seu resultado for maior que o do alvo, obteve
sucesso no curso de ação. Se for menor que o dado do alvo, falhou. Se obteve o mesmo número
obteve um sucesso especial e a trama progride. De um jeito ou de outro a história anda e outro
momento de caos surgirá adiante.

Sucesso: ou curso de ação deu certo e o perigo imediato foi evitado, ganhando controle
temporário da situação, ninguém sai prejudicado. A partir do primeiro sucesso você consegue
ver uma saída da situação arriscada e deve definir quantos sucessos mais precisa para que ela
deixe de ser uma pedra no seu sapato, por enquanto. Isso pode ser evidente, então o total seria
2 e você já tem um. Pode ser 3 e falta ainda algo incerto acontecer, mas não vai ser tão simples
sair dessa mesmo. Ou 4, quando a enrascada plantada imediata na sua frente te deixou em
grande desvantagem. Fácil, médio ou difícil. Decida. Então conte o que acontece dali até o
próximo momento de apuros decisivo.

Falha: o curso de ação foi interrompido ou não foi efetivo. Sua personagem estará envolvida pela
situação e em perigo ainda maior, ou se era uma situação de vida ou morte, bom, morreu (ou se
lascou e estará incapacitada pelo resto da história). Seus únicos recursos para evitar isso são os
talentos latentes e nos casos de morte, a armadura de plot. Um talento latente é algo que você
inventa sobre a personagem que pode ajudar a salvar seu pescoço na situação em que ela se
encontra. Você pode afirmar que ela treinou para isso porque frequentou a academia e essa era
sua melhor habilidade. Pode definir que ela tem superpoderes e ela os sente ao alcance (ou
estava evitando usar em público antes, para preservar seu anonimato). Pode dizer que algo
parecido já aconteceu no passado, aquela vez em Juazeiro, e tem uma ideia do que fazer etc.
Manifestar uma habilidade latente permite que no próximo caos que você descrever sua
personagem terá tamanha vantagem que poderá rolar o dado de novo se não obtiver sucesso
na primeira tentativa. Dali para frente na história sempre que descrever algo similar de caos, terá
essa mesma vantagem. Também pode já contar quantos sucessos precisa para se livrar da
situação, 2, 3 ou 4.

Se sua personagem falhar uma segunda vez na mesma cena, capturada pelo caos ou mesmo
vítima dele, a trama progride. E se a armadura de plot funcionou, bom, você decide na hora se
isso transformou a morte certa em um sucesso inesperado, com um bom ex machina, por
exemplo, um outro grupo de agentes especiais entra na cena ou o cachorro reapareceu sozinho,
logo do outro lado da esquina no lado oposto em que você procurava. Ou você corta e a trama
progride, não sabemos ainda, mas a personagem pode ainda estar viva. Em fato, ao cortar nessas
cenas você sempre pode salvar aquela personagem mais tarde, se ainda tiver armadura de plot,
mas se já descreveu a coisa como uma morte certa e fará outras personagens reagindo a isso
depois, bom, fica mais difícil de arranjar.

Quando a trama progride a história deixa de ser em torno daquela primeira situação de caos e
passamos a ter uma nova situação. Nessa situação seu ponto de vista pode ser em torno de uma
nova personagem, que introduzirá agora, ou da mesma na cena anterior. A nova cena interage
OU não, com a primeira. Na dúvida, você pode associar a cena anterior com os números pares e
rolar um dado, se der ímpar, a cena nova não interage com a primeira, é um evento (talvez
simultâneo) em outro ambiente e independente da primeira.

Nessa nova cena você conta agora um outro evento no mesmo cenário, pode ser simultâneo ao
primeiro, no passado como um flashback (se descreveu um talento latente, é uma boa ideia
refazer aquela situação, contando com a vantagem para começar - flashbacks são cenas mais
fáceis, não importa o quanto possam parecer mais arriscadas, por causa disso) ou num futuro,
algum tempo depois da primeira cena. Se está com a mesma personagem e ela terminou a crise
passada em um mau predicado, mas ainda capaz, a nova cena de caos irá trazer alguma
oportunidade para você agir, sendo a própria situação indesejada em que se encontra talvez caos
suficiente.

Se a cena for interativa com a primeira, você deve estabelecer a correlação. Pode ser a reunião
com o chefe da agência sobre o resultado do agente especial e sua performance naquela
situação - e o caos pode ser a própria bronca que ele está tomando que pode custar o seu
emprego. Após a onda de choque, em um outro ponto da selva, um dinossauro ficou preso no
piche na correria. No avião o zumbi foi detido e preso na primeira classe, mas agora o piloto tem
de decidir o que fazer e a aeronave está com o segmento no meio interditado, cheio de zumbis
metidos a besta. No flashback, em Juazeiro, nas cores de sépia, o mesmo setup com diferentes
personagens se repete em meio a uma festa de São João... - e o procedimento da primeira cena
se repete, sucessos são buscados, 2 a 4, até serem alcançados ou a trama progredir de outra
forma.

Se a cena é independente, o plot engrossa e algo que não parece ter relação imediata acontece.
Uma agente mais experiente discute com o marido sobre um possível divórcio, após ter
descoberto ele com uma amante. Um mamífero participa de uma reunião com outros sobre o
que fazer diante da crise, que para o líder pequenino, parece uma oportunidade em meio ao
apocalipse dos dinos. Em uma cidade portuária, um capitão embriagado assiste as notícias sobre
uma crise médica que tem feito pessoas se tornarem agressivas e um acidente de trânsito no fim
da rua próximo ao bar revela que o caos já chegou ali e as pessoas se desesperam.

Entre as cenas você pode inserir tanta "calmaria" quanto desejar, interlúdios são estes
momentos em que não se joga dados, apenas conta o que aconteceu, o que os personagens
planejaram etc. Especialmente se você estiver jogando em grupo, interlúdios são interessantes
para definir o tema da história melhor e outros detalhes. Sempre que tiver que decidir questões
como o total de armadura de plot, a dificuldade da cena etc. é ideal que seja decidido com o
grupo todo. Em uma cena, mais que uma personagem pode estar presente, mas apenas uma
tem o foco, ao transigir de cena, o foco pode passar para uma próxima personagem, inclusive
manejada por jogador diferente, mas se a cena incluir outro personagem, ele pode emprestar
seu talento latente e sugerir cooperação de diferentes formas, embora seja quem joga com a
personagem em foco que role o dado do curso de ação. Após cada personagem ter tido seu foco,
as cenas podem ser multifocais, com qualquer um dos jogadores tomando a decisão de agir e
os dados - embora as consequências sejam compartilhadas quando assim a cena determinar.

Após a trama progredir pela segunda vez, você pode novamente definir sua posição na linha do
tempo. Flashbacks geralmente voltam ao ponto de sua interrupção nessa hora. Se você cortou
depois de usar a armadura de plot, um flashback pode justamente trazer uma habilidade latente
que salva seu personagem, ou alguém que ele conheceu no passado que aparece ex machina e
lhe traz sucesso ou introduz a nova personagem na cena. Na nova situação que cria, a terceira,
já é possível a resolução da trama, mas não necessariamente. Resolva a cena intuitivamente e
se ali parecer que o problema foi resolvido e a crise evitada, fim! Se recomenda sempre uma
dificuldade demandando 4 sucessos e críticos não salvam a personagem na cena final, apenas
concedem uma armadura de plot adicional - que por sua vez, também não podem resolver a
cena, apenas convertem fracasso em sucesso - se era o quarto sucesso, então sim, a cena é
resolvida via armadura de plot. Acontece. Por isso é recomendável em dificuldade média ter até
3 armaduras de plot, assim a cena final nunca vai depender apenas disso para se resolver.

O jogo não precisa contar toda a história de uma vez. Pode ser uma série de episódios, o que
torna particularmente interessante não ter mais que 5 cenas por episódio, a fim de não se
prolongar demais o jogo e deixar a ponta solta para o próximo, sem coisa resolvida demais. Se
quiser uma história curta, 3 a 5 cenas pode dar conta. Você pode decidir deixar por conta de
quantas vezes o plot engrossa, multiplicando a meta inicial de cenas, (de 6 a 10, se engrossou
uma vez), a fim de dar a profundidade ideal aos eventos, mas isso não é necessário. A única
consequência necessária do plot engrossar é ter uma cena que reúna os plots divergentes em
um só. Pode ser na reunião das personagens, o capitão embriagado fugiu com um barco e ouviu
o sinal de emergência do avião que acabou caindo na cena seguinte e decide ir até o local da
queda, próximo de uma ilha deserta onde está o piloto da aeronave e o que restou da tripulação,
além de zumbis molhados. Pode ser pela conexão do problema, os mamíferos podem estar
criando um plano para não ter sobreviventes, mas eles nunca voltam ao centro da cena, senão
como antagonistas do dinossauro que estamos acompanhando desde o início da história.

Dito isto, temos aqui, nesse PEGA PEGA de caos em caos em cada cena, como jogar e criar suas
próprias histórias, usando apenas dois dados e alguma coisa para registrar tudo que
estava acontecendo.

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