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ABDOME AGUDO

Abdome agudo é definido como toda condição dolorosa de início súbito ou de evolução
progressiva, localizada no abdome, que requer decisão terapêutica rápida de origem não traumática.
Para a melhor avaliação e hipótese do problema, é importante conhecer a anatomia e compreender a
inervação das estruturas e as vias de transmissão dos impulsos dolorosos.
É importante saber que a dor é algo muito subjetivo, e que passa pela percepção do paciente
de forma individualizada. Nesse sentido, temos que separar a dor em algumas categorias para
melhor entendermos a sintomatologia do paciente.
Dor visceral: Ocorre no peritônio visceral. Os nociceptores, responsáveis pela detecção e
codificação de estímulos nocivos. Enviam o sinal por fibras do tipo C, não mielinizadas, e são
sensíveis à distensão, isquemia, tração, compressão e torção. Além disso, a dor é difusa, de início
lento e longa duração, com capacidade de produzir náuseas, sudorese, diminuição da pressão
arterial e da frequência cardíaca
Dor somática: Ocorre no peritônio parietal e a raiz do mesentério. Os nociceptores são
inervados por fibras do tipo A delta, mielinizadas, com via da dor rápida-aguda, bem localizada e
curta duração. Essas terminações são estimuladas por diversos agentes irritantes como conteúdo
gastrointestinal, urina, bile, suco pancreático, sangue, pus e por substâncias como bradicinina,
serotonina, histamina, prostaglandina e enzimas proteolíticas.
Dor referida: Ocorre em um local diferente da onde houve o estímulo.

SÍNDROMES ABDOMINAIS AGUDAS

Divide-se basicamente em cinco grandes síndromes: abdome agudo inflamatório,


perfurativo, obstrutivo, vascular e hemorrágico.

ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO

A dor é insidiosa, levando a sintomas vagos e inespecíficos como dor abdominal,


incaracterística, náuseas, vômito, anorexia e alteração do trânsito intestinal. A doença evolui de dor
visceral (mais difusa) para parietal e acomete o peritônio parietal adjacente ao órgão afetado,
tornando a dor mais localizada.
A apendicite é a causa mais comum de abdome agudo cirúrgico e começa com dor
periumbilical, tipo visceral, com anorexia, náuseas e vômito (não muito comum), e evolui para
quadrante inferior direito, com dor do tipo somática. Pode haver ainda constipação intestinal e a
parada de eliminação de flatos e até diarreia. O paciente faz uma escoliose para o lado direito para
diminuir a dor. Causa febre baixa, leucocitose moderada com desvio para a esquerda. A dor por
descompressão brusca, chamada de Sinal de Blumberg, no ponto de McBurney (ponto apendicular),
ajuda a direcionar a suspeita clínica. Outro sinal de destaque é o de Rovsing, onde o paciente relata
uma dor referida quando é palpado o hipocôndrio esquerdo e a dor se manifesta no hipocôndrio
direito. O exame de imagem inicial pode ser a ultrassonografia para confirmação de diagnóstico
clínico, porém, a tomografia é mais eficaz. O tratamento é cirúrgico.
A colecistite aguda está associada à litíase biliar. A dor inicialmente é epigástrica, visceral com
náuseas e vômitos e evolui para o quadrante superior direito. O Sinal de Murphy positivo(quando o
paciente interrompe a respiração na palpação no ponto cístico) associado a presença de cálculos
biliares e espessamento da parede vesicular na ultrassonografia, são indicativos de colecistite aguda.
O tratamento é cirúrgico.
A pancreatite aguda tem como principal causa da litíase biliar. A dor é de início súbito em
epigástrio, hipocôndrios ou região umbilical, com o paciente com o tronco inclinado para frente, a
prece maometana para alívio da dor. Dor em faixa, com irradiação dorsal. Pode causar náusea e
vômitos, além da distensão abdominal. A tomografia é o método de escolha ideal para a avaliação
do parênquima pancreático, ajudando a determinar a gravidade da doença.
A diverticulite tem localização mais comum no sigmoide, e, juntando com o cólon
descendente, encontram-se 90% dos divertículos do cólon. É mais comum em idosos, e apresenta-se
com dor no quadrante inferior esquerdo, com presença de febre e constipação intestinal. Pode ainda
haver disúria e polaciúria pela proximidade coma bexiga. O exame de escolha é a tomografia,
devendo-se evitar a colonoscopia pelo risco de perfuração.

ABDOME AGUDO PERFURATIVO

Dor de início súbito, dramático e em pouco tempo atinge seu pico, sendo que o paciente
geralmente consegue precisar a hora exata do início dos sintomas. O paciente procura manter-se
imóvel e também controlar a respiração devido à irritação peritoneal. Ocorre por perfuração de
víscera oca. O extravasamento de secreção do trato intestinal extravasa para a cavidade peritoneal,
causando peritonite, causando dor somática. O que causa esse problema é o pH baixo que irrita
quimicamente o peritônio. Causa rigidez muscular, silêncio abdominal e causa o “abdome em
tábua”.
O exame de escolha pode ser a radiografia simples, que mostra um pneumoperitônio
(presença de ar no abdome no lado contralateral da bolha gástrica). A causa mais comum de
perfuração é a úlcera péptica. Outras causas de perfuração podem ser: neoplasias, corpos estranhos,
perfuração espontânea de vísceras, doença inflamatória intestinal (especialmente doença de Crohn),
megacólon tóxico, complicação de procedimento endoscópico.

ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO

Dor em cólica intestinal pelo esforço das alças para vencer o obstáculo (obstrução) que está
impedindo o trânsito normal. O peristaltismo aumenta, e é chamado de peristaltismo de luta. A dor é
do tipo visceral, que no início pode intercalar por momentos sem dor. Quando o intestino delgado é
acometido, a dor se concentra na região periumbilical, já em obstrução de cólon, a dor é em região
hipogástrica. Os episódios de vômito surgem após a crise de dor, inicialmente reflexos e são
progressivos, para tentar aliviar a distensão das alças acometidas. Se a obstrução for mais alta, mais
precoces, intensos e frequentes serão os vômitos. Já nas obstruções mais baixas, ocorre uma maior
distensão abdominal, mais precoce a interrupção de flatos e fezes e pode surgir vômito fecaloide. A
desidratação, devido aos vômitos, é acentuada.
Assim, a doença pode evoluir para comprometimento da vascularização, irritação do
peritônio parietal, com dor somática, contínua e contratura da parede abdominal, que indica
sofrimento de alça. Também pode haver necrose.
A radiografia simples revela níveis hidroaéreos e distensões abdominais. A tomografia pode
identificar espessamento das paredes das alças ou do mesentério, bem como a presença de gás na
parede intestinal ou líquido livre na cavidade, indicando cirurgia pela complicação vascular.
Como principal causa de obstrução em adultos são as bridas e aderências, geralmente após
cirurgias. As hérnias parietais estão em segundo lugar como causas de obstrução e em caso de
obstrução colônica, a principal causa em adultos é o câncer colorretal seguido de diverticulite
complicada e volvo (torção da alça intestinal), obstrução por corpo estranho. Também é importante
acrescentar a intussuscepções, que é quando ocorre uma invaginação do intestino dentro dele
mesmo, com clássico sinal de sangue em dedo de luva, “geleia de framboesa” e ampola retal vazia.

ABDOME AGUDO VASCULAR OU ISQUÊMICO

É muito grave, devido ao diagnóstico geralmente tardio. Ocorre por isquemia arterial ou
venosa (gerando uma lesão na mucosa que evolui para transmurais), perpetuada pelo vasoespasmo
reflexo da circulação mesentérica e completada pela lesão de reperfusão. Tem como principal causa
a embolia da artéria mesentérica superior.
A dor abdominal muito intensa é o preditor e para o diagnóstico, atenta-se aos fatores de
risco, como idade maior que 60 anos, aterosclerose, infarto agudo do miocárdio recente, fibrilação
atrial, entre outros. Após a dor abdominal intensa, observa-se a peritonite seguido por intensificação
de sinais abdominais, surgindo a instabilidade hemodinâmica, o choque refratário e o óbito.
A radiografia simples ajuda a afastar outras causas de abdome aguda e a ultrassonografia,
principalmente com Doppler, pode identificar a obstrução vascular. A arteriografia para estudo da
isquemia mesentérica (redução do fluxo sanguíneo intestinal) é o padrão-ouro.

ABDOME AGUDO HEMORRÁGICO

No abdome agudo hemorrágico, soma-se a dor forte e súbita, o comprometimento


hemodinâmico rápido, hipovolemia e palidez acentuada. Como característica da dor, o paciente
apresenta dor abdominal difusa, intensa, hipotensão e massa abdominal pulsátil. Não há presença de
contratura muscular pelo sangue não irritar muito a serosa peritoneal. É importante saber que não se
trata de sangue na luz, mas sim, sangue livre na cavidade.
Por não ser comum, tem como principal causa a gravidez ectópica rota. Nesse sentido, é
importante salientar que trauma não é considerado abdome agudo. Também é importante saber se o
paciente faz uso de anticoagulantes, se sim, deve-se suspender o uso.
A principal causa é a aterosclerose, porém, infecção (sífilis) e arterites são causas possíveis.
A ruptura de aneurismas de aorta abdominal acomete geralmente pacientes idosos do sexo
masculino. O exame de ultrassonografia ajuda a confirmar o diagnóstico, embora na suspeita
clínica, o paciente já possa ser encaminhado para a cirurgia, já que nenhum paciente com
rompimento de aneurisma sobrevive sem a cirurgia.

Referências:
DANI, Renato. Gastroenterologia essencial. 4. ed. modific. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
c2006. xxii,[70]1203p. ISBN 8527711311

https://www.uptodate.com/contents/evaluation-of-the-adult-with-abdominal-pain?search=abdome
%20agudo
%20adulto&source=search_result&selectedTitle=1~150&usage_type=default&display_rank=1

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