No 47 – maio 2023

cultura do
automóvel
automóveis e motocicletas lançamentos - impressões - história

Ford
X
Chevrolet
Uma disputa secular
 AL
E DI TOR I
Duelo de titãs
F
la-Flú. Mac-Med. Prost
vs. Senna. Holyfield vs.
Tyson. Ou mesmo Kirk
Douglas e Anthony Quinn.
Grandes duelos. Duelos de
titãs. Por que não incluimos,
então, o clássico e secular
duelo entre Ford e Chevrolet?
Em várias épocas, mesmo
com consideráveis quantidades
de fabricantes de automóveis,
foram essas duas marcas que
criaram as maiores rivalidades
já presenciadas, não apenas na
2 Maio 2023 Cultura do Automóvel
indústria ou no mercado, mas
também entre os usuários. Já
vi amigos se desentenderem
devido a uma discussão de
qual é melhor, o “meu” ou o
“teu”. Muitas vezes tratava-se
mesmo de Ford e Chevrolet.
E muitas vezes o tira-teima
foi resolvido em um “racha”.
A discussão é muito antiga e
atualmente pega mais quanto
ao gosto pessoal do que em
relação às qualidades de cada
marca. Tomem suas posições!
 NESTA EDIÇÃO 47
No 47 - Maio 2023

sumário

04 Pelo Mundo
O que acontece no mundo dos automóveis

06 Ford X Chevrolet
A eterna rivalidade entre as duas maiores marcas

24 Ford X Chevrolet no Brasil

Os motoristas brasileiros também tinham preferências

30 Edições especiais de motocicletas

A Honda já produziu e vendeu diversas motos especiais

36 Campeonato Brasileiro de Regularidade Histórica

O Rally Quadrifoglio abriu a temporada de 20223

42 Carros no cinema
As 24 Horas de Le Mans, o filme

Cultura do Automóvel Maio 2023 3

 pelo mundo
Quase fiel à realidade
O gabinete que abriga o autorama, na forma do Porsche 917 de Steve McQueen, tem o mesmo tamanho do original
U
m desavisado visitante poderá
se assustar quando, ao acionar
um controle remoto, como o
de uma porta de garagem, o anfitrião
revela que aquele magnífico Porsche
917 não é um automóvel, mas sim
um gabinete com uma enorme
surpresa dentro. As fotos falam por
si: uma pista de slot-car, brinquedo
4 Maio 2023 Cultura do Automóvel
de gente grande que costumamos
chamar de autorama – ou auto-rama,
como ficou conhecido quando foi
lançado no Brasil pela Estrela, há 60
anos – se esconde sob a réplica da
carroceria do Porsche em escala real.
A pista de slot-car está montada
em um diorama representando o
autódromo de Le Mans e os carros

Os carrinhos são os mais próximos possível dos carros do filme, inclusive os que tinham uma câmera acoplada
em miniatura referem-se aos usados
no filme As 24 Horas de Le Mans,
de 1971, estrelado pelo astro/piloto
Steve McQueen. É difícil dizer se o
que mais impressiona é a “tampa” da
pista, maravilhosamente decorada
com a carroceria do Porsche 917
utilizado por McQueen no filme, ou
se é o incrível detalhamento dos
pelo mundo
objetos de cena, tais quais foram
utilizados no filme. De qualquer
modo, é um “brinquedão” que todo
marmanjo gostaria de ter em casa.
A área de box é bem fiel à realidade
e os carrinhos são os mesmos do
filme, vários Porsche 917, cauda
longa e cauda curta, um Lola T70 e
um Ferrari 512S, entre outros. l
Cultura do Automóvel Maio 2023 5
 grandes rivais

A disputa pela preferência já tem mais de um século

É
uma boa briga. Apesar de Já a Chevrolet Motor Car
existirem milhares de marcas Company foi uma empresa fundada
de automóveis no mundo, as por Louis Chevrolet em 1911,
eternas rivais Ford e Chevrolet também utilizando a marca
sempre nos proporcionaram uma Chevrolet para seus automóveis,
disputa bem mais acirrada do que porém foi absorvida pela General
qualquer outra conhecida. E há mais Motors em 1917.
de um século. Tanto Ford quanto General
Fundada em 1903 por Henry Ford, Motors fizeram parte do se
a empresa Ford Motor Company convencionou chamar de “As Três
tem como sua principal marca Grandes”, o que incluía a Chrysler
exatamente a Ford, com a qual como empresa, mas, cá entre nós,
atingiu o seu maior desempenho mesmo gigante, ela nunca se igualou
como fabricante de automóveis. às duas rivais.

O Ford Modelo T revolucionou o transporte nos Estados Unidos e no mundo

6 Maio 2023 Cultura do Automóvel


O Chevrolet “cabeça-de-cavalo” era o grande rival do Ford Modelo T nos anos 20
A disputa maior, no entanto, fica
com as marcas puras, Ford e
Chevrolet, que, desde as suas
respectivas criações, ano a ano
apresentavam ao seu público um
automóvel sempre pretensamente
melhor do que o do concorrente.
Eu passei a minha vida inteira
olhando as duas marcas – Chevrolet
e Ford – com, além do respeito que
elas conquistaram, como um
expectador em uma luta de box. Ora
vencia uma, ora outra, como se, no
geral, estivessem sempre igualadas.
Digo a vida inteira porque foi no
ano de 1963 que meu pai, Expedito
Marazzi, compilou uma lista de
modelos das duas marcas – das quais
ele também era fã – para uma épica
reportagem na revista Quatro Rodas.
Com o título “Ford X Chevrolet, um
clássico”, foi a partir daí que eu
também passei a acompanhar e
sempre comparar os modelos de
cada uma, ano a ano.
grandes rivais
Se naquela época, 60 anos atrás, a
briga era focada nos modelos básicos
das duas empresas, Ford e Chevrolet,
pouco tempo depois a lista poderia
crescer, para, por exemplo, Lincoln
X Cadillac, ou Mercury X
Oldsmobile, para citar algumas
marcas das empresas, ou mesmo
modelos que seguiram vidas
próprias, como Mustang X Camaro,
ou Thunderbird X Corvette. Muita
coisa, certo? Então vamos focar em
Chevrolet X Ford.
Lá atrás, em 1963, Expedito
afirmava que já não existia o
“fordista” roxo, ou adeptos
fervorosos dos “chevies”, mas acho
que eles estavam apenas guardando
munição para o que viria a seguir.
Isso porque em uma época lá pelas
décadas de 70 e 80, a dedicação
extremada pelas marcas se mostrou
mais forte do que nunca. Incluindo
também, pelo menos por aqui, os
“volksmaníacos”. ç
Cultura do Automóvel Maio 2023 7
 grandes rivais ford x chevrolet

O Ford Modelo A tinha um motor de quatro cilindros de válvulas lateraisde 3,3 litros e 40 cv

O Chevrolet Ramona, de 1929, tinha um motor de seis cilindros em linha de 3,2 litros e 46 cv

8 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 ford X chevrolet
É claro que tudo começou a ficar
forte no tempo do Ford Modelo T.
O mais popular de todos os
automóveis, perdendo apenas para o
Fusca, era a maioria pelos difíceis
caminhos de terra e lama dos anos
10 e 20. A Chevrolet, no entanto,
apenas em 1926 conseguiu equilibrar
a contenda com seu “cabeça-de-
cavalo”, cuja maior inovação em
relação ao “T”, que já estava em final
de carreira, era o câmbio de três
marchas.
Com esse modelo, a Chevrolet
praticamente decretou o fim do Ford
Modelo T, que foi substituído, em
1927, pelo Ford Modelo A, talvez o
mais bem resolvido automóvel de
sua época.
Muito parecidos, como quase todos
os automóveis de outras marcas
nessa época, Ford e Chevrolet
brigavam, então, pelos motores. O
Ford Modelo A tinha um motor de
quatro cilindros de válvulas laterais,
com cilindrada de 3,3 litros e
O novo Ford Modelo 18, de 1932, estreou o novo motor V8 de 65 cv
grandes rivais
potência de 40 cv, enquanto que o
motor do Chevrolet cabeça-de-
cavalo tinha válvulas no cabeçote
mas com potência de apenas 35 cv.
A resposta da Chevrolet foi o
Ramona, em 1929, um motor seis
cilindros em linha de 3,2 litros e 46
cv com válvulas no cabeçote que fez
o Ford de quatro cilindros comer
poeira. Esse motor ficou conhecido
por Stovebolt Six.
A revanche veio com o novo Ford
Modelo 18, em 1932, com o também
novo motor V8. Mesmo com
válvulas laterais (um V8 com válvulas
no cabeçote seria além de complexo,
muito caro), o Ford disparou na
frente com uma potência de 65 cv, a
ponto de o fora-da-lei Dillinger
enviar uma carta a Henry Ford para
agradecer, dizendo que, com esse
motor, a polícia não mais o pegaria,
com seus velhos motores de quatro
cilindros que continuaram em
produção por dois anos mais, no
atualizado Ford Modelo B. ç
Cultura do Automóvel Maio 2023 9
 grandes rivais
O belo motor V8 do Ford de 1932
É interessante ressaltar que esses
dois motores, que equiparam por
tanto tempo os Chevrolet e os Ford,
são considerados os mais importantes
na história dos automóveis dessa
época. O V8 flathead da Ford,
conhecido por 8BA mas com
algumas variações para equipar
veículos maiores, ficou em produção
por 21 anos, sendo substituído
apenas em 1953 pelo Rocket de
válvulas no cabeçote.
Já o motor Chevrolet Ramona de
seis cilindros de 1929, em sua
concepção básica, foi mais longe,
pois é a base dos tão amados motores
de seis cilindros em linha que
equipou o Chevrolet Opala também
o Chevrolet Omega até 1998, entre
muitos outros modelos.
Nesse período, então, e também
10 Maio 2023 Cultura do Automóvel
ford x chevrolet
devido à impossibilidade de a
Chevrolet se igualar a Ford em
relançar a potência de seu melhor
motor, a disputa entre as duas marcas
enveredou pelos detalhes estéticos e
de acabamento.
No campo dos equipamentos de
segurança, a Chevrolet dotou seus
modelos com freios hidráulicos em
1933, enquanto a Ford só adotou
essa tecnologia seis anos depois. Da
mesma forma, a Chevrolet
incorporou um sistema em suas
versões “de luxo” que foi considerado
“muito chique”: a alavanca de
câmbio na coluna de direção. Além
de chique, era prático, pois tinha
assistência a vácuo, o que tornava a
operação de trocas de marchas muito
leve e fácil. A Ford adotou o mesmo
sistema apenas no ano seguinte. ç
 ford X chevrolet grandes rivais

O motor de seis cilindros em linha do Chevrolet Ramona

Chevrolet 1936 Ford 1936

Chevrolet 1941 Ford 1941

Cultura do Automóvel Maio 2023 11

 grandes rivais ford x chevrolet

Chevrolet Fleetline Aerosedan 1942

Ford 1942, o último modelo produzido pela marca antes da guerra

12 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 ford X chevrolet
Chevrolet DeLuxe 1949
Pra encurtar a história, o que uma
fazia a outra copiava. E versa-vice.
Assim, os consumidores conheceram
diversas melhorias, como o capô do
motor, que abria lateralmente e
passou a abrir por inteiro, ou o
alargamento das cabines, com a
absorção dos estribos, resultando em
mais espaço lateralmente para o
conforto dos ocupantes.
Até 1942, quando a produção de
automóveis foi paralisada para o
esforço de guerra, os detalhes
externos de ambas as marcas
passaram por muitas melhorias,
tanto práticas como visuais. Da
aparência de “calhambeques”, eles
foram tomando as formas mais
modernas, como pela gradual
incorporação dos faróis para dentro
Ford Coupé 1949
grandes rivais
da carroceria, assim como dos
radiadores verticais, que passaram a
ficar escondidos atrás de belas grades
inclinadas e cheias de formas. Era o
automóvel se embelezando. Em
1940, os faróis estavam praticamente
dentro dos para-lamas.
Os modelos de 1946, tanto Ford
quanto Chevrolet, eram os mesmo
de antes da guerra, diferindo-se
apenas em detalhes de frisos e grades
e posição das lanternas. E em 1949,
tudo novo: Chevrolet e Ford eram
mais baixos, mais largos e mais
bonitos. O Ford 1949, com sua bola
imitando uma turbina no centro da
grade dianteira, foi notadamente
influenciado pelo estilo “bossa-nova”
do Studebaker de 1947 de Raymond
Loewy. ç
Cultura do Automóvel Maio 2023 13
 grandes rivais
Ford Custom V8 Sedan 1951
O fim da guerra fez o mundo se
sentir aliviado. Incluindo os estilistas,
pelo que se pôde notar no resultado
de seus trabalhos. A partir daí, as
mudanças eram mais frequentes e
consistentes. Olhando pelo nosso
ponto de vista – que nem precisa ser
o de 2023, mas dos anos 70, que foi
quando comecei a notar esses carros
e seus detalhes – tudo o que foi
adotado nos Ford e nos Chevrolet
pode ser avaliado sob o tão poderoso
Chevrolet Styleline DeLuxe 1951
14 Maio 2023 Cultura do Automóvel
ford x chevrolet
pincel do gosto pessoal.
O Ford 1949, para mim, é muito
mais bonito do que o Chevrolet de
1949 até 1952. E o Ford 1951, que
ganhou uma segunda bola em sua já
exagerada grade frontal, era ainda
mais bonito do que o 1949. Questão
de gosto. Mas o fatídico câmbio
automático Powerglide de duas
marchas do Chevrolet nunca me
entusiasmou. Até tive alguns, com
motores L6 e V8. ç
 ford X chevrolet grandes rivais

Ford Customline Fordor 1952

Chevrolet Styleline DeLuxe 1952

Cultura do Automóvel Maio 2023 15

 grandes rivais
Chevrolet Bel Air Sedan 1953
Chevrolet 210 Sedan 1954 (Two-Ten)
Até aí, os Ford ainda tinham o V8
flathead, cujo som dos escapamentos
diretos é uma das coisas mais belas
nesse mundo dos carros, enquanto
os Chevrolet mantinham o velho
Stovebolt Six. E, em 1952, o Ford
surge completamente diferente, com
para-brisa integral, uma “bola” mais
discreta na grade frontal, linhas
bastante angulosas e um novo motor
16 Maio 2023 Cultura do Automóvel
ford x chevrolet
OHV de seis cilindros. Os carros da
Chevrolet só mudariam em 1953,
também adotando linhas bem mais
angulosas, enquanto os Ford ficaram
iguais aos do ano anterior. Para esse
ano, foi projetado um novo motor
Ford, que ficou conhecido como
Y-block ou Rocket, mas uma crise no
fornecimento de níquel devido à
guerra da Coréia o adiou para 1954.
 ford X chevrolet
Ford Customline Sedan 1955
O motor Y foi uma sensação em
seu primeiro ano, com a mesma
cilindrada do antigo flathead mas
com menor curso e maior diâmetro
dos pistões. Isso, aliado aos novos
cabeçotes OHV, aumentaram bem a
potência, de 110 cv para 130 cv.
Se em 1954 a Ford estava na frente
por causa desse novo motor, mesmo
com a Chevrolet dando uma mostra
do que viria a seguir, com seus
modelos 1953 e 1954, o jogo mudou
radicalmente em 1955, quando a
marca da gravatinha lançou aquela
Motor V8 OHV do Chevrolet 1955
grandes rivais
carroceria que muitas vezes é
considerada a mais bonita de toda
essa saga. E com um novo e
maravilhoso motor V8 OHV que
embala os sonhos de qualquer
carromaníaco até os dias de hoje.
Com uma família completa de
carrocerias, acabamentos e motores,
o Chevrolet 1955 entrou para a
história. Repetiu a dose em 1956,
com poucas alterações estéticas e
com motores mais potentes, e fechou
a trilogia com o Chevrolet 1957, um
mini-Cadillac de encher os olhos. ç
Motor Y-block OHV do Ford 1954
Cultura do Automóvel Maio 2023 17
 grandes rivais ford x chevrolet

O lançamento da linha Chevrolet 1955 foi uma grande sensação

18 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 ford X chevrolet
Ford Fairlane Victoria 1956
A Chevrolet não parou por aí, de
1958 até, digamos, 1967, seus carros
não só ofuscam como chegam a
apagar o brilho dos Ford. Lembram
do que eu disse a respeito da questão
de gosto? É isso. O Chevrolet 1959,
Chevrolet Bel Air Sport Coupe 1956
grandes rivais
em especial o Impala Sport Sedan,
de quatro portas sem coluna central,
é uma obra de arte.
O Ford 1955 é bonito, mas nem
tanto, assim como o 1956. O 1957,
no entanto, é… feio! ç
Cultura do Automóvel Maio 2023 19
 grandes rivais
Ford Fairlane Sedan 1957. Feio!
Os anos 60 deram uma maneirada
nas linhas excessivamente espaciais
dos carros das duas marcas, em
especial os Chevrolet, até que, em
meados da década, eles ficaram meio
parecidos e chegavam a confundir,
de longe. Mais questão de gosto: o
Ford Galaxie 1965, em especial o
duas portas e mais especificamente
aquele do “motorzão”, é fantástico,
maravilhoso. Não foi à toa que
conquistou facilmente os brasileiros
dois anos depois, apenas na versão
Chevrolet Bel Air Convertible 1957
20 Maio 2023 Cultura do Automóvel
ford x chevrolet
de quatro portas com coluna central.
A reportagem de Expedito Marazzi
na Quatro Rodas foi feita em 1963 e,
por esse motivo, parou por aí. Muito
mais haveria por vir, diz ele no final,
o que realmente aconteceu, pois nós
mesmos pudemos acompanhar.
A partir desse período, também,
foram incorporados outros modelos
às duas marcas, como já foi citado no
início, desviando a principal atenção
dos carros tradicionais, que nem
sempre tinham nomes específicos. ç
 ford X chevrolet grandes rivais

Ford Retractable 1958. Melhorou...

Chevrolet Impala Convertible 1958

Cultura do Automóvel Maio 2023 21

 grandes rivais ford x chevrolet

Ford Fairlane 1959

Chevrolet Impala 1959

22 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 ford X chevrolet
Chevrolet Bel Air Two Door Sedan 1960
Chevrolet Impala Sedan 1961
Chevrolet Bel Air Sport Coupe 1962
Chevrolet Impala Sport Coupe 1963
Surgiram, então, disputas entre
modelos, como Chevrolet Camaro X
Ford Mustang, ou Ford Thunderbird
X Chevrolet Corvette. Boas sagas. E
se quisermos seguir na cronologia,
grandes rivais
Ford Sunliner Convertible 1960
Ford Sunliner Galaxie Convertible 1961
Ford Fairlane 1962
Ford Fairlane 1963
podendo incluir até as nossas pelejas,
como a eterna briga Chevrolet Opala
X Ford Maverick. Esse, no entanto,
é um (longo) assunto para futuras
ocasiões. l
Cultura do Automóvel Maio 2023 23
 grandes rivais
As disputas em nosso quintal
O DKW começou a ser produzido no Brasil em 1956 e três anos depois passou a brigar com o Volkswagen Sedan
Q
ue carro comprar? Se eu fosse
comprar um automóvel hoje,
não saberia dizer. São tantas
as opções que seria necessário um
rigoroso e demorado estudo para
escolher o mais adequado. Eu disse
o mais adequado e não o carro ideal.
Bons tempos quando não havia
assim tantas opções. Bons tempos?
Acho que não. Mas era mais fácil
escolher entre, digamos, Ford ou
Chevrolet, como veremos a seguir. E
as duas maiores marcas mundiais
davam cada passo baseado no passo
anterior da rival. E assim vivia o
mercado automobilístico.
O Fusca foi rival de todos os compactos nacionais
24 Maio 2023 Cultura do Automóvel
ford x chevrolet
Em nosso país, a briga Chevrolet
vs. Ford também existia, afinal, era o
espelho do que acontecia lá fora, o
que motivou a reportagem de 60
anos atrás. Muitas outras marcas, no
entanto, lutavam por seus espaços, a
maioria representada por alguns
corajosos importadores de carros. O
que se via, na verdade, era um
portifólio de tudo que existia no
mundo, porém em menor escala. Até
surgir a indústria brasileira, em
1956. Aí também tivemos as nossas
acirradas disputas de marcas.
Podemos começar com DKW vs.
Volkswagen. Nos primeiros anos, o
maior rival do Fusca era mesmo o
DKW, depois batizado de Belcar.
Mesmo com muitas diferenças, os
dois carros eram os compactos que
faziam o comprador pensar bastante.
E o Fusca ainda disputava mercado
com Dauphine e Gordini.
Entre os carros maiores, a briga
era entre Simca e Aero Willys. Com
 ford X chevrolet
diferenças mais sutis, daquelas que
nem todo comprador enxergava, os
dois carros eram os sedãs familiares
mais adequados para viagens com
até seis pessoas e com conforto.
A fama do Simca era de ser mais
veloz e mais esportivo, com seu
O Simca e o Aero Willys eram os carros “grandes” que brigavam pela preferência dos chefes de família
grandes rivais
motor V8, mas também mais frágil.
Já o Aero Willys, que tinha o mesmo
motor de seis cilindros em linha do
Jeep, gozava de uma boa reputação
de carro extremamente robusto,
apesar do desempenho inferior ao
do seu grande rival. 
Cultura do Automóvel Maio 2023 25
 grandes rivais ford x chevrolet

A briga Ford X Chevrolet em Dodge Dart, três anos depois. E o

nosso quintal, no entanto, demorou
um pouco mais para acontecer. O
primeiro carro de passeio da Ford
foi o Galaxie, em 1967, mas que não
teve concorrente até a chegada do
primeiro Chevrolet de passeio foi o
Opala, em 1969, que só foi ter um
rival Ford à altura em 1973, com a
chegada do Maverick. Essa foi uma
boa briga Ford X Chevrolet.

Chevrolet X Ford brasileiros: Opala e Maverick disputaram por muitos anos, tanto no mercado como nas pistas

26 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 ford X chevrolet grandes rivais

Houve também uma boa disputa
que começou em 1973, com o
lançamento do Chevrolet Chevette,
“invadindo” o mercado do Ford
Corcel, que havia sido lançado em
1969. Os dois compactos tinham,
ainda, que conquistar a simpatia dos
tradicionais compradores de carros
da Volkswagen, que, nessa época, já
tinham mais opções, como a família
da perua Variant – e seus “irmãos” –
e o recém chegado VW Brasília. 

Chevrolet X Ford brasileiros: Chevette e Corcel eram os melhores carros compactos de sua época

Cultura do Automóvel Maio 2023 27

 grandes rivais ford x chevrolet

Ford Del Rey e Chevrolet Monza disputavam uma faixa ligeiramente superior em acabamento nos anos 80 e 90

Chevrolet Kadett e Ford Escort começaram a rivalidade em 1989 e seguiram os anos 90 com versões esportivas

28 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 ford X chevrolet
A grande disputa pelo mercado dos compactos populares nos anos 90 foi entre o Chevrolet Corsa e o Ford Fiesta
Os anos 80 viram uma leve disputa
entre o Chevrolet Monza, a grande
novidade daquele início de década,
com o Ford Del Rey, que era, na
verdade, uma versão adaptada e mais
sofisticada do popular Ford Corcel.
A briga mesmo começou em 1989,
com a chegada do Chevrolet Kadett,
que pegou pesado com o compacto
da Ford, que era o Escort. Inclusive
suas versões esportivas, Kadett GSi e
Escort XR-3, disputavam em um
grandes rivais
nível ainda mais elevado, ambos com
suas icônicas versões cabriolet.
É claro que a briga entre Ford e
Chevrolet é, atualmente, muito mais
complexa do que isso e vai continuar
indefinidamente, nem tanto entre as
marcas mas, principalmente, em seus
nichos. Aqui no Brasil, a última
grande contenda entre os populares
aconteceu nos anos 90, entre o Ford
Fiesta e o Chevrolet Corsa. Assunto
para daqui uns dez anos. l
Cultura do Automóvel Maio 2023 29
 edições especiais
special editions
Edições especiais aguçam o desejo dos colecionadores
U
ma Honda CG 125 de 1976 é
bem antiga, não? É quase
cinquentona e bem diferente
da atual. Mas alguém gostaria de ter
uma dessas atualmente? Sim!!!! O
saudosismo que tomou conta do
meio motociclístico – e também o
oportunismo, mas essa já é outra
história – fez com que qualquer
pessoa que tenha tido uma breve
história com qualquer uma das
nossas motos de décadas passadas
brilhe os olhos quando vê passar
uma delas, bem reluzente.
Mais do que uma CG, em bom
estado, provoca a lembrança e o
desejo nas pessoas, mesmo sendo
modelos de grande volume de
30 Maio 2023 Cultura do Automóvel
produção, algumas versões especiais
fazem muito mais do que isso, já que
se tratam de modelos raros na época
e mais ainda nos dias de hoje.
Mesmo após a forte retomada da
indústria local, quase 50 anos atrás,
as opções disponíveis eram poucas,
de forma que começaram a surgir
versões especiais. A primeira de que
me lembro foi a Honda FS 125, uma
adaptação feita pela revendedora
Honda Moto Jumbo, de São Paulo,
que transformava uma Honda CG
125 em uma trail para uso – limitado
– no fora de estrada. O FS de seu
nome era, justamente isso, fora de
estrada, ou “Fuori Strada” no bom
italiano.

A Yamaha TT 125 era uma belezinha, mas um tanto fraca, tanto em desempenho quanto em robustez
Além do visual mais próximo ao
das poucas motocicletas para fora de
estrada que existiam até então, como
o guidão mais largo, o para-lama
dianteiro alto, de fibra, e o banco
encurtado, ela vinha também com
amortecedores traseiros maiores,
que deixava a traseira mais alta (o
para-lama traseiro também foi
elevado, por causa do maior curso da
roda), escapamento saindo por cima,
protetor de motor, pneus para terra
e protetor de farol. Um pinhão
menor fez a relação final ficar mais
curta, favorecendo o uso no fora de
estrada.
O mais curioso é que a Yamaha
também criou uma versão da RX
125 para o fora de estrada, original
de fábrica, mas que, no desempenho,
era inferior à versão não oficial da
Honda. Mas a Yamaha TT 125 era
indiscutivelmente muito mais bela,
edições especiais
atualmente se tornando uma das
pequenas nacionais mais procuradas
por colecionadores.
A própria Honda criou várias
edições especiais de sua CG 125,
sempre relativas a uma ocasião
especial. Em 2003, comemorando
cinco milhões de motocicletas
produzidas, foi criada a Honda CG
125 Titan Ouro, em edição
limitada. Como
diferencial, ela
tinha a pintura
dourada. ç
A Honda CG Titan Ouro comemora 5.000.000 de motos
Cultura do Automóvel Maio 2023 31
 edições especiais
Honda CG 150 Sport, de 2005
Honda CG 160 Titan BR, para a Copa do Mundo de 2014
Em 2005, foi lançada uma nova
versão da CG 150, a Sport. Não era
uma edição especial, mas sim uma
versão mais esportiva da CG, de
série, com a pedaleira mais recuada,
guidão mais baixo e rodas esportivas,
melhor de pilotagem do que a outra.
Como ficou muito pouco tempo em
produção, hoje é uma CG bem rara.
Em 2006, foi criada a Honda CG
150 Special Edition, comemorando
os 35 anos da fábrica brasileira, em
Manaus. Ela tinha uma exclusiva cor
laranja com grafismo especial. Para a
Copa do Mundo de 2014, a CG
32 Maio 2023 Cultura do Automóvel
honda
Honda CG 150 Special Edition, de 2006
Honda CG 160 Titan EX Edição Especial 40 anos
ganhou uma edição especial pintada
nas cores amarela e azul. E em seus
40 anos de existência, veio a Honda
CG 160 Titan EX Edição Especial.
Durante os anos 80, mesmo com
vários modelos brasileiros em
produção, o mercado “pedia”
algumas motocicletas especiais,
impossíveis de ser importadas devido
à legislação vigente. Dessa forma,
muitos sonhadores independentes
criavam suas próprias versões de
motocicletas, baseadas em modelos
existentes. Algumas fizeram relativo
sucesso e são lembradas até hoje.
 honda
É o caso da Honda CB 440S2 e da
Honda XL 300S, ambas criações da
revenda paulistana Projeto H. A
primeira tinha um kit de aumento de
cilindrada e um grafismo especial,
antecipando a Honda CB 450 oficial
que viria logo a seguir. Já a Honda
XL 300S tinha um kit Mungen que
aumentava a cilindrada e a potência,
melhorando o desempenho da
motocicleta, já que a versão oficial
da XLX 350 ainda iria demorar.
A mais difícil de ser encontrada, no
Acima, a Honda XL 300S e a Honda CB 440S2, da Projeto H, e na foto maior a Honda CB 450E Nelson Piquet
edições especiais
entanto, entre as Honda especiais de
produção em série, é a Nelson
Piquet. Da união da Honda com o
três vezes campeão mundial de
Fórmula 1 Nelson Piquet, surgiu a
versão comemorativa Honda CB
450E Nelson Piquet, em 1986, que
tinha a pintura do Williams da F1
do piloto e vinha com um capacete
com a mesma pintura. Das 317
unidades produzidas, hoje é mais
fácil encontrar uma delas restaurada
do que um dos capacetes originais.ç
Honda CB 450E Nelson Piquet
Cultura do Automóvel Maio 2023 33
 edições especiais honda

A grandalhona Honda GL 1800 Gold Wing teve uma edição comemorativa nos 40 anos do modelo, em 2015

A Honda CBR 1000RR ganhou uma versão comemorativa pelos seus 30 anos, com direito a um selo no tanque

34 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 honda
A simplória Honda Pop até que ficou bacana!
A ideia do capacete acompanhando
a motocicleta foi utilizada outras
vezes pela Honda, como no Salão da
Motocicleta de 2019, onde
apresentaram uma enorme família
de versões especiais de suas
motocicletas de produção. Todas
tinham seu capacete correspondente.
A mais bacaninha era a pequena e
simplória Honda Pop, em uma
versão Rallye HRB de encher os
olhos. Pena que era apenas um
ensaio de estilo, a motocicleta jamais
edições especiais
chegou a ser produzida.
A Honda nunca deixou de fazer
edições comemorativas. E 2015 foi a
vez da Honda GL 1800 Gold King,
que teve uma edição especial
comemorando seus 40 anos de
produção. E bem recentemente a
superesportiva Honda CBR 1000RR
teve uma versão comemorando seus
40 anos (2022), com uma pintura
especial com direito a numeração
gravada no tanque e grafismo
remetendo à motocicleta original.l
Cultura do Automóvel Maio 2023 35
 antigomobilismo
Rallye Quadrifoglio
Abertura do Campeonato Brasileiro de Regularidade
Na largada, o MG TD
de Antonio Herrmann e Naila
H
Herrmann, que correram na categoria Pré&Pós Guerra
á muito mais o que se
fazer com um automóvel
clássico do que apenas
ficar polindo os cromados
para o expor a olhos deslumbrados
de visitantes em um encontro de
fim de semana. Sim, pilotá-los! E
esse é um dos objetivos da FBVA –
Federação Brasileira de Veículos
Antigos –, com o Campeonato
Brasileiro de Regularidade
Histórica. A primeira prova de
36 Maio 2023 Cultura do Automóvel
2023 foi o Rally Quadrifoglio,
organizado sob a supervisão do Alfa
Romeo Clube do Brasil.
O primeiro carro a largar do
Centro de Tradições Nordestinas,
na capital paulista, foi o Ford
Mustang pilotado por Fernando
Leibel e navegado por Adriano
Braz. E foi justamente essa dupla
que venceu a prova, na categoria
Pro-Livre, a que permite utilizar
equipamento de navegação livre.
 antigomobilismo

O Chevrolet Camaro de Manoel Felix Cintra Neto e Renato Cintra foi o vencedor na categoria Clássica I
Na categoria Clássica I, para carros Chevrolet Camaro RS.
fabricados de 1961 até 1970, apenas O mesmo equipamento é utilizado
são permitidos para a navegação o na Clássica II, veículos fabricados de
cronômetro e a calculadora e a dupla 1971 a 1980, que foi vencida pelo
vencedora foi Manoel Felix Cintra Alfa Romeo Spider 2000 de Ricardo
Neto e Renato Cintra, com um Prado e Americo Sammarone. 

Ricardo Prado e Americo Sammarone venceram na categoria Clássica II, com um Alfa Romeo Spider 2000

Cultura do Automóvel Maio 2023 37

 antigomobilismo
A largada do vencedor da categoria Pré&Pós Guerra, o Ford Roadster de Leonardo Forestieri e David Guss
A categoria Clássica III, para
carros fabricados de 1981 até 1993,
foi vencida pela dupla Adilson Baher
e Rosane Baher, de Santa Catarina,
em um Volkswagen Voyage.
Carros produzidos até o ano de
1960 entram na categoria Clássica
Pré&Pós Guerra, que permite,
também, apenas o cronômetro e a
calculadora. Essa categoria foi
vencida pela dupla Leonardo
Forestieri e David Guss, que
cumpriram o percurso com um
simpático Ford Roadster 1929. A
segunda posição ficou com os
Herrmmans, Antonio e Naila, com
um belo MG TD verde.
38 Maio 2023 Cultura do Automóvel
rallye quadrifoglio
Para aqueles que desejam competir
com mais tecnologia de navegação, a
categoria App permite a utilização
de até dois aparelhos celulares ou
tablets e seus aplicativos. A dupla
vencedora nessa categoria foi a de
Cristiano Oliveira e Ernesto
Kabashima, com participaram da
etapa com um Dodge Charger R/T.
Sendo o antigomobilismo uma
atividade de cunho essencialmente
social, o Campeonato Brasileiro de
Regularidade Histórica tem ainda
uma categoria para antigomobilistas
que desejam apenas percorrer os
caminhos do rali, ou, como a própria
FBVA define, “desfrutar o passeio”.
 rallye quadrifoglio antigomobilismo

Mogar Dreon Gomes e Wagner Sacomani no Mercedes-Benz e Marco Pigossi e Felipe Cunha no Alfa Romeo GTV

No Fusca, Jorge Luiz de Carvalho e Lavio Cezar de Carvalho. No Alfa Romeo 2300, Franco Funk e Guilherme Marx

No Porsche 356, Carlos de Azevedo Antunes e Evaldo Luque. No Alfa Romeo, Luiz Gustavo Rosset e Mariana Rosset

Primeira parada na estrada. No Opala, a dupla Antonio Andrade e Fábio Luis Ravelli. O zequinha é Reynaldo Scalco

Cultura do Automóvel Maio 2023 39

 antigomobilismo rallye quadrifoglio

Alguns felizes “ralizeiros”

Evaldo Luque e Carlos Antunes no Porsche 356

Os Herrmanns, Antonio e Nalia, no MG TD

Manoel Felix Cintra Neto e Renato Cintra no Camaro RS

Ricardo Prado ao volante do Alfa e Americo Sammarone

Antonio Andrade, Reynaldo Scalco e Fábio Luis, no Opala

Antonio Nunes e Gerson Borini, no Kadett GSi Leonardo Azevedo e Felipe Bitu, no Alfa Romeo 164

40 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 rallye quadrifoglio
Já no Circuito da Capuava, os participantes estacionaram na grama e foram curtir o almoço e a premiação
A categoria Turismo é para carros
fabricados até 1998 e, sob análise de
cada caso, para carros fabricados até
o ano de 2003. Nessa categoria, a
dupla melhor classificada foi a de
antigomobilismo
Hanza El Moumen e Silvio Luiz
Esmeraldo Júnior, participando com
um Mercedes-Benz SL 500.
Ao fim da prova, já no Circuito da
Capuava, no interior paulista, todos
os participantes estacionaram seus
veículos no gramado e curtiram a
beleza e a tranquilidade do local,
para o almoço, divulgação dos
resultados e entrega dos prêmios.
Alguns deles até se aventuraram na
pista, fazendo de suas máquinas um
instrumento de grande apreciação.
No fim foi uma grande festa.
A próxima etapa do Campeonato
Brasileiro de Regularidade Histórica
será o V Rally Vale Europeu, em
Santa Catarina, no dia 17 de junho.
O evento, que é organizado pelo
Blumenau Vintage Club, terá uma
novidade no CBR, que são duas
etapas em um único dia, uma
padrão, contabilizando a pontuação
integral, e uma curta, contando a
metade dos pontos. l
Cultura do Automóvel Maio 2023 41
 carros no cinema

As 24 horas de
Le Mans

Cena final do filme As 24 Horas de Le Mans, quando o Porsche 917 número 22 disputa a liderança da prova

42 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 carros no cinema

O
filme começa com Michael
Delaney, personagem de
Steve McQueen, percorrendo
bucólicas estradas vicinais com seu
Porsche 911, quando, ao entrar em
uma nova estrada, vindo da direção
de Paris e Ruaudin e dirigindo-se a
Le Mans, se depara com o local
onde, no ano anterior, havia sofrido
um grave acidente na corrida.
Com apenas 12 anos de idade
quando assisti o filme As 24 Horas
de Le Mans (Le Mans, 1971), não
entendi a ligação da estrada com a
corrida, mas logo depois, apaixonado
pelo filme e interessado pela famosa
prova de endurance, fui conhecer
melhor os detalhes de ambos.
O filme As 24 Horas de Le Mans
faz parte de uma trilogia informal
que começou com Grand Prix, em
1966, seguiu com o filme 500 Milhas
(Winning, 1969), e fechou de forma
magistral com este filme, mostrando
a ambientação de bastidores das três
principais corridas do mundo – GP
de Mônaco (Fórmula 1), 500 Milhas
de Indianápolis e Le Mans. ç

Steve McQueen chegando a Le Mans com seu Porsche 911 no dia da grande corrida

Cenas dos expectadores da corrida, passando a noite da forma que desse, em barracas, dentro do carro ou no chão

Cultura do Automóvel Maio 2023 43

 carros no cinema AS 24 horas de le mans

Além da grande disputa, Le Mans oferece muitas opções de diversão para quem vai ao local assistir a corrida

O fato de misturar estrada com a qual alguns carros ultrapassam a

pista de corrida é que o circuito
oficial de Le Mans, chamado de
Circuito Bugatti, é parcialmente
utilizado nessa prova, que se abre
para as estradas da região passando
pelas cidades de Le Mans, Mulsanne
e Arnage. O traçado mais longo,
chamado de Circuito de La Sarthe, é
atualmente utlizado apenas para as
24 Horas, percorrendo 13.626 km a
cada volta e passando por locais
icônicos como as curvas de Arnage,
Maison Blanche e Mulsanne, antes
de uma reta de cinco quilômetros na
velocidade de 400 km/h.
Mas vamos ao filme. Michael
Delaney (Steve McQueen) chega
para participar da edição de 1970 das
24 Horas de Le Mans lembrando do
acidente que o tirou da prova no ano
anterior e vitimou o piloto italiano
Piero Belgetti.
A primeira parte do filme mostra o
local da prova, parte do circuito, as
pessoas lá presentes para assistir ou
trabalhar, acampadas, preparando-se
para um fim de semana cheio. Logo
após começam os trabalhos das

Cenas do filme antes de começar a prova. Com pequenas alterações em curvas, o circuito tem hoje 13.626 km

44 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 AS 24 horas de le mans
Bastidores das equipes: transporte e movimentação dos carros que vão participar da prova
equipes, descarregando os carros e
montando seus locais de preparo e
manutenção dos veículos. Aí, então,
conhecemos alguns dos pilotos e
suas acompanhantes.
A corrida começa logo aos vinte e
poucos minutos de filme e, além dos
acontecimentos na pista, a história
pessoal de cada piloto e seus dramas
pessoais vão sendo mostrados no
decorrer da longa prova.
Pela primeira vez nessa prova, a
largada não seria mais no tradicional
estilo Le Mans, no qual os pilotos
atravessavam a pista, entravam em
carros no cinema
seus carros e davam a partida. Isso
fazia com que eles não afivelassem o
cinto de segurança, resultando nas
mortes que ocorreram nos dois anos
anteriores, 1968 e 1969 (conheça a
história real na edição 40 da revista
Cultura do Automóvel).
Um dos pontos altos do filme As
24 Horas de Le Mans é a largada,
vista também pelo interior dos
carros e com uma emocionante
batida de corações em bom volume.
Pelo menos foi emocionante para os
garotos de 12 anos que estavam no
cinema naquele dia. ç
Cultura do Automóvel Maio 2023 45
 carros no cinema
As cenas de corrida são cativantes,
os protótipos daquele ano eram os
mais fascinantes de toda a história
das corridas mundiais e eles foram
mostrados com impressionantes
detalhes.
Michael Delaney corre com o
Porsche 917 de número 20, tendo
como seu maior rival o piloto Erich
Stahler, com o Ferrari 512S de
número 8. Um acidente, no entanto,
o mais fabuloso do filme, tira o
Porsche número 20 de cena, mas
Delaney acaba assumindo o outro
carro da equipe, o Porsche 917 de
No filme, o Porsche 917 acidentado de número 20 era o mesmo Lola T70 amarelo da foto acima, disfarçado
46 Maio 2023 Cultura do Automóvel
AS 24 horas de le mans
número 21, com o qual disputa a
liderança no final da corrida.
A cena do acidente do Porsche foi
bem impressionante, repetida varias
vezes e em câmera lenta. Não me
lembro do fato, nem por quê, mas
quem estava no cinema comigo me
diz, até hoje, que eu reclamei muito
dessa repetição.
A dúvida que tive e que, acho eu,
muitos outros que também viram o
filme na época também tiveram, foi
como fizeram cena tão real, com um
carro tão especial. Fui descobrir o
segredo muito tempo depois.
 AS 24 horas de le mans carros no cinema

Os carros mais importantes que, destruído estava em um péssimo

no filme, foram danificados, o
Porsche 917 e o Ferrari 512S, eram
réplicas, feitas a partir de Lolas T70.
No caso do Porsche 917 de Steve
McQueen, fica fácil perceber isso, já
que o carro utilizado na cena era o
mesmo Lola amarelo de número 11
que havia se acidentado no começo
da corrida. Dá para ver bem a parte
inferior da lateral amarela. Depois
de tanto tempo, podemos ficar
sabendo desses detalhes, de que se
trata de um kit Laser, disponível no
mercado, e que o Lola realmente
estado de conservação. Teve, então,
um fim bastante honroso.
Para a cena do acidente ainda mais
forte que sofreu o Ferrari 512S de
número 7, também foi utilizado um
Lola T70 disfarçado. O que restou
do carro foi vendido para um ferro
velho e depois foi recuperado pelo
colecionador Nick Mason, baterista
do Pink Floyd.
O Ferrari 512S de número 8, de
Erich Stahler, também pegou fogo,
em uma cena, queimando seu dublê,
o piloto Derek Bell. ç

O Ferrari 512S de número 7 original também foi substituído por um Lola T70 com kit Laser para a cena do acidente

Após seu acidente com o Porsche número 20, Delaney assume o volante do Porsche número 21 e termina a prova

Cultura do Automóvel Maio 2023 47

 carros no cinema AS 24 horas de le mans

le mans no cinema x le mans ao vivo

Fui assistir As 24 Horas de Le Mans no
Cinerama da Av. São João. Com 12 anos de
idade, estava empolgado, mas não tinha
experiência suficiente para entender tudo o
que passava naquela corrida. Por isso
guardei as lembranças mais dos carros e
menos do enredo e dos bastidores. Já
conhecia uma prova de 24 Horas, Interlagos
já havia sido palco de quatro edições (1960,
1961, 1966 e 1970), sendo que dei uma
passadinha na de 1966 para ver meu pai
correr de Simca em parceria com Walter
Hahn (chegaram em primeiro lugar na
categoria e quarto lugar na geral) e fiquei
mais tempo nos boxes na edição de 1970.
Saí do cinema com aquela pulga atrás da
orelha, principalmente devido à parte da
história que mostra o parque de diversões,
com um monte de gente se divertindo em
exposições e restaurantes enquanto os
pilotos pilotavam e descansavam quase que
confortavelmente. É, eu conhecia provas
longas em Interlagos mas não fazia ideia do
que era Le Mans. Em Interlagos, o negócio
era dormir nos pneus mesmo.
Fui conferir essa realidade nas três edições
das 24 Horas de Interlagos de motocicletas
(1974, 1975 e 1976), sendo que tentei com
vontade participar da edição de 1975 (já
contei essa história em alguma ocasião).
Mesmo não correndo, passei as 24 horas
ajudando e atrapalhando a equipe de boxes.
Só fui viver um McQueen na pele em Itú,
quando me inscrevi para as 24 Horas de
Kart de 1996. Aí, sim, montei uma equipe e
até aluguei um motor home para descanso
dos pilotos entre os turnos. Descansaram
mesmo, todos foram dormir e não voltaram
para a prova, que foi finalizada por mim e
pelo jovem piloto Adriano Grieco. Dessa
forma, a madrugada não serviu para
descanso, mas para curtir o local, que não
tinha parque de diversões mas tinha um
bom restaurante com vista para a pista.
Em Interlagos, naquela época, só a cantina
mofada. Atualmente, Interlagos oferece
mais conveniências para provas longas.
O máximo mesmo foi quando fui assistir as
24 Horas de Le Mans em 1999. Cheguei
cedo, fui conhecer todo o local – enorme –
e passei a corrida toda nos boxes. Como
jornalista, estava no box da Porsche quando
alguém descobriu que era meu aniversário.
Não ligo para isso, mas aquele aniversário
foi especial: eles compraram um bolo e eu
apaguei 40 velas lá mesmo. Inesquecível.
Inesquecível, também, aquele local mágico.
Nas primeiras horas de corrida, fui até a
curva Mulsanne, local onde, nos treinos, um
Mercedes-Benz CLR havia levantado vôo
ao final da reta de 5 km, na qual atingem
velocidade de até 400 km/h. Para chegar lá,
fui de carro e demorou, pois é preciso cruzar
várias propriedades rurais particulares.
Fiquei um bom tempo fotografando na
curva Mulsanne, mas começou a escurecer
e fui embora. Pouquíssimo tempo depois,
outro Mercedes-Benz CLR acabou voando,
no mesmo lugar de seu companheiro de
equipa no dia anterior. Quase peguei a foto.
Le Mans é mesmo um espetáculo que deve
ser visitado pelo menos uma vez na vida.

48 Maio 2023 Cultura do Automóvel

 AS 24 horas de le mans carros no cinema

Matra-Simca MS 650 Porsche 910

Lola T70 GT Porsche 908/02

Lola T70 MkIII Ferrari 512S Spider

Alfa Romeo T33/3 Le Mans Alfa Romeo T33/3

Porsche 914/6 GT Porsche 911

Ferrari 312P Chevron B16

Cultura do Automóvel Maio 2023 49

 carros no cinema
As cenas dos boxes de Le Mans são antológicas. Dá vontade de estar lá. Eu estive.
Porsche 917 L
Porsche 917 LH Le Mans cauda longa
Falando em dublês, o filme As 24
Horas de Le Mans teve mais astros
das corridas do que do cinema. Além
de Derek Bell, pilotaram os carros
Jackie Ickx, Richard Attwood, Jean
Pierre Jabouille, Vic Elford, Brian
Redman e Jo Siffert, entre muitos
outros, além, é claro, do próprio
Steve McQueen.
Os carros que aparecem na corrida
50 Maio 2023 Cultura do Automóvel
AS 24 horas de le mans
também formam uma galeria à parte,
como Porsche 910, Ferrari 3312P,
Lola T70 GT MkIII, Alfa Romeo
T33/3 Le Mans, Porsche 908/02,
Matra-Simca MS 650, Porsche 917L
e um Porsche 917 LH Le Mans de
cauda longa. Muitos carros de outras
categorias também passearam na
tela, como Corvette Stingray 427,
Porsche 911 e Porsche 914. l
Cultura do Automóvel Março 2023 51