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DESMISTIFICANDO A GASOMETRIA:

DISTÚRBIOS
HIDROELETROLÍTICOS
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 3

ÍNDICE

04 DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO

05 HIPOCALEMIA

08 HIPERCALEMIA

11 DISTÚRBIOS DO CÁLCIO

12 HIPOCALCEMIA

16 HIPERCALCEMIA

21 DISTÚRBIOS DO MAGNÉSIO

21 HIPERMAGNESEMIA

22 HIPOMAGNESEMIA

24 DISTÚRBIOS DO SÓDIO

25 HIPONATREMIA

33 HIPERNATREMIA

38 CONCLUSÃO

39 REFERÊNCIAS

40 SOBRE A MEDWAY

41 NOSSOS CURSOS

44 ACESSE GRATUITAMENTE

46 FICOU ALGUMA DÚVIDA?


Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 4

DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO

IMPORTÂNCIA:

• Distúrbio relativamente comum na prática clínica


• Uma causa reversível de parada cardiorrespiratória

PRINCÍPIOS BÁSICOS:

• Distribuição: 98% intracelular/2% extracelular


• Excreção: 90% renal/10% trato gastrointestinala

O QUE AFETA A EXCREÇÃO RENAL:

• Dieta
• Função túbulo contorcido distal
• Distúrbios ácido-básicos
• Mineralocorticóides (ex: aldosterona)

O QUE AFETA O BALANÇO INTRA E EXTRACELULAR:

• Distúrbios ácido-básicos
• Insulina
• Mineralocorticóides
• Catecolaminas
• Medicamentos (ex: B2-agonistas)
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HIPOCALEMIA

1. DEFINIÇÃO

• Potássio sérico < 3,5 mEq/L

2. CLASSIFICAÇÃO

• Leve: 3,1 a 3,5 mEq/L


• Moderada: 2,5 a 3,0 mEq/L
• Grave: < 2,5 mEq/L

3. PRINCIPAIS ETIOLOGIAS

PERDA POR VIA RENAL:


• Uso de diuréticos (ex: tiazídicos)
• Hiperaldosteronismo
• Acidose tubular renal (tipo I e II)
• Congênitas: síndrome de Bartter e síndrome de Gitelmann
• Nefrite intersticial
• Intoxicações → antiinflamatórios/hidroxicloroquina/paracetamol

PERDA POR VIA GASTROINTESTINAL:


• Diarreia e vômitos
• Fístulas gastrointestinais

TRANSLOCAÇÃO PARA O MEIO INTRACELULAR:


• Alcalose (metabólica ou respiratória)
• Administração de insulina (ex: cetoacidose diabética)
• Atividade adrenérgica excessiva (trauma, sepse, droga vasoativa…)
• Paralisia periódica hipocalêmica (familiar ou tireotóxica)

REDUÇÃO DE INGESTA:
• Jejum prolongado
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• Etilismo
• Desordens alimentares (ex: bulimia e anorexia)

4. PRINCIPAIS SINAIS E SINTOMAS

NEUROMUSCULAR:
• Fraqueza muscular/rabdomiólise
• Paralisia muscular progressiva ascendente (similar ao Guillain-Barré)

CARDIOVASCULAR:
• Arritmias/palpitações

GASTROINTESTINAL:
• Alteração do hábito (constipação/íleo)

5. QUAIS EXAMES COMPLEMENTARES POSSO SOLICITAR


ALÉM DO POTÁSSIO SÉRICO:

• Gasometria arterial → avaliar distúrbios ácido-básicos


• Glicose
• Eletrólitos → em especial, o magnésio (pode estar reduzido concomitantemente)
• Função renal
• Avaliação bioquímica urinária, se disponível → avaliar perda renal
• Eletrocardiograma

6. PRINCIPAIS ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS:

• Onda U proeminente
• Redução da amplitude da onda T
• Prolongamento do intervalo QT
• Infradesnivelamento do segmento ST

7. PRINCÍPIOS DE TRATAMENTO:

Todos os pacientes devem ser monitorizados continuamente pelo risco de


alterações eletrocardiográficas
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• Para cada 1 mEq/L de potássio sérico reduzido, estima-se redução corporal total entre 200
a 400 mEq
• Vias de reposição: oral e intravenosa
• Hipocalemia leve → reposição oral
• Hipocalemia moderada a severa → reposição oral + intravenosa
• Velocidade de reposição em acesso periférico → até 10 mEq/h
• Velocidade de reposição em acesso central → até 20 mEq/h

1 ampola KCl 19,1% = 10 mL = 25 mEq


1 ampola KCL 10% = 10 mL = 13,4 mEq

• Concentração máxima em veia periférica = 80 mEq/L


• Concentração máxima em acesso central = 120 mEq/L SUGESTÕES DE REPOSIÇÃO

Figura 2. ECG de um paciente com hipocalemia grave (K sérico = 2.4 mEq/L); reparem na onda U proeminente nas derivações precor-
diais associado ao achatamento da onda T e prolongamento do intervalo QT. Fonte: https://ecg.bidmc.harvard.edu/maven/dispcase.
asp?rownum=24&ans=1&caseid=25
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8. SUGESTÕES DE REPOSIÇÃO
INTRAVENOSA PERIFÉRICA (CORRER IV EM 4H):
• KCl 19,1% 16 mL + 500 mL SF 0,9%
• KCl 10% 30 mL + 500 mL SF 0,9%

INTRAVENOSA CENTRAL (CORRER IV EM 2H):


• KCl 19,1% 10 mL + 250 mL SF 0,9%
• KCl 10% 20 mL + 250 mL SF 0,9%

9. CID10:

• E87.6 - hipopotassemia
• E87 - outros transtornos do equilíbrio hidroeletrolítico e ácido-básico

HIPERCALEMIA

1. DEFINIÇÃO

• Potássio sérico acima de 5,5 mEq/L

2. PRINCIPAIS ETIOLOGIAS
DIMINUIÇÃO DA EXCREÇÃO RENAL:

• Insuficiência renal (crônica ou aguda)


• Acidose tubular renal tipo IV
• Hipoaldosteronismo
• Doença de Addison
• Diuréticos poupadores de potássio (ex: espironolactona)

TRANSLOCAÇÃO PARA O EXTRACELULAR:


• Acidose metabólica
• Rabdomiólise
• Medicamentos → B-bloqueadores/alfa-agonistas/succinilcolina
• deficiência de insulina
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• Paralisia periódica hipercalêmica


• Lise tumoral
• Ingesta excessiva

PSEUDO HIPERCALEMIA:
• Uso de torniquete
• Hemólise pós punção venosa traumática
• Trombocitose (plaquetas > 800.000/mm7)
• Leucocitose (Leucócitos > 100.000/mm7)

3. PRINCIPAIS SINTOMAS

NEUROMUSCULARES:
• Fraqueza muscular
• Paralisia muscular progressiva ascendente

CARDIOVASCULARES:
• Arritmias

GASTROINTESTINAL:
• Diarreia
• Náuseas/vômitos

4. QUAIS EXAMES SOLICITAR ALÉM DE POTÁSSIO SÉRICO:


• Outros eletrólitos (Na, Mg, P, Ca…)
• Função renal e glicose
• Gasometria → avaliar distúrbios ácido-básicos
• CPK → em casos quando suspeita de rabdomiólise
• Eletrocardiograma

5. QUAIS AS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁ-


FICAS:
• Onda T apiculada
• Prolongamento intervalo PR
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• Achatamento da onda P
• Alargamento do complexo QRS
• Encurtamento do intervalo QT
• Ritmo sinusal (idioventricular)
• Bradicardia sinusal ou juncional

Atenção: as alterações eletrocardiográficas não se correlacionam com os níveis de


potássio; a presença de alterações eletrocardiográficas devem ser tratadas prontamente,
mesmo sem a confirmação laboratorial devido ao risco de arritmias!

Figura 3. ECG demonstrando alterações decorrentes de hipercalemia (K = 8.5). Note o alargamento do complexo QRS, onda T apicula-
da e achatamento da onda P. Fonte: Acervo Medway

Figura 4. Ritmo sinusoidal secundária a hipercalemia grave; K sérico 10.5 mEq/L. Fonte: https://ecg.bidmc.harvard.edu/mavendata/
images/case164/img.pdf
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6. PRINCIPAIS TRATAMENTOS

Todos os pacientes devem ser monitorizados continuamente pelo risco de


alterações eletrocardiográficas

• Indicação → alteração eletrocardiográfica


• Gluconato cálcio 10% 10 mL + 100 mL SF 0,9% (5 minutos)
• Repetir ECG e, se necessário, repetir cálcio até normalização

TRANSLOCAÇÃO PARA O INTRACELULAR:


• Solução polarizante → 25 a 50g glicose + 10U insulina regular IV:
• 500 mL SG 10% OU
• 100 mL SG50% + 100 mL AD
• Fenoterol/salbutamol → 10 gotas + 5 mL SF 0,9% inalatório
• Bicarbonato 1 mEq/Kg IV (nos casos de acidose metabólica grave)

ELIMINAÇÃO CORPORAL:
• Furosemida 40 mg IV (exceto naqueles com disfunção renal)
• Sorcal → 30g + 100 mL manitol IV (cada vez menos usado)
• Hemodiálise de urgência → nos casos refratários

7. CID10
E87.5 - Hiperpotassemia

DISTÚRBIOS DO CÁLCIO

1. PRINCÍPIOS FISIOLÓGICOS BÁSICOS

A) HOMEOSTASE DO CÁLCIO: 3 HORMÔNIOS E 1 RECEPTOR:


• 1,25-di hidroxicolecalciferol (vitamina D):
• Formada no túbulo contorcido distal
• Promove absorção de cálcio no intestino delgado
• Promove reabsorção óssea → diminui cálcio sérico
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• PTH:
• Produzido e secretado nas glândulas paratireoides
• AUMENTA cálcio sérico
• Ativa osteoclastos → promove desmineralização óssea
• Aumenta síntese de vitamina D
• Aumenta reabsorção de cálcio no intestino
• Promove fosfatúria

• Calcitonina:
• Produzida nas células C da glândula tireóide
• o cálcio sérico
• Reduz atividade dos osteoclastos e a reabsorção óssea

• Receptor cálcio sensível:


• Fica ativo na hipercalcemia
• Inibe produção de PTH e promove secreção de calcitonina
• Promove calciúria e poliúria

B) COMO O CÁLCIO É TRANSPORTADO NO ORGANISMO?


• Ligado à proteínas plasmáticas:
• Principalmente albumina
• 45-50%

• Ligado à complexos iônicos:


• Citratos, fosfatos, carbonatos…
• 5-10%

2. HIPOCALCEMIA
A) DEFINIÇÃO:
• Cálcio sérico total < 8,5 mg/dL ou 2,12 mmol/L
OU
• Cálcio iônico < 4,4 mg/dL ou 111 mmol/L
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B) PRINCIPAIS ETIOLOGIAS:
• Associadas a PTH elevado (hiperparatireoidismo secundário):
• Doença renal crônica
• Deficiência de vitamina D
• Resistência à vitamina D (raquitismo/osteomalácia)
• Resistência ao PTH (hipomagnesemia/pseudohipoparatireoidismo)
• Perda de cálcio da circulação:
• Pancreatite aguda
• Lise tumoral
• Metástases osteoblásticas
• Alcalose respiratória aguda
• Sepse

• Associadas a PTH baixo (hipoparatireoidismo):


• Pós cirúrgicas (tireoidectomia/paratireoidectomia…)
• Genéticas (agenesia, hipocalcemia dominante autossômica…)
• Autoimunes (ex: doença poliglandular autoimune tipo 1)
• Radiação cervical

• Outras causas:
• Desnutrição/alcoolismo
• Distúrbios do magnésio
• Hipomagnesemia inibe secreção de PTH
• Hipoalbuminemia:
• O cálcio sérico cai 0,8 mg/dL a cada redução de 1g/dL de albumina
• Cálcio iônico pode permanecer normal!
• Cálcio corrigido = Ca mensurado + [(4 - albumina) x 0,8]
• Medicamentos:
• Fenitoína/fenobarbital
• Gentamicina/foscarnet
• Cisplatina
• Diuréticos de alça (ex: furosemida)
• Glicocorticóides
• Bisfosfonatos (ex: alendronato de sódio)
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C) SINAIS E SINTOMAS

• Neuromusculares:
• Fraqueza/fadiga
• Espasmos musculares
• Crises convulsivas
• Alucinações
• Sinal de Chvostek: consiste na contração de músculos faciais ipsilaterais ao se percutir
o trajeto do nervo facial próximo à orelha.
• Sinal de Trousseau: consiste na indução do espasmo carpopedal ao se insuflar o
manguito de pressão arterial acima da pressão arterial sistólica por 3 minutos.

Figura 5. Sinal de Trousseau. Figura 6. Sinal de Chvostek.


Fonte: bedsidetothebench.wordpress.com/ Fonte: bedsidetothebench.wordpress.com/

• Cardiovasculares:
• Insuficiência cardíaca
• Arritmias ventriculares

• Ossos e pele:
• Osteodistrofia
• Osteomalácia
• Pele seca/hiperpigmentação
• Cabelo quebradiço
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D) O QUE MAIS DEVO SOLICITAR DE EXAMES?


• Albumina:
• Correção dos níveis de cálcio se hipoalbuminemia

• Fósforo sérico:
• Se elevado → pode estar relacionado à função renal ou alteração PTH
• Se diminuído → pensar em hiperparatireoidismo secundário

• Magnésio:
• Hipomagnesemia reduz secreção de PTH

• PTH:
• Se diminuído → hipoparatireoidismo
• Se aumentado ou normal → pseudo-hipoparatireoidismo/alterações da vitamina D/
hipomagnesemia

• Função renal

E) PRINCIPAIS ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS:

• Prolongamento intervalo QT (ST longo e onda T normal)


• Inversão onda T (em casos mais severos)

Segmento ST Longo

QT Normal QT Prolongado
Figura 7. Prolongamento ST secundário à hipocalcemia. Fonte - retirada e adaptada de: https://litfl.com/hypocalcaemia-ecg-library/
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F) PRINCÍPIOS DE TRATAMENTO:

Todos os pacientes devem ser monitorizados continuamente pelo risco de


alterações eletrocardiográficas

• Reposição intravenosa:

Se houver hipocalcemia severa e/ou sintomas!


Ca sérico < 7,5 mg/dL (1,9 mmol/L) OU Ca iônico < 3 mg/dL (0,8 mmol/L)

• Gluconato de cálcio → 1g = 1 ampola = 4,3 mEq Ca


• Cloreto de cálcio → 1g = 1 ampola = 13,4 mEq Ca
• Obs: sempre fazer cloreto de cálcio em acesso central!

• Como prescrever?:
• Diluir 1 ou 2 ampolas em 100 mL SF 0,9% e correr em 20 min
• Repetir a cada 60 minutos até os sintomas se resolverem!
• Dosar cálcio 6/6h
• Lembre-se de repor o magnésio se o mesmo estiver baixo!

3. HIPERCALCEMIA

A) DEFINIÇÃO:
• Cálcio sérico total > 10,5 mg/dL
E/OU
• Cálcio iônico > 2,7 mEq/L (5,4 mg/dL; 1.35 mmol/L)

B) CLASSIFICAÇÃO:
• Leve
• Cálcio total 10,5 a 11,9 mg/dL

• Moderada
• Cálcio total 12 a 13,9 mg/dL

• Grave
• > 14 mg/dL
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C) PRINCIPAIS ETIOLOGIAS:
• Aumento da reabsorção óssea:
• Hiperparatireoidismo primário
• Aumento PTH
• Hiperparatireoidismo terciário
• Malignidade
• Produção proteína semelhante ao PTH (PTHrp)
• Osteólise (metástases)
• Hipertireoidismo
• Hipervitaminose A
• Imobilização prolongada

• Diminuição excreção urinária:


• Hipercalciúria hipercalcêmica familiar
• Uso de diuréticos tiazídicos

• Aumento da absorção gastrointestinal:


• Intoxicação por vitamina D
• Síndrome leite-álcali
• Ingesta excessiva carbonato de cálcio e/ou leite
• Doenças granulomatosas
• Sarcoidose
• Tuberculose
• Histoplasmose

D) SINAIS E SINTOMAS:
• Neuromuscular e ossos:
• Confusão/apatia
• Alucinações
• Hipotonia/hiporreflexia
• Fraqueza/fadiga
• Fraturas ósseas

• Cardiovascular:
• Arritmias
• Hipertensão (calcificação dos vasos)
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• Trato gastrointestinal:
• Constipação
• Náuseas/vômitos
• Doença ulcerosa péptica
• Pancreatite

• Trato urinário:
• Poliúria
• Insuficiência renal
• Nefrolitíase

E) O QUE SOLICITAR DE EXAMES?


• Albumina
• Corrigir o cálcio se houver hipoalbuminemia
• PTH:
• Se aumentado → hiperparatireoidismo primário ou terciário
• Se diminuído → oncogênico; hipertireoidismo...
• Função renal
• Vitamina D:
• Aumento calcidiol (25-OH-vit D) → ingesta excessiva vitamina D
• Aumento calcitriol (1,25 - OH - vit D) → granulomatosas
• Magnésio
• Fósforo
• Eletrocardiograma

F) PRINCIPAIS ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS:


• Encurtamento do intervalo QT (principal)
• Presença de ondas J de Osborn
• Também presente em hipotermia (só que tem QT longo)
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Figura 8. Eletrocardiograma de paciente com hipercalcemia; Repare nas ondas J de Osborn (setas) associadas com intervalo QT curto
nas demais derivações. Fonte: https://litfl.com/hypercalcaemia-ecg-library/

G) PRINCÍPIOS DE TRATAMENTO

Todos os pacientes devem ser monitorizados continuamente pelo risco de


alterações eletrocardiográficas

• Se cálcio total > 14 mg/dL e/ou cálcio total > 12 mg/dL com sintomas:
• Hidratação vigorosa:
• Uso de salina isotônica 200 a 300 mL/h (SF 0.9%)
• Primeiras 24h → 3 a 4L; depois → 2 a 3L/dia
• Objetivo: diurese 150 a 200 mL/h

• Diuréticos de alça:
• Dose diurética 20 a 40 mg/dia (individualizada)
• Não usar de rotina
• Usar para manter a diurese acima

• Corticoides:
• Prednisona 1 mg/Kg VO ou Hidrocortisona 300 mg IV
• Em caso de intoxicação de vitamina D/doenças granulomatosas
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• Terapia anti-reabsortiva (se cálcio total > 14 mg/dL):


• Pamidronato:
• 90 mg + 250 mL SF 0,9% IV em 2 a 4h
• Correr 60 mg se função renal < 30 mL/min
• Não repetir em menos de 7 dias

• Ácido zoledrônico:
• 4 mg IV em 15 min (efeito imediato)
• Pode repetir se necessário
• Não usar se clearance < 30 mL/min

• Calcitonina:
• 4 a 8 U/Kg via SC ou IM 12/12h por 2 dias
• Não usar como tratamento isolado (risco de taquifilaxia)

• Hemodiálise :
• No caso de hipercalcemia refratária

• Se hipercalcemia leve ou moderada sem sintomas:


• Sem necessidade de tratamento de urgência
• Tomar 6 a 8 copos de água por dia
• Evitar tiazídicos, dieta rica em cálcio, desidratação e inatividade física

4. CID-10:
E83.5 - Distúrbios do metabolismo de cálcio

E58 - Deficiência de cálcio da dieta


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DISTÚRBIOS DO MAGNÉSIO

1. HIPERMAGNESEMIA

A) PRINCIPAIS ETIOLOGIAS:
• Insuficiência renal
• Infusão de magnésio
• Ex.: infusão em pacientes com pré-eclâmpsia
• Ingesta oral excessiva
• Antiácidos e/ou laxativos
• Miscelâneas
• Cetoacidose diabética
• Hiperparatireoidismo primário
• Intoxicação por lítio
• Estados hipercatabólicos (ex.: lise tumoral)

B) SINAIS E SINTOMAS
• Sintomas cardiovasculares:
• Funciona como bloqueador de canal de cálcio!
• Hipotensão
• Bradicardia
• Aumento intervalo QT/aumento intervalo PR/bloqueios AV

• Sintomas neuromusculares:
• Diminuição dos reflexos profundos
• Sonolência
• Paralisia muscular
• Quadriplegia flácida

→ Sintomas variam conforme concentração sérica de magnésio

Entre 4 a 6 mEq/L → náuseas, vômitos, diminuição reflexos profundos


Entre 6 a 10 mEq/L → sonolência, hipocalcemia, hipotensão, alteração ECG
> 10 mEq/L → paralisia muscular, apneia, colapso cardiovascular
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C) QUAIS EXAMES DEVO SOLICITAR ALÉM DE MAGNÉSIO SÉRICO?:


• Função renal (creatinina)
• Eletrocardiograma
• Cálcio e potássio → principais eletrólitos

D) TRATAMENTO:

Todos os pacientes devem ser monitorizados continuamente pelo risco de


alterações eletrocardiográficas

• CESSAR INFUSÃO DE MAGNÉSIO


• De acordo com função renal:
• Furosemida 40 a 80 mg IV (se clearance entre 15 a 45 mL/min)
• Considerar hemodiálise (se clearance < 15 mL/min)
• Se sintomas neurológicos ou cardiovasculares
• Gluconato de cálcio 10% 10 mL durante 5 minutos IV

2. HIPOMAGNESEMIA

A) PRINCIPAIS ETIOLOGIAS
• Perdas extra renais:
• Diarreia
• Queimadura
• Sepse
• Pancreatite aguda

• Perdas renais:
• Cetoacidose
• Doenças renais túbulo-intersticiais
• Diurese osmótica

• Distúrbios metabólicos/endócrinos:
• Síndrome secreção inapropriada hormônio antidiurético
• Hipertireoidismo/hiperparatireoidismo
• Correção de cetoacidose diabética
• Distúrbios potássio e cálcio
• Baixa ingesta:
• Alcoolismo
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• Pancreatite crônica (esteatorréia)


• Ressecção intestino delgado

• Medicamentos:
• Diuréticos de alça
• Aminoglicosídeos
• Intoxicação vitamina D
• Uso de álcool
• Inibidores de calcineurina (ciclosporina e tacrolimus)

B) SINAIS E SINTOMAS

• Neuromusculares:
• Tetania
• Sinais de Chvostek e Trousseau
• Espasmos musculares
• Convulsões
• Movimentos involuntários / coreiformes

• Cardiovasculares:
• Disfunção da bomba de Na-K-ATPase
• Insuficiência cardíaca
• Arritmias cardíacas
• Hipotensão
• Alargamento do complexo QRS/diminuição amplitude onda T

C) QUAIS EXAMES DEVO SOLICITAR ALÉM DO MAGNÉSIO SÉRICO?:

• Potássio sérico
• Cálcio sérico
• Fósforo sérico
• Gasometria → avaliar distúrbios ácidos-básicos

Hipopotassemia, hipocalcemia e hipofosfatemia geralmente estão presentes em


pacientes que apresentam hipomagnesemia
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D) TRATAMENTO

• Apresentação das ampolas:


• Ampola 10% = 10 mL = 1g magnésio
• Ampola 20% = 10 mL = 2g magnésio
• Ampola 50% = 10 mL = 5g magnésio

• Pacientes com sintomas severos (convulsões, arritmias e/ou tetania):


• Ataque → 1 a 2g de Mg diluído em 100 mL de soro glicosado 5%
• Correr a dose de ataque em 10 minutos
• Sugestão de manutenção → 4 a 8g de Mg em 12 a 24h
• Em pacientes com clearance renal < 30 → reduzir dose pela metade!
• Em crianças → 25 a 50 mg/Kg (dose máxima da infusão = 2g)

• Pacientes estáveis com poucos ou nenhum sintoma:


• Correção conforme dosagem sérica de magnésio
• [Mg] < 1 mg/dL (0,8 mEq/L) → 4 a 8g em 12 a 24h
• [Mg] entre 1 a 1,5 mg/dL (0,8 a 1,2 mEq/L) → 2 a 4g em 4 a 12h
• [Mg] entre 1,6 a 1,9 mg/dL (1,4 a 1,6 mEq/L) → 1 a 2g em 1-2h

3. CID-10:
E83.4 - Distúrbios do metabolismo de magnésio

E61.2 - Deficiência de magnésio

DISTÚRBIOS DO SÓDIO

1. DEFINIÇÃO
• O sódio é um eletrólito predominantemente extracelular

• Os níveis séricos variam entre 135 a 145 mEq/L


Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 25

Para entender o equilíbrio fisiológico do sódio, é necessário conhecer as relações


entre esse eletrólito e a água corporal, passando pelo conceito de tonicidade. Existe
um gradiente entre substâncias osmoticamente ativas (capazes de movimentar a
água entre os compartimentos extra e intracelular, como o sódio e a glicose, por
exemplo), que em condições fisiológicas, produz um equilíbrio osmótico. Assim, os
distúrbios do sódio devem ser entendidos como alterações da movimentação de
água entre os compartimentos, gerando desequilíbrio osmótico

2. O EQUILÍBRIO FISIOLÓGICO:
• Os principais mecanismos responsáveis pela manutenção do equilíbrio do metabolismo
do sódio (e da água) no organismo são o ADH e o sistema renina-angiotensina-aldosterona
(SRAA)

• O principal objetivo é restabelecer a volemia e reverter o estado de hipoperfusão detectado


pelos receptores. Isso ocorre da seguinte forma:

• Ativação do SRAA, produzindo vasoconstrição e reabsorção de sódio (e


consequentemente de água) aumentando o volume extracelular efetivo

• Liberação de ADH pelo hipotálamo, aumentando a reabsorção de água livre nos túbulos
coletores através das aquaporinas e gerando aumento da resistência vascular periférica

HIPONATREMIA

1. DEFINIÇÕES
• Na sérico < 135 mEq/L
• Distúrbio mais frequente entre pacientes internados

• Espectro bastante amplo de apresentações

Atenção: a hiponatremia deve ser entendida muito mais como um distúrbio da água
do que do sódio. Isso porque, na prática, o que ocorre na maioria das vezes é um excesso
de água corporal, que pode estar relacionado com algum grau de falha no ADH

2. CLASSIFICAÇÃO
• É feita conforme a osmolaridade sérica, podendo ser:
• Hipertônica
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 26

• Isotônica
• Hipotônica

• Hiponatremia hipertônica: não é uma hiponatremia propriamente dita. O que ocorre é


que existem outros solutos no extracelular (como glicose, principalmente), que deslocam
o equilíbrio osmótico aumentando a quantidade de água que se desloca do intra para o
extracelular, causando uma “diluição” do sódio:
• A principal representação são os estados hiperglicêmicos. Deve-se fazer uma correção:
a cada aumento de 100 mg/dL acima de 100 de glicemia, há uma redução de cerca de
2 mEq de sódio
• Com a correção da hiperglicemia, há o retorno do equilíbrio osmótico

• Hiponatremia isotônica: chamada de pseudohiponatremia, consiste num artefato


devido à técnica de mensuração (indireta) do sódio pelo laboratório. Pode ocorrer em
situações de hipertrigliceridemia (soro lipêmico) e paraproteinemias (mieloma múltiplo,
uso de imunoglobulinas, hiperbilirrubinemia). Deve-se solicitar ao laboratório medida por
ionometria nesses casos

• Hiponatremia hipotônica: são as verdadeiras hiponatremias e daremos atenção especial


a elas. São subdivididas de acordo com a volemia do paciente, e por isso essa avaliação é
fundamental. Falaremos disso adiante no roteiro de investigação
• Principais causas
• Uso de medicações:
• Diuréticos tiazídicos
• Fenotiazinas
• Antidepressivos tricíclicos
• IRSS
• AINEs, fibrados, opióides, nicotina etc
• Insuficiência adrenal primária e secundária
• Hipotireoidismo
• Síndrome cerebral perdedora de sal
• ICC
• Insuficiência renal aguda ou crônica
• Cirrose hepática
• Síndrome nefrótica
• Hiponatremia secundária ao uso de ecstasy (“intoxicação hídrica”)
• Polidipsia primária
• SIADH
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 27

3. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

• Classificação pela gravidade:


• Leve: 135-130 mEq/L
• Moderado: 129 a 125 mEq/L
• Grave: < 125 mEq/L

Sintomas • Mal-estar
leves • Náuseas

• Cefaleia
• Náuseas
• Desorientação
Sintomas
• Confusão mental
moderados
• Agitação
• Ataxia
• Arreflexia

• Vômitos intratáveis
• Desconforto respiratório podendo culminar em parada respira-
Sintomas tória por herniação cerebral
graves • Alteração de nível de consciência (desde sonolência excessiva
até coma)
• Convulsões

Tabela 1. Classificação pela gravidade Fonte: Acervo Medway.

ROTEIRO DE INVESTIGAÇÃO

A. PRIMEIRA ETAPA
1. DESCARTAR HIPONATREMIA HIPERTÔNICA

Solicitar glicemia capilar e realizar correção do nível sérico de sódio pela glicemia.
A cada 100 mg/dL da glicemia acima de 100mg/dL, aumentar 2 mEq/L do sódio sérico

2. DESCARTAR HIPONATREMIA ISOTÔNICA (PSEUDOHIPONATREMIA)

Avaliar situações que podem gerar erros na mensuração do sódio por método indireto:
soro lipêmico, paraproteinemia (mieloma múltiplo, icterícia obstrutiva). Solicitar
mensuração por ionometria (método direto)
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 28

3. DESCARTAR HIPONATREMIA ISO/HIPERTÔNICA POR SOLUTOS EXÓGENOS


→ Ao descartar as principais causas acima, saberemos que estamos diante de um paciente
com hiponatremia hipotônica, a causa mais prevalente

Questionar ativamente sobre cirurgias ou procedimentos (urológicos, ginecológicos)


com uso de soluções de irrigação (glicina, sorbitol) e uso recente de manitol ou
imunoglobulinas (agentes osmoticamente ativos)

B. SEGUNDA ETAPA
1. QUESTIONAR SOBRE USO DE MEDICAMENTOS (PRINCIPAL: TIAZÍDICOS)

2. AVALIAR SINAIS DE HIPERVOLEMIA:


• Presença de edema periférico
• Ascite
• Congestão pulmonar
• Acúmulo de líquido no terceiro espaço (edema sacral, edema de parede abdominal)
• Turgência jugular

Se presentes: hiponatremia hipotônica hipervolêmica


Principais causas: ICC, cirrose hepática, síndrome nefrótica, gestação, IRA, DRC

3. AVALIAR SINAIS DE HIPOVOLEMIA:


• Hipotensão
• Mucosas secas
• Turgor reduzido
• Sede (se mecanismo intacto)
• Olhos fundos

Se presentes: hiponatremia hipotônica hipovolêmica


Necessário avaliar se a perda ocorre por mecanismo renal ou extra-renal

• Buscar perdas gastrointestinais:


• Diarreia
• Vômitos
• Queimaduras
• Suor
• Hemorragia
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 29

• Buscar perdas renais:


• Diurese osmótica
• Uso de diuréticos

• Sódio urinário > 40 mEq/L = perdas renais:


Se causa evidente não for encontrada, deve ser dosado o sódio urinário
• Insuficiência adrenal
• Nefropatia perdedora de sal
• SIADH

• Sódio urinário < 20 mEq/L = perdas extra-renais:


• TGI
• Terceiro espaço

4. SE NÃO HOUVER SINAIS DE ALTERAÇÃO DA VOLEMIA, A DOSAGEM DE OSMOLARI-


DADE URINÁRIA DEVE SER SOLICITADA

O objetivo é avaliar a resposta do ADH no contexto da hiponatremia e a possibilidade de


alteração patológica.

• Osmolaridade aumentada (> 100 mOsm/kg)


• Retenção hídrica com concentração urinária (ADH aumentado)

• Osmolaridade diminuída (< 100 mOsm/kg)


• Urina muito diluída (ADH reduzido ou ausente)

Ideal na hiponatremia: redução do ADH, para secretar água livre (urina diluída)

• Osmolaridade diminuída: sem alterações no mecanismo fisiológico


• Causas: excesso de ingesta hídrica:
• Intoxicação hídrica (ecstasy)
• Potomania secundária à psicose
• Bebedores de cerveja
• Dieta do chá e torrada

• Osmolaridade aumentada: mecanismo fisiológico descartado:


• Antes de mais nada: descartar hipotireoidismo e deficiência de cortisol
• Se TSH e cortisol normais, a principal causa é SIADH
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 30

C. PRINCIPAIS CAUSAS DE SIADH

Infecções, hemorragia, neoplasia, psicose, delirium tremens, neuro-


SNC
cirurgia

Ciclofosfamida, Carbamazepina, Haloperidol, ISRS e IRSN, Bromo-


Medicamentos
criptina, Amiodarona, DDAVP

Doenças TB, empiema, abscesso pulmonar, IRpA, neoplasia (pequenas célu-


pulmonares las, carcinoma broncogênico)

Sarcoma, linfoma, leucemia, neoplasias (duodeno, timo, bexiga,


Outras
pâncreas, próstata, útero)

Tabela 2. Principais causas de SIADH. Fonte: Acervo Medway.

5. TRATAMENTO

A REPOSIÇÃO DE SÓDIO NÃO DEVE ULTRAPASSAR 6 MEQ/L EM 24H!

• Quem NÃO tem indicação de tratamento?:


• Pacientes com hiponatremia leve
• Pacientes com hiponatremia aguda grave assintomáticos em autocorreção por
diurese osmótica:
• Dosagem seriada do sódio de 1/1h até correção
• Caso não haja autocorreção:
• Bolus de NaCl 3% 50ml
• Pacientes com hiponatremia crônica grave assintomáticos
• Internação e dosagem seriada de Na (12/12h)

• Pacientes com necessidade de intervenção imediata


• Hiponatremia aguda grave sintomática - presença de convulsões ou coma

NACL 3% 100 ML em bolus (15-20 min), podendo repetir até 3 vezes se não houver
melhora dos sintomas
Opção: bicarbonato de sódio 8,4% 50ml (equivale a 6% de sódio), até 3 repetições

→ IMPORTANTE: 500ml NaCl 3% = 445 ml SF 0,9% + 55 ml NaCl 20%:

• Reavaliar sódio sérico após cada bolus


• Se não houver melhora clínica após reposição, provavelmente a hiponatremia não era
causa dos sintomas: investigue diagnósticos diferenciais
• Após tratamento agudo, avaliação de hora em hora do sódio sérico
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 31

• Pacientes sem necessidade de intervenção imediata:


• Hiponatremia aguda moderada
• Hiponatremia crônica sintomática

NACL 3% 6 ML/KG EM BIC (CORRER EM 24H)


Espera-se aumentar 1 mEq/L para cada solução contendo 1 ml/kg.
Ajustaremos a infusão para a correção máxima permitida de 6 mEq/L em 24h

• Dosar sódio sérico de 4/4h em pacientes crônicos


• Dosar sódio sérico após 1h, 6h e 12h em pacientes agudos com sintomas moderados
• Atentar sinais de hipervolemia
• Interromper infusão quando o Na = 125 mEq/L
• Outras medidas terapêuticas:
• Restrição hídrica
• Avaliar uso de diuréticos se paciente com alto risco de hipervolemia
• Furosemida 40mg EV 12/12h
• Tratamento da causa base

6. INDICAÇÕES DE INTERNAÇÃO

• Pacientes com sintomas agudos moderados ou graves


• Pacientes com Na < 125 mEq, independente do tempo de instalação hiponatremia
aguda grave = UTI

7. A SÍNDROME DE DESMIELINIZAÇÃO OSMÓTICA

Principal complicação da correção inadequada do sódio, ocorre quando o aumento


da natremia em 24h é superior ao limite preconizado (6 mEq/L). Isso repercute como
injúria direta aos astrócitos e oligodendrócitos, culminando na apoptose dessas
células e aparecimento de sintomatologia neurológica grave cerca de 24h após. Os
principais sintomas são:
• Tetraparesia flácida (início)
• Tetraparesia espástica
• Paralisia pseudobulbar
• RNC
• Coma
• Síndrome de locked-in
• Morte
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 32

Pacientes com hiponatremia grave (abaixo de 110 mEq/L), desnutridos, etilistas


crônicos e hepatopatas avançados têm risco aumentado de desmielinização,
tornando-se especialmente relevante a monitorização contínua dos níveis de sódio
nesses pacientes durante a reposição

8. PRESCRIÇÃO SUGERIDA

Dieta conforme estabilidade clínica

Restrição hídrica

Se indicação de tratamento imediato

SF 0,9% 445 ml + NaCl 20% 55ml → fazer 100ml da solução em bolus (15 a 20 min)
até um máximo de 3 repetições
ou
Bicarbonato de sódio 8,4% → fazer 50ml da solução em bolus (15 a 20 min)
até um máximo de 3 repetições

Tratamento em 24h

NaCl 3% 6 ml/kg em BIC (correr em 24h) -


interromper infusão quando Na sérico atingir 125 mEq/L

Diureticoterapia se necessário

Furosemida 40mg EV 12/12h

Sintomáticos

Dipirona 1g EV 6/6h
Metoclopramida 10 mg EV 12/12h se náuseas
Ondansetrona 8mg EV 12/12h se náuseas

Cuidados gerais

Balanço hídrico
Sinais vitais 6/6h
Dosagem seriada de Na conforme quadro clínico

Glicemia capilar 6/6h


Glicose 50% 4 ampolas EV se dextro < 70
Correção com insulina R conforme dextro

Tabela 3. Prescrição sugerida. Fonte: Acervo Medway.


Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 33

Checar Baixa Osmolaridade Osmolaridade


Na < 135 osmolaridade osmolaridade normal alta
sérica

Artefato Hiperglicemia
Checar laboratorial
Baixa osmolaridade
osmolaridade urinária
< 100 mOsm/L Aumento Intoxicação
de proteínas alcoólica
Alta
osmolaridade Osmolaridade Ureia
Independente
> 100 mOsm/L normal aumentada
de ADH

Chá e torradas Dependente de ADH

Checar estado volêmico, sódio urinário e ácido úrico


Potomania
do bebedor
de cervejas Hipervolêmica ICC Cirrose Síndrome
nefrótica
Na urinário < 20
Polidipsia
psicogênica Hipovolêmica Perdas GI Perdas renais Outras
perdas
Na urinário < 20
Falência renal
(285 mOsm/kg) Insuficiência
Euvolêmica Hipotereoidismo SIADH
adrenal

Na urinário > 20

Figura 9. Investigação das hiponatremias. Fonte: Acervo Medway.

9. CID 10

E87.1 Hiposmolaridade e hiponatremia

E87.7 Sobrecarga de líquidos

HIPERNATREMIA

1. DEFINIÇÕES

• Sódio sérico > 145 mEq/L


• Associada quase que invariavelmente com perda hídrica
• Ocorre normalmente em pacientes que não têm acesso à água (se o mecanismo da sede
estiver intacto)
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 34

2. CLASSIFICAÇÃO

Status volêmico Condição clínica associada

• Síndrome de Cushing
• Hiperaldosteronismo primário

Hipernatremia hipervolêmica • Aumento de ingesta de sal


• Latrogênico (salina hipertônica, infusão de
bicarbonato, falha no aporte de água livre em
paciente crítico/acamado)

• Diabetes insipidus central


• Diabetes insipidus nefrogênico
Hipernatremia euvolêmica • Hipodipsia (baixa ingesta hídrica)
• Medicamentos (lítio, fenitoína, aminoglicosídeos,
anfotericina)

• Diurético osmótico
• Diurético de alça
• Diurese pós obstrutiva
• Vômitos
Hipernatremia hipovolêmica
• Diarreia
• Fístula GI
• Sudorese
• Queimaduras

Tabela 4. Classificação. Fonte: Acervo Medway.

3. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
• Devido aos mecanismos de autorregulação e adaptação cerebral, o tempo de instalação
do distúrbio eletrolítico é de fundamental importância: pacientes com distúrbios agudos
são muito mais sintomáticos.

São considerados pacientes de risco para hipernatremia aqueles que têm acesso
restrito à água ou alterações no mecanismo da sede. Podemos citar como exemplos:
• Pacientes idosos frágeis ou com capacidade cognitiva comprometida
• Pacientes críticos intubados ou com dieta via enteral
• Pacientes com diabetes insipidus
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 35

• As principais manifestações, de acordo com o tempo de instalação, são:


• < 48h:
• Irritabilidade
• Convulsões
• Coma
• Choque
• > 48h:
• Confusão mental
• Letargia
• Outros sintomas possíveis incluem náuseas, vômitos, sede, poliúria, diarreia

• Os achados de exame físico serão diretamente relacionados ao status volêmico do


paciente, podendo cursar com hipotensão, taquicardia, olhos fundos, mucosa seca,
alteração de estado mental e turgor reduzido nos casos de hipovolemia ou edema e sinais
de congestão em pacientes hipovolêmicos

4. ROTEIRO DIAGNÓSTICO:
1. QUESTIONAR SOBRE USO DE MEDICAÇÕES E COMORBIDADES PRÉVIAS

A REPOSIÇÃO DE SÓDIO NÃO DEVE ULTRAPASSAR 6 MEQ/L EM 24H!

2. AVALIAÇÃO DE STATUS VOLÊMICO PELO EXAME FÍSICO

3. INVESTIGAÇÃO LABORATORIAL INICIAL

Função renal (a relação uréia/creatinina é importante para avaliação de lesão pré


renal), urina I, eletrólitos, osmolaridade urinária

4. DESCARTAR FATORES LABORATORIAIS QUE ALTEREM A DOSAGEM DO SÓDIO SÉRICO


(VIDE CAPÍTULO DE HIPONATREMIA)

5.AVALIAÇÃO DA OSMOLARIDADE URINÁRIA

O objetivo é avaliar a resposta do ADH no contexto da hipernatremia e a possibilidade de


alteração patológica:
• Osmolaridade aumentada (> 700-800 mOsm/kg)
• Retenção hídrica com concentração urinária (ADH aumentado)
• Osmolaridade diminuída (< 300 mOsm/kg)
• Urina muito diluída (ADH reduzido ou ausente)
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 36

Ideal na hipernatremia: aumento do ADH, para reduzir perdas de água livre (urina
concentrada)

• Osmolaridade diminuída: ADH ineficaz - falha no mecanismo fisiológico


• Existe falha na secreção de ADH ou resistência ao ADH secretado?

→ Para responder a questão, administraremos ADH exógeno

• Após administração exógena de ADH, é esperada alteração da osmolaridade.


• Se houver alteração = deficiência de ADH (Diabetes Insipidus central)
• Se não houver alteração = resistência ao ADH produzido (Diabetes Insipidus
nefrogênico)

• Osmolaridade aumentada: mecanismo fisiológico sem alterações:


• Avaliação do sódio urinário:
• Sódio urinário aumentado (> 100 mEq/L) = aumento do aporte de sódio
(cristaloides, uso de corticoides)
• Sódio urinário reduzido (< 20 mEq/L) = perdas extra-renais (TGI, perdas insensíveis)

5. TRATAMENTO:

Antes de iniciar o tratamento, avaliar estabilidade hemodinâmica!

• Instabilidade hemodinâmica ou choque = reanimação volêmica com salina isotônica (SF


0,9%)
• Casos sabidamente agudos (< 6h): conduta imediata
• Realizar reposição de água livre com objetivo de redução do nível sérico de sódio em
1-2 mEq/L a cada hora

SG5% 3-6 ml/kg/h


Dosar sódio sérico a cada 4 horas

• Pacientes crônicos e terapia de manutenção dos casos agudos após atingida euvolemia
• Necessidade de reposição do déficit de água livre

Déficit de água livre (L) = [(sódio sérico – 140)] × ACT


140

Lembrando que ACT = peso x 0,6 (homens) ou 0,5 (mulheres)


Em pacientes idosos: 0,5 (homens) ou 0,45 (mulheres)
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 37

→ LEMBRANDO QUE:
• Nacl 0,9% - 154 mEq/L de Na
• Nacl 0,45% 77 mEq/L de Na
• SG 5% 0 mEq/L de Na
• Outras condutas incluem a correção do distúrbio de base, suspensão do aporte de sódio e
diureticoterapia em pacientes hipovolêmicos:

Sódio sérico > 145 mEq/L

Osm urinária Osm urinária


> 700-800 mOsm/L < 700-800 mOsm/L

Sódio urinário Sódio urinário


Perda urinária de água livre
< 25 mEq/L > 100 mEq/L

Perdas Osm urinária Osm urinária


Sobrecarga de sódio < 300 mOsm/L > 300-600 mOsm/L
extremas (NaCl, NaHCO3,
cristaloides,
mineralocorticoides)

Trato gastrointestinal Diabetes Di Parcial


Perdas insensíveis insipidus Diurese osmótica
completo Diuréticos de alça

Figura 10. Condutas em pacientes hipervolêmicos. Fonte: Acervo Medway.

6. CID10
E87.0 Hiperosmolaridade e hipernatremia
Desmistificando a gasometria: distúrbios hidroeletrolíticos 38

CONCLUSÃO

Galera! Os distúrbios hidroeletrolíticos são muito comuns na prática clínica e despencam nas
provas de residência! Mas com nosso material vai ficar muito mais fácil para vocês saberem
fazer o diagnóstico etiológico e a condução desses distúrbios no dia a dia!

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