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História da Psicologia

A importância do passado para o presente

Historiografia: refere-se ao estudo dos métodos de produção do conhecimento


histórico.

“Toda e qualquer produção humana — uma cadeira, uma religião, um computador, uma
obra de arte, uma teoria científica — tem por trás de si a contribuição de inúmeros
homens, que, num tempo anterior ao presente, fizeram indagações, realizaram
descobertas, inventaram técnicas e desenvolveram ideias. Em suma: por trás de
qualquer produção material ou espiritual, existe a História” (BOCK; FURTADO &
TEIXEIRA, 1999, p. 39).

A história da Psicologia tem por volta de dois milênios (início na Grécia, de 700 a. C.
até a dominação romana, véspera da era crista). O interesse por ela remonta aos
primeiros espíritos questionadores (BOCK; FURTADO & TEIXEIRA, 1999, p. 39).

Sempre houve fascínio pelo comportamento, especulações acerca da natureza e


condutas humanas são o tópico de muitas obras filosóficas.

“É uma das mais antigas disciplinas acadêmicas, e ao mesmo tempo uma das mais
novas” (BOCK; FURTADO & TEIXEIRA, 1999, p. 39).

No século V a. C., Sócrates, Platão, Aristóteles e outros sábios gregos se viam às voltas
com muitos dos mesmos problemas que hoje ocupam os psicólogos: a memória, a
aprendizagem, a motivação, a percepção, a atividade onírica e o comportamento
anormal, por exemplo.

As mesmas espécies de interrogações feitas atualmente sobre a natureza humana


também o eram séculos atrás, o que demonstra uma continuidade vital entre o passado e
o presente em termos de seu objeto de estudo.

É indispensável recuperar sua história para compreender a diversidade com que a


Psicologia se apresenta hoje.

Não há uma única forma, abordagem ou definição particulares da Psicologia


moderna com que concordem todos os psicólogos.

Vemos uma enorme diversidade, e até desacordo, tanto em termos de especializações


científicas e profissionais como em termos de objeto de estudo.

O eixo de referência que vincula essas áreas e abordagens distintas é a história da


evolução da disciplina Psicologia.

O conhecimento da história pode trazer ordem à desordem, produzir sentido a partir do


caos; permite enxergar o passado com mais clareza e explicar o presente.
“HISTÓRIA” – Por quê? O que é?

A história nos ajuda a entender o tempo que vivemos, mesmo que saibamos que toda
história é uma narrativa e é arbitrária.

É uma narrativa, porque diz respeito à descrição de fatos que aconteceram (contada
por alguém que não estava no local e nem na mesma época);

É a memória humana preservada e sem ela não podemos ter o senso de uma
continuidade, não poderíamos nem mesmo preservar a cultura e os saberes que nos que
nos constituem.

É arbitrária porque é um historiador que conta a história e nada garante que ela seja
contada do mesmo modo por outro historiador. Cada um irá destacar os fatos históricos
que considera mais relevantes.

O historiador, tal como o arqueólogo, trabalha com “fragmentos” = dados históricos, e a


partir desses fragmentos / dados tenta recriar os eventos e as pessoas do passado.

História da Psicologia

E ainda, os dados podem ser incompletos...

1. Eles podem ter se perdido,

2. Podem ter sido deliberadamente suprimidos,

3. Traduzidos de maneira imprecisa ou

4. Distorcidos por um participante ou pesquisador motivados por interesses

pessoais. A história da Psicologia contém muitos exemplos incompletos ou, talvez,

imprecisos de produção da verdade histórica.

HISTÓRIA” – formas ou tipos (Conceituação)

Há vários modos de se contar uma história. A seguir nos debruçaremos sobre duas
formas: a evolutiva e a descontínua.

1. História Evolutiva – linear (cronológica)

Concebe os fatos históricos numa cadeia linear = a evolução está sempre


acontecendo = o futuro é sempre a superação do passado.

Nessa concepção seria possível acompanhar a evolução de um objeto no decorrer


da história.

O passado interessa senão como passagem para um presente ao qual se pretende


também superar em nome de um futuro mais grandioso, mais aperfeiçoado.

Há um suposto consenso coletivo que leva à evolução.


Duas abordagens podem ser adotadas para explicar como a ciência psicológica se
desenvolveu:

1.1 Teoria personalista

Considera que o progresso é decorrente da ação de pessoas que modificaram o curso


da História / figura do precursor.

Há diversos precursores nas mais diversas áreas do saber: Platão, Aristóteles,


Copérnico, Descartes, Newton, Hume, Kant, Marx, Nietzsche, Comte, Wundt,
Freud, Foucault etc.

1.2 Teoria naturalista

Considera que a época modela as pessoas e assim os conhecimentos produzidos.


O Zeitgeist, é a expressão alemã comumente utilizada para designar o espírito
[Geist] intelectual de um tempo [Zeit], de uma época, e que determina
inextricavelmente a ação dos sujeitos históricos
O positivismo pode ser considerado um Zeitgeist.

2. História Descontínua

Nega o sentido evolutivo de qualquer história, (a visão personalista, de precursores


e mesmo do Zeitgeist, no âmbito científico).

Cada momento histórico só pode ser entendido nele mesmo, em seu contexto
político e social.

É feita de confrontos, de lutas, nas quais normalmente é o vencedor que se coloca


como detentor da verdade histórica, que narra uma certa história.

Não há objetos evoluindo através do tempo, mas em cada contexto emerge um


objeto diferente, definido pelas práticas humanas e também pelo acaso, que
não pode ser negado.

A tese de doutorado do crítico francês Michel Foucault, publicada como História da


Loucura na Idade Clássica – é uma ilustração da história descontínua. Em sua obra, em
linhas gerais, aborda problemas concretos (a insanidade, a prisão, a clínica, o corpo, a
medicina, a sexualidade) num contexto específico, geográfica (a França, na Europa ou
no Ocidente) e historicamente (idade do clássica, do século XVIII, ou na Grécia antiga,
etc.).

O passado pode nos mostrar que nada é eterno e que o tempo que vivemos é também
construído, no presente, por múltiplas forças sociais e políticas.

A importância de uma história da Psicologia


Em suma, a História e seu estudo são imprescindíveis para o entendimento da Psicologia
como saber, para percebermos de que modo o homem vem transformando seus modos
de pensar a si mesmo e, principalmente, para termos a noção de que estamos
construindo e utilizando um saber que não é universal, mas que tem sua própria história
e que, portanto, tem também seus limites espaço-temporais.

Nesse sentido, a Psicologia é um saber histórico, em transformação, inacabado e que


está sendo continuamente construído.

A psicologia é uma das mais antigas disciplinas acadêmicas e, ao mesmo tempo, uma
das mais novas.

História da Psicologia Moderna

Wilhelm Wundt (1832-1920), até então médico e filósofo alemão, é considerado o


fundador da Psicologia como ciência independente da disciplina filosófica. É o
primeiro psicólogo na história, pois foi quem criou o primeiro laboratório de
psicologia, em 1879, em Leipzig, na Alemanha. Sua obra e empreendimento são
considerados os marcos dessa fundação que passa a assumir características científicas,
baseando-se na observação, coleta de dados e experiências no teor do espírito
positivista.

No prefácio à primeira edição de Princípios de Psicologia Fisiológica, obra publicada


em 1874, Wundt que essa obra consistia numa tentativa de delimitar um novo domínio
da ciência ao qual dera o nome de Psicologia (SCHULTZ & SCHULTZ, 2001).

As ideias psicológicas na Antiguidade e na Idade Média

Como havíamos trabalhado na aula anterior, sobre “a importância do passado para o


presente”, a Psicologia é uma das mais antigas e uma das recentes disciplinas
acadêmicas.

A história revela que há milhares de anos atrás, desde que o homem se percebeu como
um ser pensante, inserido em um complexo chamado “natureza”, vem buscando
respostas para suas dúvidas e fatos que comprovem e expliquem a origem, as causas e
as transformações que ocorrem no mundo e, agora, no universo.

O comportamento e a conduta humana são assuntos que sempre fascinaram os homens e


estão registrados historicamente ao longo desses longos anos de existência do homem
na terra.

Por muito tempo buscou-se explicações para as questões naturais e humanas através de
personagens mitológicos.

Nas sociedades primitivas os acontecimentos eram explicados em termos de forças fora


do âmbito dos eventos naturais observáveis (sobrenatural). As explicações eram
externas, pois predominava o pensamento mítico. Daí a relevância do MITO.
Para os gregos, os mitos eram narrativas sagradas sobre a origem de tudo. Eram tudo em
que acreditavam como verdadeiro. Os poetas-videntes, que narravam os mitos,
possuíam uma autoridade mística sobre os demais, pois eram "escolhidos dos deuses"
que lhe mostravam os acontecimentos passados através de revelações e sonhos, para que
esses fossem transmitidos aos ouvintes.

O mito, sem dúvida, é, por essa razão, uma das primeiras e mais ricas construções do
homem para entender a complexidade da vida. Foi inicialmente uma representação
coletiva, transmitida através de várias gerações e que relata explicações do mundo,
como é o caso da mitologia grega.

A explicação mitológica não se prende à lógica racional, nem busca oferecer


comprovações de suas afirmações. É simplesmente a tentativa do homem de dar nome a
uma complexidade que não consegue compreende com sua razão.

Usa alegorias simbólicas na explicação do homem e do mundo.

Como exemplo, temos na mitologia escandinava, que as tempestades (fenômeno


natural) seriam a expressão da cólera dos deuses guerreiros. Na mitologia grega, por
outro lado, como relata Homero, a vitória na guerra era a expressão do favoritismo dos
deuses gregos.

Com o passar do tempo, o MITO parecia não satisfazer os homens, pois se tornava,
para alguns, insuficiente para explicar a quantidade cada vez maior de questões que
surgiam.

Assim, surgiu um novo modo de tentar explicar a complexidade da vida e esse novo
modo recebeu o nome de FILOSOFIA e o surgimento desse modo de pensar estava
atrelado a busca de entendimento pela racionalidade.

Esse momento corresponde aproximadamente ao século VI a. C.. Precisamente, a


Filosofia nasce na Grécia antiga e etimologicamente significa "amizade pelo saber” e
define uma forma característica de pensar (pensamento racional). Com ela vários
pensadores, chamados de filósofos, destacaram-se, cada um com sua forma particular de
pensar e buscar a sabedoria. Assim, instala-se um corte histórico; tem-se o pensamento
mítico e o pensamento filosófico.

Do mýthus e crenças religiosas a humanidade ascendeu à razão, ao logo (lógos). Trata-


se de uma evolução gradativa, uma vez que não houve um rompimento brusco com o
pensamento dos antepassados.

Durante muitos séculos, a FILOSOFIA tornou-se o campo de saber hegemônico na


criação de concepções de mundo e de homem que se dedicava a pensar acerca do que
posteriormente tornou-se domínio da Psicologia moderna e de outros campos de saber
que tomam o homem como o ponto central, como a Antropologia e a Sociologia, por
exemplo.

O tipo de pensamento característico da FILOSOFIA era o pensamento racional e lógico


e dele temos inúmeros testemunhos.
Na história da FILOSOFIA, existiu um filósofo grego que se tornou o primeiro a
efetuar uma espécie de corte, foi “um divisor de águas”, como se costuma dizer. Trata-
se de Sócrates. A partir dele há uma filosofia pré-socrática e uma filosofia pós-
socrática.

Os filósofos pré-socráticos (anteriores a Sócrates)

Contribuíram para o rompimento com a visão mítica e religiosa que se tinha até então da
natureza (eventos naturais) adotando uma forma científica e racional de pensar. Abaixo
tomaremos notas de um ponto importante destacados em geral por esses filósofos e que
tem relação com nosso tema de estudo.

Preocupavam-se em definir a relação do homem com o mundo através da percepção.


Para tal, discutiam que:

o se o mundo existe é porque o homem o vê, ou


o se o homem o vê é por aquele lhe ser anterior (problemas relacionados
com a natureza do mundo físico).

Com essa dupla maneira de filosofar, os filósofos introduziram duas abordagens opostas
no campo da filosofia: idealismo e materialismo.

Idealistas

Os filósofos idealistas são os que partem da perspectiva de que é a partir do homem que
se pode conceber o que quer que seja. O mundo é aquilo que o homem consegue
formalizar por intermédio da sua percepção. É a ideia que forma o mundo. Essa doutrina
filosófica prega que o mundo material é determinado pelas ideias. E nessa esteira
ingressam filósofos como Pitágoras (pré-socrático), Platão, Descartes, Kant chegando
ao apegou na filosofia do alemão Georg Hegel.

Materialistas

Os filósofos materialistas, em contrapartida, pressupõem a matéria como causa de


qualquer concepção de mundo. A matéria de que é feita o mundo é dada para a
percepção. Incluem-se nessa doutrina os filósofos Tales de Mileto (água), Anaximandro
(indeterminação), Anaxímenes (ar), Heráclito (fogo). Em sentido extremo essa doutrina
postula que tudo o que existe no mundo é decorrente de circunstâncias materiais,
inclusive o pensamento e os valores humanos. É o que ocorre no pensamento do
filósofo alemão Karl Marx.

No século VI a. C., os filósofos gregos propuseram uma primeira tentativa de


sistematizar uma “psicologia” ao começarem a especular acerca do homem e sua
interioridade.

O termo Psicologia vem do grego e compõem-se de duas palavras: psyché (alma) logos
(razão). No sentido etimológico, psicologia seria o estudo da alma. Essa ou espírito seria
a parte imaterial do ser humano e englobaria pensamento, sentimentos (amor e ódio),
irracionalidade, desejo, sensação, percepção etc.
Entretanto, o significado de “alma” sofreu transformações através da própria evolução
do pensamento da humanidade, sobretudo a partir da fundação da Psicologia moderna.

Contribuições de três importantes filósofos gregos:

(Sócrates, Platão e Aristóteles)

Os filósofos gregos começaram a buscar respostas racionais para perguntas sobre a


vida humana, sobre as coisas que nos circundam. Perguntas como: de onde viemos?
Para onde vamos? Por que isso é ou não assim? O que fazemos neste planeta?, passaram
a ocupá-los e as respostas que produziram são apresentadas em suas obras.

Sócrates nasceu em Atenas (469 a.C.-399 a.C.) e se tornou um renomado filósofo


ateniense do período da Grécia clássica.

É considerado um dos fundadores da filosofia ocidental sendo, apesar das duras e


contundentes críticas do filósofo alemão do século XIX, Nietzsche (1856-1900), é
reiteradamente considerado um dos mais importantes filósofos de todos os tempos.

Sua filosofia é conhecida principalmente através dos relatos em obras de escritores que
viveram mais tarde, especialmente dois de seus alunos, Platão e Xenofonte, bem como
pelas peças teatrais de seu contemporâneo Aristófanes.

Atribui-se aos diálogos de Platão o relato mais abrangente de Sócrates a ter perdurado
da Antiguidade à atualidade.

A principal preocupação de Sócrates era com o limite


que
separa o homem dos animais. Para tal, situou na RAZÃO (inteligência) a principal
característica humana.

A RAZÃO permitia ao homem sobrepor-se aos seus instintos (base da irracionalidade).

Ao definir a razão como peculiaridade do homem ou como essência humana, Sócrates


abriu um caminho que seria muito explorado pela Psicologia moderna. Isso quer dizer
que as teorias da consciência são frutos dessa primeira sistematização na Filosofia.

Sócrates dizia que a Filosofia não era possível enquanto o indivíduo não se voltasse para
si próprio e reconhecesse suas limitações. Para tal, formulou a máxima que atravessa
séculos e que se expressa sob a forma: "Conhece -te a ti mesmo“. Maiêutica.

É assim que a “Psicologia” na Antiguidade ganha consistência.

Discípulo direto de Sócrates e principal transmissor de sua obra, Platão, que viveu em
Atenas, no período de 428/427 a.C.-348-347 a.C., foi um dos mais importantes filósofos
gregos, sendo recorrentemente referenciado por diversos autores dos mais heterogêneos
campos do saber. Foi quem inicialmente definiu um “lugar” para a razão humana no
corpo (é na cabeça que se encontraria a alma do homem).
Esse filósofo grego concebeu a alma como uma instância separada do corpo. Afirmou
que a medula seria o elemento de ligação da alma (que está na cabeça) com o corpo.
Para ele, quando o homem morria, a matéria (o corpo) desaparecia, mas a alma ficava
livre para ocupar outro corpo e assim sucessivamente.

Assim, podemos considerar Platão como um filósofo que acreditava na existência e na


sobrevivência da alma.

Ler: o mito da caverna de Platão (Capítulo VII de A república)

Aristóteles foi discípulo de Platão e é considerado um dos mais importantes pensadores


da história da Filosofia. Contribuiu demasiadamente com a inovadora postulação de que
alma e corpo não podem ser dissociados. Para esse filósofo, alma é a essência do corpo,
é “a harmonia das funções vitais”.

Psyché: seria o princípio ativo da vida. Tudo o que cresce, reproduz-se e se alimenta
possui uma psyché ou alma. Nesse sentido, os vegetais, os animais e o homem teriam
alma.

Aristóteles retomou o estudo da Natureza, criou métodos de investigação que


influenciaram o desenvolvimento da Ciência moderna, passando inicialmente pelo
pensamento de são Tomás de Aquino e dos empiristas ingleses dos séculos XVI, XVII e
XVIII.

Enfatizou a verificação dos fenômenos através dos sentidos (experiência), para o


estabelecimento do conhecimento confiável, não se prendendo a meras especulações
racionais.

Para o que posteriormente tornou-se a Psicologia moderna, uma das principais


contribuições de Aristóteles foi estudar as diferenças entre a razão, a percepção e as
sensações, tal como podemos encontrar em Do anima, texto considerado o primeiro
tratado no âmbito da Psicologia.

Quanto ao estudo da “alma humana”, há aproximadamente 2.300 anos antes da


Psicologia moderna, já existiam duas correntes filosóficas que nasceram na
Antiguidade, sobreviveram na idade média e modernidade e alcançaram a
contemporaneidade.

A platônica: fundamentada na crença da imortalidade da alma e separada do


corpo.

A aristotélica: fundamentada na ideia da alma como instância mortal e


pertencente ao corpo.

Portanto, posterior ao corte socrático, mas ainda na Antiguidade, no século III a. C.,
surgiram essas duas escolas filosóficas que foram denominadas de ESTOICISMO e
EPICURISMO.
O ESTOICISMO foi a escola filosófica fundada pelo filósofo grego Zenão de Cítio, a
qual aderiram alguns pensadores que passaram a ser designados de estoicos. Esses
afirmavam que todo universo corpóreo é governado por uma razão divina, que lhe
garante a harmonia. Esse universo corpóreo foi denominado de Kosmos.

No plano moral, esses pensadores pregavam a serenidade e a impassibilidade em face da


dor ou do infortúnio. Propuseram que os homens deveriam viver de acordo com a lei
racional da natureza e aconselhavam a indiferença em relação a tudo que é externo ao
ser.

O plano ético dessa escola filosófica baseava-se não no prazer, mas na busca da
felicidade por intermédio da virtude.

Tal como para Aristóteles, que escreveu que não há nada no intelecto que antes não
tenha passado pelos sentidos, pela experiência sensível, para os estoicos, a mente
humana é concebida como uma tabula rasa, uma herança que determinará o pensamento
do filósofo empirista inglês John Locke.

Desse modo, pode-se dizer que o ESTOICISMO é uma escola filosófica materialista.
E, se tudo é material, toda atividade é movimento. Assim também deve-se conceber a
ideia de Deus materialmente, tal como a alma e as propriedades das coisas.

O EPICURISMO foi uma escola filosófica também pertencente aos séculos III e IV a.
C. e que foi fundada pelo filósofo grego Epicuro. Os adeptos dessa escola foram
chamados de epicuristas e afirmavam que a verdade provinha apenas da sensação.

Em oposição aos estóicos, baseavam a ética na experiência do prazer. A busca da


felicidade não era intermediada pela virtude, mas pelo prazer direto, desde que,
entretanto, não fosse buscado egoisticamente ou em prejuízo dos demais.

Os epicuristas acreditavam em deuses, mas defendiam que eles não intervinham no


mundo material.

Historicamente, a passagem das concepções filosóficas antigas às desenvolvidas na era


medieval foi subsidiada por aqueles (os intérpretes da escola de Alexandria e de
traduções latinas) que viveram no período do HELENISMO, termo derivado da obra
do historiador alemão J. G Droysen (MARCONDES, 2014).

Ora, o que vem a ser o HELENISMO?

Esse termo serve para designar, segundo Marcondes (2014, p. 84), “a influência da
cultura grega em toda região do Mediterrâneo Oriental e do Oriente Próximo desde as
conquistas de Alexandre [...] até a conquista romana do Egito em 30 a. C., que passa a
marcar a influência de Roma nessa mesma região”.

Ainda segundo esse autor, “Embora houvesse uma filosofia desenvolvida em Roma e
escrita em latim, ela resultava em grande parte de desdobramentos das escolas
filosóficas gregas, sobretudo o estoicismo e o epicurismo”, escolas que nos deteremos a
seguir.
Antes de chegarmos à Idade Média, iniciada pela queda do último imperador romano
(476 a.C.), mas já na era cristã, surgia o filósofo e teólogo santo Agostinho, que se
tornou bispo de Hipona.

É considerado um dos últimos pensadores da Antiguidade, ao mesmo tempo em que é


um dos primeiros filósofos medievais, pois sua obra influenciou os rumos do
pensamento medieval em seus primeiros séculos. O que se tornou conhecido através da
sua pena como platonismo cristão, é a síntese entre o pensamento cristão e a filosofia
grega.

Marcondes (2014, p. 111) eleva-o ao lugar de “filósofo mais importante, devido à sua
criatividade e originalidade, a surgir no pensamento antigo desde Platão e Aristóteles”.
Também o considera “um pensador do final do período antigo, ainda profundamente
ligado aos clássicos, mas já refletindo em sua visão de mundo e em suas preocupações
as grandes mudanças pelas quais passa sua época e prenunciando o papel que o
cristianismo terá na formação da cultura ocidental, para o que contribui de forma
decisiva” (MARCONDES, 2014, p. 111).

Das três contribuições ao desenvolvimento da filosofia destacadas por Marcondes


(2014, p. 112), a segunda é particularmente relevante para nosso enfoque. Trata-se da
sua “teoria do conhecimento em ênfase na questão da subjetividade e da interioridade”.

Inspirado na filosofia platônica, transmitida pelos intérpretes de Alexandria, sobretudo


por neoplatônicos como Plotino e Porfírio, e articulando-a aos ensinamentos de são
Paulo e do Evangelho de são João, Agostinho “se pergunta então como pode a mente
humana, mutável e falível, atingir uma verdade eterna com certeza infalível”
(MARCONDES, 2014, p, 113 grifo nosso).

A resposta a essa questão encontra-se no âmago de sua TEORIA DA ILUMINAÇÃO


DIVINA, elaborada com base na teoria platônica da reminiscência (em Ménon e A
república).

Atingir uma verdade eterna é condição de possibilidade para o conhecimento e esse


supõe algo de prévio. Nesse sentido, sua posição é inatista, pois supõe que o
conhecimento não é derivado inteiramente da apreensão sensível ou da experiência
concreta, necessitando de um conhecimento prévio que sirva de ponto de partida para o
próprio processo de conhecer.

Não se restringido à tese platônica, Agostinho introduz sua contribuição com a teoria da
interioridade e da iluminação. Marcondes (2014) o considera o primeiro a desenvolver,
com base em concepções neoplatônicas e estoicas, uma noção de INTERIORIDADE
que prenuncia o conceito de SUBJETIVIDADE do pensamento moderno. Em sua
filosofia encontra-se a oposição (interior-exterior) e a concepção de que a interioridade
é o lugar da verdade. É olhando para a sua interioridade que o homem a descobre ou
“no homem interior habita a verdade”. Essa interioridade “é dotada da capacidade de
entender a verdade pela iluminação divina” (MARCONDES, 2014, p. 114). A mente
humana, acrescenta Marcondes (2014, p. 114), “possui uma centelha do intelecto divino,
já que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus. A teoria da iluminação vem
assim a substituir a teoria platônica da reminiscência, explicando o ponto de partida do
processo de conhecimento e abrindo o caminho para a fé”. (MARCONDES, 2014, p.
114).

Dando um extenso salto, o pensamento psicológico foi amplamente silenciado ao longo


da Idade Média, subjugado pelos dogmas cristãos. Ainda assim, temos dele notícias
através de importantes pensadores que estavam fortemente influenciados pelo
pensamento cristão, na medida em que o cristianismo era a principal religião da Idade
Média e nessa época havia uma implacável supremacia da Igreja Católica Apostólica
Romana sobre o pensamento filosófico e científico.

Algumas das características desse momento era a autoridade da Igreja ao impor sobre os
homens sua doutrina como verdade que não podia ser questionada. A razão foi amalgada
à fé, permanecendo quase indissociáveis. Temendo perder a autoridade, a Igreja, por
meios dos seus representantes, reprimia toda ideia que poderia traçar novos caminhos
para a ciência, impedindo seu livre desenvolvimento.

Nesse extenso período (aproximadamente 10 séculos), pouco conhecimento a ciência


acumulou. O interesse pelos fenômenos naturais era nocivo para a salvação da alma. A
concepção de homem que se tinha estava restrita aos dogmas cristãos. Era baseada no
princípio de que o homem era a imagem e semelhança de Deus, que seu comportamento
estava sujeito somente à vontade divina.

Nesse sentido, o homem não podia ser objeto de investigação científica, pois o corpo era
representado como sacrário da alma.

Apesar da forte pressão exercida pela Igreja, particularmente alguns pensadores como
santo Anselmo, conseguiram destacar-se, mas, sem dúvida, foi são Tomás de Aquino,
filósofo e teólogo que pertenceu ao período da alta escolástica, quem conseguiu
reorientar o pensamento Ocidental para o campo da investigação filosófica.

São Tomás de Aquino é considerado o príncipe da escolástica. Ao contrário de


Agostinho, Aquino não considerou a filosofia platônica, mas a aristotélica, sobretudo
por meio dos seus intérpretes árabes, destacando-se a pena de Averróis. Isso quer dizer
que no pensamento de Aquino alma e corpo eram indissociáveis. A alma não habita o
corpo, ela o anima, como escreveu Aristóteles em Do anima.

Ao buscar a distinção aristotélica entre essência e existência, Aquino postulou que o


homem, na sua essência, busca a perfeição através de sua existência. Entretanto, ao
Contrário de Aristóteles, afirmou que somente Deus seria capaz de reunir a essência e a
existência. O homem busca a perfeição a medida que busca a Deus. Assim, a alma, a
essência, seria o elo de ligação entre o homem e Deus, o que conduziria a mortalidade à
imortalidade. Aquino ainda ofereceu argumentos racionais para justificar os dogmas da
Igreja.

Da Antiguidade à Idade Média, acompanhamos, de forma breve e panorâmica, as ideias


psicológicas nessas duas idades da História a partir dos argumentos de Sócrates, Platão
e Aristóteles, das escolas estoicismo e epicurismo, de santo Agostinho e são Tomás de
Aquino. Esse último revela em sua obra o interesse que muitos dos seus
contemporâneos tinham acerca da pesquisa filosófica fora dos limites eclesiásticos
sustentados pela escolástica. Poucos séculos depois, assistimos a grande produção
artística e cultural que ensejou o Renascimento, abrindo caminhos para uma nova idade
histórica, a IDADE MODERNA, como sua ideia de progresso e valorização do
homem.

Bibliografia

BENJAMIN JR., L. T. Uma Breve História da Psicologia Moderna, LTC, 2009.

MARX, M. H., HILLIX, W. A. Sistemas e teorias em psicologia. São Paulo: Cultrix,


1998.

SCHULTZ, D. P., SCHULTZ, S. E.; História da psicologia moderna. São Paulo:


Cengage Learning, 2009.

Bibliografia complementar:

BOCK, A. M.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: Uma introdução ao


estudo de Psicologia. São Paulo: Saraiva, 1998.

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