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CURSO DE ATUALIZAÇÃO DE TÉCNICA DE POLÍCIA

JUDICIÁRIA MILITAR

Noções de Direito Militar

Teoria Geral do Direito


Definição e Ramos do Direito Militar
OBJETIVOS DESTA AULA

Nesta aula você irá:

Conhecer a Teoria Geral do Direito conhecendo a sua Definição,


bem como ter noção do conceito de Direito Militar e seus
ramos norteadores.
DISCIPLINA: NOÇÕES DE DIREITO MILITAR
UNIDADE DIDÁTICA I: NOÇÕES DE DIREITO MILITAR
 
SUMÁRIO
UNIDADE I – NOÇÕES DE DIREITO MILITAR
1.1) Teoria Geral do Direito
1.1.1 - Definição de Direito
1.2) - Definição e ramos do Direito Militar
1.2.1 Definição de Direito Militar
Escola brasileira do Direito Militar
1.2.2) Ramos dos Direito Militar
I - Direito Constitucional Militar
II – Direito Penal Militar
III– Direito Processual Penal Militar
IV – Direito Administrativo Militar
V – Direito Previdenciário Militar
VI - Direito Internacional dos Conflitos Armados (ou Direito Internacional
Humanitário
Unidade I – NOÇÕES DE DIREITO MILITAR
 
Teoria Geral do Direito
 
1.1.1 - Definição de Direito
  Definir um objeto significa indicar o seu verdadeiro sentido, ou seja, a
sua significação precisa.
Ao se procurar apresentar uma definição do Direito, primeiramente,
deve-se ter em mente que o vocábulo “direito” compreende enfoques e
significados diversos. Exemplificando, o termo em questão pode ser utilizado
para significar o justo, ou o conjunto de normas jurídicas, ou a prerrogativa
que tem a pessoa de fazer valer determinada posição jurídica etc.
O Direito, assim, pode ser visto sob diversas perspectivas, como as que
seguem: Direito como justiça, Direito como ordenamento jurídico, Direito
como direito subjetivo..
Há os mais diversos conceitos de Direito, variando conforme as
diferentes Escolas e Teorias seguidas pelos autores.
Apresentamos, aqui, o conceito de Direito em seu aspecto objetivo,
entendido como a realidade, presente na vida social, que regula as relações
entre as pessoas.
Nesse enfoque, o Direito pode ser definido como o conjunto de
normas imperativas que regulam a vida em sociedade, dotadas de
coercibilidade quanto à sua observância.
Os seres humanos, por viverem em sociedade, necessitam de regras e
princípios que possibilitem o convívio entre as pessoas, permitindo a
evolução, a harmonia e a paz nas relações sociais . O Direito é justamente
esse conjunto de normas, estabelecidas com essa finalidade.
Os preceitos jurídicos são normas imperativas de comportamento, no sentido de
que a sua observância é obrigatória.
Para se alcançar essa imperatividade, as normas jurídicas são dotadas de
coercibilidade, que é a possibilidade de se ter a coação, como forma de constranger
(obrigar) a pessoa ao cumprimento da norma jurídica. Isso ocorre mediante a previsão
e a imposição de sanção, aplicada de forma organizada, pela autoridade constituída,
ou seja, pelo órgão para isso instituído, de modo a garantir o respeito à ordem
jurídica.
A sanção, assim, é a consequência jurídica prevista pela norma de Direito, no
caso do seu descumprimento. A coação, por sua vez, é a aplicação efetiva da sanção.
O Direito é dotado de coercibilidade, ou seja, possibilidade de haver a coação,
significando a coação potencial .
IMPERATIVIDADE: obrigatoriedade.

COERCIBILIDADE: possibilidade de aplicar o que determina a Norma.

COAÇÃO (ação de constranger, ou seja, compelir, mediante força organizada, o


cumprimento obrigatório da norma jurídica).

SANÇÃO: consequência pelo descumprimento da norma, aplicada de forma organizada


e predeterminada com o objetivo de garantir o respeito à ordem jurídica.
Deve-se registrar ainda que, na atualidade, além das
tradicionais sanções de natureza punitiva, as quais apresentam
“intimidação” para que não sejam desrespeitadas as normas
jurídicas, observam-se as chamadas “sanções premiais”, as quais
oferecem incentivos e vantagens aos obrigados que cumpram certos
preceitos jurídico-normativos (por exemplo, estabelecendo desconto
ao contribuinte que paga o tributo antes do vencimento) .
Aponta-se, ainda, que o elemento essencial do Direito é a chamada
bilateralidade atributiva, ou seja, “uma proporção intersubjetiva, em
função da qual os sujeitos de uma relação ficam autorizados a pretender,
exigir, ou a fazer, garantidamente, algo.
Desse modo, o Direito sempre envolve uma relação entre
duas ou mais pessoas, significando a bilateralidade. Além disso,
para que se trate de Direito, é essencial que se tenha a atribuição
garantida de uma pretensão ou ação (atributividade) .
A atributividade, assim, significa a “qualidade inerente à
norma jurídica de atribuir, a quem seria lesado por sua eventual
violação, a faculdade de exigir do violador, por meio do poder
competente, o cumprimento dela ou a reparação do mal sofrido” .
Acrescente-se, ainda, que, apesar da definição acima
apresentada, não se adota a posição restritiva de que o Direito se
limita às normas positivadas pelo Estado.
Efetivamente, o Direito, como realidade e experiência social,
leva em conta os fatos sociais, procurando garantir que valores
reconhecidos como necessários sejam preservados. Observa-se,
portanto, uma unidade envolvendo fato – valor – norma
O Direito, assim, é a ordenação das relações sociais baseada
na “integração normativa de fatos e valores” .
Além disso, mesmo sob o ângulo do Direito como conjunto
de normas jurídicas, estas não são postas exclusivamente pelo
Estado, uma vez que a ordem jurídica reconhece poder normativo a
certos grupos sociais e mesmo às pessoas em suas relações em
sociedade .
Nesse sentido, temos, por exemplo, as normas coletivas
produzidas pelos atores sociais, como os entes sindicais, ao firmarem
convenções e acordos coletivos de trabalho, regendo as relações de
trabalho. Os próprios particulares também possuem o poder negocial,
decorrente da autonomia privada, permitindo firmarem negócios jurídicos,
com o fim de reger relações individuais, desde que dentro de limites
permitidos pelo sistema jurídico.
Assim sendo, uma outra forma de definir o Direito pode ser assim
enunciada: ordenação imperativa, atributiva e coercível da conduta
humana, como forma de assegurar valores necessários à regulação da vida
em sociedade.
Em última análise, a Teoria Geral do Direito pode ser entendida como a
ciência da realidade jurídica, apresentando noções comuns a todas as ordens
jurídico-positivas, como as de fonte do Direito, relação jurídica, fato jurídico,
sujeito de direito, norma jurídica etc. Essas noções jurídicas mais gerais são,
assim, utilizadas pela Ciência do Direito , mas as suas conclusões também são
aplicáveis à Sociologia Jurídica, à História do Direito etc. A Teoria Geral do
Direito, desenvolvendo-se no plano do conhecimento positivo do Direito, procura
determinar as “estruturas lógicas da experiência jurídica em geral”, elaborando
princípios e generalizações conceituais, determinando os seus conceitos básicos .
Cabe à Teoria Geral do Direito, assim, “formular os conceitos jurídicos
fundamentais, indispensáveis ao raciocínio jurídico
1.2) Definição e ramos do Direito Militar
1.2.1 Definição de Direito Militar
Segundo Jorge Cezar de Assis, por Direito Militar há que se
entender todo o conjunto legislativo que está ligado, de uma forma ou
outra, ao sistema que envolve tanto as Forças Armadas Brasileiras,
como aquelas que são consideradas suas Forças Auxiliares: as
polícias militares e os corpos de bombeiros militares e do Distrito
Federal.
Até mesmo pela ausência de estudos mais aprofundados sobre o tema,
costuma-se ter a ideia de que a expressão Direito Militar estaria a referir-se
apenas ao Direito Penal Militar e ao Direito Disciplinar Militar, implicando
restrições ao seu conceito.
Daí por que necessário conhecer toda a legislação material que se refere
à organização e funcionamento das Forças armadas, incluindo as Polícias
Militares e os Bombeiros Militares. Não se pode perder de vista, no entanto,
que há uma visão de senso comum que observa o Direito Militar apenas
como Direito Penal Militar e o Direito Disciplinar Militar.
Entender a estrutura e a organização das Forças Armadas, das
Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares, seu modus
vivendi próprio, além de usos e costumes militares que lhe são
peculiares se faz, portanto, necessário.

Assim, Jorge Cezar de Assis afirma que:


A sociedade militar é peculiar;
Possui modus vivendi próprio;
Todavia, submeter-se aos princípios gerais do direito, amoldando-se ao
ordenamento jurídico nacional; pode-se e deve ser submetida ao controle
judicial do qual a ninguém é dado furtar-se.
Esta peculiaridade exige sacrifício extremos (a própria vida), que é mais
do que simples risco de serviço das atividades tidas como penosas ou
insalubres como um todo.
Para condição tão especiais de trabalho, especial também será o regime
disciplinar, de modo a conciliar tanto os interesses da instituição como os
direitos dos que a ele se submetem. A rigidez do regime disciplinar e a
severidade das sanções não podem ser confundidas com supressão de
direitos”.
Recebe o nome de direito militar o ramo do direito dedicado aos assuntos
jurídicos relacionados às forças armadas e aos militares estaduais. O direito militar é
conhecido também pelo nome de direito castrense, palavra de origem latina, que
designa o direito aplicado nos acampamentos do Exército Romano. De fato, a
origem deste segmento remonta ao direito romano, onde foi criado para manter a
disciplina nas legiões.
O conteúdo deste ramo do direito alcança tanto aos militares federais, que
são os integrantes das Forças Armadas, Exército Brasileiro, Marinha de Guerra e
Força Aérea Brasileira, como aos militares estaduais, que são os integrantes das
Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares.
Como visto o direito militar trata de uma categoria de funcionários
públicos considerados especiais, com direitos e prerrogativas que na sua
maioria são assegurados a funcionários civis. Ao mesmo tempo, os militares
estaduais ou federais possuem direitos especiais e obrigações diferenciadas,
como por exemplo, o sacrifício da própria vida no cumprimento de missão
constitucional, (o chamado tributo de sangue ou tributus sanguinis).
Assim, o legislador constituinte originário deu aos militares o direito de
serem processados e julgados perante uma justiça especializada, a Justiça
Militar da União ou a Justiça Militar dos Estados e do Distrito Federal.
Cabe mencionar que o Direito Militar adquiriu importância
com a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808, a partir
do primeiro tribunal da nação, o Conselho Militar e de Justiça, que se
transformaria no Superior Tribunal Militar, STM, atualmente com
sede em Brasília, cuja jurisdição atinge todo o território nacional. De
acordo com a constituição, o STM é considerado um Tribunal
Superior, mas na prática funciona como um tribunal de segundo grau,
já que não existe na estrutura judiciária nacional um Tribunal
Regional Militar.
Muitos defendem a extinção da justiça militar, por
considerarem sua simples existência um privilégio, já que em várias
ocasiões esta prevê julgamento em separado para militares que
cometeram a mesma infração do civil. Já os defensores de sua
existência entendem que o direito militar visa proteger não apenas os
militares em si, mas sim as instituições militares, estaduais, do
Distrito Federal ou da união. Na área penal, inclusive, as penas são
em grande parte mais rígidas que aquelas que se encontram
estabelecidas no vigente Código Penal Brasileiro.
1.2.2 - Ramos dos Direito Militar
Dentro do direito militar, o ramo que mais se destaca é o direito
penal militar. Além deste, merecem destaque o direito processual penal
militar, administrativo militar, disciplinar militar e previdenciário
militar, além do direito internacional dos conflitos armados, composto
por normas internacionais adotadas pelo Brasil, e que são do interesse
da classe militar.
I - Direito Constitucional Militar

A primeira referência à matéria militar encontrada no texto da


Constituição em vigor ocorre no campo dos direitos e garantias
fundamentais, mais exatamente no inciso VII do art. 5º que assegura a
prestação de assistência religiosa em entidades militares de internação
coletiva.
O mesmo art. 5º, no inciso XLIV, afirma constituir crime
inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou
militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
O inciso LXI do art. 5°, quando se cuida das formalidades necessárias à
prisão, disciplina matéria militar ao legitimar exclusão odiosa à liberdade de
locomoção nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos
em lei.
O inciso VI do parágrafo terceiro do art. 12 da Constituição estabelece que
são privativos de brasileiros natos, dentre outros os cargos de oficial das Forças
Armadas.
No campo dos direitos políticos o parágrafo segundo do art. 14 da
Constituição cuida da vedação do alistamento no período de serviço militar
obrigatório.
O artigo 20 da Constituição da República inclui entre os bens
da União as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras,
das fortificações e construções militares.

Ao disciplinar a competência da União o inciso XIV do art. 21


da Constituição, por sua vez, estabelece, dentre outras disposições de
organizar e manter a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do
Distrito Federal.
Ao definir a competência legislativa privativa da União o art.
22 da Constituição estabelece que compete privativamente à União
legislar sobre: requisições civis e militares, em caso de iminente
perigo e em tempo de guerra (inciso III) e normas gerais de
organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e
mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares
(inciso XXI) e defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima,
defesa civil e mobilização nacional (inciso XXVIII).
Ao reger o Distrito Federal, o parágrafo quarto do art. 32 da
Constituição remete ao legislador infraconstitucional a edição de lei
que disponha, dentre outros sobre a utilização pelo governo do
Distrito Federal da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiro Militar.
No campo da organização do Estado, mais exatamente da
Administração Pública, a Constituição reservou capítulo para os
militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios (art. 42).
Embora não seja matéria propriamente militar, mas sim de
organização judiciária e de repartição da "jurisdição", quando cuida
da organização dos Poderes, mais exatamente do Poder Judiciário, a
Constituição dispõe acerca da competência para julgar matéria militar,
estabelecendo uma disciplina harmônica na matéria, mercendo relevo
os comandos dos artigos 122 a 124 que cuidam dos Tribunais e Juízes
Militares.
Os parágrafos terceiro e quarto do art. 125 da Constituição
traçam os parâmetros para instituição da Justiça Militar nos Estados e
sua competência.
Adotando critério orgânico ou subjetivista o legislador
constituinte no art. 142 cuidou no âmbito da defesa do Estado e
das organizações democráticas das "Forças Armadas".
Note-se que no art. 142 contém regras que definem o
caráter mesmo da matéria militar em nosso país, regras e
princípios estes que não se cingem apenas às forças armadas
enquanto órgãos, mas à noção mesma que seja "militar" e
"militarismos" no Estado de direito posto.
No capítulo das "Forças Armadas" o legislador traçou os princípios
constitucionais militares, o perfil orgânico das Forças Armadas e o quadro
básico de direitos, deveres e sujeições dos militares.
O art. 143 da Constituição, por seu turno disciplinou o serviço militar
obrigatório.
Por fim, o art. 144 da Constituição, ocupado com a segurança pública,
relacionou entre os órgãos incumbidos da preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio as polícias militares e corpos de
bombeiros militares, definindo-lhes a competência (parágrafo quinto) e suas
vinculações às Forças Armadas (parágrafo sexto).
II – Direito Penal Militar
Quanto aos aspectos jurídico-penais já está pacificada na doutrina
a existência de um ramo especial do direito penal (direito penal
especial, portanto), que versa sobre os peculiares institutos que são
objeto de estudo próprio do direito penal militar. Os penalistas são
unívocos na tese de que o direito penal militar realmente ostenta a
condição de direito penal especial, seja pelo trato singular conferido
aos seus temas e pelo objeto particular sobre o qual recai sua tutela,
seja ainda pela especialização do Órgão jurisdicional incumbido de
sua aplicação.
O arcabouço penal militar envolve temas de elevada indagação,
como a teoria do crime militar e a teoria da sanção penal militar, com
contornos absolutamente distintos dos versados no direito penal
comum. Primeiramente deve-se dizer que o estudo detido do tipo penal
militar oferece campo de reflexão científica bastante largo, mormente
pelo fato de que não se tem como fácil a tarefa de conceituar e
classificar o crime militar.
A Constituição de 1988 até faz referência no art. 5º, LXI, nos
seguintes termos: “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou
por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei” (grifei). Contudo, não há no
ordenamento positivo brasileiro, qualquer conceito legal de crime
propriamente militar, havendo, tão-somente, os recursos predispostos
no art. 9º e 10, do estatuto repressivo militar (Decreto-Lei 1.001/69),
que contempla regra de extensão ou de tipicidade indireta.
Novamente se invoca o magistério de Álvaro Mayrink da Costa,
para o qual “a distribuição da matéria na parte especial do Código Penal
Militar é diferente da adotada no Código Penal comum. No Militar,
compreende 8 títulos divididos em capítulos, e estes, algumas vezes, em
seções, na seguinte sequência:
1 – crimes contra a segurança externa do país;
2 – crimes contra a autoridade ou disciplina militar;
3 – crimes contra o serviço e o dever militar;
4 – crimes contra a pessoa;
5 – crimes contra o patrimônio;
6 – crimes contra a incolumidade
7 – crimes contra a administração militar;
8 – crimes contra a administração da Justiça Militar.
Quanto ao sistema de penas, impende destacar o
elevado grau de severidade das sanções previstas tanto em
tempo de paz, quanto em tempo de guerra – ocasião em que
é admissível até a pena capital, com amparo da própria
Carta Constitucional, art. 5º XLVII, “a”.
Além de penas privativas rígidas, o direito penal militar prevê
também outras modalidades de penas específicas, como impedimento,
suspensão do exercício do posto ou graduação, reforma. Há também as
chamadas penas acessórias, das quais avulta-se como uma das mais
pesadas, a exclusão das forças armadas.
Não bastasse o rigor das penalidades previstas no ordenamento
punitivo castrense, é oportuno mencionar que há vedações que
inviabilizam a adoção de penas alternativas ou de medidas
despenalizantes, nos moldes daquelas erigidas pela Lei 9.099/95, que
implantou, no Brasil, os Juizados Especiais.
Tudo isso faz emergir um conjunto de preceitos completamente
singulares, com traços marcantes e dissociados do direito penal comum, a
justificar, por isso mesmo, um estudo muito mais direcionado.
Com muita razão, por conseguinte, Álvaro Mayrink da Costa, quanto
afirma:
“Destarte, mais por comodidade do que por convicção científica, não são
poucos os que ainda consideram o Direito Penal Militar como um simples
satélite do Direito Penal comum, destituído de condições necessárias para
aspirar à consagração de uma disciplina jurídica autônoma”.
Hodiernamente, já se assistem a ensaios frutuosos que visam
dissecar o fenômeno penal militar, em seus ângulos mais particulares,
com desenvolvimento de estudos acerca, por exemplo, da aplicabilidade
da teoria da imputação objetiva na análise da estrutura do crime militar
culposo e da co-autoria em crime militar.
O certo é que há muito o que se fazer para retirar o direito penal
militar da sombra a que vem sendo relegado durante tanto tempo, sem
que se tenha intentado avançar no trato científico de seus princípios e
institutos.
III– Direito Processual Penal Militar
  O devido processo penal militar também representa garantia
fundamental para todo aquele que venha a responder pela prática de
um crime perante a Justiça Militar. Em razão disso, muito
naturalmente vicejou o direito processual penal militar ao lado do
direito substantivo, explicitando os ritos e as formas pelas quais
deveria gizar o processo no âmbito jurisdicional castrense.
Importa salientar que, embora haja muita similitude dos
procedimentos adotados na seara militar com aqueles decorrentes
do processo comum, não é menos certo que há diferenças e
particularidades próprias deste ramo especial, sobretudo por
adotar o denominado sistema de escabinato
É que, para atender à instrumentalização ou formalização do
direito material castrense, notório que o direito processual penal
militar também reflita dita especialização, absorvendo os princípios
próprios de tal ordenamento, de sorte que o processo penal militar está
todo ele permeado pela hierarquia e disciplina, desde a fase em que o
antecede (Inquérito Policial Militar), até o contraditório propriamente
falando, assegurando-se a harmônica aplicação de tais parâmetros
substantivos, embora jamais se afastando dos dogmas constitucionais
que a tudo rege.
O direito processual penal militar tem por objeto, portanto, a
aplicação do direito penal militar, podendo ser conceituado, como o
complexo de normas e princípios que trata das formas de aplicação
da lei penal militar e de suas sanções.
A estrutura da Justiça Militar em tempo de paz e em tempo de
guerra está prevista no Código de Processo Penal Militar (Decreto-lei
1002/69) e na Lei de Organização Judiciária Militar da União (Lei
8.457/92).
Incumbe, constitucionalmente, à Justiça Militar processar e julgar os
crimes militares previstos em lei, sendo certo que para bem aplicar as normas do
direito penal militar, os integrantes de tal foro especial, são concursados, da mesma
forma que os membros do Ministério Público Militar que atuam em tal contexto
jurisdicional. Eis a razão que levou José Frederico Marques, a tecer as seguintes
considerações:

“A justiça militar é das poucas jurisdições especiais cuja existência se justifica. Não se trata
de um privilégio de pessoas, mas de organização decorrente, como lembra Astolpho
Rezende, das 'condições especiais' que ligam pessoas e atos de índole particular atinentes ao
organismo militar, como também pela natureza das infrações disciplinares, aptas a
comprometer a ordem jurídica e a coesão dos corpos militares”.
Também é indispensável que o direito processual penal militar
seja frequentemente visitado, objetivando o melhor desenvolvimento
de suas normas e institutos, inclusive com a perspectivação de que haja
uma reforma de alguns ritos e aplicação de novos institutos, como a
suspensão condicional do processo.
IV – Direito Administrativo Militar
No denominado contexto administrativo militar, revelam-se
inumeráveis institutos e princípios jurídicos, escassos são os estudos
científicos voltados para a explicitação de seus contornos e matizes,
acarretando uma lacuna, que, em verdade, não poderia ignorar a ampla
gama de consequências jurídicas projetadas por este ramo especial e
particular do direito administrativo a que se denomina direito
administrativo militar.
Ramo especialíssimo do Direito Administrativo, o Direito
Administrativo Militar não discrepa do conceito de Direito
Administrativo, antes com ele se coaduna, enfocando o tema pertinente
à relação do servidor militar federal (integrantes das Forças Armadas)
e do servidor militar estadual (integrantes da Polícia Militar e do
Corpo de Bombeiros de cada Estado, do Distrito Federal e dos
Territórios) com a respectiva Força ou Corporação.
Estuda o campo dos direitos e obrigações dos servidores
militares ativos e inativos (reformados ou da reserva), arrimado na
Constituição Federal e em diversas fontes legais esparsas (leis,
decretos, regulamentos e portarias aplicadas a tal categoria de
servidores), enfatizando os aspectos da inclusão ou ingresso no
serviço ativo militar, remuneração, promoção, direitos decorrentes
da passagem à situação de inatividade, deveres e obrigações,
prerrogativas do exercício da função militar, pensão militar etc.
Adicionado a isso, trabalha com o conceito de administração militar,
sinalando seus princípios estruturais e os balizamentos que dão substrato à
atuação dos diversos órgãos administrativos militares e seus agentes.
Deste modo, o Direito Administrativo Militar pode ser entendido
como sub-ramo do Direito Administrativo Comum, que, através de um
conjunto de princípios jurídicos entrelaçados, disciplina e regula a atuação
dos órgãos militares, dos agentes/servidores militares, objetivando atingir a
função constitucional reservada às Forças Militarizadas.
Semelhantemente ao berço de sua origem, já que o direito
administrativo militar é um ramo especial do direito administrativo lato
sensu, sua posição situa-se no contexto do direito público, regendo-se
pela persecução do interesse público ou comum, na medida em que
consagra as normas e os princípios reguladoras da atuação das
organizações castrenses, voltadas ao desempenho de funções típicas do
Poder Público, indelegáveis ao segmento privado, por expressa
definição constitucional, como sejam as funções de segurança externa e
as de segurança interna.
V – Direito Previdenciário Militar
É relevante frisar que os militares possuem um regime
previdenciário próprio, dadas as próprias e inafastáveis peculiaridades
do ofício castrense – sujeito, não raras vezes, a toda sorte de sacrifícios,
com muitos reflexos na vida pessoal e familiar.
Tudo isso reclama um modelo particular, com normas que
resguardem o profissional das armas das inevitáveis ocorrências ao
longo do desempenho da atividade abraçada.
Neste sentido, o direito previdenciário militar se apresenta como
sendo um ramo especial voltado para o estudo das normas, princípios e atos
decorrentes da inativação dos militares, abrangendo a reserva, a reforma, as
pensões militares e outros benefícios de natureza assistencial-previdenciário.
Convém asseverar que o direito previdenciário militar regula vários
tipos de inativação, bem como diversas modalidade de pensões militares,
incluindo aquelas decorrentes de participação em operações bélicas,
denominadas de pensões de ex-combatente e outras de natureza especial.
Por outro lado, ocorrem muitos acidentes em serviços, pela
própria natureza arriscada da atividade, a exigir adequação aos
regramentos que ensejam proteção ao militar invalidado ou
incapacitado para o ofício militar. Tudo isso é tratado neste campo
jurídico especializado, com profusa quantidade de normas e processos
específicos de formalização dos atos de reforma ou de assistência
médico-hospitalar, com os benefícios inerentes. Tal ramo ainda está se
formando, havendo poucos trabalhos doutrinários sobre seus institutos.
VI - Direito Internacional dos Conflitos Armados (ou Direito
Internacional Humanitário)
O direito internacional dos Conflitos Armados pertence aos
domínios do direito internacional público, mas seu estudo é de
suma importância para os que laboram com o direito militar lato
sensu. É que suas normas interferem, necessariamente, na
construção do direito militar interno de todo e qualquer país,
máxime os signatários do estatuto penal de Roma.
Destarte, envolve, por exemplo, o estudo das normas adotados
pelo Brasil, em matéria de Conflitos Armados, inclusive aquelas
pertinentes ao estatuto penal de Roma e ao Tribunal Penal Internacional.
Torna-se, pois, uma ramo de grande impacto para as esferas
militares, visto que apresenta o rol de regras que, atualmente, regulam o
direito de guerra, as questões emergidas ao longo de um conflito armado, a
conduta que deve presidir as operações bélicas, os direitos e deveres dos
militares durante uma conflagração, a proteção dos direitos humanos
durante o conflito, dentre outros.
É correto dizer que o Brasil é signatário de várias normas de caráter
internacional sobre conflitos armados, embora nem sempre tenha cuidado de
adequá-las, internamente, para sua plena vigência e eficácia. O estudo do Direito
Internacional dos Conflitos Armados representa, destarte, fundamental passo na
análise de tais aspectos, até para precisar as responsabilidades do país em relação
às tropas militares que sejam deslocados para atuar em missões de paz ou mesmo
em conflitos armados que, eventualmente, venham a ser deflagrados.
Questões atinentes aos direitos humanos, ao uso de minas antipessoais e
armas químicas, por exemplo, devem merecer o acurado exame, com a introdução
da disciplina em todas as Academias de formação militar.
 
REFERENCIAS

Cf. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua


portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 926.
Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 1, p. 3:
“não se pode conceber a vida social sem se pressupor a existência de um certo número de
normas reguladoras das relações entre os homens, por estes mesmo julgadas obrigatórias”.
Cf. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 2: “o
Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois
nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção e solidariedade”.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 69: “Pela palavra coercibilidade entendemos a possibilidade
lógica da interferência da força no cumprimento de uma regra de direito”.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 71: “O Direito [...] é de tal natureza que implica uma
organização do poder, a fim de que sejam cumpridos os seus preceitos. Como as normas
jurídicas visam a preservar o que há de essencial na convivência humana, elas não podem ficar
à mercê da simples boa vontade, da adesão espontânea dos obrigados. É necessário prever-se a
possibilidade do seu cumprimento obrigatório. Quando a força se organiza em defesa do
cumprimento do Direito mesmo é que nós temos a segunda acepção da palavra coação”.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 72-74: “As formas de garantia do cumprimento das regras
denominam-se ‘sanções’. Sanção é, pois, todo e qualquer processo de garantia daquilo que se
determina em uma regra. [...] O que caracteriza a sanção jurídica é a sua predeterminação e
organização”.
Cf. RODRIGUES, Silvio. Op. cit., p. 4: “À medida que as sociedades evoluem e se
organizam politicamente, a sanção, em vez de se manifestar pela própria reação do ofendido,
parte da autoridade constituída. Esta atribui à norma força coercitiva, impondo, por
conseguinte, sua observância”.
Cf. DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 19. ed. São Paulo:
Saraiva, 2008. p. 378: “Exemplificativamente: a multa contratual é sanção, e a cobrança
judicial dessa multa é coação”.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 48-49.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 76-77.
REALE, Miguel. Op. cit., p. 49
Cf. MARTINS, Sergio Pinto. O pluralismo do direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 2001. p.
62: “Fontes heterônomas são as que vêm de fora da vontade das partes e são emanadas do
Estado. Exemplos: as Constituições, as leis, os decretos, as sentenças normativas. Fontes
autônomas são oriundas das próprias partes, como o contrato de trabalho, o regulamento de
empresa, a convenção e o acordo coletivo”.
REALE, Miguel. Op. cit., p. 51.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 51-52.
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 382.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 65: “a) onde quer que haja um fenômeno jurídico, há, sempre
e necessariamente, um fato subjacente (fato econômico, geográfico, demográfico, de ordem
técnica etc.); um valor, que confere determinada significação a esse fato, inclinando ou
determinando a ação dos homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou
objetivo; e, finalmente, uma regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra
um daqueles elementos ao outro, o fato ao valor; b) tais elementos ou fatores (fato, valor e
norma) não existem separados um dos outros, mas coexistem numa unidade concreta; c) mais
ainda, esses elementos ou fatores não só se exigem reciprocamente, mas atuam como elos de
um processo (... o Direito é uma realidade histórico-cultural), de tal modo que a vida do
Direito resulta da interação dinâmica e dialética dos três elementos que a interagem”.
Cf. DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 246.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 77: “na realidade, existe Direito também em outros grupos,
em outras instituições, que não o Estado. [...] Parece-nos, pois, procedente a teoria da
pluralidade das ordens jurídicas positivas”.
Cf. DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 220.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 18: “É claro, portanto, que a Ciência Jurídica se eleve ao plano
de uma Teoria Geral do Direito, que [...] representa a parte geral comum a todas as formas de
conhecimento positivo do Direito, aquela na qual se fixam os princípios ou diretrizes capazes
de elucidar-nos sobre a estrutura das regras jurídicas e sua concatenação lógica, bem como
sobre os motivos que governam os distintos campos da experiência jurídica”.
Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 329.
Cf. GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 45. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2012. p. 17, destaques do original.
 ASSIS. Jorge Cesar. Curso de Direito Disciplinar Militar. 2ª ed. Revisada e Atualizada -
Curitida: Juruá: 2011.
 DIREITO CONSTITUCIONAL - PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS, disponível em
http://resumojuridicoaqui.blogspot.com.br/2015/12/direito-constitucional-principios.html.
Acesso em 01/10/2017.
 DUARTE, Antônio Pereira. Visão científica da ordem jurídica militar. In: Âmbito Jurídico,
Rio Grande, XI, n. 60, dez 2008. Disponível em: <
http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4
588
>. Acesso em set 2017.
GRACIA, Gustavo Filipe Barbosa Introdução ao estudo do direito : teoria geral do direito /
Gustavo Filipe Barbosa Garcia. – 3. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense: São Paulo:
MÉTODO, 2015.
 
MARTINS, Eliezer Pereira. Direito Constitucional Militar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-
4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3854>.
Acesso em: 1 out. 2017.

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