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DIREITO

ADMINISTRATIVO:
GÊNESE & EVOLUÇÃO
Um resumo esquemático

Discente: Guilherme Neves Stadtler


 No período do Antigo Regime, vigente nos séculos XIV a XVIII, não se
concebia a existência de Direito Administrativo autônomo, uma vez que não
havia limites impostos à atuação estatal.
 O Estado absoluto (Estado de Polícia – Polizeirecht) caracterizava-se pela
centralização do poder nas mãos do monarca que possuía poderes ilimitados.
 A vontade do rei era a própria vontade do Estado, a lei suprema (l’Etat c’est
moi).
 O Estado, por não se encontrar limitado pela ordem jurídica, não poderia ser
responsabilizado pelos danos eventualmente causados a terceiros (The King
can do no wrong).

ORIGEM
 Direito Administrativo = fruto de milagre (Prosper Weil)? Continuidade do
regime anterior (Paulo Otero)? Ou fruto da pressão social?
 O nascimento do Direito Administrativo relaciona-se diretamente com a
consagração dos ideais da Revolução Francesa de 1789 e o surgimento do
Estado de Direito.
 A partir dos ideais liberais revolucionários, o poder estatal é limitado e o
Direito Administrativo é concebido como um ramo especial do Direito,
regulador das relações envolvendo o Estado e o exercício das atividades
administrativas.

ORIGEM
 As limitações ao poder estatal e a proteção dos cidadãos podem ser
justificadas por três conquistas revolucionárias:
 A) princípio da legalidade: submissão do Estado à lei (Estado de Direito)
substituindo a liberdade absoluta e arbitrária do Antigo Regime pelo governo
das leis.
 B) princípio da separação dos poderes: mecanismo de limitação do
exercício do poder estatal. Evitava a concentração de poderes nas mãos de um
mesmo órgão.
 C) Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão: consagra direitos
fundamentais que são oponíveis ao Estado.

ORIGEM
 Célebre Julgamento do Caso Blanco de 1873: o Tribunal de Conflitos, ao
apreciar um conflito de competência entre o Conselho de Estado (jurisdição
administrativa) e a Corte de Cassação (jurisdição comum) fixou a competência
do Conselho de Estado tendo em vista a presença do serviço público naquele
caso e a necessidade de aplicação de regras publicísticas, diferenciadas das
aplicáveis aos particulares.
 Lei do 28 pluviose do ano VIII de 1800: apontada como a “certidão de
nascimento” do Direito Administrativo. Estabeleceu normas de organização
administrativa e de solução de litígios contra a Administração Pública.

ORIGEM
 O Direito Administrativo é o ramo do Direito Público que tem por objeto
as regras e os princípios aplicáveis à atividade administrativa
preordenada à satisfação dos direitos fundamentais.
 Atividade administrativa: caracterizada de forma residual para englobar, em
princípio, todas as atividades não legislativas e não judiciais (poder de polícia,
função regulamentar, fomento, serviços públicos, regulação, etc). Exercício
concreto, por meio de ações ou omissões estatais, da função administrativa.
 Função administrativa: conjunto de prerrogativas e competências estatais
(difícil conceituação e diferenciação das demais funções estatais).

CONCEITO
 Fundamento do Direito Administrativo: inicialmente concebido a partir da
noção de serviço público, foi alargado e encontrou fundamento na concepção
tradicional do interesse público. Atualmente, influenciado pelo fenômeno da
constitucionalização do ordenamento jurídico, seu principal objetivo é a
satisfação dos direitos fundamentais.

CONCEITO
 Compreendem os mecanismos utilizados pelos diversos países para o controle
jurisdicional da atuação administrativa.
 Em síntese, é possível mencionar duas espécies de sistemas administrativos
que podem ser encontrados no direito comparado: sistema da dualidade de
jurisdição (sistema do contencioso administrativo ou da jurisdição
administrativa) e sistema da jurisdição una (unidade de jurisdição).

SISTEMAS ADMINISTRATIVOS
 Sistema da dualidade de jurisdição – Sistema Francês (sistema do
contencioso administrativo ou da jurisdição administrativa): adotado,
inicialmente, na França e utilizado por diversos países (Alemanha, Portugal, etc),
consagra duas ordens de jurisdição:
 A) ordinária ou comum: exercida pelo Judiciário sobre os atos dos particulares em
geral.
 B) administrativa: exercida por juízes e Tribunais administrativos, que tem na
cúpula o denominado Conselho de Estado, dotado de forte independência em
relação ao Poder Executivo. O Conselho de Estado exerce a função consultiva, com
a expedição de recomendações (avis), e a função contenciosa por meio de decisões
(arrêts) sobre conflitos envolvendo a juridicidade das atividades administrativas.

SISTEMAS ADMINISTRATIVOS
 Sistema da jurisdição uma – Sistema Inglês (unidade de jurisdição):
 de origem inglesa e norte-americana, o sistema confere ao Poder Judiciário a
prerrogativa de decidir de maneira definitiva sobre a juridicidade de todos os atos
praticados por particulares ou pela Administração Pública.
 É o sistema adotado no Brasil por meio do princípio da inafastabilidade do controle do
Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CRFB).

SISTEMAS ADMINISTRATIVOS
 França: o julgamento do caso Blanco (arrêt Blanco), de 1783, e a promulgação
da lei do 28 pluviose do ano VIII de 1800 reconheceram a autonomia científica
desse ramo do Direito, dotado de institutos, métodos e princípios próprios que
não se confundiam com o tradicional Direito Civil.
 Alemanha: o Direito Administrativo alemão foi pautado pelo desenvolvimento
sistemático, científico e abstrato a partir da doutrina.
 Itália: o Direito Administrativo italiano sofreu influências do Direito alemão e
francês, pois conciliou a metodologia científico-abstrata germânica e a casuística
francesa. O primeiro livro da disciplina surge na Itália em 1814 (Principii
fondamentali di diritto amministrativo, de Giandomenico Romagnosi).

DIREITO ADMINISTRATIVO
COMPARADO & BRASILEIRO
 Espanha: o Direito Administrativo espanhol, inspirado nas tradições francesa
e italiana, tem se desenvolvido com bastante intensidade nos últimos anos,
especialmente a partir de doutrinadores importantes.
 Portugal: a doutrina administrativa portuguesa tem influenciado o Direito
Administrativo pátrio, com destaque para autores importantes, tais como:
Marcelo Caetano, Diogo Freitas do Amaral, Vital Moreira, entre outros.
 Argentina: o Direito Administrativo, que também exerce forte influência no
Brasil, tem avançado com imensa desenvoltura, especialmente no campo
doutrinário.

DIREITO ADMINISTRATIVO
COMPARADO & BRASILEIRO
 Inglaterra e Estados Unidos: pertencem ao sistema Common Law, marcado
pela força dos costumes, da equidade e dos precedentes judiciais.
 Direito administrativo comunitário e Direito administrativo global: o
Direito Administrativo tradicional, vinculado à concepção da noção de Estado,
vem passando por profundas transformações ao longo do tempo, destacando-
se, por exemplo, o seu processo de internacionalização e crescente
desvinculação aos limites dos Estados nacionais, em razão da globalização
econômica e jurídica (Direito Administrativo comunitário). Por outro lado, o
fenômeno da globalização do Direito Administrativo e a crescente importância
da atuação regulatória de organizações justificam a existência do denominado
Direito Administrativo global.

DIREITO ADMINISTRATIVO
COMPARADO & BRASILEIRO
 Brasil: o Direito Administrativo surge e se desenvolve no Brasil após o período
colonial, com a declaração de independência e a instituição de uma monarquia limitada
pela ordem jurídica. Com a Revolução de 1930 e a promulgação da Constituição de
1934, percebe-se a crescente intervenção do Estado na ordem econômica e social, o que
acarreta a instituição de novas entidades administrativas, a assunção de novas tarefas
pelo Estado e o aumento do quadro de agentes públicos, demonstrando, dessa forma, a
importância no desenvolvimento do Direito Administrativo brasileiro.
 Após o período ditatorial e com a promulgação da Constituição de 1988, o Direito
Administrativo é inserido no Estado Democrático de Direito, passando por importante
processo de constitucionalização, com o reconhecimento da centralidade dos direitos
fundamentais e da normatividade dos princípios constitucionais.

DIREITO ADMINISTRATIVO
COMPARADO & BRASILEIRO
 Ao contrário de outros ramos do Direito, o Direito Administrativo brasileiro
não é codificado. A autonomia legislativa reconhecida aos Entes federados fez
surgir normas federais, estaduais, distritais e municipais, o que demonstra sua
heterogeneidade e pluralidade.
 É possível perceber uma espécie de codificação parcial por meio de normas
sobre o processo administrativo.

AUSÊNCIA DE CODIFICAÇÃO &


PLURALIDADE DE FONTES
 O Direito Administrativo, dotado de especialização e autonomia científica,
relaciona-se com outros ramos do Direito, bem como com outras áreas do
conhecimento não jurídicas ( Economia, Sociologia, etc).
 A) Direito Constitucional: o texto constitucional é repleto de normas
direcionadas à organização administrativa, aos agentes públicos, às atividades
administrativas, etc.
 B) Direito Tributário e Direito Financeiro: o lançamento de tributos, a
arrecadação de receita, a efetivação da despesa pública, entre outras atividades
financeiras ou tributárias são disciplinadas, em grande medida, pelo Direito
Administrativo.

TAXINOMIA DO DIREITO ADMINISTRATIVO:


RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DO
DIREITO
 C) Direito Eleitoral: a efetivação das normas estabelecidas no Código
Eleitoral (Lei 4.737/1965) e legislação correlata envolve, necessariamente, o
exercício de atividades administrativas, tais como o alistamento eleitoral, a
organização da votação, a fiscalização da propaganda partidária, etc.
 D) Direito do Trabalho e Direito Previdenciário: esses dois ramos guardam
estreita relação com o Direito Administrativo, com destaque para os órgãos e
autarquias responsáveis pela fiscalização do cumprimento das normas
trabalhistas e previdenciárias, na concessão de benefícios, na aplicação de
sanções, na utilização do regime celetista para empregados das pessoas
jurídicas de Direito Privado da Administração, etc.

TAXINOMIA DO DIREITO ADMINISTRATIVO:


RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DO
DIREITO
 E) Direito Penal: a legislação penal tipifica, por exemplo, crimes contra a
Administração (arts. 312 a 359-H do CP), bem como é possível aplicar
princípios penais ao Direito Administrativo sancionador (ex.: devido processo
legal, ampla defesa, contraditório).
 F) Direito Processual Civil e Penal: a organização dos tribunais, a prática de
atos administrativos, no exercício da função atípica dos magistrados, a
organização da carreira, a aplicação de sanções disciplinares, dentre outros
exemplos, subordinam-se ao Direito Administrativo, sem olvidar, no que
couber, de determinados princípios do processo judicial ao processo
administrativo.

TAXINOMIA DO DIREITO ADMINISTRATIVO:


RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DO
DIREITO
 G) Direito Civil: previsão no Código Civil de institutos e conceitos
importantes que são utilizados, com bastante frequência, pela Administração
Pública, naquilo que se convencionou denominar “fuga para o direito privado”
(ou publicização do privado e privatização do público), tais como os atos
jurídicos, os negócios jurídicos, os bens, as pessoas jurídicas de direito
privado, etc.
 H) Direito Empresarial: a celebração de contratos comerciais, a utilização de
formas societárias por pessoas instituídas pela Administração, etc.

TAXINOMIA DO DIREITO ADMINISTRATIVO:


RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DO
DIREITO
 No interior do Direito Administrativo, em razão da complexidade e especialização
de determinadas áreas, verifica-se a importância crescente, por exemplo, do
Direito Regulatório, do Direito da Concorrência e do Direito Econômico.
 No campo do Direito Internacional (Público e Privado) é possível ver a relação
com o Direito Administrativo, tais como as atividades diplomáticas, a disciplina e
a organização dos órgãos internacionais, as arbitragens internacionais envolvendo
entidades da Administração.
 Em razão do fenômeno da globalização, econômica e jurídica, é possível afirmar a
existência do Direito Administrativo comunitário (também denominado Direito
Administrativo europeu ou da União Europeia) e do Direito Administrativo
global.

TAXINOMIA DO DIREITO ADMINISTRATIVO:


RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DO
DIREITO
 A evolução do Direito Administrativo confunde-se com a própria evolução da
concepção do Estado. Para fins didáticos, podemos apontar três momentos
principais:
 A) Estado Liberal de Direito: na etapa embrionária do Direito
Administrativo, vinculada à consagração do Estado Liberal de Direito,
concebia-se o Estado como um inimigo do povo. O Estado assumia um papel
marcantemente abstencionista na ordem social e econômica, supervalorizador
da livre-iniciativa, cuja preocupação central era a de assegurar a liberdade
(autonomia da vontade) dos indivíduos.

EVOLUÇÃO DO ESTADO &


DO DIREITO ADMINISTRATIVO
 B) Estado Social de Direito: com o surgimento do Welfare State,
notadamente após a II Guerra Mundial, é reforçada a intervenção estatal na
economia e nas relações sociais, com o objetivo de minimizar algumas
mazelas oriundas do período liberal. A necessidade de agilidade e eficiência
estatal acarreta a denominada “fuga para o direito privado”, com a
contratualização da atividade administrativa, substituindo o modelo autoritário
pelo consensual, e a instituição de entidades administrativas com
personalidade jurídica de direito privado.

EVOLUÇÃO DO ESTADO &


DO DIREITO ADMINISTRATIVO
 C) Estado Democrático de Direito: a necessidade de desburocratização da
Administração Pública, com o intuito de agilizar a atuação estatal e torna-la
eficiente, acarreta o “retorno do pêndulo”, com a devolução de atividades
econômicas e a delegação de serviços públicos à iniciativa privada.
 O Estado Pós-Social ou Subsidiário representa uma redefinição das
atividades administrativas que devem ser prestadas diretamente pelo Estado e
das demais atividades que podem ser prestadas por particulares, notadamente
por não envolverem a necessidade do exercício do poder de autoridade, com a
valorização da sociedade civil no desempenho de atividades socialmente
relevantes.

EVOLUÇÃO DO ESTADO &


DO DIREITO ADMINISTRATIVO
 Novo Constitucionalismo europeu era marcado por três características
principais:
 1) a ascensão do princípio democrático, após o período totalitário, como único
princípio de organização política;
 2) a consagração da jurisdição constitucional concentrada, inspirada na
doutrina kelseniana;
 3) a criação de um sistema especial dos direitos fundamentais perante as
maiorias eventuais e transitórias, assegurado pela justiça constitucional.

A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO
ADMINISTRATIVO & A VALORIZAÇÃO DOS
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
 O novo constitucionalismo (“neoconstitucionalismo”, “constitucionalismo
contemporâneo” ou “constitucionalismo avançado”) é caracterizado pela
crescente aproximação entre o Direito e a moral, especialmente a partir do
reconhecimento da normatividade dos princípios constitucionais e da crescente
valorização dos direitos fundamentais.
 Os princípios constitucionais e os direitos fundamentais passam a ter posição
de destaque na ordem constitucional.

A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO
ADMINISTRATIVO & A VALORIZAÇÃO DOS
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
 O fenômeno da constitucionalização do ordenamento jurídico abalou alguns dos mais
tradicionais dogmas do Direito Administrativo:
 A) a redefinição da ideia de supremacia do interesse público sobre o privado e a ascensão do
princípio da ponderação de direitos fundamentais;
 B) a superação da concepção do princípio da legalidade como vinculação positiva do
administrador à lei e a consagração da vinculação direta à Constituição;
 C) a possibilidade de controle judicial da discricionariedade a partir dos princípios
constitucionais, deixando-se de lado o paradigma da insindicabilidade do mérito
administrativo;
 D) a releitura da legitimidade democrática da Administração, com a previsão de instrumentos
de participação dos cidadãos na tomada de decisões administrativas (consensualidade na
Administração).

A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO
ADMINISTRATIVO & A VALORIZAÇÃO DOS
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
 O Direito Administrativo tem sofrido profundas transformações nos últimos
anos, sendo possível destacar:
 A) Constitucionalização e o princípio da juridicidade;
 B) Relativização de formalidades e ênfase no resultado;
 C) Elasticidade do Direito Administrativo;
 D) Consensualidade e participação;
 E) Processualização e contratualização da atividade administrativa;
 F) Publicização do Direito Civil e a privatização do Direito Administrativo;
 G) Aproximação entre a Civil Law e a Common Law.

MUTAÇÕES & TENDÊNCIAS


DO DIREITO ADMINISTRATIVO

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