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Todo um precedente histórico, em que lendas,

mitos e cultos religiosos celebrizam fundamentos


metafísicos para a definição do justo e do injusto,
Filosofia antecede a formação da sofística.
De fato, as noções fluídas, a mitologia, as
Plano de aula 2 intervenções dos deuses, a ira divina, os poderes
naturais e sobrenaturais… imperaram enquanto o
Primeira parte homem não se fez, por meio de um processo
histórico, senhor de seu próprio destino.
A esse período da história grega convencionou-se
chamar pré-socrático (anterior ao século V a.C.),
Contexto histórico: no qual impera a preocupação do filósofo pela
cosmologia (céu, éter, astros, fenômenos

o surgimento da meteorológicos…), pela natureza (causas das


ocorrências naturais…) e pela religiosidade
(mística, culto, reverência, práticas grupais,
sofística iniciação à sabedoria oculta…).
O texto aqui apresentado nesse power point foi extraído da A ruptura com toda essa herança cultural, com
obra: toda essa tradição pré-socrática, somente se
BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis de.
Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas, 2001. daria com o advento do movimento sofístico no
século V a.C.
• O homem grego, ávido de independência em
face dos fenômenos naturais e das crenças
sobrenaturais, vê-se, historicamente, investido
de condições de alforriar-se dessa tradição. É
um dizer sofístico, de autoria de Protágoras,
esse que diz: o homem é a medida de todas as
coisas (pánton métron anthrwpos).
• Isso no sentido da libertação dos cânones
A ruptura homéricos e das legendárias tradições
patriarcais e sacerdotais que dominavam o
sofista espírito grego.
• Somente no século V a.C. solidificam-se
condições que facultam que as atenções
humanas estejam completamente voltadas
para as coisas humanas (comércio, problemas
sociais, discussões políticas, guerras
intracitadinas, expansão de território…).
• Eis aí o mérito da sofística, qual seja: principiar
a fase na qual o homem é colocado no centro
das atenções, com todas as suas ambiguidades
e contraditórias posturas (psicológicas, morais,
sociais, políticas, jurídicas…).

• É esse o contexto de florescimento do


movimento sofístico, muito mais ligado que
está, portanto, à discussão de interesses
comunitários, a discursos e elocuções públicas,
A ruptura à manifestação e à deliberação em audiências
políticas, ao convencimento dos pares, ao
sofista alcance da notoriedade no espaço da praça
pública, à demonstração pelo raciocínio dos
ardis do homem em interação social… A Grécia
teve de aguardar momento político,
econômico, social e cultural em que esses
caracteres pudessem encontrar o eco que
suscitasse a formação de especialistas na arte
do discurso.
A ruptura sofista
• A difusão da expressão do movimento dos sofistas nos
meios filosóficos, bem como a criação de uma espécie
de menosprezo pelo modus essendi, pelo
profissionalismo do saber e pela forma do raciocínio
dos sofistas, adveio, sobretudo, com a escola
socrática.

• De fato, Sócrates destaca-se como declarado


antagonista dos sofistas, e dedica boa parte de seu
tempo a provar que nada sabem, apesar de se
intitularem expertos em determinados assuntos e
cobrarem pelos ensinos que proferem.

• Na sequência do pensamento socrático, Platão


incorpora esse antagonismo intelectual e o transforma
em compromisso filosófico, e lega para a posteridade
uma visão dicotômica que opõe diretamente as
pretensões da filosofia (essência, conhecimento,
sabedoria…) às pretensões da sofística (aparência,
opinião, retórica…).
A ruptura sofista

• Aristóteles dá continuidade ao mesmo entendimento,


sedimentando-o no contexto do pensamento
filosófico, de modo que se incorpora ao mundo
ocidental a leitura socrático-platônica da sofística.
r text•o Ademais, o que robustece a facilidade de manutenção
ici ona desta imagem que a filosofia formou dos sofistas é a
ra ad
ue pa carência de textos e manuscritos a seu respeito, bem
Cliq como a sobrevivência dos textos platônicos e
aristotélicos como textos de majoritária leitura no
panorama filosófico ocidental.
• Alguns motivos teriam induzido à formação dessa fase de
pensamento na Grécia clássica (século V a.C.), e não
coincidentemente em pleno século de ouro da civilização
grega, o chamado Século de Péricles, momento da história
grega em que arte (escultura, pintura, teatro…), mitologia,
filosofia, literatura, história, política… alcançaram o maior
grau de excelência humana.

• Os motivos mais próximos, não obstante serem muitos,

Importância do podem ser apontados como: estruturação da democracia


Clique para adicionar
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texto esquematização da participação popular nos
ateniense;
Clique para adicionar
texto
textode exercício do poder, sem necessidade de
instrumentos

discurso provar riqueza, nobreza ou ascendência; sedimentação de um


longo processo de reorganização social e política de Atenas;
expansão das fronteiras gregas; acúmulo de riquezas;
intensificação do comércio; abertura das fronteiras para o
contato (pacífico ou bélico) com outros povos; necessidade de
domínio de conhecimentos gerais, para o uso retórico;
necessidade de domínio da técnica de falar, para o uso
assemblear; entre outros.
• Nesse momento, em que a voz passa a
ecoar com maior importância, em que
exsurge a necessidade de exercer a
cidadania por meio do discurso, em
que a técnica oratória define o homem
público…, estão plantadas as sementes
para aqueles que haveriam de ser
Importância do conhecidos pela posteridade como
sofistas.
discurso • Contudo, a palavra sofista, no entanto,
tem cunho pejorativo, depreciativo,
uma vez que assim se designa aquele
que não é sábio, mas que pretende
ser, ou versado em uma técnica.
• Respondendo a uma necessidade da
democracia grega é que os sofistas tiveram
seu aparecimento; o preparo dos jovens, a
dinamização dos auditórios, o fornecimento
de técnica aos pretendentes de funções
públicas notáveis, o fornecimento de
instrumentos oratórios e retóricos para o
cuidado das próprias causas e dos próprios
Importância do negócios (“o cuidado adequado de seus
negócios pessoais, para poder administrar
discurso melhor sua própria casa e família, e também
dos negócios do Estado, para se tornar poder
real na cidade, quer como orador, quer como
homem de ação”: Protágoras)…, tudo isso
favoreceu a eclosão do movimento que se
pulverizou por toda a Grécia.
• Por isso, são importantes os sofistas, sobretudo
por ter relevado a técnica para a dominação do
discurso assemblear e pela rediscussão da
dimensão do homem como ponto de partida
para as especulações humanas.

• A emergência do discurso, a mercantilização da


sociedade, inclusive da demanda por
Importância do conhecimentos técnicos e enciclopédicos,
favoreceram a proliferação de homens que, sem

discurso destino fixo, ensinavam de modo itinerante. Isso


não há que se negar como dado comum a todos
os sofistas: são eles homens dotados de domínio
da palavra, e que ensinam a seus auditórios
(auditórios abertos ou círculos de iniciados) a
arte da retórica, com vista no incremento da arte
persuasiva (peitho).
• As amplas disputas, discussões e debates que permearam todo
o século V a.C., no plano da política, no plano das estratégias
de guerra, no plano das deliberações legislativas, no plano dos
julgamentos nos tribunais populares…, inclusive em virtude da
presença e do desenvolvimento das escolas de sofistas,
colaboraram no processo de abertura dos horizontes do
pensamento grego. A liberdade de expressão, matiz
característico do século de Péricles, aliada ao amor pelo cultivo

Retórica e da oratória e da retórica, ensejou a possibilidade de


questionamento da posição particular do homem perante a
phýsis e como membro participante do corpo político.

prática • A praça pública (agorá), povoada por homens dotados da


técnica (techné) de utilização das palavras, funcionava como

judiciária
oficina da intelectualidade em sua expressão oralizada. Além
da praça pública, a muitos interessava o domínio da linguagem
(pense-se que os discursos forenses eram encomendados a
homens que se incumbiam de escrevê-los para serem lidos
perante os juízes – este é o trabalho dos logógraphoi) para
estar diante da tribuna, perante os magistrados.
• As palavras tornaram-se o elemento primordial para a
definição do justo e do injusto. A técnica (techné)
argumentativa faculta ao orador, por mais difícil que
seja sua causa jurídica, suplantar as barreiras dos
preconceitos sobre o justo e o injusto e demonstrar
aquilo que aos olhos vulgares não é imediatamente
visível.

Retórica e • As experiências jurídicas, nesse contexto, aproximam-


se do casuísmo relativista que só pode definir a justiça
prática ou a injustiça do caso diante da análise de sua
situação concreta, de sua ocorrência efetiva, de sua

judiciária
apreciação imediata.
• Isso favorece o desenvolvimento do discurso
judiciário, pois, conquanto que bem articulado, pela
força da expressão oral, e bem defendido perante os
magistrados, o efeito a ser produzido pode favorecer
aquele que deseja por ele ver-se beneficiado.
• No lugar desses, para os sofistas, surgia o relativo, o provável, o possível,
o instável, o convencional. Um dos destaques na proliferação de ideias e
pensamentos acerca da relatividade das coisas foi Protágoras. A
assunção dessa posição diante dos fatos e valores desencadeou, no
plano da reflexão acerca do justo e do injusto, a relativização da justiça.
Isso porque, no debate entre o prevalecimento da natureza das leis
(phýsis) e o prevalecimento da arbitrariedade das leis (nómos), os

Justiça a
sofistas optaram, em geral, pela segunda hipótese, sobretudo os
partidários das teses históricas acerca da evolução humana; a lei
(nómos) seria responsável pela libertação humana dos laços da barbárie.

serviço dos
Isso porque, coerentemente com seus princípios, diziam ser o homem o
princípio e a causa de si mesmo, e não a natureza.
• Ora, deliberar sobre qual será o conteúdo das leis é atividade

interesses
preponderantemente humana, e nisso não há nenhuma intervenção da
natureza, como admitido pela tradição literária e filosófica grega. A
natureza (phýsis) faria com que as leis fossem idênticas em todas as
partes, tendo-se em vista que o fogo arde em todas as partes da mesma
forma, como posteriormente dirá Aristóteles. No entanto, pelo contrário,
o que se vê é que homens de culturas diferentes vivem legislações e
valores jurídicos diferentes, na medida em que se encontra em seu poder
definir o que é o justo e o que é o injusto
• Muitos dos cultores do movimento
sofístico, embasados em tal dicotomia,
advogaram a ideia de que existiria uma
oposição intrínseca entre a lei da natureza
(phýsis), o que equivale a dizer a lei do
mais forte sobre o mais fraco, e a lei
Justiça a convencionada pelo homem (nómos), lei
esta que seria artificial e que atentaria
serviço dos contra a ordem natural das coisas.
Destarte, preconizavam que os homens
interesses deveriam submeter-se ao poder daquele
que ascendesse ao controle da cidade por
meio da força; a justiça é vantagem para
aquele que domina e não para aquele que
é dominado (Trasímaco).
• Com isso, a noção de justiça é relativizada, na medida
em que seu conceito é igualado ao conceito de lei; o
que é o justo senão o que está na lei? O que está na lei
é o que está dito pelo legislador, e é esse o começo, o
meio e o fim de toda justiça. Nesse sentido, se a lei é
relativa, se se esvai com o tempo, se é modificada ou
substituída por outra posterior, então com ela se
encaminha também a justiça.
Justiça a • Em outras palavras, a mesma inconstância da
legalidade (o que é lei hoje poderá não ser amanhã)
serviço dos passa a ser aplicada à justiça (o que é justo hoje poderá
não ser amanhã). Nada do que se pode dizer absoluto

interesses (imutável, perene, eterno, incontestável…) é aceito


pela sofística. Está aberto campo para o relativismo da
justiça. Eis aí o início de um debate que haverá de se
perpetuar na tradição filosófica grega pós-socrática,
sobretudo evidenciada em Platão e Aristóteles, tendo-
se em vista que deram azo à formação da questão: é a
lei natural ou convencional? Outro debate acendeu-se
com o fomento dessa questão, a saber: são os gregos
superiores aos bárbaros?
• No campo do direito e da justiça, a sofística mobilizou
conceitos no sentido de afastar todo tipo de ontologia
ou mesmo todo tipo de metafísica ou mistificação em
torno dos valores sociais. Nem as deusas da justiça,
nem Thémis, nem Diké, dão origem às leis humanas,
mas somente os homens podem fazer regras para o
convívio social; as leis são atos humanos e racionais
que se forjam no seio de necessidades sociais, o que só
é possível por meio da discussão comum, da
deliberação consensual, da comunicação participativa e
do discurso.

Conclusões • De fato, o que há de comum entre os sofistas é o fato


de, em sua generalidade, apontarem para a identidade
entre os conceitos de legalidade e de justiça, de modo
a favorecer o desenvolvimento de ideias que
associavam à inconstância da lei a inconstância do
justo. Confronto maior ainda se evidencia com a
interlocução dos sofistas com Sócrates, que haverá de
construir todo um conjunto de ideias claramente
antagônico ao dos sofistas.
• Do exposto, pode-se apreender que a sofística
representando já uma quebra na tradição grega mais
antiga, não obstante as nuances e os matizes que
caracterizam os pensamentos individuais de cada qual
dos sofistas, consiste num movimento intelectual
coincidente com determinado contexto histórico-
cultural (século V a.C.) que o habilitou a uma serventia
social, jurídica e política muito grande, superando o
cosmologismo pré-socrático.
• A emergência do discurso, a proliferação de escolas de
Conclusões ensino de técnicas retóricas, a construção de práticas
políticas e jurídicas que requeriam a sapiência de
recursos persuasivos… ensejaram o nascimento, o
fortalecimento e a divulgação do vento sofístico.
Esmaecidas essas condições, no ocaso do século IV
a.C., deixaram de representar um dado prevalecente
da cultura grega, quando se iniciou a polêmica com os
pensamentos aristotélico, estoico e cínico.

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