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Seção VII F

Capítulo 124
Repercussão socioeconômica do
câncer de próstata

Marcelo Luiz Bendhack


Bernardo Sobreiro

Dados do Censo 2000 revelam que a população Na década de 1970, a maioria (cerca de 70%)
brasileira total atinge 169.799.170 habitantes. Destes, dos casos tinha diagnóstico em fase avançada. Atual-
86.223.155 são mulheres e 83.576.015 representam a mente estes números estão bastante modificados,
população masculina. Considerando-se que homens tendo 80% dos pacientes o diagnóstico ainda com
acima de 40 anos de idade se encontram na faixa de a doença localizada.
screening (detecção precoce), temos 28.401.347 homens Entretanto, de acordo com o Censo de 2000,
em avaliação médica de rotina, anualmente. apenas 25,7% de todos os homens no país possuem
Em 1995, a incidência do câncer de próstata (CAP) planos de saúde. O restante teria avaliações cobertas
aumentou e atingiu níveis epidêmicos. Utilizando dados de forma particular ou por meio do Sistema Único
do CDC de Atlanta (1999), temos a informação de de Saúde (SUS). Dos que dependem desta última
que a incidência CAP nos Estados Unidos atingiu 160 forma, 42% consultam em postos ou centros de saú-
novos casos a cada 100 mil homens dentro do grupo de e 21,5% em ambulatórios de hospitais conve-
de risco (≥ 40 anos). Extrapolando estes dados para a niados. Aqueles que procuram atendimento por meio
população brasileira, teríamos 45.400 novos casos de de consultas particulares representam 5% da popu-
CAP, anualmente. lação. Outros homens não têm nenhum tipo de ser-
O número de óbitos por CAP, na Alemanha, é de viço de saúde para detecção precoce. Esta é uma
9 mil/ano (para uma população de 80 milhões de população predominantemente rural.
habitantes). Este número aumentou 16%, se compa- Com os dados disponíveis atualmente se torna
rado com a mortalidade pela mesma doença, em 1976. extremamente difícil estabelecer os reais custos do
No Brasil, este número, atualmente, é de 8.200/ano. CAP no Brasil. O que procuramos apresentar neste
Devido à não notificação compulsória em nosso país, capítulo são estimativas acerca desta doença, em
este pode estar subestimado e o número real seria de nosso país.
18 mil óbitos/ano. Vale ressaltar que apenas um terço Consideremos o valor de screening (básico) pelos
dos homens com CAP morrem especificamente de- planos de saúde. A consulta médica, hoje, tem o valor
vido ao seu tumor. bruto de R$ 30. A determinação do antígeno prostático
Esta doença acomete cerca de 17% dos homens. O específico (PSA) custa R$ 25. O exame de urina
risco de ela se apresentar, durante a vida de um homem, adiciona R$ 15 ao custo e a ultra-sonografia de próstata
é de 24%. Enquanto sua incidência para homens entre por via abdominal, R$ 40. Assim, temos o valor de
45 e 49 anos de idade é de sete novos casos/100 mil custo básico, via convênio, de R$ 110.
homens/ano, para aqueles com mais de 80 anos o nú- Caso todos os brasileiros com idade igual ou supe-
mero é de 1.200/100 mil homens/ano. rior a 40 anos e inferior a 80 anos de idade fossem

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submetidos aos exames de rotina uma vez ao ano, Esta, se realizada sob orientação de ultra-sonografia e
seriam examinados anualmente 21.136.213 homens. sedação, teria o custo estimado de R$ 1 mil.
O custo total destas avaliações, considerando-se Em relação ao tratamento da doença localizada,
apenas o diagnóstico precoce do CAP, seria de estima-se que cerca de 80% dos pacientes serão
R$ 2.324.983.430 (2 bilhões e trezentos milhões). submetidos à prostatectomia radical, o que, por sua
Nesta avaliação, não estão compreendidos pacientes vez, apresenta custo unitário (convênio) na ordem
com mais de 79 anos de idade (731.350), os quais de R$ 7.000. Em Curitiba, capital do Estado do
não são submetidos, de rotina, à avaliação do PSA. Paraná com perto de 2 milhões habitantes, cerca de
Se todos fossem considerados, teríamos o custo de 200 prostatectomias radicais são realizadas ao ano.
avaliação estimada em R$ 3.124.148.170. Assim, cerca Assim, o custo anual total seria de R$ 1.400 mi. Este
de R$ 3,1 bilhões seriam investidos anualmente para raciocínio poderia ser extrapolado, com reservas, para
o diagnóstico desta doença. todo o Brasil. Assim, poderíamos estimar que apenas
Há inúmeras possibilidades de raciocínio. Pode- para o tratamento cirúrgico deveriam ser gastos
se, por exemplo avaliar o custo cumulativo durante R$ 119 milhões de reais/ano.
anos de avaliação sistemática. Além disso, não é A estas informações podem ser somados os custos
incomum o mesmo paciente ter necessidade de avaliar de tratamentos radioterápicos para doença localizada
o PSA mais de uma vez ao ano, sem mencionar a e antiálgicos, hormonioterapia, tratamento da dor
determinação do PSA livre. (inclusive bisfosfonatos), internamentos por intercor-
Os valores de custo para diagnóstico não param por rências diversas e quimioterapia. Devem-se considerar
aí. Ainda temos valores associados à biópsia da próstata. também os dias de ausência ao trabalho, o que
determina custos indiretos da doença.
Tabela 1: População de homens brasileiros de acordo com a faixa Em resumo, os custos de diagnóstico precoce e
etária (IBGE - Censo 2000)
tratamento do CAP são enormes. O custo de trata-
mento da doença avançada é extremamente maior
que para a doença localizada. Uma política econômica
planejada especificamente para esta doença, poderia
reduzir os seus gastos. A obtenção de recursos para
campanhas de diagnóstico precoce e tratamento, a
partir do governo ou da sociedade organizada ou,
ainda, a contratação de médicos com esta única
finalidade, deveriam ser avaliadas e discutidas.

Leitura recomendada
1. Altwein JE. Prostatakarzinom. Epidemiologie, Ätiologie,
Pathologie, Diagnostik, prognostische Faktoren. Em: Rübben
H (editor). Uro-Onkologie. Springer-Verlag Berlin
Heidelberg New York, pp. 169-232, 2001.
2. Bendhack ML, Miller S, Ackermann R. Surgical therapy of
locally confined prostate carcinoma. Schweiz. Rundsch.
Med. Prax. Nov 12; 86 (46): pp. 1819-1824, 1997.
3. Censo IBGE 2000.
4. Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein, AJ. Campbell’s
Urology. Oitava edição, Philadelphia, 2002.

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Capítulo 125
Epidemiologia e história natural

Flavio Luis Ortiz Hering

O câncer de próstata é o tumor sólido não-cutâneo O câncer de próstata surge em geral na zona
de maior incidência em homens acima de 50 anos periférica (15% em outra parte da glândula). Os
de idade, representando mais de 40% dos tumores tumores da zona transicional produzem em torno de
que atingem o sexo masculino nessa faixa etária. quatro vezes mais PSA que os da zona periférica, embora,
Segundo a American Cancer Society, em 2002 nos em geral, sejam biologicamente menos agressivos.
EUA, foram diagnosticados 198.100 novos casos e Após o advento do PSA, 20% dos tumores de
35.200 homens morreram em decorrência da doença, próstata têm metástase no momento do diagnóstico.
enquanto na Europa 134 mil diagnósticos foram Dos pacientes em tratamento hormonal, 80% fica-
realizados e 32.100 foram a óbito. Desses pacientes, rão hormônio-resistentes entre 18 e 36 meses e 85%
20% tinham história familiar. terão metástases ósseas. Nos pacientes em que sur-
A incidência varia de acordo com a raça e a gem metástases ósseas, o tempo de sobrevida, em
localização geográfica. Os países escandinavos e o geral, é de 20 a 30 meses. Dos pacientes que recebem
Canadá apresentam a maior incidência mundial do tratamento curativo para o câncer de próstata loca-
câncer de próstata, enquanto nos países orientais a lizado, 30% reincidem.
freqüência é até 25 vezes menor (a incidência na China A disseminação linfática atinge, em geral, os gân-
é de 0,8/100 mil e nos EUA é de 100/100 mil). glios obturadores e ilíacos, e a hematogênica, os ossos
Segundo as estatísticas americanas, a incidência em do esqueleto axial.
negros é maior que em brancos (proporção de 2:1), O câncer de próstata tem uma expressão clínica
fato não observado no Brasil. Segundo Thomas e pequena em relação à incidência, pois em 30% das
colegas (2002), quanto à incidência de câncer de próstata autópsias encontram-se câncer de próstata e somente
em homens mais jovens, os negros têm 60% mais que 1% a 2% da população manifestará a doença. Em
os homens brancos, com 200% a mais de mortalidade. torno de 40% dos homens entre 60 e 80 anos de idade
Stamey e Kabalin verificaram que o tempo de têm foco microscópico de adenocarcinoma bem-
duplicação tumoral do câncer de próstata é lento, diferenciado, e esses tumores, quando menores que
variando entre dois a quatro anos. Esses dados são 0,5 cc, são muito pouco agressivos, e denominados
confirmados em estudos clínicos de pacientes com de latentes.
câncer de próstata localizado e não-tratado. A Entre 3% e 5% dos homens morrerão de câncer
progressão local foi observada de 42% a 83% dos próstata e 10% desenvolverão doença clínica. Esse
pacientes em seguimento de seis anos e só 6% a 16% fato tem implicações médicas e éticas, pois pode estar
morreram do tumor. As metástases ósseas podem havendo um excesso de detecção e de tratamento
ocorrer em até 12 anos após o diagnóstico. com todos os efeitos colaterais.

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Alguns fatores podem influenciar na evolução do próstata por provocarem maior biodisponibilidade
câncer prostático, como o grau histológico, o volume do hormônio masculino. Dietas com baixo teor de
tumoral e o estádio na ocasião do diagnóstico. Quan- gordura podem provocar queda de até 30% dos
do o volume do tumor primário é menor que 3 cc, níveis de testosterona plasmática. A testosterona tem
as metástases raramente acontecerão e, quando tiver um papel importante no câncer de próstata, provo-
mais que 12 cc, quase sempre ocorrerão. cando a proliferação da célula neoplásica. Os homens
Histologicamente, quando o Gleason é de 2 a 4, castrados antes da puberdade, têm incidência muito
80% dos pacientes sobrevivem 15 anos, de 5 a 7, menor do câncer de próstata.
40% sobrevivem os 15 anos e de 8 a 10, mais de Elementos como o zinco, selênio, os betacarotenos,
90% morrerão antes desse prazo. Com o aumento a vitamina E e a soja seriam fatores protetores contra
da taxa de diagnóstico mais precoce nos últimos o câncer prostático.
anos, a incidência de metástases ganglionares caiu de Não existem comprovações científicas de outros
20% a 40% nas décadas de 1970 e 1980 para 4% a fatores que possam influenciar no câncer de próstata,
6% nos últimos anos. como, por exemplo, os vírus, a vasectomia e outros.
Fatores genéticos também são relevantes na O câncer de próstata é, portanto, uma doença com
ocorrência do câncer prostático. Homens com pa- um complexo comportamento biológico e com alguns
rente próximo (primeiro grau) que tenha câncer de fatores que, às vezes, podem prever sua evolução clínica.
próstata têm 2,5 vezes mais chance de desenvolver
a doença. Se tiverem dois parentes próximos, o
risco aumenta em cinco vezes, e com três parentes Leitura recomendada
aumenta para 11 vezes. Nos casos hereditários, o
1. Jemal A, Thomas A, Murray T, Thun M. Cancer Statistics,
câncer de próstata pode manifestar-se mais precoce-
2002. CA Cancer J Clin, 52: 23, 2002.
mente, muitas vezes antes dos 50 anos de idade, 2. Catalona WJ, Antenor JAV, Roehl KA. Screening for
porém não existem trabalhos que impliquem isso Prostate Cancer in High Risk Populations. J Urol 186:
como doença mais agressiva. 1980-1984, 2002.
3. Berruti A, Dogliotti L, Bitossi R, Fasolis G, Gorzegno G,
Os genes implicados e mapeados são HPC1
Bellina M, Torta M, Angeli A. Incidence of skeletal
(1q24-25), HPCX (xq27-28), CAPB (1p36), HPC20 complications in patients with bone metastatic prostate
(20q13) e HPC2/ELAC2 (17p). cancer and hormone refractary disease: Predictive role of
As dietas ricas em gordura animal podem estar bone resorption and formation markers evaluated at baseline.
J Urol, 164: 1248-53, 2000.
relacionadas com maior incidência do câncer de
4. Green Lee RT, Murray T, Bolden S. Cancer Statistics, 2000.
American Cancer Society, January/February 50: 6-11, 2000.

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Seção VII F

Capítulo 126
Prevenção do câncer de próstata

Marcos Tobias Machado


Caio Cesar Cintra

Introdução idade, com pico em torno dos 70-74 anos de idade, e


que sua evolução é lenta. Afro-americanos apresentam
Tendo em vista as altas prevalência e mortalidade do um risco 60% maior de desenvolver a doença e uma
câncer de próstata, estratégias de prevenção, sobretudo mortalidade duas vezes maior que a população
para com os grupos de alto risco, podem vir a ter um caucasiana da mesma idade.
impacto significativo na história natural da doença, que Estudos epidemiológicos da década de 1950 de-
se impõe como um problema significativo na saúde monstram que ser irmão de um homem com câncer
pública, principalmente nos países ocidentais. de próstata aumenta o risco da doença em duas a três
vezes. Esse risco é ainda maior se a idade de apareci-
mento da doença for precoce e se o acometimento
Fatores de risco determinados familiar for múltiplo. A penetrância dos genes do câncer
de próstata familiar não é conhecida, mas é possível
Os únicos fatores de risco já estabelecidos são: idade, que eles se relacionem a apenas 10% dos casos. Pelo menos
etnia e história familiar. Estudos demonstram que sua cinco genes distintos já foram descritos, relacionados
incidência começa a aumentar a partir dos 55 anos de aos casos familiares de câncer de próstata (Tabela 1).

Tabela 1: Genes relacionados ao câncer de próstata familiar

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Guia Prático de Urologia

Fatores de risco/ Um trio de substâncias antioxidantes tem sido


proteção sob investigação correlacionado à diminuição nos riscos: selênio,
vitamina E e licopeno. O selênio e a vitamina E foram
descobertos acidentalmente durante estudos com
Fatores ambientais outros objetivos.
A incidência do câncer de próstata apresenta uma No caso do selênio, durante um estudo que
variação extraordinária em todo o mundo. Em afro- investigava câncer de pele e suplementos alimentares,
americanos, ela é 60% maior que a observada em houve uma redução de 67% na incidência de Ca de
Shangai. Quando se estuda a incidência da doença próstata no grupo que recebia selênio, em relação ao
em populações de imigrantes que normalmente não grupo controle.
apresentariam uma incidência significativa do pro- Do mesmo modo, no Alfa-tocoferol Beta Caroteno
blema, observa-se um aumento significativo no Cancer Prevention Study, um grupo de 29.133 homens
número de casos, fornecendo, talvez, o maior argu- foram randomizados quanto à administração de
mento a favor do papel das influências do ambiente alfatocoferol (50 mg/dia). Aqueles que receberam
na manifestação da doença. 50 mg/dia de vitamina E apresentaram 35% menos
Ca de próstata que o grupo controle.
Dieta Esses achados levaram ao desenvolvimento de um
protocolo chamado SELECT – Seleniun and Vitamin
Uma das maiores características da dieta ocidental E Cancer Prevention Trial. Vários estudos vêm demons-
é seu alto teor de gordura e calorias. Estudos antigos trando a associação do licopeno, encontrado sobre-
correlacionaram o consumo per capita de gordura com tudo no tomate e nos seus derivados, e a proteção
a mortalidade por câncer de próstata, principalmente em relação ao câncer de próstata. Seu efeito, prova-
relacionada à gordura saturada, proveniente da carne velmente, está relacionado a sua forte ação antioxi-
animal. No entanto, estudos mais recentes encon- dante, a maior entre os carotenos.
traram uma associação apenas fraca entre esses Leguminosas também têm sido avaliadas. Existe
elementos (risco relativo 1,5-2). Quando os tipos de bastante interesse nos efeitos anticarcinogênicos da
gordura são estudados separadamente, existe uma genisteína, uma isoflavona encontrada na soja que
fraca evidência de que ácidos graxos ômega 3 de apresenta atividade estrogênica fraca e que causa
cadeia longa exerçam algum papel protetor, en- aumento nos níveis da globulina transportadora dos
quanto o ácido alfalinoleico seja um fator de risco. hormônios sexuais, diminuindo os níveis séricos da
Segundo o Health Professionals Follow-Up Study, homens testosterona livre, biologicamente ativa. Outros
com um consumo > 2 mil mg de cálcio/dia apresen- estudos correlacionam sua concentração urinária à
taram um risco 4,6 vezes maior de apresentarem a menor incidência da doença em japoneses, quando
doença, em relação aos indivíduos do grupo controle. comparados a finlandeses (Tabela 2).

Tabela 2: Alimentos relacionados ao câncer de próstata e seus efeitos (em estudo)

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Guia Prático de Urologia

Fatores antropométricos e tem sido relacionado a um menor risco, em alguns


atividade física estudos. Algumas drogas com efeitos sobre o meta-
bolismo dos androgênios estão sob investigação
Não existem dados que comprovem associação (espironolactona e cimetidina).
entre esses dados e o risco de se desenvolver câncer
de próstata. Marcadores histológicos
A presença de neoplasia intra-epitelial (PIN), uma
Perfil hormonal
lesão reconhecida como precursora do câncer pros-
Existem duas hipóteses principais, referentes ao tema: tático, foi correlacionada a um risco 15 vezes maior
1) O desenvolvimento tumoral é dependente do da doença.
estímulo androgênico. Com base nessa depen-
dência androgênica, um grande estudo rando-
mizado fase III vem sendo realizado, o US Leitura recomendada
Prostate Cancer Prevention Trial, que avalia o uso da
1. Clark LC, Combs GF, Turnbull BW, et al. Effects of selenium
finasterida na redução da incidência da doença. suplementation for cancer prevention in patients with
Seus resultados são esperados para o ano de 2004. carcinoma of the skin: a randomized controlled trial. JAMA.
2) Os níveis de IGF-1, um hormônio que media 1996, 276: 1957-63.
2. Heinomen OP, Albanes D, Virtamo J, et al. Prostate cancer
a ação do hormônio de crescimento, têm mos-
and supplementation whith alpha-tocopherol and beta-
trado relação com o câncer de próstata em al- carotene: incidence and mortality in a controlled trial. J.
guns estudos. Essa substância induz o cresci- Natl Cancer Inst. 1998, 90: 440-6.
mento da próstata em ratos. 3. Klein EA, Thompson IM, Lippman SM, et al. SELECT: The
next prostate cancer prevention trial. J Urol, 1311-5.
Doenças clínicas concomitantes 4. Russel DW, Wilson JD. Steroid 5-alpha-reductase: two genes/
two enzyms. Annu Rev Biochem. 1994, 63: 25-61.
A cirrose diminui os riscos de Ca de próstata. O
DM de longa duração, com baixos níveis de insulina,

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Capítulo 127
Rastreamento – prós e contras

Antonio Carlos Pereira Martins


Adauto José Cologna

O rastreamento consiste na aplicação de testes ou esses tumores, o rastreamento do adenocarcinoma da


exames para detecção de uma doença quando os próstata é controvertido. A questão, pois, não é de
sinais e sintomas específicos estão ausentes. No caso prevalência do câncer, nem de métodos diagnósticos,
do adenocarcinoma prostático, o rastreamento pode uma vez que o PSA é de baixo custo e de sensibilidade
ser classificado em ativo e passivo (diagnóstico). O superior à mamografia. As dúvidas existentes decorrem
ativo se caracteriza por atingir homens da comu- de outras causas:
nidade, assintomáticos ou não, estimulados a se sub- 1) a história natural da neoplasia prostática não é
meter aos testes por iniciativa de um grupo ou serviço. totalmente conhecida;
O passivo ou diagnóstico faz parte da rotina da 2) o tumor geralmente ocorre acima dos 50 anos
avaliação urológica convencional de pacientes que de idade e concorre em mortalidade com outras
procuram consultórios ou hospitais em busca de doenças comuns para a faixa etária;
assistência médica. O rastreamento ativo é mais 3) a eficácia do tratamento ainda é discutida.
controvertido que o passivo. Para as dúvidas sobre a história natural concorrem
Qualquer rastreamento só é considerado eficiente vários fatores. Estudos de necrópsia mostram que
se atender os seguintes requisitos: 40% a 50% dos homens com idade superior a 70
1) a doença é grave; anos de idade portam focos de carcinoma prostático
2) a incidência da doença justifica a relação custo/ sem que tenham apresentado manifestação clínica ou
benefício; morte pelo tumor. Daí a conceituação de neoplasias
3) os métodos para diagnóstico são seguros, ba- bem-diferenciadas, de volume igual ou inferior a 0,2
ratos, rápidos, reprodutíveis e dotados de sensi- a 0,5 mL, como inofensivas, e a conseqüente deno-
bilidade e especificidade aceitáveis; minação de tumores indolentes ou insignificantes.
4) o tratamento é de eficácia comprovada e de Assim, o objetivo do rastreamento não é apenas
custo defensável do ponto de vista social; diagnosticar o câncer mais precocemente, mas iden-
5) a terapia precoce oferece melhores resultados tificar aquele que representa ameaça ao portador.
que a aplicada tardiamente. Como somente 3% a 5% dos homens morrem em
As estimativas do Ministério da Saúde (INCA) decorrência do câncer prostático e apenas 10%
mostram que a neoplasia prostática no Brasil é a desenvolvem doença clínica, parece evidente que a
segunda em freqüência e mortalidade dos homens maioria dos tumores indolentes não evolui de modo
(Tabela 1). Em nosso meio, sua incidência rivaliza com a causar manifestações clínicas ou óbito. Daí a preocu-
a do câncer da mama e é muito superior a do colo pação ética de indicar o rastreamento com risco de
uterino. Porém, ao contrário do que acontece com levar ao excesso de diagnóstico e de tratamento que

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Guia Prático de Urologia

Tabela 1: Estimativas da incidência e taxa de mortalidade (por 100 mil habitantes do mesmo sexo) das neoplasias mais comuns no
Brasil, segundo a localização primária (ano de 2003)

é dispendioso e associado à morbidade expressiva. Mas prospectivo, randômico, adotando para compa-
parece não ser esta a extensa experiência dos rastrea- ração um grupo controle sem tratamento, usando
mentos usando o PSA e o toque retal, pois a maioria como parâmetros a mortalidade específica e a
dos tumores diagnosticados não se enquadra na categoria morbidade ao final do período de observação.
de indolentes. A explicação provável é que, devido ao Estudos em larga escala dessa natureza estão em
pequeno volume do carcinoma indolente, seu impacto andamento. Um estudo de rastreamento randômico
sobre o PSA total não seria tão relevante e também recente realizado no Canadá mostrou mortalidade
porque esse tumor atinge, mais freqüentemente, homens específica pelo câncer ao final de oito anos de
acima dos 70 anos de idade, já fora da faixa mais seguimento de 48,5/100 mil homens/ano no grupo
recomendável para o rastreamento. controle (não submetido aos testes) contra 15/100
As principais causas de morte no Brasil no ano 2000 mil homens/ano no grupo sujeito aos testes e
estimadas pelo INCA foram: aparelho circulatório – tratamento. Há, pois, fortes evidências da eficácia
27,5%, neoplasias – 12,7%, causas externas – 12,5%, do rastreamento e tratamento radical curativo. As
aparelho respiratório – 9,3% e outras – 33,2%. Desta dúvidas maiores surgem dos estudos não-randô-
forma, o carcinoma prostático concorre sobretudo micos ou demonstrativos que analisam o impacto
com as doenças dos aparelhos circulatório e respiratório do rastreamento sobre a mortalidade específica de
com taxas elevadas de mortalidade. Mas os avanços maneira indireta, ou seja, pela comparação com
no tratamento dessas doenças (assim como das registros históricos. Assim, a mortalidade por câncer
neoplasias) estão elevando a sobrevida da população prostático em relação à prevalência nos Estados
com aumento da importância do câncer prostático. Unidos variou de 35 mil/85 mil (41%) em 1985 a
O óbice das doenças concomitantes é enfraquecido 41 mil/317 mil (13%) em 1996, o que causa a falsa
ao se condicionar o rastreamento a homens com impressão de melhora no prognóstico. A
expectativa de vida superior a dez anos. Os principais interpretação alternativa é a introdução do teste do
problemas representados por essas doenças referem- PSA a partir de 1986-7, que antecipa o diagnóstico
se à interferência na história natural da neoplasia e na em cinco anos (tumores de menor estádio), além
interpretação dos resultados do tratamento. de também detectar carcinomas indolentes. No
O padrão ouro para comprovar a eficácia do período 1990-5, o NIH referiu queda de 12% na
rastreamento e do tratamento consiste no estudo mortalidade por câncer da próstata naquele país,

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Guia Prático de Urologia

Quadro 1: Rastreamento do carcinoma prostático – prós e contras

considerada muito precoce para ser justificada pelos após esclarecimentos sobre os riscos e benefícios, em
rastreamentos. Novos casos de câncer no final da homens que o requeiram ou aceitem, com idade
década de 1990 eram estimados em 145/100 mil superior a 50 anos (ou a partir dos 45 anos de idade
homens nos Estados Unidos e 65/100 mil homens em situações especiais) e com expectativa de vida igual
na Europa, enquanto a mortalidade pelo câncer se ou superior a dez anos, pois o médico que se negar a
assemelha em ambas regiões, variando de 20 a 30 fazê-lo estará correndo riscos legais e éticos.
mortes/100 mil homens/ano. Tem-se interpretado
a discrepância entre a incidência e a mortalidade
nas duas regiões como conseqüência do uso mais Leitura recomendada
intenso dos rastreamentos nos Estados Unidos, sem
1. Barry MJ. Prostate-specific-antigen testing for early diagnosis
que haja convicção dos benefícios destes. No of prostate cancer. N Engl J Med 2001; 344: 18.
exterior, não há consenso sobre o rastreamento do 2. http://www.inca.gov.br
câncer prostático e, mesmo as entidades que o 3. Hugosson J. Early diagnosis: state of the art in clinical routine
apóiam, como a AUA e a American Cancer Society, and screening studies. In: Kurt KH, Mickisch GH, Schröder
FH. Renal, bladder, prostate and testicular cancer –
recomendam que seja efetuado somente com o un update. Ed. The Parthenon Publishing Group. New York.
consentimento do voluntário ou paciente após 2000, p. 91.
esclarecimentos sobre o risco/benefício. 4. Labrie F, Candas B, Dupont A, Cusan L, Gomez JL, Suburu
Acreditamos que os rastreamentos ativos devam RE, Diamond P, Levesque J, Belanger A. Screening
decreases prostate cancer death: first analysis of 1988
se restringir aos projetos de pesquisa, e seu emprego Quebec prospective randomized controlled study.
em larga escala, com objetivos assistenciais, deve Prostate 1999; 38: 83.
aguardar o surgimento de evidências mais sólidas, 5. Standaert B, Denis L. Prostate cancer screening. In: Kaisary
favorecendo o denominador da equação custo+risco/ AV, Murphy GP, Denis L, Griffiths K. Text Book of
Prostate Cancer – Pathology, Diagnosis and
benefício. Não obstante, recomendamos que o Treatment. Ed. Martin Dunitz. London. 1999; p. 103.
rastreamento passivo deva ser realizado rotineiramente,

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Capítulo 128
Genética e câncer de próstata

Nelson Gattás

Por muito tempo atribuiu-se a origem do tumor


prostático como e determinada pela estimulação hor-
monal da testosterona, porém, atualmente, sabe-se que
o desenvolvimento tumoral é regido geneticamente,
sendo em 10% dos casos por transmissão hereditária e
os demais por alterações genéticas esporádicas.
Estudos epidemiológicos sugeriram um aumento
do risco de morte por CaP entre parentes de primeiro
e segundo graus. Pesquisas recentes sugeriram a
presença de pelo menos um locus de gene dominante
responsável pela transmissão hereditária do CaP, sendo
identificados os genes HPC1 e o BRC1 como os
prováveis envolvidos no processo.
Figura 1: O acúmulo de mutações pode afetar a expressão dos
genes controladores do equilíbrio celular

Cada tecido tem em seu código genético infor-


mações sobre divisão celular e apoptose, promo-
vendo seu próprio equilíbrio. As mutações gené-
O aparecimento do CaP esporádico, como a ticas, por vezes, provocam uma desativação de
maioria dos tumores sólidos, surge de um acúmulo genes supressores tumorais ou ativação de onco-
de alterações genéticas ocorridas ao longo da vida. genes, que desorganizam a homeostase tissular ou
No sentido amplo, mutação gênica pode ser defi- por aumento desgovernado da divisão celular ou
nida como qualquer tipo de alteração no material pela diminuição da apoptose, causando assim o
genético não esperada que se pode perpetuar nas aparecimento dos tumores.
demais gerações celulares. Atualmente, aceita-se o Pelos estudos já realizados, sabe-se hoje que uma
conceito de que a gênese tumoral está baseada no grande quantidade de genes estão envolvidos na
acúmulo destas mutações, que podem afetar a carcinogênese prostática, sendo o maior número
expressão de genes controladores do equilíbrio deles genes supressores de tumor, como o Rb, o
celular dos tecidos, predispondo ao aparecimento p53, e o PTEN, e não-oncogenes como o RAS, o
de neoplasias (Figura 1). MYC e o ERBB2.

433

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Seção VII F

Também fatores como o de maior prevalência Leitura recomendada


tumoral em indivíduos negros, bem como o apare-
cimento de metástases e a transformação em tu- 1. Harrington KJ, Spitzweg C, Bateman AR, Morris C, Vile
RG. Gene therapy for prostate cancer: current status and
mores refratários ao tratamento hormonal são re-
future prospects. J. Urol; 166: 1220-33, 2001.
gidos geneticamente. 2. Gattas N. Construção de sistema gênico em plasmídeo para
O conhecimento cada vez maior do código avaliar o Gene PTEN como supressor tumoral em células de
genético envolvido na formação do CaP é que veio câncer prostático. Tese de doutorado apresentada ao Departa-
propiciar o desenvolvimento de uma nova modali- mento de Cirurgia da Unifesp, 1999.
3. Latil A, Lindereau R. Genetics aspects of prostate cancer.
dade de tratamento, que é a terapia gênica, ainda
Virchov arch. 432: 389-94, 1997.
em fase de avaliação laboratorial, e portanto com 4. Ruijter E, Van der Kaa C, Miller G, Ruiter D, Debruyne F,
resultados clínicos precários, porém com um caráter Schalken J. Molecular genetics and epidemiology of prostate
promissor muito grande na cura do CaP. carcinoma. Endocrine Rev. 1997, 20 (1): 22-45.

434

Untitled-2 434 11/03/04, 13:44


Seção VII F

Capítulo 129
PSA – importância no diagnóstico

Gilvan Neiva Fonseca

Desde sua identificação e introdução como um PSA e câncer


efetivo marcador biológico nos anos 1970, o PSA
tem grande impacto no screening, diagnóstico, O potencial de utilização do PSA no screening do
tratamento e análise terapêutica do câncer da próstata. câncer da próstata tem sido demonstrado em vários
Inúmeros estudos clínicos têm evidenciado o seu estudos. Níveis de PSA de 2,5 a 4 ng/mL podem
grande potencial de utilização em oncologia urológica. evidenciar câncer clinicamente significatante de 13%
Trata-se de uma glicoproteína de 34Kd, constituída a 22%. Níveis de PSA entre 4,1 e 10 ng/mL, o
de aproximadamente 240 resíduos de aminoácidos, câncer foi detectado em cerca de 27% a 33% e acima
semelhante à calicreína humana. de 10 ng/mL, a incidência foi acima de 50% de
Sua forma molecular exibe cinco epítopos que fun- neoplasias. O PSA acima de 10 ng/mL é altamente
cionam como antígenos para os anticorpos utilizados indicativo de doença não-confinada e invasão
nas análises e ensaios clínicos. É produzido nas células extracapsular. Acima de 20 ng/mL é altamente
epiteliais com grande concentração nos ductos e ácinos indicativo de doença extraprostática. Autores estimam
das células prostáticas e níveis um milhão de vezes que a produção de PSA é cerca de 3,5 ng/mL/g de
superior às concentrações plasmáticas. câncer. Análises computadorizadas e estudos de
regressão logística associando PSA, escore de
Formas moleculares do PSA Gleason, PIN, marcadores moleculares e densidade
microvascular têm evidenciado maior sensibilidade
O PSA é identificado na circulação sistêmica sob três no estadiamento patológico e na progressão da
formas: a forma livre com baixa concentração, pequena doença. Vários autores com grande número de séries
vida média, rapidamente filtrada nos glomérulos renais e e estudos cohorts publicados do PSA têm determinado
de forma similar à encontrada no ejaculado. As formas sensibilidade de 58% a 92%, especificidade de 40%
conjugadas representam maior concentração sérica e estão a 84%, valor preditivo positivo de 31% a 54%,
ligadas, alfa-1-antiquimotripsina e alfa-2-macroglobulina acurácia de 56% a 90%.
com vida plasmática de 2,2 a 3,2 dias, metabolizadas em
nível hepático. Inúmeros kits utilizando anticorpos
monoclonais e policlonais encontram-se à disposição para Densidade e relação
a análise clínica Yang Pros-Check, Hybritech (Tandem E percentual do PSA
e R), TOSOH, IMX Lab. Abbott, ACS Lab. CIBA.
Padronizado por vários autores, o índice clínico de Inúmeros trabalhos têm evidenciado uma corre-
sensibilidade é de 0,1 ng/mL. lação proporcional dos valores de PSA e o volume

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Seção VII F

da glândula prostática. A correlação pode ser obtida ao ano e projetam com este fato um aumento de
dividindo o valor do PSA pelo volume da glândula 17,1% de valor preditivo positivo na detecção do
prostática (em cm 3 ). Apenas 2% de HPB câncer. A velocidade de crescimento acima de 200%
apresentam valores de PSA acima de 10 ng/mL e ao ano pode representar a presença de prostatite.
25% dos pacientes com PSA entre 4 e 10 ng/mL Alguns investigadores têm demonstrado elevações
podem apresentar histologia benigna. A relação PSA biológicas do PSA com a ejaculação, massagem
livre/PSA total tem efetivamente melhorado a prostática, cistoscopia, sondagem vesical, biópsias da
especificidade do PSA quando aplicado no screening. próstata, ultra-som endorretal e exercícios de ciclismo.
Níveis maiores que 25% representam crescimento
benigno e níveis inferiores a 10% estão relacionados
em 60% com o adenocarcinoma. Homens utili- PSA e o tratamento do câncer
zando finasterida podem apresentar 50% de redução da próstata
do PSA em três meses.
Vários estudos sugerem que o PSA-nadir, após a
prostatectomia radical, deve permanecer abaixo de
PSA e idade 0,2 ng/mL, o que caracteriza a não-evidência de
recorrência. Níveis de PSA acima de 0,4 ng/mL
O PSA tende a aumentar seus valores com o apresentam recorrência em 100% dos pacientes. No
avanço gradual da idade, isto possivelmente com tratamento radioterápico, o PSA decresce nos próxi-
desenvolvimento de HPB. Os valores referenciados mos 1,4 a 2,6 meses seguintes à terapia. Após a
na literatura, em homens de 40 a 79 anos de idade, irradiação, 25% dos pacientes apresentam valores de
poderão ser utilizados em screening com 95% de PSA de 2,5 ng/mL ou menos. Apenas 11% apresentam
intervalos de confiança (Tabela 1). O uso da tabela remissão em níveis indetectáveis. O PSA-nadir é um
de valores de PSA específico poderá em screenings importante indicador de resposta à terapia hormonal.
aumentar a sensibilidade de detecção de câncer da Na terapia hormonal, acima de dois terços apresentam
próstata em homens jovens. uma remissão duradoura de PSA, 31% decrescem em
níveis normais e 9% apresentam níveis indetectáveis.
Tabela 1: Relação idade screnings PSA

Conclusão
O PSA é o mais importante marker tumoral em
oncologia urológica. Sua análise permite aferir
com sucesso o comportamento biológico do cân-
cer da próstata. Pode ser usado com segurança no
Oesterling e colegas (CI 95%) screening diagnóstico e na análise de estadiamento,
monitorar a evolução e as respostas às várias
modalidades de tratamento.
Velocidade de PSA
A velocidade de PSA é a mudança de seus valores Leitura recomendada
ao longo do tempo. O crescimento da próstata pode
ser aferido e monitorado anualmente pelos valores de 1. Ernstoff MS, Heaney JA, Peschel. RE- Prostate Cancer,
PSA. A velocidade de PSA é utilizada com um mínimo Ed. Blackwell Science Inc., USA, 1998.
de três títulos com intervalos de dois anos. As 2. Belldegrun A, Kirby RS, Oliver T. New perspectives in
prostate cancer. Ed. Isis Medical Media Ltd, 1998.
publicações e conceitos atuais na velocidade do PSA 3. Kaisary AV, Murphy GP, Denis L, Griffiths K. Prostate
projetam o aumento máximo de 20% ao ano e/ou cancer – Pathology, Diagnosis and Treatment. Ed.
0,75 ng/mL/ano. Trabalhos recentes evidenciam que Martin Dunitz, 1999.
o câncer apresenta crescimento do PSA de 50% a 100% 4. Campbell’s Urology – 8a edição.
5. Guideliness of American Urological Association, 2003.

436

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Seção VII F

Capítulo 130
O exame físico na avaliação do
câncer de próstata

Augusto José de Aragão

O exame físico permanece como uma ferramenta disso, durante este momento da anamnese e exame
relevante para o diagnóstico do câncer de próstata (CaP), físico, podem ser dadas explicações sobre quais sinais
mesmo com a evolução dos métodos complementares, estão sendo procurados durante o exame físico, e
como o PSA, o USG, e as biópsias guiadas por USTR, quais podem ser indicativos de câncer.
que auxiliam em uma detecção cada vez mais precoce. Na fase inicial, os sintomas podem estar comple-
Deixado muitas vezes para um segundo plano, por tamente ausentes, o que faz muitos homens não procu-
médicos que preferem realizar somente a investigação rarem o urologista por não estarem sentindo nada.
laboratorial e de imagem para a próstata, o exame físico, Além disso, a maior parte dos sintomas urológicos
especificamente o toque retal, ainda é de suma impor- que acometem o homem, na faixa etária em que o
tância no dia-a-dia do urologista. CaP predomina, correspondem a sinais e sintomas de
No caso do toque retal, a probabilidade de um hiperplasia prostática benigna e não ao câncer. Por isso,
homem com o toque retal suspeito ter câncer é de uma busca ativa deve ser realizada em todos os casos.
quase um em três (valor preditivo positivo – VPP = O toque retal se torna, assim, uma etapa importante
22% a 34%). A probabilidade aumenta quando esta no exame físico na avaliação do CaP.
suspeita é encontrada em homens com hiperplasia Antes de realizar o toque, devemos fazer uma
prostática benigna, geralmente mais idosos. Da inspeção da região perianal, para afastar patologias
mesma maneira, o VPP é maior em homens da raça hemorroidárias ou carcinomas anais, que podem ser
negra do que na branca (38% versus 22%). Vários uma causa de dor e prejudicar o exame adequado.
estudos nos últimos dois anos concordam que, para A maioria dos casos de CaP está localizada na
valores de PSA maiores que 4 ng/mL, o toque retal zona periférica da próstata, e pode ser detectada
combinado ao PSA serve efetivamente para a investi- durante o toque retal, quando o seu volume é maior
gação do diagnóstico precoce do CaP, por suas altas que 0,2 cc3. A presença de anormalidades no toque
taxas de detecção. retal significa câncer em 15% a 40% dos casos, de
Como parte da consulta inicial, o exame físico, acordo com a experiência do examinador. O pri-
além de sua função diagnóstica, complementa o meiro sinal pode ser um nódulo endurecido, lem-
vínculo na relação médico-paciente, pois transmite brando que nem todo nódulo endurecido significa
confiança a este no momento em que é examinado, câncer de próstata, podendo ser também um
e não são apenas solicitados exames. Da mesma nódulo de hiperplasia prostática benigna, cálculo
maneira, o contato, associado a explicações, ajuda a prostático, tuberculose, prostatites, áreas de infarto,
quebrar tabus e a difundir a importância da consulta anomalias do ducto ejaculatório, anomalia da
urológica e do diagnóstico precoce do CaP. Além vesícula seminal, flebolitos da parede retal, pólipos

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Seção VII F

ou tumores retais. Geralmente, nos nódulos neoplá- Na fase avançada da doença, o CaP pode manifestar-
sicos, há uma consistência firme e bordo nítido, sem se com dores ósseas decorrentes de metástases à distância,
elevações da superfície, ao contrário do que acon- alteração do fluxo urinário com evolução para retenção
tece em patologias infecciosas. urinária, havendo globo vesical palpável, hematúria,
A consistência da próstata, que normalmente é a linfoadenopatias, edema de membros inferiores e queda
da borracha ou da região tênar da mão, pode do estado geral com caquexia concomitante.
encontrar-se endurecida ou pétrea, com perda dos Quanto à faixa etária para realizar o toque retal,
limites laterais ou com as vesículas seminais em casos recomenda-se realizar o exame em todo homem
avançados. Estas, por sua vez, normalmente não- acima de 50 anos de idade. No caso dos homens com
palpáveis, podem estar endurecidas ou pétreas, casos de CaP nos familiares de primeiro grau, esta
significando metástases. A perda da mobilidade e idade deve ser reduzida para os 40 anos. Em todos os
fixação da próstata à parede do reto também é um casos, o exame deve ser realizado anualmente.
sinal de doença avançada.
Por causa do risco significativo de CaP, reco-
menda-se a biópsia de próstata para todo paciente Leitura recomendada
com toque retal suspeito, independente do valor do
1. Aus G, Abbou CC, Pacik D, Schmid HP, van Poppel H,
PSA, porque 25% dos homens com CaP têm valores WolffJM, Zattoni F. EAU. Guidelines on Prostate Cancer.
de PSA abaixo de 4 ng/mL. Nestes valores de PSA, Eur Urol. 2001 Aug; 40(2): 97-101.
há controvérsia sobre se o toque retal é importante 2. De la Rosette JJ, Alivizatos G, Madersbacher S, Perachino
M, Thomas D, Desgrandchamps F, de Wildt M. EAU
na detecção do CaP, pois o VPP do toque diminui à
Guidelines on Benign Prostatic Hyperplasia (BPH). Eur
medida que diminui o valor do PSA; entretanto, a Urol. 2001, Sep; 40(3): 256-63.
importância do toque permanece independente do 3. Netto Jr NR: Urologia Prática. São Paulo, Atheneu Ed. 4a
valor do PSA. Uma das justificativas para isto é que ed. 1999; pp. 81-95, 237-47.
4. Carter HB, Partin AW. Diagnosis and Staging of Prostate
cerca de 20% dos CaP crescem fora da zona periférica Cancer. In: Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein AJ,
da próstata, que pode ser detectável ao toque, Campbell’s Urology. Philadelphia, W.B.Saunders Company.
crescendo na zona de transição. 1998; pp. 2519-38.

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Seção VII F

Capítulo 131
Biópsia – quando e como?

Marcus Vinicius Maia Rezende

A biópsia prostática (Bxptt) teve grande impulso gues aos pacientes, contendo referências em caso de
com o advento da ultra-sonografia transretal (USTR). emergência, telefone ou bip.
Associado ao melhor conhecimento da anatomia zo- Deve-se dar preferência para o posicionamento
nal da glândula prostática, descrita por Mc’Neal, este do paciente em decúbito lateral esquerdo, em lugar
método atualmente é considerado o “padrão ouro” da inconveniente posição de litotomia.
para diagnóstico do câncer de próstata. Possui indi-
cação precisa nos casos de elevação do antígeno pros- Preparo intestinal
tático específico (PSA) ou exame digital retal (EDR)
Os defensores do preparo intestinal afirmam que
suspeito. Devido à baixa especificidade, as alterações
as fezes podem interferir mecanicamente no estudo,
texturais encontradas no exame ultra-sonográfico não
além de aumentar o risco de complicações infec-
constituem, isoladamente, indicação para biópsia. ciosas, enquanto outros autores discordam total-
Achados histopatológicos de neoplasia intra-epitelial mente. Lindert e Terris acusaram bacteremia em 16%
e atipia celular indicam re-biópsia, embora o intervalo das biópsias; destas, 87,5% não tiveram preparo intes-
entre os procedimentos não esteja bem-estabelecido. tinal. Já Carey e colegas não evidenciaram diferença
Idealmente, devemos ter a biópsia prostática diri- significativa de complicações importantes entre os
gida por USTR como método simples, eficaz e se- grupos, em um estudo com 410 pacientes. Apesar
guro, entretanto não existe um consenso em relação de controverso, Soloway e colegas mostram que 79%
ao preparo e técnicas empregadas para sua realização, dos urologistas americanos prescrevem rotineira-
como veremos. mente algum tipo de enema.

Profilaxia antibiótica
Preparo da pré-biópsia
Estudos mostram uma redução das complicações
Exames laboratoriais não são realizados rotineira- infecciosas quando antibióticos são administrados
mente, e jejum somente é necessário se estiver progra- profilaticamente. Novamente, não existe uma unifor-
mada sedação. midade na escolha do medicamento e sua dosagem.
Pacientes em uso de anticoagulantes, ácido acetil- Taylor e colegas reportam uso de 13 antibióticos dife-
salicílico, devem ser orientados a suspender o medica- rentes, em 48 regimes distintos, adotados pelos urolo-
mento com uma semana. gistas no Reino Unido. Importante é que o antibiótico
Consentimento informado sempre deve constar tenha amplo espectro de ação, particularmente para
na rotina pré-biópsia. Orientações sobre os descon- bactérias do grupo Gram-negativo, e tenha boa pene-
fortos e complicações pós-biópsia devem ser entre- tração no tecido prostático. Por estas características, as

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Guia Prático de Urologia

fluoroquinolonas têm grande aceitação, podendo ser estudos não obtiveram o mesmo sucesso. Peters e
administradas na véspera do procedimento ou horas colegas defendem a sedação usando propofol, mas com
antes. Vários estudos recentes enfatizam os convenientes inconveniente da maior complexidade do método.
da profilaxia em dose única, sem comprometer sua Nossa experiência concorda com a literatura que a
segurança. Cuidado especial deve ser empregado em injeção de lidocaína no feixe periprostático reduz
pacientes portadores de valvulopatia cardíaca que drasticamente a sensação dolorosa do procedimento,
necessitam de profilaxia para endocardite bacteriana, enquanto a aplicação de lidocaína gel intra-retal não difere
assim como pacientes imunodeprimidos, diabéticos. do grupo placebo (Tabela 1).

Analgesia
Apesar da biópsia de próstata ser bem-tolerada pela
Material necessário
maioria dos pacientes, a dor e o desconforto do Figura 1.
procedimento não devem ser negligenciados, como
mostra o estudo de Irani e colegas, em que 19% dos
pacientes recusariam repetir a biópsia sem anestesia. Em Estratégias
1996, Nash e colegas já descreviam importante redução
da dor injetando lidocaína 1% no feixe vasculonervoso Em 1989, Hodge e colegas introduziram o con-
periprostático. Resultados semelhantes foram ceito de biópsias sistemáticas, em que a próstata era
comprovados por vários outros autores. Usando dividida em seis sítios (sextantes), vindo substituir as
método simples, Issa e colegas defendem o uso de biópsias dirigidas e tornar-se técnica padrão mun-
lidocaína gel intra-retal, alcançando diferença significativa dialmente. Algum tempo depois, novas estratégias
da dor comparado com grupo placebo. Vários outros foram propostas, evidenciando níveis de falso-

Tabela 1: Seqüência para preparação de biópsia prostática

Figura 1: Equipamento necessário para procedimento de biópsia prostática

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Guia Prático de Urologia

negativo na ordem de 25% com a técnica em sex- transição e uma da linha média, acrescentando cinco
tantes. Eskew e colegas somaram aos sextantes quatro fragmentos aos sextantes; conhecido como “método
biópsias nas bordas laterais (duas de cada lado) e dos 11 sítios”, conseguiu um acréscimo de 33% sobre
três biópsias da linha média, totalizando 13 frag- a técnica dos sextantes.
mentos e melhorando a sensibilidade do método em Presti e colegas também defendem biópsias das bor-
35% – técnica que ficou conhecida como das “cinco das laterais somadas aos sextantes. Retirando duas
regiões”. amostras de cada lado, alcançaram uma sensibilidade
Babaian e colegas, baseados em modelos simu- de 96% com o método. Mais tarde, estes autores re-
lados de reconstrução computadorizada de espécies portam uma variação da técnica desconsiderando o
de prostatectomia radical, propuseram a retirada de fragmento da linha parassagital da base prostática de
dois fragmentos das bordas laterais (que denomi- cada lado, diminuindo para oito fragmentos, e
naram “corno anterior”), duas biópsias da zona de mantendo a sensibilidade no nível de 95% (Figura 2).

Figura 2: Estratégias

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Seção VII F

Cuidados pós-biópsia as referências em caso de emergência, telefone ou bip.


As complicações mais freqüentes e o algoritmo de
Os pacientes sempre devem ser orientados sobre condutas adotadas pelo serviço de urologia do Hos-
os desconfortos e complicações pós-biópsia, incluindo pital Ipiranga-SP estão exemplificados na Tabela 2.

Tabela 2: Complicações em biópsia de próstata

* Retenção urinária simples (sem sinais de prostatite aguda, febre) – cateterismo vesical + antibioticoterapia por 7 dias

Leitura recomendada
1. Hodge KK, McNeal JE, Terris MK, Stamey TA. Random 2000; 163: 163-7.
systematic versus directed ultrasound guided transrectal core 3. Matlaga BR, Eskew LA, McCullough DL. Prostate biopsy:
biopsies of the prostate. J Urol, 1989; 142: 71-5. Indications and technique. J Urol, 2003; 169: 12-9.
2. Presti JC, Chang JJ, Bhargava V, Shinohara K. The optimal 4. Terris MK. Ultrasonography and biopsy of the prostate. In:
systematic prostate biopsy scheme should include 8 rather Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein AJ. Campbell’s
than 6 biopsies: results of a prospective clinical trial. J Urol, Urology. 8th ed. 2002.

442

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Seção VII F

Capítulo 132
Re-biópsia – por que e como?

Stênio de Cássio Zequi


Rodrigo Souza Madeira Campos

Até 34% das biópsias sextantes habituais (Hodge primeira vez, com exceção de neoplasias de pequeno
e colegas, 1989) são falsas-negativas. Isso ocorre volume (< 0,5 cm3) encontradas após três ou quatro
porque a técnica interessa apenas à região parassagital exames. Djavan e colegas, não demonstraram diferença
da próstata não removendo fragmentos da zona estatística significativa em 1.051 pacientes quanto ao
transicional, das regiões mais laterais e anteriores à estádio Gleason e a evolução clínica entre tumores
uretra (com até 10% a 20% de positividade). Um diagnosticados no primeiro exame versus na re-biópsia.
fragmento sextante remove apenas 1/500 da glân-
dula, limitando a acurácia principalmente em grandes
A morbidade da re-biópsia
próstatas (> 50g). Não se registra aumento da morbidade em re-
Existem dúvidas a respeito da realização de re- biópsias comparadas ao exame inicial.
biópsia prostática.
Profilaxia
Positividade da re-biópsia Na manhã do exame é realizado um enema e
inicia-se o uso de fluoroquinolonas por três a cinco
Até 96% dos cânceres são detectados nas duas
dias. As complicações agudas mais comuns são: hema-
primeiras biópsias.
túria, reflexo vagal, sangramento retal e retenção e as
A positividade na segunda, terceira e quarta
crônicas: hematúria, hemospermia, disúria, infecção/
biópsias varia respectivamente entre 10% a 20%, 5% bacteremia, retenção. Após a terceira biópsia, a morbi-
a 9% e 2% a 4%. Removendo-se 23 fragmentos em dade pode ser maior.
média, sob anestesia na Mayo Clinic, encontrou-se
31% e 20% de positividade nos quarto e quinto Quem deve ser re-biopsiado
exames respectivamente. Casos de forte suspeita
Pela chance de positividade entre 2% e 20% em
podem requerer até mais biópsias. Casos de menor
novas biópsias, a maioria dos pacientes submetidos à
risco podem ter as biópsias evitadas após dois ou
primeira biópsia é candidata a pelo menos mais um
três exames negativos.
exame. Tentativas de selecionar pacientes de “baixo
Importância clínica de uma neoplasia risco” para a re-biópsia (PSA < 10 ng/mL; PSAd
diagnosticada através da re-biópsia < 0,15 ng/mL/cc; PSAV < 0,75 ng/mL/ano; ausência
de NIP, história familiar, toque e ultra-sonografia
Tumores diagnosticados em re-biópsias têm a normais) são infrutíferas, pois 23,8% destes indi-
mesma importância clínica daqueles diagnosticados na víduos têm diagnóstico de câncer em novo exame.

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Guia Prático de Urologia

Quando indicar Número de fragmentos e zonas


biopsiadas
Fatores inequívocos que indicaram um primeiro
exame são os mesmos que indicam a re-biópsia (PSA Inexiste consenso sobre o número ideal de frag-
> 10 ng/mL, toque retal suspeito/sugestivo), associa- mentos. Além dos fragmentos sextantes, há a tendência
dos a duas novas informações: os achados anatomo- de se incorporar em ambos os lados três fragmentos
patológicos e ultra-sonográficos. mais lateralizados da zona periférica (apiciais, médias
Nos casos de PSA entre 4 e 10 ng/mL (zona cin- e basais). Um a dois fragmentos da zona transicional
zenta), indica-se nova biópsia nas seguintes condições: também devem ser coletados, principalmente em
PSA superior ao valor ajustado para idade, ou PSA próstatas com mais de 30 a 50 g, nas quais se inclue a
densidade > 0,15 ng/mL/cc, ou velocidade de ele- biópsia das regiões anteromedial e justauretral.
vação de PSA > 0,75 ng/mL/ano. O percentual de
PSA livre/PSA total é o melhor, mais reprodutível e Quando?
acessível método na determinação de novas biópsias, Uma nova biópsia pode ser realizada após seis
principalmente quando inferior a 25% – 30%. semanas do exame inicial sem incremento de morbi-
A densidade de PSA pela zona transicional é dade. Pacientes ansiosos ou com forte suspeição
26 ng/g/cm3 quando disponível (baixa reproduti- clínica podem ser biopsiados antes deste prazo. Nos
bilidade em nosso meio) indica o procedimento. casos de menor risco de câncer, um período de seis
Lesões nodulares hipoecogências na ultra-sonografia a 12 meses permite acompanhar a curva de PSA,
transrretal prévia devem ser re-biopsiadas. sem atraso diagnóstico significativo.
Pacientes que em uma primeira biópsia apresen-
taram neoplasia intra-epitelial de alto grau (NIP de Sedação e analgesia
alto grau) ou atipias prostáticas configuram alto risco
para o câncer, entre 27% até 80% das vezes, devendo Na Europa e nos EUA, os níveis de ansiedade e
ser re-biopsiados. Parece haver maior chance de posi- desconforto frente ao exame e à necessidade de
tividade nos sextantes imediatamente adjacentes àque- sedação são estatisticamente maiores (p < 0,05) nos
les acometidos pela NIP ou atipia no exame prévio. pacientes mais jovens (< 65 anos). Exames sob anes-
Por exemplo, se um ápice ou base apresentam NIP tesia permitem a remoção de um maior número
ou atipia, as maiores chances de positividade serão de fragmentos com possível incremento de positivi-
neste mesmo sextante (remover três fragmentos), nos dade. Embora suportável sob anestesia tópica, tra-
fragmentos contralaterais em espelho (remover dois ta-se de um momento estressante. A decisão deve
a quatro fragmentos) e no terço médio ipsilateral (re- ser individualizada.
mover dois fragmentos). Lesões no terço médio de-
vem indicar biópsias no ápice e base ipsilaterais e
também no terço médio contralateral.

Figura 2: Resumo indicações, prazos e técnica da re-biópsia da


próstata. Re-biópsias: conclusões

Leitura recomendada
1. Fleshner NE, O’Sullivan M, Fair W R Prevalence and
Figura 1: Esquema de indicação de uma segunda biópsia de predictors of a positive repeat transrectal ultrasound guided
acordo com Djavan e colegas. Algoritmo: PSA e re-biópsias. biopsy of prostate J Urol 158: 505-8, 1997.

444

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Guia Prático de Urologia

2. Allen EA, Kahane H, Epstein JI. Repeat biopsy strategies for 4. Stewart CS, Leibovich BC, Bradley C et al. Prostate
men with atypical diagnoses on initial prostate needle biopsy. cancer diagnosis using a saturation needle biopsy technique
Urology 52: 803-7, 1998. after previous negative sextant biopsies. J Urol: 166: 86-
3. Djavan B,Waldert M, Zlotta A et al. Safety and morbidity of 92. 2001.
first and repeat transrectal ultrasound guided prostate needle 5. Djavan B, Renzi M, Schulman CC et al. Repeat prostate
biopsies: Results of a prospective European cancer detection biopsy: who, how and when? A review. Eur Urol:
study J Urol 166:856-60, 2001. 42(2):93-103, 2002.

445

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 133
O estudo histopatológico da
biópsia prostática

José Carlos de Almeida

As biópsias prostáticas são realizadas para detectar Os principais critérios citológicos são núcleos volu-
carcinomas em pacientes com manifestações ao mosos, nucléolos proeminentes e ausência de células basais.
exame físico e/ou alterações do PSA. No adenocarcinoma da próstata, devemos consi-
A próstata é uma glândula constituída por ductos derar, como fator prognóstico, o componente histo-
e ácinos, situados em meio a um estroma fibromus- lógico que predomina na lesão. É neste aspecto que
cular. Os ácinos e ductos prostáticos, exceto nos seg- se baseia a gradação de Gleason.
mentos periuretrais imediatos, são revestidos por uma A gradação histológica de Gleason considera cinco
dupla população de células, representada por uma graus de diferenciação. Devem constar, no laudo da
camada interna colunar secretora e uma camada biópsia, o grau predominante e o grau secundário. A
externa formada por células basais. soma dos dois graus totaliza uma contagem final que
As células basais são reativas para citoceratina de alto varia de 2 a 10.
peso molecular (34-beta), na reação de imunistoquímica. O grau de Gleason mais freqüente em biópsias
A presença de células basais exclui o diagnóstico por agulha é o 3. Os graus 2 e 1 são muito raros e
de adenocarcinoma da próstata; por outro lado, a dificilmente detectados.
sua ausência, como critério único, não pode ser consi-
Contagem final de 2 a 5 = neoplasia de baixo grau;
derada para o diagnóstico de câncer. Outros fatores
Contagem final 6 = neoplasia de grau intermediário;
devem ser observados, tais como desarranjo arqui-
Contagem final 7 a 10 = neoplasia de alto grau.
tetural e alterações citológicas.
As biópsias obtêm material especialmente da zona
Pelo menos três glândulas atípicas são necessárias
periférica. Nesta região, predominam os carcinomas,
para fazer o diagnóstico de câncer. Em casos difíceis,
as neoplasias intra-epiteliais, inflamações crônicas e
devem ser feitos cortes seriados (três níveis). O termo
atrofias. A hiperplasia e a adenose nesta topografia
proliferação atípica de pequenos ácinos é utilizado
são achados ocasionais. em caso de dúvida.
Carcinomas da próstata O envolvimento de gânglios nervosos na biópsia
por agulha não necessariamente significa que há
Em 98% dos casos, o carcinoma origina-se nos ácinos. disseminação extraprostática. O carcinoma de prós-
O diagnóstico é feito baseado no desarranjo arqui- tata se dissemina pelos espaços neurais, porque esta é
tetural e nas características citológicas. a via de menor resistência.
O desarranjo arquitetural é representado predo- Lesões consideradas como neoplasias insignificantes
minantemente pela infiltração do estroma. são aquelas com Gleason de baixo grau ou grau

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Guia Prático de Urologia

intermediário, que comprometem menos de três


fragmentos. Os fragmentos envolvidos devem ter
menos de 50% da área comprometida.

Proliferação atípica de pequenos ácinos


Termo utilizado em caso de dúvidas, quando não
há critérios suficientes para o diagnóstico de câncer.
Alguns patologistas preferem usar o termo
“suspeito, mas não conclusivo”.
As causas mais freqüentes para esta terminologia são:
focos muito pequenos (70% dos casos), focos que desa-
parecem em cortes mais profundos (61% dos casos) e
ausência de critérios citológicos (55% dos casos).
O laudo “suspeito mas não-conclusivo” nos coloca
diante de uma dúvida diagnóstica, o que indica uma
segunda biópsia, que, de acordo com a literatura, será
positiva entre 21% a 57,1% dos casos.

Prostatites
Infiltrados inflamatórios são freqüentes em biópsias
de próstata e não significam necessariamente prostatite. Figura 1: Neoplasia intra-epitelial
O diagnóstico de prostatite tem valor quando são obser-
vados granulomas, exsudatos purulentos ou abscessos.
Causas de prostatite Nos laudos anatomopatológicos, devem ser
Bacteriana, tuberculose, secundária ao uso de BCG, registrados apenas os casos de NIP de alto grau.
sarcoidose e idiopáticas. As alterações citológicas da NIP são semelhantes
às do adenocarcinoma de próstata. O que a diferencia
Hiperplasia nodular do adenocarcinoma é a ausência de desarranjo
Crescimento não-neoplásico, decorrente da hiperplasia arquitetural e a presença de células basais.
do estroma e do tecido glandular, em graus variados. Em casos de NIP, o paciente deve ser acompa-
Geralmente origina-se em glândulas internas, não nhado, considerando-se também a possibilidade de
sendo detectada habitualmente em espécimes de uma nova biópsia.
biópsia periférica. A freqüência do encontro de adenocarcinoma
Assim sendo, nas biópsias prostáticas por agu- numa segunda biópsia é de 26% a 53%.
lha, o diagnóstico de hiperplasia nodular da prós-
tata é excepcional.

Neoplasia intra-epitelial prostática


São lesões atípicas do epitélio de revestimento de ductos
e ácinos que têm o potencial de evoluir para carcinoma.
A presença de NIP em biópsias prostáticas indica
uma grande probabilidade de o paciente apresentar
concomitantemente um adenocarcinoma. Esta possi-
bilidade é menor quando a NIP é identificada em
fragmentos oriundos de RTU.
De acordo com as alterações citológicas, as neo-
plasias intra-epiteliais são classificadas em alto ou
baixo graus.
Figura 2: Tecido prostático benigno

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Guia Prático de Urologia

Atrofias
Atrofia é usualmente vista após a sexta década,
podendo ser detectada focalmente a partir da terceira
década; geralmente resultante de inflamação, isquemia,
radiação ou hormonioterapia.
Histologicamente pode ser de forma errada inter-
pretada como adenocarcinoma.
Apesar do caráter aparentemente infiltrativo, sua
disposição conserva a estrutura lobular da glândula
prostática.

Figura 4: Adenocarcinoma de próstata

Simula carcinoma, mas não preenche todos os


critérios citológicos e arquiteturais. O padrão de células
basais é descontínuo e intermediário entre o adeno-
carcinoma e a hiperplasia nodular. Pode haver uma
variação leve no tamanho e forma do núcleo e os
nucléolos são geralmente pouco proeminentes. O
diagnóstico diferencial com o adenocarcinoma é difícil,
sendo a imunomarcação muitas vezes necessária.
Existem controvérsias sobre o significado biológico
e evolutivo desta lesão para adenocarcinoma.
Figura 3: Atrofia prostática A adenose é incomum em biópsias por agulha,
mas pode ser vista quando a zona de transição é
biopsiada intencional ou inadvertidamente.
Nas atrofias, não são observadas atipias celulares
ou nucléolos evidentes, além de haver preservação
da camada de células basais.
Leitura recomendada
A atrofia não é considerada uma alteração pré-maligna. 1. Epstein JI, Potter SR. J Urol 166:402, 2001.
2. Iczkowski KA et al. Am J Surg Pathol 21:489,1997.
Adenose 3. Billis, A. Uropatologia Próstata. Guia prático para o
diagnóstico. Goiânia: Editora da UFG, 1997.
É uma proliferação de ácinos de pequeno a médio 4. Young, Srigley, Amin, Ulbright, Cubilla. Tumors of the
calibre que formam nódulos bem-circunscritos. Prostate Gland Atlas of Tumor Pathology. AFIP, 2000.

449

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 134
Classificação, patologia e
estadiamento do câncer de próstata

Renato Scaletscky

Classificação e estadiamento os mesmos parâmetros clínicos, foram elaborados,


baseados em um grande número de pacientes
O estadiamento do câncer da próstata (CaP) submetidos à prostatectomia radical com detalhado
evoluiu muito nestes últimos anos. A classificação estudo do estádio patológico final (Tabelas de Partin
original de Whitmore-Jewett, usada amplamente até e Kattan). As percentagens nestas tabelas representam
o final dos anos de 1980, classificando a doença em a probabilidade de se ter um dado estádio patológico
quatro estágios principais (A, B, C e D), deu lugar à final, por análise de regressão logística das três
popularização maior da classificação TNM, refinada variáveis empregadas combinadas: estádio clínico pré-
algumas vezes mais recentemente (1992/1997). A operatório, valores séricos de PSA e o escore de
classificação TNM valoriza individualmente o status Gleason. Por exemplo, um paciente com PSA de 6,5
do tumor local (T), os linfonodos (N) e a presença e um pequeno nódulo palpável (T2a), cujo Gleason
de metástases (M) (Figura 1). é 6, tem cerca de 51% de chance de ter seu tumor
O objetivo deste estadiamento é unificar uma ainda confinado à próstata. Para um mesmo PSA e
linguagem universal, selecionando o paciente para o Gleason, no caso de um tumor não-palpável (T1c),
tratamento apropriado, de acordo com o nível da suas chances aumentam para cerca de 67% de ser
doença, além de predizer o prognóstico. Todo o confinado. Esse nomograma tem demonstrado, em
esforço deve ser feito para se conseguir avaliar corre- estudos recentes, eficácia superior, quando
tamente a extensão do CaP, pois não há tratamento comparado ao mero julgamento clínico, acerca da
adjuvante que possa, de forma consistente, erradicar extensão e invasão tumoral.
a doença extraprostática. Métodos de estadiamento
O estadiamento patológico (feito após a cirurgia)
é mais útil e fidedigno que o clínico, que é baseado As modalidades usadas para avaliar o status de uma
no PSA, toque retal, escore de Gleason da biópsia e neoplasia da próstata serão abordadas com maior
técnicas de imagem. A correta extensão e volume profundidade no capítulo seguinte. Utiliza-se os
do tumor, status das margens e linfonodos dão-se seguintes métodos nesta avaliação: toque retal, nível
somente no estadiamento patológico. O estadia- sérico de PSA e seus derivados, o escore de Gleason
mento clínico apresenta problemas para indicar da biópsia e métodos de imagem como a ultra-
corretamente uma prostatectomia radical, porquanto sonografia transretal (U/STR) e a cintilografia óssea.
o estadiamento patológico por vezes difere do clínico, Outras modalidades de imagem, tais como a tomo-
em geral, supra-estadiando o tumor. Desta forma, grafia computadorizada, ressonância magnética, ultra-
nomogramas, ou tabelas de probabilidades, usando sonografia abdominal, urografia venosa e raios X

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Guia Prático de Urologia

Figura 1: Classificação e estadiamento TNM para câncer de próstata

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Guia Prático de Urologia

Continuação Figura 1

simples do abdome, podem ainda ser utilizadas em Vem sendo estudado o uso do PSA complexado, cujo
casos selecionados, mas não são de uso rotineiro. ensaio é mais preciso que seu cálculo a partir do livre
Todas possuem valor clínico limitado devido à sua é total, além de outros marcadores, tais como a HK2,
incapacidade de detectar doença extraprostática. outra calicreína, como o PSA.
Após o advento do PSA, tem se observado que a A U/STR vem sendo empregada, de forma
cintilografia óssea, o melhor método para se detectar rotineira, na avaliação de próstatas suspeitas de
metástases ósseas, não costuma ser positiva em abrigarem carcinoma, há cerca de 15 anos. Seu papel
pacientes com PSA sérico menor que 10 ng/mL. Se é orientar a realização de biópsias transretais e
o escore de Gleason não colocar o paciente no grupo assegurar, ao examinador, que uma área ampla e
de pior risco, talvez este exame seja desnecessário. adequada está sendo a mostrada. Pode, também, por
O toque retal é de uso obrigatório para avaliar, vezes, fornecer uma idéia do estadiamento local, da
em casos de tumores palpáveis, sua mobilidade, extensão capsular ou extracapsular. No entanto, não
fixação e volume. No entanto, o toque retal isolado é um método preciso para se localizar um CaP inicial,
subestadia, significativamente, a possibilidade da nem deve ser usado como arma de rastreamento.
doença não estar mais restrita ao órgão. Por isso, qualquer paciente, com indicação de biópsia,
O PSA é o marcador mais útil no momento, mas, seja por toque retal alterado, elevação do PSA, ou
isoladamente, não pode precisar, com acurácia, o ambos, deve ser biopsiado, independente dos acha-
estádio da doença devido ao overlaping entre as diferentes dos ultra-sonográficos.
fases da neoplasia. Da mesma forma, seu uso para Tem havido considerável debate acerca do tumor
screening ou rastreamento é limitado pela presença de T1c, que não é palpável e cujo diagnóstico é feito
hiperplasia prostática benigna (HPB). O uso do valor pela biópsia motivada pela elevação dos níveis de
sérico total do PSA deu lugar a vários índices, tais como PSA. Originalmente, a classificação TNM de 1992
PSA ajustado para idade, PSA livre como uma fração considerava que, neste estágio, a doença não deveria
do total e, ainda, a velocidade. A densidade, calculada produzir imagem alterada ou nódulo ao U/STR, sob
a partir da divisão do PSA sérico pelo volume ultra- pena do mesmo ser re-estadiado para T2a. Atual-
sonográfico (transretal) da próstata, não consegue mente, no entanto, aceita-se que esses tumores, com
prever, de forma significativa, a real extensão pós- nódulo visível, mas não palpável, possuam um
operatória da neoplasia nem a possibilidade de comportamento semelhante ao T1c, sem alteração
recorrência bioquímica, tendo este cálculo perdido sua de imagem, devendo ser classificados como tal.
importância. A densidade, ajustada para a zona de Até o momento, não existem métodos inteiramente
transição, é melhor que a densidade calculada pelo confiáveis para se detectar doença extraprostática
volume total, mas ainda apresenta valor preditivo baixo. precoce. Pacientes de alto risco para doença N+,

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Guia Prático de Urologia

cujos métodos usuais de imagem não revelam metás- próstatas com carcinoma, mas não necessita obrigato-
tases, podem, por exemplo, ser submetidos à amos- riamente estar presente para o carcinoma desenvolver-
tragem dos linfonodos por videolaparoscopia. O uso se. O risco de encontrar-se CaP, em biópsias subse-
de anticorpos monoclonais para a detecção de qüentes a uma com PIN somente, varia entre 25% e
doença linfonodal vem sendo estudado há alguns 35% e, é motivo para repetição do procedimento.
anos (ProstaScint), demonstrando um valor preditivo PIN, por si só, não causa elevação do PSA.
positivo de cerca de 50% a 60%. Estes ainda não A Figura 2 mostra a evolução das diversas etapas de
são empregados de forma rotineira, na prática clínica. transformação do epitélio prostático normal, passando
por fases de displasia, PIN, até o carcinoma invasivo.
O tipo histológico de CaP que mais interessa ao
Patologia do câncer da próstata urologista é o adenocarcinoma. Este deve ser graduado
pelo sistema de Gleason, baseado no padrão glandular
O papel do patologista adquiriu enorme impor-
do tumor, identificado sob microscopia com pouca
tância desde que o tratamento cirúrgico vem sendo
magnificação (Figura 3). Desta forma são identificados
empregado de forma mais criteriosa, desde o advento
os dois padrões histológicos predominantes dentre
do PSA e, em mudanças na classificação, que
os cinco indicados por Gleason. Estes variam desde
valorizaram de sobremodo o estadiamento local,
entre outros. um padrão bem-diferenciado (grau 1) até um padrão
A neoplasia intra-epitelial prostática de alto grau muito pouco diferenciado (grau 5). A soma dos dois
ou PIN é a lesão precursora do carcinoma invasivo tipos predominantes fornece o escore, que vai,
da próstata. Arquitetonicamente, observam-se portanto, de 2 até 10. O prognóstico, de acordo com
glândulas prostáticas benignas, revestidas com o escore, varia de bom (2, 3, 4), moderado (5, 6) a
camadas de células citologicamente atípicas. ruim (7, 8, 9, 10). O escore 7 pode ser obtido pela
Originalmente descrita por Bostwick e Brawer em soma dos graus 4+3 ou 3+4, sendo o primeiro número
1987, substituiu os termos usados para as alterações sempre o mais predominante. Alguns autores
patológicas descritas previamente como atipias e acreditam que estes deveriam ser diferenciados, sendo
displasia intraductal. PIN de baixo grau não deve que o tumor 4+3 permaneceria no grupo de pior
mais ser referido em laudos de anatomopatológicos prognóstico, enquanto que o 3+4 se associaria ao de
pela dificuldade em diferenciar-se HPB e PIN de prognóstico intermediário. É possível que esta distinção
baixo grau. Este, em achados de biópsias, não de comportamento entre os dois subtipos de 7 venha
aumenta o risco de encontrar-se CaP em biópsias a se confirmar em estudos com follow up mais longo.
subseqüentes. A designação de PIN, portanto, refere- O escore de Gleason, no entanto, é mais fidedigno
se ao PIN de alto grau, que agora reúne os grupos em espécimes de prostatectomia radical ou de
previamente chamados de PIN2 (displasia moderada) ressecção endoscópica, que em biópsias por agulha.
e PIN3 (displasia severa). PIN está presente em maior O subestadiamento é um fato relativamente freqüente
número, principalmente em zona periférica, em em avaliações de biópsias por agulha. Além disto, os

Figura 2: Adaptado de Bostwick DG, J Urol 1995; 154: 1791-4

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Guia Prático de Urologia

O termo extensão extracapsular é mais comu-


mente empregado para caracterizar tumores nos
tecidos moles periprostáticos. A invasão perineural
ocorre ao longo de planos de menor resistência ou
“perfurações” da cápsula, sugerindo extensão extra-
capsular. No entanto, não parece piorar o prog-
nóstico nem é sinônimo de invasão linfática, que
denota um pior prognóstico.
Tumores mais avançados podem invadir as vesí-
culas seminais, em geral por propagação através da
base da glândula até a parede muscular da vesícula
seminal. Pode haver extensão pelos canais ejaculadores
(incomum) bem como focos metastáticos isolados
Figura 3: Adaptado de Gleason DF, J Urol 1974; 111: 58-64 na mesma (raro), sem extensão direta.

escores 2 até 4, nem sempre espelham o padrão final


Conclusão
e há sugestões para que sejam omitidos do laudo da Com o advento do PSA, campanhas de rastrea-
biópsia inicial, principalmente pela sua mensagem de mento e de divulgação pública do CaP, tem havido
bom prognóstico, o que nem sempre espelha a uma tendência de se diagnosticá-lo mais precoce-
realidade. Estes dados, que fornecem uma idéia de mente, de volume menor, com a possibilidade real
prognóstico, foram validados por índices de sobrevida. do emprego de terapias curativas. Portanto, todo
Volume esforço deve ser empreendido pelo urologista para
estadiar e classificar a doença de forma correta, de
De acordo com McNeal, somente tumores com mais modo que as decisões mais acertadas possam ser
de 1 cm de diâmetro (volume igual a 0,5 cm3), têm a tomadas para cada paciente.
capacidade de extensão extracapsular. A propagação para
vesículas seminais ou linfonodos em geral é mais comum
em tumores com mais de 2 cm de diâmetro. Leitura recomendada
Localização 1. Carter HB, Partin AW. Diagnosis and staging of prostate
cancer. In Walsh PC (ed.), Campbell’s Urology. Phila-
A grande maioria dos tumores situa-se em zona delphia, Saunders, 2002, cap. 88, pp. 3055-79.
periférica (cerca de 85%), principalmente em situação 2. Epstein JI, Pizov G, Walsh PC. Correlation of pathological
findings with progression following radical prostatectomy.
posterior ou postero-lateral, sendo a zona de tran- Cancer 1993; 71: 3582-93.
sição o segundo local mais freqüente. A bilateralidade 3. McNeal JE. Cancer volume and site of origin of
é também mais comum. adenocarcinoma of the prostate: Relationship to local and
distant spread. Hum Pathol 1992; 23: 258-66.
Extensão 4. Ohori M, Kattan MW, Utsonomiya T et al. Do impalpable
stage T1c prostate cancers visible on ultrasound differ from
Diversos termos são usados para definir extensão those not visible? J Urol 2003; 169: 964-8.
5. Partin AW, Kattan MW, Subong EN et al. Combination of
extraprostática. O termo invasão capsular, em geral, PSA, clinical stage and Gleason score to predict pathological
refere-se ao tumor atingindo a região da cápsula, sem, stage of localized prostate cancer. A multi-institutional
no entanto, ultrapassá-la. update. JAMA 1997; 277: 1445-51.

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 135
Como estadiar o câncer de próstata

Valdemar Ortiz
Marcos Lima de Oliveira Leal

Inicialmente, o estadiamento do câncer da próstata Tabela 1: Classificação e estadiamento TNM para câncer de
era baseado exclusivamente em dados clínicos (co- próstata
mo o toque retal) e exames de imagem. A partir
destas informações, definia-se o estadiamento clí-
nico, cujo sistema de classificação é o TNM. Devido
às falhas que ocorrem com este método, surgiram
novos conceitos de definição de risco.
Atualmente, para melhor definição de risco,
combinam-se as informações da avaliação clínica
a critérios como nível de PSA sérico, grau de Glea-
son e interpretação dos dados da biópsia prostá-
tica. Os principais objetivos do correto estadia-
mento do câncer de próstata são predizer prog-
nóstico e selecionar terapia adequada.
A principal via de disseminação linfática é, para a
cadeia ilíaco-obturadora, ocorrendo em até 10% dos
casos da doença, inicialmente, considerada localizada.
Nos pacientes com metástase hematogênica, o principal
sítio acometido são os ossos do esqueleto axial. Em
caso de doença terminal, 85% dos pacientes têm
metástase óssea e 20% têm metástase visceral, sendo
fígado e pulmão os principais órgãos acometidos.

Métodos de estadiamento

Toque retal
Este método ainda é muito utilizado para avaliação
da extensão local do câncer. A partir dos achados, po-
demos iniciar o estadiamento clínico do TNM (Tabela 1).

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Guia Prático de Urologia

O toque retal tem limitações por ser examinador Exames de imagem


dependente, não apresentar alterações em casos ini-
ciais, além de erros na estimativa da extensão da O estadiamento locorregional por exames de ima-
doença. Tumores considerados inicialmente loca- gem pode ser feito com a realização de USG-transretal,
lizados em pacientes submetidos à prostatectomia tomografia computadorizada e ressonância magnética.
radical evidenciam comprometimento extrapros- Na avaliação quanto à metástase à distância, realiza-se
tático pelo exame anatomopatológico em até 40% a cintilografia óssea e exames de raios X.
60% dos casos. O advento, em larga escala, de rastreamento para
Da mesma maneira que 20% a 30% dos tumores câncer de próstata tem permitido diagnóstico mais
classificados inicialmente como extraprostáticos são precoce, com redução na incidência de doença metas-
localizados. Apesar destas limitações é etapa tática e de doença localmente avançada. A alta inci-
obrigatória da avaliação. dência do câncer de próstata e o alto custo dos exa-
mes de imagem levam à necessidade do uso racional
PSA destes métodos.
A definição dos pacientes de baixo risco para
O PSA é uma glicoproteína de baixo peso mole-
doença metastática (PSA < 10 ng/mL, estágio < T2c
cular (33 kDa), da família das calicreínas. É excretado
e Gleason < 7) permite que neste grupo não haja
pelos ductos prostáticos para a luz uretral como
necessidade de realizar exames de imagem para
parte do plasma seminal, tendo função de lique-
complementar o estadiamento.
fação. Pequena fração atravessa a membrana basal
O USTR tem limitada capacidade em mapear a
e alcança a circulação. O nível de PSA considerado
extensão da doença na glândula prostática. A deter-
normal é abaixo de 4,0 ng/mL, porém alguns fato-
minação da infiltração capsular, em pacientes com
res interferem nesta avaliação. O PSA tem impor-
doença clinicamente localizada submetidos à prosta-
tante papel no diagnóstico precoce e controle do
tectomia radical, tem sensibilidade em torno de 66%
paciente tratado.
e especificidade de 46%.
O nível de PSA pré-tratamento tem sido bastante A avaliação da pelve por exames de TC e RMN é
usado em estratificação de risco e avaliação do geralmente realizada para excluir metástases linfonodais
resultado após tratamento local. A concentração em pacientes candidatos à terapia local. Entretanto, a
sérica do PSA correlaciona-se com o volume tumoral incidência de metástases linfonodais é baixa (< 5%) e
e o estadiamento. De maneira geral, 70% a 80% dos os exames têm alto custo com baixa sensibilidade
pacientes com valores de PSA inferiores a 4 ng/mL (36%), apesar de especificidade de 97%. Os pacientes
apresentam doença restrita ao órgão, enquanto se PSA que parecem se beneficiar da realização destes exames
entre 4,1 a 10 ng/mL estes índices chegam a 55%. devem ter alto risco de metástase linfonodal com
Em casos de PSA maior que 20 ng/mL a chance de ausência de doença à distância. Neste grupo, incluem
doença confinada ao órgão é menor que 20%. os pacientes que têm cintilografia óssea normal, grau
Apesar destas associações, o nível isolado do de Gleason maior que 6, toque retal anormal (T2 a
PSA não tem mostrado acurácia para um estadia- T4) e um PSA sérico maior que 25.
mento correto. Enquanto o acometimento linfonodal é relativa-
Uma avaliação em conjunto com o grau de Glea- mente incomum na apresentação inicial, a extensão
son do tumor e estádio clínico aumenta consideravel- extracapsular ocorre de 20% a 40% e a invasão da
mente a sensibilidade e a especificidade em predizer vesícula seminal em torno de 8%. A utilização de
o comprometimento linfonodal quando comparado USTR e RMN para avaliar extensão local da doença
com o uso isolado do PSA. parece ser mais confiável que a tomografia. Porém,
O uso de nomogramas que levam em conta estas devido à grande variabilidade encontrada nos
associações permite uma melhor avaliação de risco resultados de sensibilidade destes métodos, torna-se
pré-operatório e ajuda em uma definição da melhor necessária a interpretação destes achados em asso-
estratégia de tratamento. ciação com o grau de Gleason, nível de PSA, estádio
Outros dados como percentagem de biópsias clínico e dados de biópsia. A utilização de RMN com
positivas, refinamento dos métodos de imagem e o coil endorretal parece ser mais útil nos casos de risco
uso de marcadores moleculares podem melhorar intermediário, trazendo pouca informação adicional
ainda mais a estratificação de risco. nos casos de alto e baixo risco.

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Guia Prático de Urologia

A cintilografia óssea tem substituído o uso de raios X Leitura recomendada


na detecção de metástase do câncer de próstata. Ape-
sar da alta sensibilidade, tem baixa especificidade. O 1. Rees MA, Resnick MI, Oesterling JE. Use of prostate specific
antigen, Gleason score, and digital rectal examination in
PSA é o melhor método para predizer os resultados
staging patients with newly diagnosed protate cancer. Urol
da cintilografia. Nos casos com PSA < 15 ng/dL, a Clin North Am 1997, 24: 379-88.
possibilidade de uma cintilografia óssea positiva é 2. Partin W, Carter HB, Chan DW, Epstein JL, Oesterling JE,
menor que 0,6%. Rok RC, Webwer JP, Walsh PC. Prostate Specific Antigen in
staging of localized prostate cancer: influence of tumor
O uso de graduação do tumor, estádio local ou a
differentiation, tumor volume and benign hiperplasia. J Urol
combinação destes dados, não se mostrou superior 1990, 143: 747-52.
ao PSA isoladamente. Desta forma, a realização da 3. Oesterling JE. Using PSA to eliminate the staging radionuclide
cintilografia óssea pode ser omitida nos casos com bone scan.Significant economic implications. Urol Clin North
Am 1993, 20: 705-11.
PSA < 15.
4. Partin AW, Kattan MW, Subong EN, et al. Combination of
prostate-specific antigen, clinical stage, and gleason score to
predict pathological stage of localized prostate cancer. A
Linfadenectomia pélvica multi-institutional update. JAMA 1997, 277: 1445.
5. Narayan P, Gajendran V, Taylor SP, et al. The role of transrectal
A incidência de metástases linfonodais tem diminuído ultrasound-guided biopsy-based staging, preoperative serum
prostate-specific antigen, and biopsy Gleason score in
com a detecção mais precoce da doença, variando de prediction of final pathologic diagnosis in prostate cancer.
3% a 5%. A indicação de linfadenectomia pélvica deve Urology 1995, 46: 205.
ser relacionada com dados de diferenciação celular e
nível de PSA (Gleason > 6 e PSA > 15).

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 136
Doença localizada – opções
terapêuticas

Antonio Carlos Lima Pompeo

As campanhas de detecção precoce do câncer de gica da PR, teve reduzida a alta incidência de compli-
próstata (CaP) trouxeram um novo panorama rela- cações (incontinência, disfunção erétil, perda exces-
cionado ao seu tratamento, pois cada vez mais vêm siva de sangue intra-operatória) para índices acei-
sendo diagnosticadas neoplasias em estádios iniciais, táveis e essa operação passou a ser empregada em
com maior potencial de cura. praticamente todos os centros urológicos. Tem
Embora o CaP tenha em geral evolução lenta, sua como vantagem erradicar, de maneira imediata
história natural é variável, apresentando, por vezes, metás- populações de células tumorais, inclusive as radior-
tases precoces, quando a cura é excepcional devendo a resistentes.
orientação terapêutica ser instituída sem demora. Estatísticas recentes mostram cerca de 80% dos
Fatores prognósticos permitem antever compor- pacientes com estádio T1-2 Nx M0 (A-B) tratados
tamento biológico mais agressivo desses tumores, pela PR sem evidência de progressão da doença após
tais como: cinco anos (Tabela 1) e 47% a 73% após dez anos
a) histologia desfavorável (Gleason 7-10); (pelas dosagens de PSA) (Tabela 2).
b) alterações da ploidia; Admite-se que pacientes submetidos a PR, uma
c) extensão local (estádio); e vez constatado envolvimento de linfonodos e/ou
d) PSA elevado. vesículas seminais, necessitam de tratamento hor-
Esse comportamento variável orienta condutas tera- monal complementar.
pêuticas totalmente opostas. Na atualidade admitem-se Fatores determinantes do sucesso terapêutico
duas modalidades de tratamento com potencial de cura: pela PR:
‹ prostatectomia radical (PR); a) ausência de margens comprometidas e de infil-
‹ radioterapia (Rdt). tração de vesículas seminais e/ou linfonodos;
O regime de “observação” (sem tratamento) tam- b) níveis séricos de PSA indetectáveis três meses
bém é aceito em casos selecionados. Não existe, até após a cirurgia; e
o momento, consenso na literatura sobre a melhor c) histologia tumoral favorável (Gleason < 7). Não
alternativa a ser empregada “em todos os casos”. existe consenso sobre quais limites séricos do PSA con-
Revisão da Associação Americana de Urologia (1995) tra-indicariam a cirurgia.
de 12.501 artigos sobre o tema considerou aceitáveis A hormonioterapia neoadjuvante é controversa,
apenas 165 (1,3%), o que mostra a falta de unifor- podendo alterar a interpretação do exame histológico,
midade dos dados divulgados. e sua eficácia em termos de intervalo livre de doença
A prostatectomia radical, após a notável contri- e sobrevida não está bem-estabelecida. A maioria
buição de Walsh (anos 1980) para a anatomia cirúr- contra-indica seu emprego.

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Guia Prático de Urologia

Tabela 1: PR ausência de progressão (AP) após cinco anos

Tabela 2: PR ausência de progressão (AP) após dez anos

Radioterapia quando na seleção se incluem o estadio (T1-T2a), PSA


< 15 ng/mL e histologia favorável. Os modernos
A radioterapia, método terapêutico preferencial equipamentos de radioterapia, conformacional ou
durante décadas, tinha como argumentos favoráveis multiplanar, possibilitam a visão tridimensional
índices de complicações menos expressivos que as computadorizada da próstata, limitando os campos
operações do passado. Além disso, os resultados de de irradiação e diminuindo o comprometimento de
cura a longo prazo, segundo autores como Bagshaw órgãos adjacentes (portanto, os índices de compli-
e colegas, seriam semelhantes aos da PR. Atualmente, cações a curto e longo prazos) (Tabelas 3 e 4).
embora muito empregada, tem índices de falha em
30% a 40% dos casos, normalmente com clones celu-
lares radiorresistentes às doses usualmente utilizadas. Braquiterapia
Esses pacientes evoluem com biópsias positivas para
neoplasia um ano ou mais após a radioterapia, sinal Técnicas recentes de braquiterapia com colocação
de mau prognóstico. Catalona e colegas mostram percutânea de sementes radioativas (iodo, paládio)
índices globais de elevação do PSA pós-radioterapia oferecem vantagens por tratar-se de procedimento
em 35% a 75% dos casos em cinco anos e em 80% simples e apresentar baixos níveis de complicações.
após dez anos, superiores aos da prostatectomia Resultados a longo prazo estão por ser mais bem-
radical, excetuando-se os doentes com infiltração local definidos, principalmente pela dificuldade na distri-
extracapsular e/ou vesículas seminais. buição das irradiações nas áreas tumorais. Próstatas
Níveis de PSA séricos pós-radioterapia podem pequenas (< 60 g), PSA < 10 ng/L e histologia favo-
fornecer dados prognósticos importantes quando, rável são critérios considerados ideais para este proce-
após quatro meses, não caem para níveis abaixo de dimento, com resultados semelhantes aos da radio-
4 ng/mL, aumentando significativamente os índices terapia externa.
de recorrência. Os níveis de PSA que demonstram
estar o paciente livre da doença continuam a suscitar
controvérsias e ainda não foram definidos, variando
Crioterapia
de 0,5 a 4 ng/mL (ideal < 1 ng/mL). A crioterapia, utilizada no passado, foi reativada
A seleção de pacientes interfere expressivamente nos em alguns serviços, visando o tratamento do CaP
resultados obtidos pelos diversos métodos terapêuticos. localizado. O procedimento atual é pouco invasivo,
Assim, na radioterapia, melhores resultados são obtidos sendo a hipotermia determinada por nitrogênio

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Guia Prático de Urologia

Tabela 3: Progressão livre de doença (PLD) após radioterapia. Resultados com períodos < 5 anos

Adaptada de Scardino

Tabela 4: Progressão livre de doença (PLD) após radioterapia. Resultados com períodos > 10 anos

Adaptada de Scardino

líquido conduzido por probes colocados por via Recomendações para


percutânea, com prévio aquecimento uretral da área tratamento do CaP localizado
correspondente ao colo vesical e ao esfíncter externo. (T1-T2)
Os resultados terapêuticos mostraram significativo
avanço nas técnicas atuais com baixos índices de As recomendações do Consenso Brasileiro sobre
fístulas e estenoses A disfunção erétil continua a ser Câncer de Próstata (1998) são:
uma complicação freqüente. Os índices de sobrevida
a longo prazo não estão bem-definidos. É um proce- Prostatectomia radical
dimento que pode ser empregado em escapes da
‹ Expectativa de vida superior a dez anos;
terapia local, principalmente na radioterapia.
‹ Ausência de contra-indicações clínicas para a
cirurgia;
Regime de observação ‹ Participação do paciente na decisão terapêutica.

Radioterapia
O regime de observação tem seus adeptos (Johans-
son e colegas), os quais defendem a teoria de que o ‹ Pacientes com risco para o tratamento cirúrgico;
benefício do tratamento cirúrgico ou radioterápico ‹ Expectativa de sobrevida suficientemente longa
pouco acrescentaria em termos de sobrevida. A maior para que o tratamento se justifique;
crítica a esses estudos é a inclusão de elevado percentual ‹ Ausência de patologia colorretal que contra-
de pacientes idosos, com histologia favorável e baixo indique a irradiação;
estádio e de conhecido pequeno risco de progressão. ‹ Participação do paciente na decisão terapêutica.
Essa conduta pode ser recomendada para doentes com
as citadas características, mas não para pacientes mais Conduta expectante
jovens, com histologia e estadiamento menos favoráveis,
‹ Expectativa de vida inferior a dez anos;
pois nessas condições os índices de progressão são muito
‹ Histologia favorável (bem diferenciados ou
altos. Dados de história natural (Catalona e colegas)
moderadamente, Gleason 2 a 6);
mostram índices de progressão em cinco e dez anos,
‹ Participação do paciente na decisão.
respectivamente, de 5% a 10% - A1 (T1a); 35% a 80%
O sucesso terapêutico das opções citadas depende
- A2 (T1b); 35% a 55% - B1 (T2a); 77% a 90% - B2
muito da seleção criteriosa dos pacientes, cuja participação
(T2b) e praticamente 100% - C (T3c).
é recomendável na escolha do método de tratamento.

463

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Seção VII F

Leitura recomendada Holmberg L, Krusemo UB. High 10-years survival rates in


patients with early, untreated prostatic cancer. JAMA
267:2191-6, 1992.
1. Bagshaw MA, Cox RS, Ray GR. Status of radiation treatment
4. Scardino P. treatment option for localized prostate cancer.
of prostate cancer at Stanford University. NCI Monogr. 7:
In: Prostate cancer treatment: stage by stage. Postgraduate
47-60, 1988.
Course 9750, AUA, 1997.
2. Blasko JC, Frimm PD, Ragde H. Brachitherapy and organ
5. Walsh PC. Radical retropubic prostatectomy. In: Walsh PC,
preservation in the management of carcinoma of the prostate.
Retik AB, Stamey TA, Vaughan ED Jr (ed.). Campbell’s
Semin Radiat Oncol 3: 240-9, 1993.
Urology. Philadelphia, WB Saunders 3:2865-6, 1992.
3. Johansson JE, Admai HO, Andersson SO, Bergstrom R,

464

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Seção VII F

Capítulo 137
Prostatectomia radical –
retropúbica versus perineal
versus laparoscópica

Nelson Rodrigues Netto Junior


Maurício Rodrigues Netto

Os critérios de indicação da prostatectomia radical existem situações que podem fazer a cirurgia ser mais
já foram apresentados em outro capítulo. Atualmente difícil. Do ponto de vista anatômico, da mesma forma
temos três modalidades cirúrgicas: retropúbica, que ocorre na cirurgia aberta, nas próstatas pequenas
perineal e laparoscópica. (menores de 20 g), geralmente, a dissecção é mais difícil,
pois os limites da glândula ficam mais difíceis de serem
reconhecidos. O oposto também ocorre, pois em
Prostatectomia radical próstatas volumosas (mais de 80 g) a dissecção e a
laparoscópica mobilização lateral são mais difíceis, principalmente
quando a cavidade pélvica é profunda e estreita.
A prostatectomia radical laparoscópica foi primei- Outras condições, como obesidade, prostatite ou
ramente realizada em 1991 por Schuessler e colabo- cirurgia prévia da próstata, tornam a cirurgia mais
radores, cujos resultados obtidos em nove casos difícil, mas não representam contra-indicações para
foram publicados em 1997. Os resultados não foram a cirurgia, exceto quando relacionadas à anestesia.
encorajadores e os autores concluíram que a laparos- Terapia hormonal neoadjuvante pode causar maior
copia não era uma alternativa eficaz se comparada à dificuldade cirúrgica, em grande parte devido ao
prostatectomia aberta. A partir de janeiro de 1998, menor volume da glândula.
Guillonneau e Vallancien iniciaram no Instituto
Montsouris em Paris a prostatectomia radical Cuidado pré-operatório
laparoscópica, apoiados na larga experiência com a
Esses cuidados são gerais e os mesmos utilizados
prostatectomia radical retropúbica e cirurgia
nos outros procedimentos cirúrgicos.
laparoscópica. Atualmente, a cirurgia é praticada em
diversos países. Antibioticoterapia profilática
As principais vantagens do método são a redução Aplicação endovenosa de cefalosporina de terceira
da morbidade no intra e pós-operatório e a melhor geração duas horas antes da operação.
preservação das estruturas vasculares, musculares e
do feixe vasculonervoso conseguida com a ampliação Prevenção antitrombótica
ótica das imagens. É muito importante devido ao risco acumulado
de fatores: neoplasia, cirurgia pélvica e laparoscopia.
Contra-indicações específicas Recomenda-se o uso diário de heparina subcutânea,
Não existem contra-indicações anatômicas que de baixo peso molecular, cuja dose é estabelecida de
possam ser previstas antes da cirurgia. No entanto, acordo com o risco do paciente. Inicia-se três horas

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Guia Prático de Urologia

antes da operação e mantém-se até 15 dias após a O inconveniente do método é a longa curva de
cirurgia. A deambulação a partir do primeiro dia pós- aprendizado, além disso, os resultados oncológicos,
operatório deve ser estimulada, como também o uso apesar de comparáveis atualmente, necessitam de maior
de meia elástica. tempo de seguimento para serem comprovados.
Não é necessária tricotomia ou preparo intestinal
de rotina.
Prostatectomia radical perineal
Alguns destaques da cirurgia
A prostatectomia radical perineal foi a primeira
A grande vantagem da cirurgia laparoscópica é a cirurgia usada para o tratamento do câncer da
qualidade da imagem do campo cirúrgico. A próstata. Descrita no século XIX por H. Young, foi
identificação e preservação do feixe vasculonervoso a técnica mais utilizada para o tratamento do câncer
é mais fácil que na cirurgia aberta, devido à da próstata até o final da década de 1970.
magnificação da imagem. Os pequenos vasos são Com a introdução das modificações e melhoria
cauterizados com bisturi bipolar com o intuito de técnica, a via retropúbica tornou-se mais popular.
evitar lesão térmica, porém não há confirmação Atualmente a cirurgia perineal é realizada em pou-
que este método seja superior aos demais. cos centros, sendo poucos os urologistas treinados
De modo geral, é preservado o colo vesical, mas nessa cirurgia.
não é necessária a eversão da mucosa vesical. A cirurgia é minimamente invasiva, com as vanta-
A anastomose uretrovesical deve ser cuidadosa, gens de atuar em uma região relativamente avascular,
podendo ser usada sutura contínua ou pontos permitindo boa exposição e facilitando a recons-
separados, ao redor de 12 pontos. O objetivo é não trução da anastomose uretrovesical. Os pacientes mais
haver extravasamento de urina e conseqüente fibrose idosos toleram muito bem esta via de acesso, fato
uretral. O vazamento de urina na anastomose pode, nem sempre verificado na via intraperitoneal, em
também, provocar íleo paralítico transitório. As lesões decorrência de limitações na expansibilidade pul-
da bexiga e ureter são muito raras. monar no pós-operatório.
A via de acesso extraperitoneal começou a ser Em suma, a prostatectomia perineal é associada
utilizada mais recentemente, como também os com pequena perda de sangue, pequena incisão, curto
robôs, facilitando a cirurgia, inclusive melhorando período de internação, pequeno desconforto pós-
os resultados. operatório e rápido retorno às atividades.
O cateter uretral é retirado entre quatro e dez dias, A principal crítica à cirurgia é quanto à linfadenec-
podendo ser removido a partir do segundo dia, desde tomia pélvica. Atualmente, quando indicada, ou seja,
que as condições da anastomose sejam adequadas. a tabela de Partin indicando a possibilidade de metás-
Complicações tase para linfonodos maior que 5%, a linfadenecto-
mia é realizada por via laparoscópica e deve
A taxa de conversão para cirurgia aberta está preceder o acesso perineal.
abaixo de 5%, com tendência para 0%. As compli- Outra desvantagem apontada é que a preservação
cações operatórias ocorrem raramente e diminuem do feixe vasculonervoso é mais difícil por via perineal
com a experiência do cirurgião. As complicações que retropúbica.
neurológicas ou musculares estão relacionadas à Contra-indicação à cirurgia pode ocorrer nos
posição do paciente e ao tempo de cirurgia. As lesões casos de anquilose coxofemoral e cirurgia prostática
da bexiga e ureter são muito raras. As maiores aberta, prévia. Na obesidade mórbida, a posição
complicações são as lesões do reto com incidência de litotomia forçada pode representar contra-indi-
menor que 1%. cação parcial em razão da limitação dos movi-
A continência urinária obtida é em torno de 75% mentos do diafragma.
após seis meses e de 87% após um ano. Estudos recentes mostram que os resultados são
A potência sexual é avaliada por intermédio de comparáveis com a retropúbica em termos de mar-
métodos diversos, alguns por interrogatório direto gens positivas, incisão capsular, continência e potência,
realizado pelo médico, outras vezes por questioná- bem como em relação ao controle do câncer a longo
rios enviados pelo correio, o que não permite ade- prazo. As complicações são as mesmas que as da
quada comparação e avaliação. prostatectomia retropúbica (Figuras de 1 a 4).

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Guia Prático de Urologia

Cortesia Dr. Renato Prado Costa

Cortesia Dr. Renato Prado Costa


Figura 1: Via de acesso à prostatectomia perineal

Cortesia Dr. Renato Prado Costa

Figura 3: Corte esquemático da cirurgia

Cortesia Dr. Renato Prado Costa

Figura 4: Sutura uretrovesical

Prostatectomia radical
retropúbica
A prostatectomia radical retropúbica é a cirurgia
mais utilizada atualmente para o tratamento do câncer
da próstata localizado. A partir de 1982, com as modi-
ficações introduzidas por Walsh, a morbidade e a mor-
talidade da cirurgia diminuíram muito. Os objetivos
do cirurgião na ordem são: cura do câncer, pre-
servação da continência e preservação da potência.
Figura 2: Posicionamento do paciente – litotomia forçada Para conseguir esses objetivos, a indicação da cirurgia,
isto é, a seleção dos pacientes deve ser rigorosa.

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Seção VII F

É preconizado um intervalo de seis semanas entre feixe reduz a menos de 50% a chance de manutenção
a biópsia da próstata e a cirurgia e de 12 semanas da atividade sexual.
após ressecção transuretral da próstata. Este intervalo
permite a resolução do processo inflamatório e hema-
toma, tornando a cirurgia mais anatômica, permitindo Leitura recomendada
a preservação do feixe vasculonervoso e evitando lesão
1. Schuesler W, Schulam P, Clayman R et al. Laparoscopic radical
do reto. A taxa de mortalidade é de 0,2%, a necessidade prostatectomy; initial short-term experience. Urology 50: 854-7, 1997.
de transfusão diminui com a experiência do cirurgião 2. Guillonneau B, Cathelineau X, Barret E, et al. Prostatectomie
e sua equipe e as taxas de continência e potência são radicale Coelioscopique. Premiere evaluation après 28
variáveis nas diferentes séries publicadas, variando de interventions. Presse Medicale 27: 1570-4, 1998.
3. Walsh PC. Anatomic radical retropubic prostatectomy. In:
2% a 10% e de 30% a 60%, respectivamente. A prin- PC Walsh, AB Retik, ED Vaughan Jr. and AJ Wein Edit.
cipal causa de incontinência é a deficiência esfincteriana Campbell’s Urology 7th ed., Philadelphia, W.B. Saunders
intrínseca. A preservação da potência está relacionada Co., vol 2 Chapt 86, p. 2565, 1998.
a três fatores: idade, estádio clínico e patológico e 4. Weldon VE. Technique of modern radical perineal
prostatectomy. Urology, 60: 689-94, 2002.
técnica cirúrgica adequada, com preservação ou não 5. Guillonneau B. Laparoscopic radical prostatectomy: Here to
do feixe vasculonervoso. A preservação unilateral do stay? AUA news, vol. 8 issue 2, 47-8, 2003.

468

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Seção VII F

Capítulo 138
Análise crítica das manobras para
preservação da continência e da
função erétil

Marcelo Luiz Bendhack

A prostatectomia radical (PTR) é um proce- à preservação da continência e potência são os


dimento tecnicamente desafiador, no qual pequenas cuidados com o plexo venoso retropúbico e a dis-
diferenças na técnica cirúrgica podem apresentar secção apical.
enorme impacto sobre os resultados. A redução de Neste capítulo serão consideradas duas compli-
sua morbidade nos permite indicar esta como forma cações relacionadas à PTR: incontinência urinária (IU)
ideal de tratamento para doença localizada, deter- e disfunção erétil (DE).
minando o mínimo de efeitos colaterais possíveis e
excelente controle oncológico.
Desde que o antígeno prostático específico (PSA) Incontinência urinária
foi estabelecido como marcador tumoral para detec-
ção precoce do carcinoma da próstata (CaP), aumento A IU após PTR apresenta incidência de 2% até
importante na incidência desta doença foi verificado. 32%. A maioria dos estudos apresenta taxas de cerca
Outra conseqüência da determinação do PSA de 10%. Ela tem efeito deletério significativo sobre
consiste no fato de que a maioria dos tumores da a qualidade de vida.
próstata atualmente diagnosticados se encontram na Sabe-se que, após a retirada do catéter transuretral,
fase de doença localizada e, assim sendo, são passíveis ela é muito freqüente e pode regredir de modo
de tratamento curativo pela PTR. importante e espontâneo em um período de até seis
Assunto de pesquisa de extrema importância em meses após a cirurgia. Melhora pouco significativa
relação a esta doença, ainda em desenvolvimento, é a pode ser observada, no entanto, até 12 meses depois.
definição de parâmetros – no período pré-operatório Uma das dificuldades associadas ao tema é a
– que possam determinar o potencial de malignidade definição de IU. Enquanto muitos consideram
do tumor. continência como a falta absoluta de absorventes,
Enquanto pesquisas não permitem definir, com outros aceitam o uso de um absorvente/dia.
segurança, este potencial, o diagnóstico precoce e o A IU após PTR pode ser atribuída, basicamente,
tratamento cirúrgico associado ao mínimo de compli- à incompetência do esfíncter, porém a instabilidade
cações permanecem como objetivos principais. do detrusor, a obstrução ao fluxo ou a combinação
A avaliação da possibilidade de reduzir compli- destes fatores também pode favorecer sua ocorrên-
cações deste procedimento curativo não pode, de cia. Urgência miccional é diagnosticada em 67% dos
modo algum, comprometer seu princípio número casos de IU após PTR.
um: o controle oncológico do CaP. Os aspectos Estatisticamente, a incidência de IU pode ser asso-
fundamentais para o controle do câncer associado ciada aos seguintes fatores:

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Guia Prático de Urologia

Idade Outras tentativas têm sido descritas para a manu-


Fator importante, porém não comprovado em tenção da continência. Elas incluem a preservação
todos os estudos. Pacientes com menos de 70 anos de do colo vesical (pouca importância), reconstrução
idade apresentam incidência de IU de 5%, enquanto de colo vesical (substitui sua preser vação) e
que com mais de 70 a taxa aumenta para 13%. uretropexia anterior. Alguns recomendam a
preservação dos ligamentos retropúbicos, o que
Experiência do cirurgião manteria o suporte anterior da uretra. Em estudo
Parece evidente que o cirurgião mais experiente controlado, a continência foi readquirida mais
tenha menos complicações. rapidamente no grupo em que esta técnica foi
empregada.
Pode haver relação entre a estenose da anastomose Importantes são os cuidados com a técnica, pois
e o desenvolvimento de IU. Muitos estudos, no os resultados de vários métodos conservadores de
entanto, não comprovam esta associação. O mesmo tratamento da IU, no período pós-operatório, perma-
se verifica para a preservação dos feixes neuro- necem incertos. Ao se verificar IU após PTR, o paciente
vasculares (FNV). História prévia de ressecção transu- deve ser orientado a evitar o consumo de cafeína,
retral ou radioterapia pélvica podem facilitar o líquidos em grande quantidade e bebidas alcoólicas.
desenvolvimento de IU. Exercícios esfincterianos durante a micção devem
Os principais pré-requisitos para manutenção ser realizados, bem como o diagnóstico por exclusão
da continência são a integridade do músculo esfínc- de possível estenose de colo vesical. Medicamentos
ter externo e o comprimento da uretra funcional. como alfa-agonistas, anticolinérgicos e antidepressivos
Ainda persiste o dilema não resolvido da manu- (imipramina) podem ser prescritos.
tenção da uretra intrapélvica mais longa poder O uso de injeções de colágeno/teflon pode ser
determinar margens apicais positivas, localização indicado em casos de IU leve, porém não pode ser
mais freqüente deste fator prognóstico negativo. utilizado em homens que receberam radioterapia e/
O esfíncter estriado não é um simples músculo ou apresentem estenose de colo vesical. Em casos
anular periuretral dentro do diafragma pélvico, mas mais severos está indicado o implante de esfíncter
artificial.
sim estrutura complexa com fibras circundando
o ápice da próstata. Quanto mais estas fibras sejam
preservadas, maior a probabilidade de recuperar Disfunção erétil
a continência após a PTR.
A preservação do plexo pélvico e das fibras auto- Complicação importante, com incidência que varia
nômicas para o esfíncter estriado também contribui de 9% a 89%.
para o controle da continência pós-operatória. Antes do início dos anos de 1980, impotência foi
Cuidados especiais devem ser observados com a em geral considerada como resultado inevitável da
técnica da anastomose vesicuretral. Estudos PTR. Após a exata descrição neuroanatômica dos
demonstram vantagem para o direto envolvimento ramos autonômicos do plexo pélvico para o corpo
do tecido muscular do esfíncter estriado na sutura cavernoso, técnica especial foi apresentada para a
da anastomose. preservação dos mesmos.
Embora não exista correlação significativa entre Os princípios são dissecção apical cuidadosa e
potência e continência, é geralmente aceito que fatores dissecção próxima/junto ao aspecto póstero-lateral
anatômicos – mais que a preservação de nervos da próstata. Nas melhores séries, técnica nerve-sparing
autônomos – tenham grande impacto no aumento bilateral permitiu recuperação da função sexual em
do controle urinário após PTR. até 91% dos casos, dependendo da idade do pa-
Em algumas situações de pequeno coto uretral, ciente. Além da idade e da técnica cirúrgica empre-
pelve estreita ou profunda, ou ainda hemorragia ve- gada, estádio tumoral e a forma de anastomose
nosa persistente, a anastomose vesicuretral indireta vesicuretral influenciam as taxas de impotência no
(Vest technique, [Igel e colegas., 1988]) pode ser uma pós-operatório (Tabela 1).
alternativa. Alguns cirurgiões preferem a eversão da A técnica de avaliação dos resultados, por exem-
uretra para o interior da pelve através de compressão plo, entrevistas diretas, revisões de prontuários ou
direta sobre o períneo. questionários enviados por correio, e a definição de

470

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Guia Prático de Urologia

Tabela 1: Influência da idade e preservação dos feixes neurovasculares (FNV) na função sexual

potência podem modificar os resultados de publi- Conclusões


cação. O impacto da técnica nerve sparing no controle
do câncer tem sido amplamente discutido e indi- As complicações após PTR têm sido reduzidas de
cações desta técnica devem ser lembradas quando a modo significativo durante os últimos 15 anos. Basea-
mesma é considerada (Tabela 2). da em estudos anatômicos, a técnica cirúrgica vem
Embora discutível, muitos autores suportam o sendo desenvolvida continuamente e tem contribuído
conceito de que a preservação da função sexual não para melhores resultados de continência e potência.
compromete o controle do câncer. Atualmente, tanto Todavia, eliminação radical de todo tecido tumoral
a incidência de IU como da DE deveriam ser baixas. continua a ser o objetivo principal da PTR. O aspecto
Se isto não ocorre, revisão de videoteipe intra-opera- básico do controle do câncer, como para o controle
tório de casos com sucesso e insucesso pode contribuir da continência e potência, é a técnica de abordagem
no sentido de melhorar os resultados. do plexo dorsal e a dissecção apical/póstero-lateral.
Recomendações técnicas para evitar complicações Com a técnica atual se tornou possível curar a maioria
no período pós-operatório, com referência especial dos homens com doença localizada e melhorar sua
à IU e impotência, são apresentadas na Tabela 3. qualidade de vida após a cirurgia.

Tabela 2: Indicações para preservação dos feixes neurovasculares (FNV)

Tabela 3: Recomendações técnicas para evitar complicações como incontinência urinária e impotência sexual, após prostatectomia radical

471

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Guia Prático de Urologia

Continuação Tabela 3

472

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Guia Prático de Urologia

Leitura recomendada 3. Jarow JP. Puboprostatic ligament sparing radical retropubic


prostatectomy. Semin Urol Oncol. 2000 Feb; 18(1):28-32.
4. Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein, AJ. Campbell’s
1. Bendhack ML, Miller S, Ackermann R. Surgical therapy of
Urology. Oitava edição, Philadelphia, 2002.
locally confined prostate carcinoma. Schweiz. Rundsch.
5. Wirth M. Prostatakarzinom – Therapie des lokal begrenzten
Med. Prax. Nov 12; 86 (46): pp. 1819-24, 1997.
Prostatakarzinoms. Em: Rübben H (editor). Uro-
2. Ebert T, Bendhack ML. Prostatakarzinom - Diagnostik,
Onkologie. Springer-Verlag Berlin Heidelberg New York,
hormonelle Therapie, Radiotherapie, Chemotherapie.
pp. 233-67, 2001.
Urologe A, 36: 570-7, 1997.

473

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Seção VII F

474

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Seção VII F

Capítulo 139
O anatomopatológico da
peça cirúrgica

Paulo Martins Rodrigues


Henrique da Costa Rodrigues

A correta análise histopatológica da peça cirúrgica prognóstico, pacientes com EEC associada a margens
da prostatectomia radical e sua interpretação, além de negativas e escore de Gleason menor que 7 se
critérios prognósticos na determinação de probabilidade comportam como pacientes com doença confinada.
de sobrevida livre de doença, também é determinante Por outro lado, a presença de EEC associada a tumores
para a instituição de tratamentos adjuvantes, como com escore de Gleason maior ou igual a 7 e/ou margem
radioterapia do leito prostático ou terapia hormonal. positiva está associada a pior prognóstico.
Os critérios prognósticos mais importantes na
interpretação do laudo anatomopatológico de uma Invasão de vesícula seminal
prostatectomia radical são: A invasão da vesícula seminal pelo câncer de
próstata é classificada no sistema TNM como pT3b.
Presença de doença Nesses casos a doença não está mais confinada ao
órgão e a possibilidade de sobrevida livre de doença
extraprostática em cinco anos está em torno de 34%. É importante
que sejam estabelecidos junto ao patologista critérios
Extensão extracapsular (EEC) exatos para determinação da invasão de vesícula
seminal. A invasão da chamada porção intraprostática
É a presença de tumor na gordura periprostática, da vesícula seminal pode na realidade ser carac-
nos espaços perineurais do feixe neurovascular ou terizada como invasão do ducto ejaculador e seu im-
formando um nódulo que se estende para fora dos pacto sobre o prognóstico é bem menor, já que ainda
limites prostáticos. É classificado como pT3a no sistema é considerado um tumor pT2. Outra fonte de con-
TNM. É importante que o patologista informe se a trovérsia é a invasão do tecido periprostático ao redor
EEC é focal ou extensa, já que esta diferença tem valor da vesícula seminal. Estes pacientes têm extensão
prognóstico. Para ser considerado pT3, é necessário que extracapsular e devem ser classificados como pT3a.
haja tumor fora da cápsula prostática, quando esta pode
ser reconhecida. A informação de que o tumor “invade
a cápsula prostática sem contudo ultrapassá-la” não tem Margens cirúrgicas
valor do ponto de vista prático e deve ser abandonada.
Outra consideração a ser feita é a diferenciação de A definição de margem positiva é a presença de
margem positiva com invasão EEC. Pode haver EEC tumor na superfície ressecada pelo cirurgião. Assim,
com margem negativa, assim como pode haver achados como “tumor próximo à margem” não de-
margem positiva sem EEC. Do ponto de vista vem ser reportados. No ápice prostático, local mais

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Guia Prático de Urologia

freqüente de margem cirúrgica positiva, a incidência tumor geralmente se dá através de metástases à dis-
de margem positiva pode estar associada à forma tância e a radioterapia externa do leito prostático não
que o patologista processa a amostra. Quando é feito costuma oferecer resultados.
um shave do ápice prostático, há uma chance maior
de diagnósticos falsos-positivos de margem cirúrgica
comprometida. Uma causa iatrogência de margem Presença de metástase para
positiva é a incisão capsular, quando há transecção linfonodos pélvicos
de tumor intraprostático. A incisão capsular ocorre
mais freqüentemente na face posterolateral, geral- A incidência de comprometimento linfonodal tem
mente resultado de uma tentativa de preservação do diminuído nos últimos anos graças à possibilidade
feixe vasculonervoso. Do ponto de vista prognóstico, de diagnóstico mais precoce de câncer de próstata e,
a presença de margem cirúrgica positiva diminui as atualmente, está em torno de 1,5%. Congelação intra-
chances de sobrevida livre de doença em 5 anos de operatória de linfonodos só tem sentido se o cirur-
82% para 60%. Margens positivas extensas, multifocais gião tem a intenção de interromper a prostatectomia
ou associadas à EEC estão associadas a pior prog- radical em função do achado de linfonodo positivo.
nóstico. Pacientes com margem cirúrgica positiva Quando realizar a linfadenectomia, o cirurgião deve
geralmente estão mais propensos a recidivas locais exigir que toda a gordura que envolve os linfonodos
da doença e podem se beneficiar de radioterapia ex- seja incluída para estudo. Do ponto de vista prog-
terna no leito prostático, ficando a critério do cirurgião nóstico, o acometimento linfondodal é definido
definir se precoce ou tardiamente. como doença avançada.
Outros dados como presença de invasão peri-
neural, invasão vascular, volume tumoral, ploidia de
Grau de diferenciação tumoral DNA e densidade microvascular ainda têm valor
(escore de Gleason) controverso na interpretação dos resultados de uma
prostatectomia radical, e seu relato no laudo fica a
O escore de Gleason é o mais importante fator critério do patologista e do cirurgião.
prognóstico de progressão após prostatectomia
radical. O escore é a soma dos dois graus mais fre-
qüentes à amostra. Escores de 2 a 4 são raros e estão
geralmente associados a tumores de zona de transição
achados incidentalmente após ressecção transuretral da Tabela 1: Classificação e estadiamento TNM para câncer de próstata
próstata (estágios T1a e T1b). Escores de 5 e 6 têm
prognóstico relacionado com o de outras variáveis
como margem cirúrgica e EEC. Tumores com escore
de Gleason 7 têm prognóstico pior que os de escore
5 e 6, principalmente quando o componente dominante
é quatro (tumores 4 + 3 são piores que tumores 3 +
4). Escore de Gleason VII associado a outros achados
adversos como margem comprometida ou EEC tem
prognóstico ruim, com risco de progressão de mais
de 60% em 5 anos. Tumores com escore de Gleason
de 8 a 10 têm prognóstico muito ruim e geralmente
se apresentam em fase avançada, não sendo passíveis
de remoção cirúrgica. A recorrência deste tipo de

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Guia Prático de Urologia

Leitura recomendada
2. Sakr WA, Grignon DJ. Practice parameters, pathologic staging
1. Epstein JI. Pathologic assessment of the surgical specimen. and handling radical prostatectomy specimens. Urol Clin
Urol Clin N Am. 2001, 28: 567-94. N Am. 1999, 26: 453-63.

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 140
Margens comprometidas – conduta

Fernando Pires Vaz


Luis Carlos Vilas Boas

Quando nos referimos a “margens comprome- seminais, das margens ou extensão extracapsular, e não
tidas”, na verdade estamos falando de tumores T3, existe na atualidade um método com acuidade suficiente
que podem ser T3a, quando existe extensão extra- para detectar invasão microscópica.
capsular bi ou unilateral ou T3b, quando existe invasão A conduta clínica nesses casos terá, portanto, que
das vesículas seminais. Ou seja: estamos nos referindo ser tomada após a cirurgia, quando o patologista
ao paciente que foi submetido a uma prostatectomia informar que as margens cirúrgicas estão compro-
radical e cujo espécime cirúrgico revelou tumor que, metidas ou que o tumor se estendeu às vesículas
avaliado pelo sistema TNM, apresentará uma das seminais, e essa conduta irá depender de vários fatores.
classificações acima. Os principais fatores a serem considerados são: o
Este diagnóstico, é claro, só pode ser feito a tipo do tumor e seu grau de diferenciação; o estado
posteriori, ou seja, após o exame da peça cirúrgica. geral do paciente e a sua recuperação pós-operatória;
Isto é ainda mais verdade, porque tanto a ultra- a idade do paciente; o comportamento do PSA sérico
sonografia transretal como a tomografia computa- no pós-operatório; e também o grau da penetração
dorizada pré-operatórias, exames freqüentemente capsular, pois uma margem positiva multifocal implica
empregados na tentativa de estadiamento do câncer em pior prognóstico que uma margem positiva soli-
de próstata, não são capazes de definir, com certeza, a tária, assim como uma extensa margem solitária tem
extensão extracapsular, especialmente se esta for pior prognóstico que uma margem focal solitária. Este
microscópica. tratamento também irá variar de acordo com a
O uso de ressonância magnética nuclear, um preferência do médico e da sua experiência com um
método ainda em estudo, parece ser superior aos dos métodos de tratamento.
outros dois exames, especialmente no que diz respeito Para que uma cirurgia radical tenha sucesso no que
ao diagnóstico de invasão das vesículas seminais. diz respeito à cura de um câncer de próstata, é neces-
Para isto, entretanto, é necessário utilizar bobinas sário que a lesão seja completamente ressecada, e que
endorretais e metodologia especial. Mesmo com esse não existam células neoplásicas fora da próstata.
método, contudo, não é possível predizer, com cer- De acordo com um estudo feito por Scardino,
teza, a extensão extracapsular de uma lesão neoplásica no Memorial Hospital de New York, EUA, quando
da próstata. as margens estão comprometidas, a probabilidade
Na opinião pessoal dos autores, um toque retal bem- de não progressão da bioquímica da doença nos dez
feito, por um examinador experiente, tem quase a anos que sucedem a operação foi apenas 35%.
mesma eficiência dos exames empregados anterior- Existe também um outro estudo multinstitucional
mente para detectar invasão macroscópica das vesículas demonstrando que pacientes com margens compro-

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Seção VII F

metidas tinham três vezes mais probabilidade de Várias séries contemporâneas confirmaram o valor
recorrência bioquímica da doença a cada ano, quando da radioterapia pós-operatória quando as margens estão
comparados aos que tinham margens negativas. comprometidas. Aproximadamente 50% dos pacientes
Este fato é verdadeiro, mesmo quando lidamos se beneficiarão desta forma de tratamento e esta
apenas com pequenas invasões das vesículas seminais. melhora, provavelmente, irá se traduzir por um intervalo
Uma revisão da literatura mundial recente mostra livre de doença maior e possivelmente maior sobrevida.
que em pacientes muito bem-selecionados e estadia- Caso se opte pela complementação terapêutica
dos no pré-operatório, as possibilidades de encon- com a radioterapia, é importante aguardar um pe-
trarmos comprometimento das margens é de apro- ríodo de três a seis meses após a operação para evitar
ximadamente 25% e, quanto maior o grau de Gleason a perpetuação da incontinência urinária e problemas
da neoplasia, maiores serão as probabilidades de haver relacionados à anastomose uretrovesical. A radio-
invasão ou perfuração capsular, a exemplo do que terapia também pode retardar ou inviabilizar a
ocorre quando falamos de metástases para linfonodos recuperação da potência sexual.
regionais. Durante a intervenção, extremo cuidado deve A maioria dos pacientes não morre de recidiva
ser tomado ao dissecar o ápice e a face posterior ou local e, sim, de metástases à distância, cujo controle
dorsal do colo vesical, na região do trígono, que são não é obtido com radioterapia local pós-operatória.
os locais onde mais comumente existe invasão extra- Não existe, na literatura mundial, um consenso sobre
prostática do tumor. É claro que a menor suspeita, o a melhor forma de tratamento dos pacientes com
feixe vasculonervoso homolateral deve ser sacrificado, margens positivas. Tal condição poderá ser tratada por
e a extensão da ressecção aumentada. meio de radioterapia, hormonioterapia ou combinação
As vesículas seminais são o primeiro ponto de de ambos. É importante, para a definição da terapêutica
extensão da neoplasia e, mesmo nos casos de invasão complementar adequada, estratificar os pacientes em
microscópica, mais de 75% dos pacientes apresentarão baixo e alto risco, levando em consideração diversos
recidiva ao longo dos anos. É importante lembrar, fatores, tais como idade, Gleason, PSA pós-operatório
contudo, que 25% deles serão curados apenas com a e extensão da penetração capsular.
cirurgia nos casos de invasão microscópica. Os pacientes de baixo risco, (PSA pré-operatório
Foge ao escopo desta obra a ilustração detalhada < 10, Gleason < 7 e com invasão focal da capsular),
da técnica cirúrgica e os leitores são remetidos às poderão ser apenas acompanhados com o PSA sérico
referências para aprofundarem seus conhecimentos e tratados conforme o comportamento do mesmo.
técnicos sobre o tema. A radioterapia pélvica complementar será utilizada nos
casos em que a invasão seja um pouco mais extensa.
Os pacientes de alto risco (PSA > 10, Gleason 8 a
Conduta terapêutica 10 e extensa invasão extracapsular) deverão ser tratados
de maneira adjuvante por meio hormônio e radio-
Inicialmente, foram feitas tentativas de diminuir a terapia, sem esperar que o PSA se eleve, pois os pacientes
incidência de margens comprometidas utilizando-se serão mantidos em hormonioterapia logo após a
terapia hormonal neoadjuvante. Embora seja real- cirurgia, e até a complementação do tratamento.
mente possível reduzir a incidência de margens
positivas e o tamanho da próstata com esse tratamento
em até 40% dos casos, esta melhora não se traduziu Leitura recomendada
por aumento da sobrevida global, nem de sobrevida
livre da doença. Além disto, a hormonioterapia 1. Davis BJ, Pisansky TM, Leibouich BC. Current Opinion In
Urology Vol. 13, Nº 02, pp. 117-22, March 2003.
neoadjuvante produz fibrose periprostática, torna mais
2. Steele GS, Richie JP. Understanding And Avoiding Positive
difícil a intervenção, aumenta os índices de impotência Margins In Prostate Cancer. Aua Update Series, Lesson 1,
definitiva e provavelmente não está indicada na vol. XX, 2001.
atualidade, exceto em pacientes que apresentem grandes
volumes prostáticos, a critério do cirurgião.

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Seção VII F

Capítulo 141
Comprometimento das
vesículas seminais –
significado clínico e conduta
Carlos Eduardo Corradi Fonseca

O acometimento das vesículas seminais pelo ade- A invasão das vesículas seminais é um importante
nocarcinoma de próstata ocorre, com freqüência fator prognóstico de progressão do câncer de
variável, dependendo da diferenciação tumoral e do próstata, assim como o PSA > 20 ng/mL, mesmo
estadiamento da doença (Tabela 1). na ausência de acometimento de linfonodos.
A grande maioria é diagnosticada pela anatomia
patológica no pós-operatório da prostatectomia radi-
cal, mas pode ser suspeitada ao ultra-som transretal Diagnóstico
ou outro método de imagem no pré-operatório.
A rota mais comum dessa invasão é por penetração O ultra-som transretal tem boa potencialidade para
tumoral na base da próstata, que cresce e se estende detecção da invasão das vesículas seminais pelo câncer
no tecido perisseminal e na glândula. Pode haver tam- de próstata, mas 15% a 40% de aparência normal têm
bém acometimento por extensão nos ductos ejacu- câncer. Quando há envolvimento, as vesículas aparecem
latórios e diretamente da base da próstata, na parede alteradas sonograficamente em até 90% dos casos.
das vesículas seminais e, menos comumente, pode Detecção de invasão microscópica pela biópsia
haver metástases diretamente no órgão. dirigida é muito menos subjetiva que o USTR ou o

Tabela 1: Probabilidade de acometimento das vesículas seminais no câncer de próstata (resumo Tabela de Partin)

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Guia Prático de Urologia

toque, pois 20% a 50% das biópsias dirigidas das


vesículas não contêm epitélio glandular. Ao ultra-som,
o acometimento das vesículas seminais pode apre-
sentar-se como hiperecogenicidade, deslocamento
anterior, aumento, assimetria ou “sinal do bico”. Estas
alterações podem freqüentemente ser variações da
normalidade e não são preditivos consistentes de
invasão da glândula.
A tomografia computadorizada e a ressonância
nuclear magnética podem ser usadas para o estadia-
mento ou a confirmação na suspeita de invasão.
A ressonância não é, em geral, mais sensível que o
USTR ou a tomografia para o diagnóstico e o Figura 3: Tumoração em vesícula seminal esquerda-CaP
paciente deverá ser submetido primeiro ao ultra-som
e depois à tomografia.
A ressonância endorretal tem grande sensibilidade
e está sendo usada com boas perspectivas na atuali-
dade, na detecção e no estadiamento.

Figura 4: Ressonância = infiltração vesícula esquerda por CaP

Conduta
Figura 1: Assimetria da textura das vesículas seminais por CaP
A prostato-vesiculectomia radical deve ser indicada
nos casos de comprometimento das vesículas seminais,
quando houver outras indicações para a cirurgia.
Quando há acometimento das vesículas seminais
(pT3b N0), os pacientes podem estar livres de doença
com a cirurgia radical em 37% a 40% em cinco anos
e 25% a 37% em dez anos. A radioterapia na recidiva
tumoral, quando há acometimento da glândula, é
controversa, mas é o tratamento mais usado e
diminui o risco de recorrência, porém não parece
alterar em relação às metástases distantes ou sobre-
vida câncer-específico.
As taxas de controle em dez e 15 anos dos paci-
entes operados submetidos à radioterapia pós-opera-
Figura 2: Aumento de vesículas com infiltração dos ângulos tórios são de 92% e 82% respectivamente, comparados
vesico-prostato-seminais com 60% e 53% à prostato-vesiculectomia somente.

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Guia Prático de Urologia

Detecção de metástases em vesículas é particular- 2. Epstein JI, Carmichael M, Walsh PC. Adenocarcinoma of
the prostate invading the seminal vesicle: definition and
mente importante na avaliação de pacientes que têm
relation of tumor volume, grade and margins of ressection
recorrência do câncer após radioterapia como trata- to prognosis. J Urol, 149: 1040, 1993.
mento primário e é considerada candidata para 3. Ohori M, Scardino PT, Lapin SL. The mechanisms and
prostatectomia de salvamento, pois é o principal fator prognotic significance of seminal vesicle involvement by
prostate cancer. Am J Urol Pathol, 17: 1252, 1993.
preditor de recorrência pós-operatória.
4. Jonathan S, Epstein JI. Pathologic of prostatic neoplasia.
Campbell’s 8th ed., vol. 4. Ed. Philadelphia: W.B. Saunders
Co., 2002, 3025.
Leitura recomendada 5. Partin AN, Mangold LA, Lamm DM, Walsh PC, Epstein JI,
Pearson JD. Contemporary update of prostate cancer staging
1. Scardino PT et al. The treatment of organ confined, nomograms (Partin tables) for the millenium. Urology, 58:
locallly advanced and metastatic prostate cancer. AUA 843, 2001.
- 98th Annual Meeting, Chicago: 3, 2003.

483

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 142
Importância da biópsia por
congelação no transoperatório

Omar Pacheco Simão

As principais indicações de se realizar uma biópsia tases para linfonodos. Nesses grupos, os nomogramas
intra-operatória no câncer da próstata diz respeito de extratificação preditiva mostram risco de acometi-
geralmente ao estado dos gânglios linfáticos, do ápice mento ganglionar por volta de 67%. Portanto, em casos
da próstata, da extremidade uretral, da área do feixe de maior risco, a biópsia intra-operatória pode ser útil
vasculonervoso, do colo vesical ou de qualquer área frente ao achado de linfonodos aumentados de volume
periprostática suspeita. O objetivo desejável é a cer- ou mesmo para estudo do produto da linfadenectomia
teza da não-invasão dessas áreas. A biópsia por conge- antes de se continuar a operação. Em duas séries
lação sofre algumas limitações. Tumores de escore alto estudadas, o índice de falsos-negativos da biópsia por
(8, 9 e 10) têm pouca precisão na análise do tecido congelação variou de 4,7% a 5,8%.
congelado, por não definição da morfologia celular
(geralmente são células sem arranjo glandular definido Ápice prostático
ou com a aparência em “anel de sinete”). Também o O ápice prostático é a zona crítica, em termos de
trauma cirúrgico intenso pode limitar a interpretação. margens positivas na prostatectomia radical, devido à
Várias particularidades envolvem as situações anatomia da glândula, localizada profundamente na
expostas: pelve. A técnica operatória inadequada, causando lesão
Gânglios linfáticos iatrogênica da próstata, é a principal causa de margem
positiva nessa região. A mobilização apical insuficiente é
Em pacientes classificados como de baixo risco uma das explicações para essa alta incidência. Além disso,
(estádio T1, baixo grau, pequeno volume e antígeno mais freqüentemente do que qualquer outro lugar na
prostático específico < 10 ng/mL), a incidência de próstata, foi descrita a ausência de uma cápsula definida
acometimento ganglionar é menor que 2% a 5%. O nessa região. Também, devido à tendência de o tumor
valor preditivo negativo na biópsia de congelação é se estender para os espaços perineurais, o curto pedículo
96,5% e o valor preditivo negativo, usando-se nomo- neurovascular nessa região pode tornar comum o
gramas de riscos, é 97,9%. Nessas situações, o estadia- envolvimento extraprostático de tumores pequenos,
mento clínico supera o estadiamento patológico, não localizados na periferia. Em um estudo em que se realizou
havendo, portanto, indicação da biópsia transoperatória biópsia por congelação de tecido periprostático da
dos linfonodos. região apical em 95 pacientes, foi encontrado adenocar-
Já pacientes com antígeno prostático específico cinoma em três deles. Esses casos tiveram a área de
> 10 ng/mL e/ou estádio T2a e escore de Gleason ressecção ampliada e os autores concluíram que a técnica
elevado, associados ao número de fragmentos posi- representa uma maneira efetiva de diminuir a incidência
tivos na biópsia, têm um progressivo risco de metás- de tecido prostático residual.

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Guia Prático de Urologia

Extremidade uretral negativos (5%) se deveram provavelmente a erros


no tingimento intra-operatório ou no processa-
A extensão da uretra é fator importante na manu- mento da amostra. Uma biópsia de congelação
tenção da continência, mas parece discutível se a preser- negativa permite ao cirurgião colocar o paciente
vação de segmentos de uretra em contato com a próstata no grupo de baixo risco de envolvimento do feixe,
tenha vantagem no resultado final da continência pós- apesar da suspeita clínica.
operatória. Portanto a secção uretral nos casos de baixo
risco para margens positivas deve ser feita perto do Colo vesical
ápice prostático, mas não junto ao mesmo.
Um estudo avaliou a biópsia por congelação da Alguns trabalhos indicam a preservação do colo
uretra subapical em 130 pacientes submetidos à vesical como um fator favorável para se readquirir a
continência urinária mais precocemente. No entanto,
prostatectomia radical e foi observado que em 68
pelo menos teoricamente, essa técnica aumentaria os
casos não havia tecido glandular no material estudado,
riscos de não se retirar todo o tecido prostático.
em 56 pacientes havia tecido glandular normal e em
Em uma avaliação desse risco, foi estudado um
seis pacientes havia tecido neoplásico na biópsia. Esse
grupo de 149 pacientes de baixo risco, e encontrou-
resultado levou os autores a ampliarem a margem
se margens positivas no colo vesical em 3% dos mes-
de corte da uretra, até que a congelação mostrasse
mos. Embora a incidência de margens positivas no
ausência de tecido prostático. Cinco dos seis pacientes
colo vesical seja baixa nos pacientes de menor risco,
com acometimento neoplásico tinham estádio clínico
a biópsia de congelação intra-operatória pode auxiliar
avançado (T3). Portanto, em casos de estadiamento
na decisão de se adotar uma técnica operatória que
mais avançado, a biópsia de congelação pode ser útil
preserve o colo vesical. Nos pacientes com doença
na secção da uretra.
mais avançada, talvez não haja razão em se adotar
Feixe vasculonervoso (área póstero-lateral) essa técnica visto que o índice de continência a longo
prazo não parece ser diferente do grupo que se
Alguns autores mostraram que, em longo prazo, submete a uma ressecção ampla do colo.
havia vantagem na excisão ampla das margens
tumorais e do feixe vasculonervoso, na sobrevida Área periprostática suspeita
livre de doença, à custa, é claro, da perda da potência O achado intra-operatório de qualquer área suspeita
do paciente. de extensão tumoral fora dos limites da próstata deve
A avaliação pré e intra-operatória do envolvi- ser biopsiado para um correto estadiamento da doença
mento tumoral do feixe vasculonervoso é difícil e e conseqüente tratamento adequado.
pouco precisa com o uso dos métodos de imagem A biópsia por congelação pode auxiliar na confir-
ou com a palpação regional durante a cirurgia. mação e na extensão da área a ser retirada.
A biópsia de congelação intra-operatória pode Em resumo, a biópsia intra-operatória por conge-
assim auxiliar para uma melhor seleção dos pacientes lação pode ser útil quando se empregam técnicas ope-
que terão preservados o feixe vasculonervoso. ratórias da prostatectomia radical menos agressivas
Cangiano e colegas descreveram uma variação técnica e, portanto, com algumas vantagens, seja para o lado
em que ressecaram tecidos moles para biópsia por do tempo operatório, seja para a potência ou
congelação na área do feixe, selecionando, assim, os continência urinária.
pacientes que teriam preservação do mesmo na Geralmente, essa biópsia por congelação tem alto
prostatectomia radical e concluíram que a técnica valor preditivo negativo (por volta 95%). Deve-se
aumentou a habilidade do cirurgião em monitorar o levar em conta o aumento dos custos do procedi-
procedimento de preservação, sem comprometer o mento quando da decisão de se utilizá-lo. Nos casos
controle do câncer. mais avançados e com indicação de cirurgia, a biópsia
Em outro estudo, Goharderakhshan mostrou que por congelação pode auxiliar na avaliação da extensão
a biópsia por congelação teve um índice de acerto da doença e da técnica a ser empregada, embora
de 91%. Os resultados falsos-positivos (quatro não exista confirmação de que a ampliação das
casos) provavelmente se deveram a erros de inter- margens operatórias tenha um real valor na sobrevida
pretação ou de informação. Os resultados falsos- final do paciente.

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Guia Prático de Urologia

Leitura recomendada ligament sparing-effects on continence and positive margins.


Urology 2002, 60: 855-8.
4. Goharderakhsshan RZ, Sudilovsky D, Carrol LA, Grossfeld
1. Bangma CH, Hop WC, Schroder FH. Eliminating the need
GD, Marn R, Carroll PR. Utility of intraoperative frozen
for per-operative frozen section analysis of pelvic lymph nodes
section analysis of surgical margins in region of neuro-
during radical prostatectomy. Br J Urol 1995, 76: 595-9.
vascular bundles at radical prostatectomy. Urology 2002,
2. Cangiano TC, Litwin MS, Naitoh J, Dorey F, deKernion JB.
59: 709-14.
Intraoperative frozen section monitoring of nerve sparing
5. Shah O, Melamed J, Lepor H. Analysis of apical soft tissue
radical retropubic prostatectomy. J Urol 1999, 162: 655-8.
margins during radical retropubic prostatectomy. J Urol
3. Deliveliotis O, Protogerou V, Alargof E, Varkarakis J. Radical
2001, 165: 1943-8.
prostatectomy: bladder neck preservation and puboprostatic

487

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Seção VII F

488

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Seção VII F

Capítulo 143
Hormonioterapia neoadjuvante
na prostatectomia

Antonio Gugliotta

O câncer prostático é uma neoplasia com incidência Acredita-se que a THN resulta no aumento da
e prevalência aumentada, nestes últimos anos, em apoptose, na redução da proliferação de células neo-
homens acima dos 50 anos de idade. Na atualidade, plásicas e, portanto, na regressão tumoral. Muitos
em virtude da freqüente solicitação do PSA e das trabalhos mostram que margens positivas, invasão
técnicas modernas de diagnóstico, como a biópsia por das vesículas seminais e/ou linfonodos positivos caem
agulha dirigida pelo ultra-som transretal, aumentou de 57% para 29% quando a cirurgia é associada à
dramaticamente o número de casos de câncer prostá- THN. Além disso, sabe-se, também, que a THN pro-
tico detectado em estágios precoces da doença, isto é, voca alterações histológicas que impossibilitam o
câncer órgão-confinado (T1/T2). Nestes casos, a pros- diagnóstico e o Gleason.
tatectomia radical tem sido a melhor opção terapêutica Nestes últimos três anos, a literatura vem mos-
indicada pelos urologistas. trando falta de uniformidade dos dados divulgados.
Associada ao desenvolvimento da técnica cirúr- A incidência da invasão de vesículas seminais e de
gica para preservação dos feixes vasculonervosos gânglios regionais não tem sofrido alterações, inici-
e, ainda, à redução da perda sangüínea, proporcio- ando questões do significado biológico em diminuir
nando menor morbidade, a prostatectomia radical tamanho do tumor e de margens positivas. Um outro
vem recebendo maior aceitação pelos pacientes. aspecto importante é a questão do PSA no pós-
Entretanto a literatura tem mostrado que 20% a operatório dos pacientes submetidos à prostatec-
30% dos casos com doença localizada antes da ci- tomia radical com THN ou somente cirurgia. Traba-
rurgia apresentam, no exame anatomopatológico lhos não têm mostrado diferença estatisticamente
da peça, margens positivas indicando extensão do significativa entre os dois grupos, isto é, diversos
tumor para fora da glândula. A experiência tem estudos recentes não demonstram, necessariamente,
mostrado, também, que muitos desses pacientes, a redução da progressão do PSA, o qual tende a ser
após certo período de tempo, apresentam alto índice semelhante nos dois grupos de pacientes (THN +
de recorrência quando comparados com aqueles cirurgia ou só cirurgia).
sem margens positivas. Outra consideração desfavorável a respeito da
Para tentar minimizar esse problema e melhorar THN é a associação com a morbidade do trata-
o valor da cirurgia radical, muitos autores iniciaram mento, custo associado e impacto na cirurgia. Efeitos
a utilização da terapia hormonal neoadjuvante (THN) adversos significativos realmente ocorrem com a
ou pré-operatória, já que é sabido o fato de o câncer terapia hormonal e muitos desses efeitos colaterais
prostático ser sensível à andrógeno-supressão. diminuem lentamente mesmo após o seu término.

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Seção VII F

O custo, também, não é insignificante, seja para o Leitura recomendada


paciente seja para os seguros-saúde, ainda mais quan-
do falamos em três meses de tratamento antes da 1. Soloway MS et al. Neoadjuvant androgen ablation before
cirurgia. Com relação ao impacto na cirurgia, sabe- radical prostatectomy in T2bNxM0 prostate cancer: 5 Year
results. J Urol. 2002, 167: 112-6.
se que a THN freqüentemente causa fibrose
2. Scolieri MJ, Resnick MI. Neoadjuvant hormonal ablative
periprostática, ocultando plano de tecido normal,
therapy before radical prostatectomy: A review.Is it indicated?
encolhendo a massa tumoral e dificultando sua pal- J Urol. 2000, 164: 1465-72.
pação durante cirurgia. Contudo, a THN não torna 3. Labrie F et al. Neoadjuvant hormonal therapy: The Canadian
a operação mais fácil nem reduz o risco de perda de experience. Urology. 1997, supp, 49:56.
sangue ou o risco de transfusões. 4. Soloway M et al. Radical prostatectomy alone vs radical
O papel da terapia neoadjuvante antes da prosta- prostatectomy preceded by androgen blocade in cT2b prostate
tectomia radical não é bem claro e não existe um con- cancer - 24 month results. J Urol. 1997, suppl, 157: 619.
senso na literatura quanto à sua utilização. Além disso, 5. Abbas F. Scardino PT. Why neoadjuvant androgen deprivation
prior to prostatectomy is unnecessary. Urol Clin North
recentes publicações realçam a ausência de dados a
Am, 1996, 23:587-603.
longo prazo e não recomendam a THN.

490

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Seção VII F

Capítulo 144
Elevação do PSA pós-prostatectomia

Eric Roger Wroclawski


Marcos Tobias Machado

Introdução No período de 15 anos, avaliando-se mais de 1.900


pacientes operados, 15% apresentaram recidiva bio-
O emprego do PSA na prática clínica promoveu química. Destes, 34% desenvolveram doença metas-
mudança dramática no estádio do câncer de próstata tática clinicamente mensurável, após um período
por ocasião de seu diagnóstico, sendo que muitos casos médio de oito anos. Neste subgrupo de pacientes, o
passaram a ser vistos, inicialmente, como doença presu- tempo médio para o óbito foi de cinco anos após o
mivelmente localizada. Este fato seguiu-se de aumento diagnóstico clínico da doença metastática.
significativo no número de pacientes submetidos à Os principais fatores preditivos da evolução nos
cirurgia radical, com intenção curativa. O seguimento pacientes que manifestaram recidiva bioquímica foram
pós-operatório destes pacientes mostra que até 30% o escore de Gleason (maior ou menor que 7), o tempo
podem desenvolver evidência bioquímica de falha para recorrência (maior ou menor que dois anos) e o
terapêutica, traduzida pela elevação sérica do PSA, em tempo de duplicação do PSA (maior ou menor que
longo prazo. dez meses).
A falência bioquímica do tratamento com intenção
curativa produz um novo subgrupo de pacientes, Dilema entre recidiva local versus
aparentemente curados, mas que experimentarão sistêmica
recidiva clínica e cuja abordagem passaremos a discutir. Saber se a elevação do PSA é decorrente de reci-
História natural da elevação do PSA diva na região da loja prostática ou se representa
pós-cirurgia radical doença à distância é importante para indicação de
terapêutica complementar, porém na maioria das
Existe grande dificuldade em se avaliar o compor- vezes é muito difícil.
tamento natural e a evolução de pacientes que apre- O emprego de cintilografia óssea e tomografia
sentam aumento isolado do PSA no pós-operatório, computadorizada são insuficientes para esta distinção. A
principalmente devido ao emprego de terapias utilização de imunocintilografia com I141 (Prostacint) pode
adjuvantes como radioterapia (RT) e/ou hormonio- localizar a recorrência em até 70% dos casos e, destes,
terapia (HT). somente um terço têm doença restrita à fossa prostática.
A série da Johns Hopkins (USA), com pequena Na prática clínica, utilizamos critérios patológicos da
interferência destes fatores, representa boa parte do análise da peça cirúrgica, o valor inicial do PSA após o
que hoje conhecemos com relação à elevação do PSA tratamento, o período livre de elevação do PSA e o
após cirurgia radical. tempo de duplicação para direcionar a conduta.

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Guia Prático de Urologia

Radioterapia de salvamento após tivas, apesar da ausência de evidências cientificamente


recidiva bioquímica definitivas.
A primeira é o emprego de antiandrogênicos não-
O tema é polêmico, mas resultados recentes da esteroidais como monoterapia.
Clínica Mayo, incluindo 166 pacientes, estádio T2-T3 Um estudo randomizado, com mais de 1.400
N0 M0 com níveis de PSA maior que 0,3 ng/mL, pacientes, comparou o emprego de bicalutamida excl-
tratados em média com 64 Gy, mostram que existe usiva com orquiectomia. Em pacientes com doença
diferença estatisticamente significativa no controle do localmente avançada, houve equivalência de sobrevida.
PSA com vantagens para o grupo que recebeu radio- Quando a doença é metastática, outras informações
terapia de salvamento. Os melhores resultados foram sugerem que a sobrevida possa ser menor no grupo
obtidos nos pacientes com níveis séricos de PSA, por que usa antiandrogênicos como monoterapia.
ocasião da radioterapia, menores que 1 ng/mL, sem Outra opção emergente é a terapia hormonal
invasão da vesícula seminal na peça cirúrgica, e nos intermitente. Pacientes com recidiva bioquímica são
pacientes com escore de Gleason abaixo de 7. passíveis de receber de dois a cinco ciclos de tratamento,
O índice de sintomas persistentes associados ao podendo ficar sem medicação por 45% do tempo de
procedimento é em torno de 17%. tratamento, entretanto com redução progressiva do
período sem medicação, a cada ciclo. A taxa de pro-
Terapia hormonal (TH):
gressão em 30 meses foi de 8%.
imediata versus tardia
A recuperação da qualidade de vida e do interesse
Não há ainda estudos controlados, duplo-cego, sexual são as vantagens desta abordagem, além de re-
randomizados, na população com elevação isolada do dução de gastos.
PSA após cirurgia, que permitam definir a conduta ideal. Outras alternativas como o emprego de finaste-
Algumas evidências recentes têm favorecido a TH rida, suplementos alimentares e fitoterápicos com
precoce nestes pacientes, inclusive com benefício não atividade estrogênica são motivos de protocolos clíni-
somente na redução de morbidade local, como cos experimentais.
também, possivelmente, de sobrevida.
Uma questão que deve pesar na indicação da TH
imediata é a possibilidade de efeitos colaterais e o
Conclusões
impacto sobre a qualidade de vida do paciente. Perda
A falta de evidências formais na abordagem dos
da libido, de massa óssea e muscular, além de fadiga,
pacientes com recidiva bioquímica pós-prostatec-
anemia e ganho de peso estão associados ao emprego
tomia radical nos leva à prática profissional com
de TH em longo prazo. decisões compartilhadas.
Como regra geral, atualmente, temos incentivado Um breve resumo para guiar a conduta pode ser
a TH precoce. visto no algoritmo a seguir.
Terapias hormonais alternativas Apesar da tentativa de controle local da doença
ter falhado, os pacientes estão com saúde preservada
A conjunção entre eficiência e poucos efeitos e encontram-se extremamente ansiosos, temendo
colaterais é desejável em pacientes que têm evolução pela possibilidade de progressão da doença.
naturalmente lenta e, no momento, apresentam-se A conversa franca, baseada nos índices de controle
assintomáticos. tumoral, sobrevida e qualidade de vida, mostrando
Neste sentido, na população com recidiva bioquí- as alternativas disponíveis, irão determinar a melhor
mica, duas estratégias terapêuticas tornam-se atra- conduta para cada caso.

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Guia Prático de Urologia

Algoritima 1: Padrões do PSA após prostatectomia radical

Leitura recomendada and pelvic lymphadenectomy in men with node-positive


prostate cancer. N Engl J Med 1999, 341: 1781-9.
1. Pound CR, Parting AW, Eisenberger MA et al: Natural history 4. Iversen P, Tyrrel CJ, Kaisry AV et al. Casodex (bicalutamide)
of progression after PSA elevation following radical 150 mg monotherapy compared with castration in patients
prostatectomy. JAMA 1999, 281: 1591-97. with previous untreated non-metastatic prostate cancer:
2. Raj GV, Parting AW, Polascikt J. Clinical utility of I capromab Results from two multicenter randomized trials at a median
pentatid imunoscintigraphy in the detection of early follow-up of 4 years. Urology 1998, 51: 389-96.
recurrent prostate carcinoma after radical prostatectomy. 5. Grossfeld GD, Chaudharry UD, Reese DM et al. Intermitent
Cancer 2002, 94:987-96. androgen deprivation; update of cycling characteristics in
3. Messing EM, Manola J, Sardsky M et al. Immediate hormonal patients without clinically apparent metastatic prostate
therapy compared with observation after radical prostatectomy cancer. Urology 2001, 58: 240-5.

493

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Seção VII F

494

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Seção VII F

Capítulo 145
Radioterapia externa –
eficácia versus dose
versus efeitos colaterais
Wladimir Nadalin
Rodrigo de Morais Hanriot

Inúmeros trabalhos vêm demonstrando que o tados em cinco, dez e 15 anos comparáveis aos
tumor de próstata é neoplasia responsiva à irra- índices de cirurgia, quando os pacientes são pa-
diação ionizante, com melhores índices de controle reados por estádio e graduação tumoral, confor-
tumoral proporcionalmente a doses mais elevadas. me comparação de nomogramas por Kattan (Fi-
Existem evidências de que a progressão tumoral guras 1 e 2).
local serve de origem para o desenvolvimento subse- Lamentavelmente, altas doses de irradiação com
qüente de metástases à distância e, em última análise, técnica de radioterapia convencional levam a taxas
comprometimento da sobrevida global. A radio- de complicações inaceitáveis. As limitações de dose
terapia com doses mais elevadas promove resul- habitualmente verificadas em radioterapia conven-

Figura 1: Nomograma de Kattan para SLD em cinco anos com RTC-3D

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Guia Prático de Urologia

Doses de até 7560 cGy com RTC-3D e 8100 cGy


com IMRT são seguras e promovem taxas de
complicações urinárias ou retais em índices seme-
lhantes ou inferiores a doses entre 6600 e 7000 cGy,
quando comparadas com radioterapia convencional
(Figura 5).

4a

Figura 2: Comparação entre tratamentos por radioterapia e


prostatectomia radical; doses acima de 7200 cGy promoveram
maior controle que doses inferiores a 7200 cGy

cional, da ordem de 6600 cGy a 7 mil cGy, são


marginalmente suficientes para controlar neoplasias
prostáticas de baixo risco (estadiamento ≤ T2a,
Gleason ≤ 6 e PSA ≤ 10 ng/mL) e insuficientes para
controlar neoplasias de risco inter mediário
(estadiamento T2b e/ou Gleason 7 e/ou PSA entre
10 e 20 ng/mL) e alto risco (estadiamento ≥ T2c,
4b
Gleason ≥ 8 ou PSA > 20 ng/mL).
Para as neoplasias de risco intermediário e alto
risco, são necessárias doses de pelo menos 7560 cGy,
somente possíveis com recursos de radioterapia
conformada tridimensional (RTC-3D) ou, ideal-
mente, radioterapia com intensidade modulada do
feixe (IMRT). Isto foi demonstrado por Zelefsky
do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center com
sobrevida livre de doença em quatro anos de 79%
versus 56%, com p = 0,04, para doses acima e abaixo
de 7560 cGy, respectivamente, no grupo de risco
intermediário. Já no grupo de alto risco, a diferença
foi de 58% versus 30%, p = 0,03, respectivamente,
com benefício claramente demonstrado com
aumento da dose (Figuras 3 e 4). 4c

Figura 4: Volume de tratamento em RT convencional x RTC-


Figura 3. Escalonamento de dose para alto risco 3D x IMRT, respectivamente 4a, 4b e 4c

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Guia Prático de Urologia

ram na ordem de 50% a 60% em período superior


a um ano, porém com taxas de resposta a uma
terapêutica com sildenafila na ordem de 85%. Os
piores resultados estão associados a pacientes
diabéticos, vasculopatas e com impotência prévia. A
possibilidade de reduzir o volume de corpo caver-
noso irradiado pelas técnicas de RTC-3D e IMRT
vem mostrando redução dos índices de impotência
classicamente relatados, porém este recurso ainda está
sob investigação clínica.
A radioterapia com finalidade radical na neoplasia
prostática está consolidada por estudos prospectivos
e aleatorizados e se constitui em forma terapêutica
Figura 5: Complicações retais RTC-3D x IMRT
efetiva, comparável à prostatectomia radical. As
técnicas modernas para emprego de doses elevadas
e minimização dos volumes de órgãos normais
envolvidos, utilizando recursos de radioterapia
Os índices de controle local relatados pelo estudo
conformada tridimensional e, mais recentemente,
prospectivo aleatorizado conduzido por Pollack no
intensidade modulada do feixe, promovem maior
MD Anderson, comparando doses de 7000 cGy e
chance de controle local e sobrevida livre de doença
7800 cGy com RTC-3D ou IMRT, mostraram claro
com menores efeitos colaterais do que radioterapia
benefício no grupo de maior dose, quando dos gru-
convencional. Os estudos mais modernos do Radiation
pos de risco intermediário e alto risco, com diferenças
Therapy Oncology Group (RTOG) já não utilizam
de sobrevida livre de doença de 55% versus 93% em
radioterapia convencional em seus protocolos, o que
cinco anos para baixa dose e alta dose, respectiva-
claramente evidencia a tendência para tratamentos
mente. A sobrevida livre de complicações retais foi
mais efetivos e com menor morbidade.
menor no grupo de 7800 cGy que conseguiu, em
seu planejamento terapêutico, minimizar volume de
reto envolvido na isodose de 7000 cGy para abaixo Leitura recomendada
de 25%, com índices comparáveis ao grupo de baixa
dose. As complicações retais grau II pelo RTOG 1. Zelefsky M, et al. High Dose Radiation Delivered by Intensity
(diarréia e cólicas moderadas, sangramento retal Modulated Conformal Radiotherapy Improves the Outcome
of Localized Prostate Cancer. J Urol 2001;166(3):876-81.
intermitente) foram de 11% e grau III (obstrução e/
2. Pollack A, et al. Prostate Cancer Radiation Dose Response:
ou sangramento necessitando intervenção cirúrgica) Results of the M. D. Anderson Phase III Randomized Trial.
de 0,75%. Complicações urinárias grau II (poliaciúria, Int J Rad Oncol Biol Phys 2002;53(5)1097-105.
telangectasia ou hematúria microscópica intermitente) 3. Kupelian P, et al. Comparison of the Efficacy of Local
Therapies for Localized Prostate Cancer in the Prostate-
foram de 1,8% e grau III (disúria importante, hema-
Specific Antigen Era: A Large Single-Institution Experience
túria freqüente ou redução da capacidade) de 1,2%. With Radical Prostatectomy and External-Beam
Estes dados mostraram a segurança em se empregar Radiotherapy. J Clin Oncol 2002;20(16):3376-85.
altas doses desde que com avaliação criteriosa de 4. Kattan M, et al. Pretreatment Nomogram for Predicting the
Outcome of Three-Dimensional Conformal Radiotherapy
volume de órgão sadio envolvido e modificação do
in Prostate Cancer. J Clin Oncol 2000;18(19):3352-9.
plano terapêutico quando necessário. Os índices de 5. Walsh P. Surgery and the Reduction of Mortality from
impotência relatados para radioterapia externa figu- Prostate Cancer. New Eng J Med 2002;347(11):839-40.

497

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Seção VII F

498

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Seção VII F

Capítulo 146
Radioterapia externa conformada 3-D

João Victor Salvajoli


Douglas Guedes de Castro

Durante os últimos 35 anos, a radioterapia externa confirmam a vantagem no uso de escalonamento


(teleterapia) tem sido um dos pilares no tratamento de dose em pacientes com câncer de próstata locali-
do câncer de próstata, utilizada em aproximadamente zado. Além disso, há um estudo fase III (RTOG P-
um terço dos pacientes submetidos à terapia definitiva. 0126) em andamento que avalia RT3D com dose de
Dentro desse período, mais especificamente até 82,28 Gy ou 72,93 Gy em pacientes com câncer de
meados da década de 1980, todos os pacientes eram próstata localizado, cujo objetivo principal é a análise
tratados com técnicas de radioterapia externa conven- da sobrevida global.
cional (RTC). Entretanto, as doses finais consideradas Os resultados do estudo fase III do M. D. Anderson
efetivas a fim de se obter o controle local, acima de Cancer Center foram relatados recentemente por
70 Gy, são limitadas pela tolerância das estruturas Pollack e colegas. Nesse estudo, 301 pacientes com
circunvizinhas à próstata, principalmente reto e bexiga, câncer de próstata estádios T1-T3 foram avaliados
quando técnicas de RTC são utilizadas. entre 1993 e 1998, com um seguimento mediano de
Os avanços determinados pela associação entre 60 meses. Foram aleatorizados 150 pacientes para o
métodos modernos de diagnóstico por imagem e braço com RTC exclusiva e dose de 70 Gy e 151
tecnologia em informática permitiram, a partir do pacientes para RTC com reforço de dose com RT3D
final da década de 1980, a implementação da radio- até 78 Gy. A sobrevida livre de recidiva bioquímica, a
terapia externa conformada (RT3D), através da qual qual foi definida como três aumentos sucessivos do
altas doses de radiação podem ser focalizadas precisa- PSA após a radioterapia, foi de 70% e 64% para os
mente em uma configuração anatômica tridimen- pacientes submetidos à dose de 78 Gy e 70 Gy,
sional do tumor (Figura 1). A RT3D possibilita maior respectivamente (p = 0,003). O escalonamento de dose
flexibilidade para o arranjo dos campos e a estimativa foi preferencialmente benéfico para pacientes com o
da dose em relação ao volume da próstata e órgãos valor de PSA pré-tratamento > 10 ng/mL. Nesse
adjacentes através da análise de histogramas dose- subgrupo, a sobrevida livre de recidiva bioquímica para
volume (DVH) (Figura 2). A versatilidade em 78 Gy e 70 Gy foi 62% e 43%, respectivamente
conformar o feixe de irradiação ao volume-alvo sem (p = 0,01). Entretanto, entre pacientes com PSA pré-
exceder as doses toleradas pelas estruturas críticas tratamento <10 ng/mL, não se observou benefício
adjacentes permite o escalonamento de dose no com o escalonamento de dose.
tumor e o aumento do controle local, sem o aumento Zelefsky e colegas relataram a experiência do
da toxicidade nos tecidos normais. Memorial Sloan-Kettering Cancer Center com escalonamento
De fato, diversos estudos retrospectivos com de dose em 1.100 pacientes com estágios T1c-T3
grandes séries e um estudo prospectivo e aleatorizado tratados de 1988 a 1998 com RT3D ou radioterapia

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Guia Prático de Urologia

III (necessidade de internação para diagnóstico ou


intervenção cirúrgica mínima), sendo três casos
relacionados à bexiga e um caso ao reto. Não houve
toxicidade tardia graus IV ou V (necessidade de
hospitalização prolongada e cirurgia de grande porte
ou complicação fatal). A toxicidade observada foi
significativamente menor do que a esperada,
comparando-se com dados históricos de pacientes
Figura 1: Histograma dose-volume de RT3D com dose total de
74,4 Gy no volume de tratamento planejado. Observam-se os tratados com RTC e dose de 68,4 Gy, o que confere
limites de tolerância impostos ao reto (70 Gy em até 25% do um excelente perfil de tolerância para RT3D, a
volume retal) e bexiga (65 Gy em até 30% do volume vesical) despeito do incremento da dose.
Observa-se, portanto, que a RT3D é uma moda-
lidade eficaz e segura para o tratamento definitivo
do câncer de próstata localizado, com resultados
conformada de intensidade modulada (IMRT). comparáveis a outras alternativas terapêuticas, como
Observaram, através da análise da sobrevida livre de a cirurgia (PR) ou a braquiterapia definitiva com
recidiva bioquímica e de biópsias sextantes realizadas sementes de iodo 125 ou paládio 103, ou tempo-
após 36 meses de seguimento, que o escalonamento rária com irídio 132. Como conseqüência, há um
de dose está associado com melhor controle local em número cada vez maior de estudos publicados e
pacientes pertencentes a qualquer um dos grupos de centros que adotam essa modalidade de trata-
prognósticos, classificados como de risco favorável, mento em detrimento da RTC.
intermediário ou desfavorável. Especificamente em No Brasil, atualmente, poucos centros dispõem
pacientes considerados de risco favorável (PSAi ≤ 10 de tecnologia para oferecer RT3D, e a maioria deles
ng/mL, estádios T1-2 e Gleason ≤ VI), a sobrevida oferecem-na a uma parcela seleta da população. A
livre de recidiva bioquímica em cinco anos foi de 90% partir do início da década de 1990 ocorreram impor-
quando tratados com 75,6-86,4 Gy ou mais e 77% tantes melhorias tecnológicas no campo da radio-
quando tratados com 64,8-70,2 Gy (p = 0,05). Esse terapia nacional. No entanto, há a perspectiva de que
resultado é consistente com séries de pacientes similares essa modalidade de tratamento seja ainda estendida
tratados com prostatectomia radical (PR). Além disso, a um número cada vez maior de pacientes benefi-
a análise de biópsias de próstata após 36 meses de ciários do Sistema Único de Saúde (SUS), nos
seguimento indicou que a incidência de biópsias próximos anos, a partir de um projeto elaborado
positivas foi de 10%, 23%, 34% e 54% para doses de pelo Governo Federal. Trata-se do projeto de reequi-
81 Gy; 75,6 Gy; 70,2 Gy e 64,8 Gy; respectivamente. pamento do parque radioterápico nacional, criado
A análise da toxicidade inerente ao escalonamento em 1998, que pretende modernizar o parque tecno-
de dose com RT3D foi objetivo de um estudo fase lógico dos hospitais integrados à rede SUS. Espera-
I recentemente publicado (RTOG 9406). Entre 1996 se que, até 2004, 24 novos centros estejam habilitados
e 1998, 173 pacientes com câncer de próstata inicial a realizar RT3D, sendo que, em alguns deles, o trata-
(T1 e T2) foram submetidos à dose de 79,2 Gy. mento já é oferecido, como, por exemplo, no Hos-
Desses, 169 foram avaliáveis. Não se observou pital do Câncer de São Paulo.
toxicidade aguda grau III (necessidade de analgésico Portanto, em nosso meio, a RT3D é uma reali-
narcótico ou suporte parenteral). Com um dade em iminente expansão e uma eficiente alter-
seguimento mediano de 3,3 anos, um total de quatro nativa no tratamento de pacientes com câncer de
pacientes (2,4%) apresentou toxicidade tardia grau próstata localizado.

500

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Guia Prático de Urologia

Figura 2: Planejamento de RT3D com 6 campos co-planares restritos à próstata

Leitura recomendada 166: 876, 2001.


3. Ryu JK, Winter K, Michalski JM et al. Interim report of
1. Pollack A, Zagars GK, Starkschall G et al. Prostate cancer toxicity from 3D conformal radiation therapy (3D-CRT) for
radiation dose response: results of the M. D. Anderson phase prostate cancer on 3DOG/RTOG 9406 level III (79.2 Gy).
III randomized trial. Int J Radiat Oncol Biol Phys, 53 Int J Radiat Oncol Biol Phys, 54 (4): 1036-46, 2002.
(5): 1097-105, 2002. 4. http://www.sbradioterapia.com.br/projetoreequipamento.htm
2. Zelefsky MJ, Fuks Z, Hunt M et al. High dose radiation 5. Hanriot RM, Salvajoli JV, Tumores de Próstata. In: Salvajoli
delivered by intensity modulated conformal radiotherapy JV, Souhami L, Faria, SL. Radioterapia em Oncologia,
improves the outcome of localized prostate cancer. J Urol, (25): 643-89, Editora Medsi, 1999.

501

Untitled-2 501 11/03/04, 13:49


Seção VII F

502

Untitled-2 502 11/03/04, 13:49


Seção VII F

Capítulo 147
Braquiterapia – eficiência versus
efeitos colaterais

Oswaldo Antônio Santos Palhares

Introdução inferiores a 10 mg/mL com uma próstata pequena


inferior a 45 g sem antecedentes de cirurgia prostática
O tratamento do câncer da próstata com se- prévia e sinais de obstrução infravesical severa.
mentes radioativas se realiza desde o princípio do No grupo de risco moderado (T2b – Gleason 7
século passado (1903). Sua vantagem principal é a a 8 – PSA 10-15 – Volume > 45 cc) poderia se utilizar
radiação de alta energia ser colocada diretamente a braquiterapia, porém precedida de tratamento
no interior da próstata, onde se localiza o câncer, hormonal durante três meses para diminuir os
evitando desta forma a possibilidade de prejudicar volumes tumoral e prostático.
os órgãos que se situam próximos à próstata, como
a bexiga e o reto. Grau do tumor
Com a outra forma de radioterapia (RT) – radio- O grau do tumor pode ter certa importância em
terapia externa com acelerador linear –, a radiação relação aos resultados do procedimento, geralmente
vai desde o exterior até o interior da próstata (atra- os pacientes com tumores de Gleason menor ou
vessando tecidos que não deveriam receber as radia- igual a 6 são bons candidatos ao I-125; e os de
ções), enquanto com a braquiterapia a radiação vai Gleason 7 a 10 ao paládio 103 (Sharkey e colegas).
desde o interior da próstata até o exterior. Por isso a Já quanto aos valores do PSA, estes devem situar-se
braquiterapia não é efetiva para tratar tumores que abaixo de 7 mg/mL.
afetam, por exemplo, as vesículas seminais ou os
gânglios linfáticos. Volume prostático
Comparada à radioterapia externa, a braquiterapia
permite aplicar doses maiores em intervalos de tem- A braquiterapia não é aconselhada para aqueles
po menores e a volumes mais restritos. pacientes que tenham um volume prostático maior
que 45 g, uma vez que a implantação, nestes casos, é
mais trabalhosa, aumentando o tempo cirúrgico e o
Indicação traumatismo prostático consideravelmente.

A braquiterapia prostática está indicada em um grupo Lobo médio


concreto de pacientes que reúnem os seguintes critérios: A presença de uma estenose da uretra e de um
pacientes com diagnóstico de câncer da próstata lobo médio prostático aumentado produzem
localizado com estadiamento T1 ou T2 N0 M0, com sintomatologia pré e pós-implante, além de difi-
Gleason menor ou igual a 6, com valores de PSA cultar o planejamento do pré-tratamento devido

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Guia Prático de Urologia

à dificuldade de se obter a delimitação correta da o estudo do volume pré-operatório e implante


área prostática. das sementes sob acompanhamento sonográfico
e fluoroscópico concomitante (Figuras 3 e 4);
Ressecção transuretral prévia ‹ Uso de sementes adicionais na área do tumor se o
Supõe uma contra-indicação relativa devido ao volume geométrico assim o exigir;
fato de que a cirurgia produz modificações na anato- ‹ TC da pelve dez dias após o implante para avali-
mia da uretra prostática, existindo risco que se planeje ação de dosimetria pós-tratamento (Figura 5).
o implante em um volume no qual se estime que se
encontre uma cavidade.

Avaliação do pré-tratamento
padrão
Consta dos seguintes procedimentos:
‹ Exames dígito-retais e testes de PSA;

‹ USG transretal da próstata, 16 biópsias da

próstata e quatro das VS;


‹ Cintilografia óssea e TC pélvica;

‹ Terapias neoadjuvantes com antiandrogênicos


Figura 1: Matriz com agulha, carregador e cartucho de sementes
se volume > 45 g;
‹ Tratamento de eventual obstrução infravesical;

‹ Alfabloqueadores – nas obstruções leves.

Técnica
Antes de se realizar a braquiterapia, deve-se pro-
ceder uma ecografia transretal muito cuidadosa, com
a qual se calcula o volume da próstata e se configura
um mapa detalhado da anatomia da glândula que, é
analisado por um programa de ordenação que
determina com exatidão a localização das sementes
(diferente para cada paciente, dependendo do tama-
nho e da forma de sua próstata).
Sharkey e colegas publicaram estudo em mais de
400 pacientes, em que descrevem avanços da técnica Figura 2: Carregador – aplicador de sementes
de braquiterapia com Pd-103 usada para o trata-
mento de pacientes nos estágios T1 e T2 do adeno-
carcinoma da próstata, demonstrando que o refina-
mento da técnica resultou em melhor recuperação
dos pacientes. Essa metodologia difere da técnica
padrão nos seguintes termos:
‹ Colocação de todas as agulhas de uma só vez para

minimizar o deslocamento da próstata através de


uma matriz (Figura 1); utilizando-se de um apli-
cador munido de um cartucho de sementes para
a realização dos implantes (Figura 2);
‹ Métodos de controle por anestesia monitorados

(MAC) durante o estudo de volume pré-opera-


tório e cistoscopia; Figura 3: Ultra-sonografia transretal da próstata evidenciando
‹ Uso de uma sonda de ultra-som biplanar durante as imagens hiperecogênitas de suas agulhas (setas em destaque)

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Guia Prático de Urologia

Figura 6: Detalhe de uma semente radioativa

Figura 4: Aplicação de sementes – imagem fluroscópica das agulhas


e sementes

Figura 7: Aplicador – imagem fluoroscópica da próstata pós-


implante das sementes

Figura 5: Dosometria – imagem de TC da próstata para cálculo


da dosimetria pós-tratamento

Conclusão
Uma desvantagem muito considerada na literatura é
não se obter informação histológica que corrobore a
situação exata da enfermidade. Esta informação se
consegue melhor com a prostatectomia radical. A linfa-
Figura 8: Resultado final do períneo após o implante das sementes
denectomia pélvica por videolaparoscopia (VLP) alguns
dias antes da braquiterapia seria uma opção.
Haakon Radge e colegas (1999) publicaram resul-
tados dos seguimentos de 152 pacientes durante dez
anos. O índice de sobrevida total foi de 66%, 64% se-
guiam clínica analiticamente livres da doença e somente Acreditamos que seja importante para os resultados
2% haviam falecido pelo carcinoma da próstata. a longo prazo do câncer da próstata que o urologista
Considerando estes resultados, podemos acreditar tenha controle sobre todos os aspectos do tratamento
que a braquiterapia prostática é um tratamento tão desta doença. Se a terapia passar pelo teste do tempo,
válido quanto a prostatectomia radical nos pacientes os urologistas estarão munidos com uma arma de
com doença localizada na próstata. tratamento menos mórbida e bastante eficaz.

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Seção VII F

Leitura recomendada disease free survival a transperineal sonography-guided


iodine-125 brachitherapy with or without 45-Gray exte bean
irradiation in the treatment of patients with clinically
1. Blasko JC, Wallner K. Brachytherapy alone for early stage
localized low to high Gleason prostate carcinoma, Cancer
prostate cancer-patient selection and technique and
1988; 83:989-1001.
Brachytherapy for early prostate cancer. 40th Annual Meet
4. Storey MR, Landgren RC, Cottone JL, Stallings JW et al.
American Society for Therapeutic Radiology and Oncology.
Transperineal 125 iodine implantation for treatment of clinically
Phoenix (Arizona). October, 1998.
localized prostate cancer; 5-year tumor control an morbidity.
2. Blasko JC, Wallner K. Brachytherapy for early prostate cancer.
Ind J Radiat Oncol Biol Phys. 1999; 43:565 570.
Treatment, results, side effects and complications. 40th Annual
5. Sharkey J, Chovnik S, Behar R, et al. Outpatient ultrasound-
Meet American Society for Therapeutic Radiology and Oncology.
guided palladium-103 brachytherapy for localized
Phoenix (Arizona). October, 1998.
adenocarcinoma of the prostate: A preliminary report of
3. Ragde H, Elgamal AAA, Snow PB, Brandt J et al. Ten-Year
434 patient. Urology 1999; 51:796-803.

506

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Seção VII F

Capítulo 148
Câncer de próstata – doença
localmente avançada

Ronaldo Damião
Fabrício Borges Carrerette

Introdução Cerca de 60% dos tumores de próstata estádio pT3


não são detectados pelo ultra-som transretal da próstata,
O tumor de próstata localmente avançado pode ser portanto é comum haver o subestadiamento e até
considerado como aquele que ultrapassa a cápsula mesmo o superestadiamento implicando em diferença
prostática (T3-T4) (Figura 1), e cujo estádio N ou M entre o estádio clínico e o cirúrgico.
seja igual a 0, o que significa ausência de comprometi- O tratamento do tumor de próstata localmente
mento dos linfonodos ou metástases à distância. O avançado objetiva o controle local do crescimento
estadiamento pré-tratamento pode não corresponder tumoral e, em alguns casos, até mesmo a cura da doença.
ao verdadeiro estádio do tumor.

Figura 1: Estadiamento do câncer da próstata, localmente avançado

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Guia Prático de Urologia

Diagnóstico mático, sabemos que estes pacientes se tornam sinto-


máticos muito rapidamente.
A suspeita diagnóstica do tumor de próstata é
baseada no exame digital da glândula e na dosagem Tratamento cirúrgico
do antígeno prostático específico (PSA). O diagnóstico O tratamento cirúrgico com prostatovesiculectomia
definitivo é alcançado através do exame histopatoló- radical pode ser empregado nos casos de estádio cT3a,
gico da próstata. Atualmente, o método de diagnós- com limitada invasão extracapsular, com escore de
tico mais empregado é a biópsia transretal guiada pela Gleason menor que VIII e PSA abaixo de 20 ng/mL.
ultra-sonografia endocorpórea; o ultra-som facilita a Nestes casos, o diagnóstico clínico pode ser de cT2 e
realização da biópsia, podendo identificar com mais o resultado da análise da peça acusar o estádio pT3,
segurança o local da zona periférica ou de transição ou seja, o tumor foi subestadiado clinicamente e o
do qual será retirado o fragmento, além de permitir a verdadeiro estádio patológico se mostra mais avan-
biópsia direta de nódulos, ou das vesículas seminais, çado. Por outro lado, cerca de 15% dos tumores cujo
quando há suspeita de tumor avançado. estádio clínico é dado como cT3 são superestadiados
Uma vez feito o diagnóstico histopatológico do (cT3 muda para pT2) e 8% são subestadiados (cT3
câncer da próstata, o próximo passo é o estadiamento passa para pT4). A biópsia das vesículas seminais pode
do tumor. Para tanto se leva em consideração os ser realizada nos pacientes com PSA acima de 20 ng/mL
achados no exame digital, o valor do PSA, o grau de e, nos casos de estar positiva, cT3b, estaria contra-
diferenciação histológica do tumor e os resultados de indicada a cirurgia radical.
exames complementares de imagem. A suspeita de Nos casos de estádio cT3, o tratamento cirúrgico
metástase ganglionar pode ser aventada pelo ultra-som, pode ser associado à radioterapia adjuvante ou
tomografia computadorizada (TC) e ressonância hormonioterapia, o que pode proporcionar um
nuclear magnética (RNM). O diagnóstico é realizado período maior de sobrevida livre da doença.
pela linfadenectomia cirúrgica, seja por cirurgia aberta O tratamento com cirurgia radical está contra-
ou videolaparoscópica. As metástases ósseas são indicado nos casos de envolvimento de linfonodos.
investigadas por meio da cintilografia óssea, esta não Nas situações onde o comprometimento linfonodal
indicada em pacientes assintomáticos, com PSA menor é diagnosticado após a cirurgia (pN+), deve-se
que 10 ng/mL e com tumor bem ou moderadamente empregar o tratamento hormonal adjuvante imediato
diferenciado. Nestes casos é pouco provável a presença ou retardado, que pode proporcionar uma sobrevida
de metástases ósseas. de dez anos livre da doença. Há incidência de pro-
O tumor de próstata pode metastizar para outros gressão tumoral menor nos casos de pequeno envol-
órgãos, os mais freqüentes são os pulmões, o fígado, vimento linfonodal microscópico, pN+.
o sistema nervoso central e a pele. A radiografia de A hormonioterapia neoadjuvante para provocar
tórax, a ultra-sonografia, o TC e a RNM são indicados uma diminuição no estadiamento da doença e per-
na suspeita de metástases para estes órgãos. O fator mitir uma cirurgia oncológica, com margens livres,
preditivo mais importante para metástase do câncer também é utilizada na atualidade.
prostático é o valor do PSA acima de 100 ng/mL, A cirurgia de ressecção transuretral da próstata
nestes casos cerca de 100% dos pacientes apresentam (tunelização da próstata) também pode ser realizada
doença metastática. nos casos de tumor avançado. Nesta situação, a
cirurgia é paliativa e objetiva a desobstrução uretral
ou a redução dos sintomas do trato urinário baixo.
Tratamento
Tratamento radioterápico
A simples observação, quando o estádio é deter-
minado no pré-operatório, está formalmente contra- A radioterapia no câncer de próstata localmente
indicada como opção para o câncer de próstata avançado (T3-T4, N0-Nx) pode ser empregada
localmente avançado; no entanto, nos casos de mar- isoladamente ou associada à hormonioterapia, esta
gem positiva, esta conduta pode ser empregada em última opção parece melhorar o resultado do trata-
casos selecionados. Embora existam uns poucos mento; este fato é comprovado experimental e clinica-
trabalhos na literatura com o simples acompanha- mente com melhora na sobrevida livre da doença,
mento, sem tratamento, do tumor avançado assinto- sendo considerado uma interação sinérgica. Trabalhos

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Guia Prático de Urologia

compararam dois grupos de pacientes com câncer de Acompanhamento do tratamento


próstata localmente avançado, o primeiro grupo
recebeu o tratamento com radioterapia isolada, e o O objetivo do acompanhamento destes pacientes é
segundo, radioterapia associada ao uso de dietiles- a monitorização da resposta ao tratamento, a estimulação
tilbestrol como terapia adjuvante. O grupo que recebeu para que o paciente não abandone seu tratamento e a
a hormonioterapia adjuvante apresentou sobrevida detecção precoce de complicações da doença.
livre de doença em dez anos de 63% contra 43% do A monitorização do PSA é muito importante e pode
grupo que recebeu radioterapia isolada, esta diferença prever a evolução do tumor; a dosagem do PSA nos
foi estatisticamente significativa (p = 0,008). três e seis meses de tratamento tem correlação com o
Outros autores também encontraram uma diferença prognóstico do paciente. Um nível de PSA indetectável
estatisticamente significativa na sobrevida e no neste período prevê uma grande probabilidade de
desenvolvimento de metástases em pacientes com resposta em longo prazo. A progressão da doença
tumor de próstata localmente avançado, tratados com costuma ocorrer em média do 12o a 18o mês após o
radioterapia isolada e radioterapia associada à hormo- início do tratamento hormonal, e o aumento na
nioterapia, com benefício para esta última opção. dosagem do PSA precede em meses o início da piora
O avanço dos métodos de imagem está permitindo clínica. O acompanhamento destes pacientes deve ser
uma melhora no planejamento da radioterapia, os realizado a cada três ou seis meses, com história clínica,
aparelhos modernos com radioterapia conformacional exame físico, dosagem do PSA, hemoglobina, uréia,
tridimensional têm permitido aplicar maior dosagem de creatinina e fosfatase alcalina.
radiação no sítio específico, poupando os tecidos vizinhos
normais. Alguns autores preconizam o tratamento
hormonioterápico previamente à radioterapia, para Conclusão
diminuir o volume tumoral e poder reduzir a dose de
radiação, minimizando a morbidade do tratamento. Existem várias opções para o tratamento do câncer
A resposta clínica da radioterapia é baseada na de próstata localmente avançado, são elas:
‹ Radioterapia externa;
medida do PSA e em biópsias sextantes após dois
‹ Hormonioterapia neoadjuvante seguida de
anos do tratamento. Cerca de 90% dos pacientes que
recebem uma dose superior a 75 Gy alcançam um radioterapia ou cirurgia radical;
‹ Hormonioterapia primária;
nadir de PSA = 1 ng/mL contra 76% dos que rece-
‹ Seguimento em casos selecionados.
bem uma dose inferior a 70 Gy.
Entendemos que o tratamento do paciente deve
Tratamento hormonal ser individualizado, considerando caso a caso fatores
como estado geral, idade, expectativa de vida,
O tratamento hormonal é considerado o padrão
comorbidades e o desejo do paciente. O tratamento
para o câncer de próstata avançado. A testosterona é
visando a cura ou o controle da doença pode ser
essencial na perpetuação do câncer prostático,
alcançado e deve ser buscado sempre em confor-
qualquer tratamento que reduza a concentração de
midade com a vontade do paciente.
testosterona no plasma ou na próstata é conhecido
como tratamento hormonal.
Os tipos de tratamento hormonal incluem: Leitura recomendada
‹ Castração cirúrgica;

‹ Estrogenos; 1. Whitmore WF Jr. Natural history and staging of prostate


‹ Análogos de hormônios liberadores dos hor- cancer. Urol Clin North Am; 11: 209-20, 1984.
2. Lerner SE, Blute ML, Zincke H. Extended experience
mônios luteinizantes (LHRHa);
with radical prostatectomy for clinical stage T3 prostate
‹ Antiandrogênicos.
cancer: outcome and contemporary morbidity. J Urol; 154:
A indicação clássica para o tratamento hormonal 1447-52, 1995.
é o adenocarcinoma de próstata localmente avançado 3. Zincke H.: Extended experience with surgical treatment of
stage D1 adenocarcinoma of prostate. Significant influences
ou metastático (T3-T4/N+/M+). Esta modalidade
of immediate adjuvant hormonal treatment on outcome.
de tratamento é opcional para os casos de pacientes Urology; 33: 27-36, 1989.
sintomáticos com câncer localizado, que não são 4. Sociedade Brasileira de Urologia. I Consenso Brasileiro de
candidatos ao tratamento curativo. Câncer de Próstata. BG Cultural, pp. 47-57, maio 1998.

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 149
Doença disseminada –
quando iniciar hormonioterapia?

Marcus Vinícius Sadi

Pacientes com câncer da próstata avançado são Somente nos últimos anos é que poucos estudos
definidos como portadores de grandes tumores pél- randomizados foram realizados para a investigação
vicos (estádio C ou T3-T4 N0 M0), ou com de qual a melhor época para a introdução do trata-
linfonodos comprometidos e/ou comprometimento mento hormonal no câncer da próstata avançado e,
sistêmico (estádio D ou T3-T4 N+ M+). Uma vez mesmo assim, muitos destes estudos têm desenho
que a base terapêutica para estes pacientes é o blo- inadequado e um poder de análise estatística criticável.
queio androgênico, é possível que se deva incluir neste O problema com a realização destes estudos é que a
grupo de pacientes com doença avançada, aqueles necessidade de seguimento tardio destes pacientes
com câncer localizado que apresentem recidiva bio- implica, em muitos casos, que os resultados clínicos
química da doença após tratamento definitivo, tam- só se tornem evidentes cerca de dez a 15 anos após
bém aqueles com tumores de alto grau (Gleason 9 e o início do estudo, especialmente se são incluídos
10) e, eventualmente, até aqueles cujo diagnóstico nestas análises pacientes com elevação do PSA após
precoce molecular sugira a presença de células à dis- tratamento local curativo. Além disto, no mundo
tância. Embora a terapia hormonal possa ser utilizada todo, é incomum que os urologistas façam o diag-
em todas as fases do câncer da próstata, a época nóstico de câncer da próstata em seus pacientes e
ideal do seu início na presença de doença avançada é depois permitam que eles sejam selecionados para
motivo de controvérsia. serem “randomizados para não serem tratados à
Os estudos originais do Veterans Administation época do diagnóstico”. Isto torna o recrutamento
Cooperative Urological Research Group (VACURG) na de pacientes a estes estudos extremamente difícil.
década de 1960, além de identificarem que o uso de Segundo o Medical Research Council (MRC), na Ingla-
estrógenos em altas doses, para pacientes com câncer terra, em um estudo com 928 pacientes com doença
da próstata metastático, promovia maior mortalidade avançada, randomizados para o tratamento hormo-
pelo risco do desenvolvimento de fenômenos vasculares nal precoce (n = 469) ou instituído somente após
tromboembólicos, também introduziram o conceito sinais de progressão da doença (n = 469), não foram
de que o uso precoce da terapêutica antiandrogênica demonstradas diferenças em termos de sobrevida
não aumentava a sobrevida deste grupo de pacientes; para pacientes com doença metastática disseminada.
portanto não estava recomendada, devendo ser adiada Entretanto, o grupo tratado precocemente teve
até os pacientes tornarem-se sintomáticos. Entretanto menos complicações locais relacionadas ao cresci-
uma reanálise destes mesmos dados sugeriu que pacientes mento do tumor. Estudos com pacientes portadores
jovens com doença metastática apresentavam maior de câncer da próstata e metástases para linfonodos
sobrevida quando tratados precocemente. pélvicos, mas sem evidência de doença metastática

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Seção VII F

por via hematogênica, também demonstram não exis- 1) o período de doença assintomática pode ser
tir vantagem em relação à sobrevida global dos paci- longo, muitas vezes de vários anos;
entes tratados precocemente. Porém existiu um maior 2) há o potencial da seleção de clones de células
risco de progressão da doença, tanto local quanto à andrógeno-independentes;
distância, naqueles tratados tardiamente. 3) a presença de efeitos colaterais do tratamento,
Pode-se recomendar o tratamento hormonal tar- como disfunção sexual, hepatopatia, gineco-
dio para pacientes idosos, assintomáticos e com tu- mastia e osteoporose, pode prejudicar a quali-
mores bem diferenciados e oferecer a introdução dade de vida dos pacientes;
precoce da terapêutica antiandrogênica para pacientes 4) não existe tratamento realmente eficaz nas falhas.
jovens, com doença disseminada mínima, sintomá- Desta forma, revisando-se as informações exis-
ticos ou com tumores indiferenciados. Obviamente, tentes dos poucos estudos randomizados, chega-se
deve-se sempre levar em consideração os custos, à conclusão de que existe alguma vantagem quanto à
efeitos colaterais e a qualidade de vida desejada em progressão da doença e sobrevida específica para os
longo prazo com estas terapias. Recentemente, três pacientes tratados precocemente, em especial aqueles
estudos randomizados com placebo, em mais de 8 com doença residual mínima, caracterizados por
mil pacientes, demonstraram que o uso de mono- recidiva bioquímica e/ou com linfonodos compro-
terapia precoce com bicalutamida 150 mg promoveu metidos após tratamento radical com intenção cura-
uma redução de 42% na progressão da doença e tiva. Os efeitos colaterais adversos promovidos pelo
sobrevida específica daqueles com M1, com um uso da terapia antiandrogênica a longo prazo são
baixo índice de efeitos colaterais. importantes, mas presumivelmente podem ser redu-
Se realmente importa a época da introdução da zidos pelo uso de monoterapia com bicalutamida
terapia hormonal também é motivo de controvérsia. em doses altas. Entretanto resultados em longo prazo
Algumas autoridades referem que qualquer doença ainda se fazem necessários.
diagnosticada pelos métodos habituais já é, por defi-
nição, muito avançada se considerarmos o tempo
de duplicação celular desde o seu diagnóstico até a Leitura recomendada
morte, pois, na maioria dos casos, o tumor já cursou
1. Anderson JB. Early versus deferred hormone therapy. Eur
pelo menos três quartos da sua história natural. Urol. 1999; 36 Suppl 2:9-13.
As vantagens da introdução precoce do trata- 2. No authors listed. Immediate versus deferred treatment for advanced
mento hormonal são: prostatic cancer: initial results of the Medical Research Council
1) normalmente o paciente tem um melhor estado Trial. The Medical Research Council Prostate Cancer Working
Party Investigators Group. Br J Urol. 1997; 79: 235-46.
geral; 3. JordanWP, Blackard C, Byar DP. Reconsideration of
2) existe um menor volume tumoral e, portanto, orchiectomy in the treatment of advanced prostatic carcinoma.
menor instabilidade genética, que é uma das South Med J. 1977; 70: 1411-3.
causas de falência terapêutica; 4. Newling DWW. The palliative therapy of advanced prostate
cancer with particular referece to the results of recent
3) a identificação mais precoce das falhas permite European clinical trials. Brit J Urol., 1997; 79: 72-81.
a instituição de outras modalidades de trata- 5. See WA, Wirth MP, Mcleod DG, Iversen P, Klimberg I,
mento mais cedo; Gleason D, Chodak G, Montie J, Tyrrell C, Wallace DM,
4) presumivelmente, promove-se uma maior Delaere KP, Vaage S, Tammela TL, Lukkarinen O, Persson
BE, Carroll K, Kolvenbag GJ. Casodex Early Prostate Cancer
sobrevida. Trialist Group. Bicalutamide as immediate therapy either alone
Em contrapartida, o uso precoce da terapêutica or as adjuvant to standard care of patients with localized or
hormonal pode não ser vantajoso porque: locally advanced prostate cancer: first analysis of the early
prostate cancer program. J Urol. 2002; 168: 429-35.

512

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Seção VII F

Capítulo 150
Doença disseminada – bloqueio
androgênico completo

Ubirajara Ferreira
Rafael S. Mamprin

Há muitos anos tem sido reconhecido que os Analisou-se o tempo de progressão da doença e
andrógenos são a chave no controle do crescimento a sobrevida global, comparando os efeitos da mono-
e função da próstata. terapia com o bloqueio total e paralelamente a toxi-
O bloqueio hormonal deflagra uma série de eventos cidade e efeitos colaterais dos dois métodos.
moleculares e bioquímicos que levam ao dano Vinte e quatro dos 27 estudos não mostraram ga-
irreversível do genoma e à morte celular programada. nho de sobrevida com o bloqueio androgênico com-
Desde meados da década de 1980, o bloqueio pleto em comparação à monoterapia (análogo
androgênico completo com castração (cirúrgica ou LHRH ou orquiectomia) e apenas três deles eviden-
medicamentosa) mais antiandrogênico periférico tem ciaram pequeno aumento da sobrevida global com
sido postulado como tratamento de primeira linha bloqueio completo.
para o controle do câncer avançado da próstata. Crawford e colegas verificaram ganho de sobre-
Labrie e colegas relataram que o bloqueio, conco- vida de 35 meses com bloqueio total em comparação
mitante, dos andrógenos de origem adrenal (que com 29 meses da monoterapia. Já Bono e colegas
correspondem a 5% - 10% da produção dos hor- obtiveram 30 meses de sobrevida para ambas as
mônios masculinos) poderia favorecer a inibição do formas de tratamento.
crescimento tumoral e possivelmente acarretaria Tyrell e colegas, usando goserelina mais flutamida,
melhora dos sintomas e da sobrevida em compa- conseguiram 25 meses de sobrevida e 31 meses
ração com a monoterapia. usando apenas goserelina, mostrando o insucesso
A partir disso, muitos ensaios clínicos têm tentado desta combinação.
mostrar que o bloqueio androgênico completo traz Eisenberger e colegas seguiram por aproxima-
realmente vantagens de sobrevida e/ou melhor damente 50 meses os pacientes com 70% de mortes
qualidade de vida. neste período, e verificaram média de sobrevida de
Vinte e sete estudos com desenho randomizado e 33 e 30 meses com o bloqueio completo e orquiec-
duplo-cego, perfazendo 7.987 pacientes, foram tomia respectivamente.
analisados comparando: Zalcberg e colegas obtiveram paralelamente 23
a) Análogo LHRH somente com análogo LHRH meses de sobrevida com bloqueio completo e 31
mais agente antiandrogênico; meses com a monoterapia. Jorgensen e colegas
b)Orquiectomia apenas com orquiectomia mais obtiveram os mesmos 33 meses de sobrevida para
agente antiandrogênico; ambos os tipos de tratamento.
c) Orquiectomia apenas com análogo LHRH mais A EORTC (European Organization for Research and
agente antiandrogênico. Treatment of Cancer) conduziu um trabalho compa-

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Seção VII F

rando o uso de goserelina mais flutamida com queio androgênico simples como forma de tratamento
orquiectomia bilateral e obteve sete meses apenas de de primeira linha do câncer avançado de próstata.
diferença no ganho de sobrevida em favor do blo-
queio completo.
Resultados contraditórios têm sido observados Leitura recomendada
quanto ao agente antiandrogênico utilizado. O uso
1. Labrie F, Dupont A, Belanger A, et al. Combination therapy
da flutamida resultou em vantagem na sobrevida with flutamide and castration (LHRH agonists or
quando associada a um análogo LHRH, comparando orchiectomy) in advanced prostate cancer: a marked
com a nilutamida. Esta se mostrou mais efetiva em improvement in response and survival. J Steroid Biochem,
combinação com castração cirúrgica. 23: 833, 1985.
2. Laufer M, Denmeade R, Sinibaldi VJ, Carducci MA,
Com relação aos efeitos colaterais e qualidade de Eisenberger MA. Complete androgen blockade for prostate
vida, foi verificado que com o uso prolongado do blo- cancer: What went wrong? J Urol 3-9 vol. 164 July 2000.
queio androgênico completo, houve maior incidência 3. Crawford ED, Eisenberger MA, Mc Leod D. et al. A
de perda da libido e potência, diminuição da massa controlled trial of leuprolide with and without flutamide in
prostatic carcinoma. N Engl J Med, 321: 419, 1989.
corporal, fadiga, ginecomastia, fogachos, alteração da 4. Bono AV, DiSilverio F, Robustelli della Cuna G et al.
função hepática, náuseas, diarréia, anemia e osteoporose. Complete androgen blockade versus Chemical castration in
Quase duas décadas após a introdução do bloqueio advanced prostatic cancer: Analysis of an Italian multicentre
completo, as conclusões se mostraram desapontadoras study. Urol Int suppl. 60: 18, 1998.
5. Tyrell CJ, Altmeir JE, Klippel F et al. A multicentre randomized
com esta forma de tratamento do câncer avançado da trial comparing the luteinizing hormone-relasing hormone
próstata. As evidências atuais demonstram que o bloqueio analogue goserelin acetate alone and with flutamide in the
androgênico completo não traz vantagens sobre o blo- treatment of advanced prostate cancer. J Urol, 146: 1321, 1991.

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Seção VII F

Capítulo 151
Bloqueio androgênico intermitente

Walter J. Koff

Desde a introdução do uso de estrógenos no trata- subcutânea; a massa muscular diminui de forma signifi-
mento do adenocarcinoma avançado de próstata na cativa, forma-se osteoporose generalizada, aparecendo
década de 1940, que valeu para a urologia, em 1946, astenia muscular, falta de concentração e memória e
o seu primeiro e único prêmio Nobel de Medicina, diminuição significativa do impulso masculino de
ganho por Huggins e Hodges, tem sido notado que o competição, com prejuízo do desempenho físico, inte-
bloqueio androgênico, realizado por qualquer meio, lectual e de trabalho.
seja orquiectomia bilateral, estrogenoterapia, análogos Por estas razões, há sugestões de que o uso de blo-
LH-RH ou antiandrógenos, é espetacularmente bem- queio intermitente poderia, de algum modo, prolongar
sucedido por algum tempo, às vezes longo, outras vezes a vida útil da supressão hormonal nas células tumorais,
curto, de menos de um a dois anos, após o qual o ampliando o tempo de evolução do tumor, e, por
tumor volta a crescer e suas células se tornam hor- outro lado, diminui-se os efeitos deletérios da ablação
mônio-resistentes, constituindo o que é denominado androgênica no organismo, propiciando a volta
escape hormonal. periódica da libido e permitindo vida sexual satisfatória
Vários mecanismos vêm sendo propostos e testa- nos intervalos da administração da medicação.
dos como responsáveis por esta independência das Vários estudos in vitro com células de adenocar-
células tumorais aos andrógenos. A causa mais estu- cinoma de próstata, ou observações em animais e
dada deste fenômeno é a proliferação e o desenvol- humanos, têm sugerido que, de fato, alguns dos efei-
vimento de células já andrógeno-independentes tos secundários citados acima são atenuados pelo
previamente existentes dentro do tumor, mas em bloqueio intermitente.
pequeno número. Outro mecanismo molecular já Muitos estudos clínicos estão sendo conduzidos
provado é a adaptação das células tumorais para vias nesta área, mas com baixo grau de evidência, pois
alternativas de sinalização dos receptores androgê- faltam estudos randomizados, controlados, e pros-
nicos. Mais recentemente tem havido evidência de pectivos com grande número de pacientes ou estudos
que as células tumorais se adaptam com auto-regu- multicêntricos. Muito menos existem estudos meta-
lação das proteínas andrógeno-reprimidas. nalíticos com esta conduta.
Por outro lado, a deprivação prolongada de andró- Na ausência destes, esta opção terapêutica pode
genos ocasiona efeitos indesejáveis no homem. O pri- ser uma opção razoável, desde que os pacientes
meiro efeito colateral importante é a perda completa sejam totalmente infor mados do seu caráter
da libido com efeito deletério também na ereção. Com investigacional e dos benefícios e riscos existentes.
o decorrer do tempo, ocorrem alterações de pele, que É lógico que a alternativa de retorno periódico da
se torna fina e frágil, com deposição de gordura atividade sexual, em homens previamente sexual-

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Seção VII F

mente ativos, é um fator muito importante na aos níveis obtidos pelos primeiros ciclos. Se isso repre-
tomada de decisão dos doentes. senta apenas a evolução natural da doença, que tende
Recomenda-se este tipo de terapêutica em a ser andrógeno-independente, ou então uma conse-
homens sexualmente ativos, com doença metastática qüência indesejável do tratamento intermitente, não
ou localmente avançada ou falha bioquímica após está claro no presente momento.
cirurgia ou radioterapia, que tenham respondido Este método terapêutico alternativo de bloqueio
muito bem ao bloqueio inicial, especialmente quando hormonal é uma estratégia ainda em investigação,
o nadir do PSA tenha sido < 0,04 ng/mL. mas possivelmente segura, que poupa os pacientes
O bloqueio pode ser mantido, inicialmente, até dos efeitos deletérios da deprivação hormonal, pelo
seis meses para se observar o nadir e, depois, suspenso menos em parte, e talvez prolonge a atuação terapêu-
até que o PSA atinja 50% do seu valor inicial pré- tica deste tratamento, que é considerado o mais efici-
tratamento ou taxas entre 4 e 5 ng/mL. ente existente para doença metastática ou refratária a
Temos notado que, quanto mais idoso o paciente, tratamento local curativo.
mais lentamente o PSA cresce após a interrupção do Um seguimento atento dos pacientes é recomen-
bloqueio, e a monitorização dos níveis de testosterona dado, tanto mais que este método ainda não de-
plasmática demonstra lenta recuperação dos níveis monstrou o seu valor específico em estudos de alto
deste hormônio através dos meses. Doentes com mais nível de evidência, como seria aconselhável em
de 70 anos de idade geralmente têm um tempo inter- qualquer terapêutica proposta.
bloqueio de seis meses a um ano em contrapartida
aos mais jovens, que geralmente não conseguem ficar
sem o bloqueio por mais de três a quatro meses. Após Leitura recomendada
a interrupção do bloqueio, os níveis de PSA plasmá-
ticos devem ser solicitados a cada um a dois meses e, 1. Reese DM, Small EJ, Alternative hormone approaches:
sempre que necessário, acompanhado de dosagem de intermittent, peripheral, triple. In: Kantoff PW, Carroll PR,
D´Amico AVD, Prostata Cancer, Principles and
testosterona plasmática. Practice. Philadelphia, Lippinncott, Willians & Wilkins,
Pacientes que apresentam um nadir de PSA acima 2002, pp. 541-48.
de 1 ng/mL são possivelmente maus candidatos a 2. Crook JM, Szumacher E, Malçone S et al. Intermittent
este tipo de tratamento, assim como aqueles com androgen supression in the management of prostate cancer.
doença muito avançada e sintomática. Urology 1999, 53: 530-4.
3. Kurek R, Rennemberg H, Lübben G, et al. Intermitent androgen
Com o decorrer do tempo, nota-se que em cada blockade in PSA relapse after radical prostatectomy an incidental
ciclo de tratamento os níveis de PSA já não caem prostate cancer. Eur Urol 1999, 35 (suppl): 27-31.

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Seção VII F

Capítulo 152
Escape hormonal – conduta

Luiz Carlos de Almeida Rocha


Luiz Edison Slongo

As tentativas de se evitar a progressão do câncer O acompanhamento da doença


prostático hormônio-refratário permanecem um desa-
fio. O conhecimento científico atual não dispõe de A dificuldade de mensurar adequadamente o volu-
uma estratégia de tratamento que possa ser comparada me tumoral e o comportamento biológico diferente
à ablação androgênica no controle dessa neoplasia. entre os doentes com comprometimento de tecidos
Faz-se necessário o completo conhecimento biológico moles daqueles com metástases ósseas ocasiona uma
do escape hormonal, o desenvolvimento de novas avaliação imprecisa dos resultados terapêuticos e de
abordagens terapêuticas e o melhor emprego das dro- um prognóstico pouco confiável.
gas já conhecidas. O câncer de próstata hormônio- O PSA tem sido usado como marcador da resposta
independente é definido por duas dosagens dos níveis ao tratamento, entretanto não há consenso quanto à
do PSA subseqüentes, com aumento de 50% em magnitude e à duração da queda nos níveis do mar-
relação ao nadir da curva decrescente por ocasião da cador para se considerar um resultado satisfatório. A
privação hormonal. queda de 50% na curva do PSA por mais de 30 dias
está fortemente relacionada com maior sobrevida dos
pacientes submetidos à quimioterapia antineoplásica.
Mecanismos do escape Os dados clínicos, níveis do PSA e a qualidade de
hormonal vida têm sido utilizados como parâmetros no acompa-
nhamento do tumor prostático.
Não se encontram totalmente elucidados os meca- Intercorrências como fraturas patológicas, sangra-
nismos responsáveis pela independência hormonal mentos, uropatia obstrutiva infra e supravesical, dor
do câncer de próstata. Entretanto é conhecida a óssea e compressão medular precisam ser adequa-
heterogenicidade desse tumor que, quando submetido damente tratadas.
à privação hormonal, oferece oportunidade de proli-
feração às células hormônio-resistentes. Mutações nos
genes que regulam os receptores androgênicos, assim Níveis de testosterona no
como sua sensibilidade, são descritas na literatura. escape hormonal
Os estudos atuais valorizam o descontrole da apop-
tose celular mediada pelo efeito antiapoptótico da Dosagens da testosterona devem ser obtidas por
alta expressão do BCL-2 e mutações no gene p53. ocasião do escape hormonal visando eventual remane-
Fatores de crescimento também são envolvidos no jamento de drogas quando tais níveis não forem os
escape hormonal. desejados. Níveis hormonais de castração mantidos

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Guia Prático de Urologia

nos pacientes com escape hormonal oferecem pe- agentes quimioterápicos permitem maior segurança e
quenos benefícios, porém sem acrescentar relevantes eficiência no emprego da quimioterapia antineoplásica.
riscos aos pacientes. Portanto, acredita-se que a terapia Os melhores resultados baseados no PSA, publi-
hormonal não deva ser suspensa. cados por Picus, 1999, e Beer, 2000, com apenas um
agente citotóxico isolado (docetaxel), foram na ordem
de 45% a 47%. Vários estudos sugerem atividade da
Síndrome da retirada dos mitoxantrona associada aos corticosteróides. O efeito
antiandrógenos sinérgico entre o estramustine associado à vimblastina,
paclitaxel ou docetaxel apresenta efeitos mensuráveis
Em 1993, foi descrita a melhora clínica e dos níveis sobre o tumor de próstata hormônio-resistente em
de PSA com a retirada dos antiandrógenos na doença 45% a 74% dos pacientes.
progressiva em aproximadamente 20% dos pacientes. Outras associações como estramustine e etoposide
Esta estratégia pode ser utilizada nos doentes porta- via oral, ciclofosfamida e etoposide ambos via oral
dores de câncer de próstata hormônio-refratário em têm sido animadoras. Cisplatina e carboplatina apre-
que a quimioterapia não esteja justificada. sentam atividade contra o tumor prostático e a sinergia
com o etoposide ou paclitaxel encontra-se em estudos.
A combinação estramustine, etoposide e cisplastina
Terapia hormonal secundária apresenta atividade nos tumores indiferenciados e
no escape hormonal hormônio-refratários. Regimes com docetaxel-calcitriol
encontram-se em fase de testes.
Altas doses de bicalutamida (150 mg) apresentam
O suramin apresenta ação contra tumores hormô-
melhores efeitos sobre o PSA quando comparadas
nio-independentes inibindo fatores de crescimento,
à dose habitual de 50 mg. O acetato de megestrol
tem pequena atividade antitumoral nesses pacientes, entretanto seu mecanismo de ação não está comple-
entretanto, 20 mg duas vezes ao dia controla em 70% tamente elucidado.
os fogachos que habitualmente acompanham os Os tumores pouco diferenciados, anaplásicos e
indivíduos com ablação hormonal. Já o seu emprego neuroendócrinos, os quais geralmente apresentam-se
em altas doses (160-320 mg/dia) melhora o apetite com PSA baixo, crescimento rápido e alta incidência
e outros sintomas que acompanham os estádios de comprometimento visceral são acompanhados de
avançados do câncer de próstata. depósitos metastáticos ósseo-líticos. Pacientes porta-
Há evidências da ação citotóxica direta do dietilstil- dores destes tumores não respondem adequadamente
bestrol em altas doses sobre as células tumorais, po- à privação hormonal e devem ser selecionados preco-
dendo resultar em melhora clínica e da dor óssea em cemente para quimioterapia citotóxica.
alguns pacientes. Aproximadamente 10% dos andro-
gênios são produzidos nas adrenais e o bloqueio
da esteroidogênese com cetoconazol ou corticos- Tratamento suportivo do
teróides pode traduzir-se em resposta clínica. A res- câncer de próstata
sposta da hormonioterapia secundária não apresenta
resultados alentadores porque as células hormônio- A maioria dos pacientes com doença avançada e
sensíveis já se encontram suprimidas pelo bloqueio hormônio-refratária apresenta dores ósseas. Na dor
hormonal primário. óssea localizada, a radioterapia externa em baixas doses
tem se mostrado eficiente, entretanto, na doença
metastática disseminada, o emprego de radiofármacos
Quimioterapia no tumor (estrôncio-89 ou samarium-153) pode controlar a dor
hormônio-refratário parcial ou completamente em 70% dos pacientes.
Todavia, essas drogas são mielossupressoras, dificul-
A quimioterapia nos tumores hormônio-resistentes tando uma posterior quimioterapia. Há evidências de
tem retomado um papel importante baseando-se na muitos pacientes com dor óssea que se beneficiam do
queda do PSA e na qualidade de vida como parâ- emprego de bifosfonatos (análogos do pirofosfato
metro dos resultados. Novas combinações de drogas que bloqueiam a reabsorção e a mineralização óssea).
citotóxicas sinérgicas, antieméticos modernos, fatores Na fase terminal da doença, freqüentemente são
de crescimento hematológicos e o advento de novos utilizadas associação de analgésicos, antiinflamatórios

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Guia Prático de Urologia

não-hormonais, glicocorticóides, opiácios e antidepres- terminais oferece um melhor atendimento aos doentes
sivos tricíclicos na tentativa heróica do controle da dor. portadores de câncer de próstata com independência
Outros sintomas como constipação, anorexia, náuseas, hormonal.
fadiga e depressão precisam ser clinicamente contor- Para o futuro, novos estudos envolvendo a terapia
nados. A abordagem multidisciplinar dos urologistas gênica, antagonistas da endotelina, oligonucleotídeos
com oncologistas clínicos, radioterapeutas, enfermeiras sintéticos, retinóides, derivados da vitamina D e
e psicólogos treinados em pacientes oncológicos butiróides são promissores.

Leitura recomendada of Urology, 2001; 45-51.


3. Tookman A, Kurowska A. In Kaisary AV, Murphy GP, Denis
1. Eisenberger MA, Carducci MA. In Walsh PC, Retik AB, L, Griffiths K. Prostate. Cancer: Pathology, Diagnosis
Voughan ED Jr, Wein AJ. Campbell’s Urology. 8th ed. and Treatment. London, 1999; 331-45.
Philadelphia, 2002; 3209-26. 4. Raghavan D. Hormone refractory prostate cancer-A moving target
2. Aus G, Abbou CC, Pacik D, Schmid HP, Van Poppel H. In: for chemotherapy. AUA News, The Official Newsmagazine
Guideliness on Prostate Cancer. European Association of The American Urological Association. 2003; 8: 50-52.

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Seção VII F

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Seção VII F

Capítulo 153
Há espaço para quimioterapia
no câncer de próstata?

Marcelo Luiz Bendhack

Apenas 30% dos pacientes com diagnóstico de (antiandrógeno). Isto favoreceria a progressão da
câncer da próstata (CaP) irão morrer em decorrência doença e somente a retirada do antiandrógeno po-
da doença. deria interromper este processo.
Os tratamentos quimioterápicos podem ser efe- Aspecto importante do tratamento do CaP hor-
tuados em diferentes fases do tratamento, com dife- mônio refratário (CaPHR) é a aceitação de que existem
rentes finalidades terapêuticas. Não existe tratamento vários – diferentes – fenótipos. O fenótipo sensível à
curativo para o CaP na fase de metástases à distância. hormonioterapia pode ser encontrado. Tratamentos
A terapia primária considerada padrão para estes como retirada de antiandrógenos, cetoconazol, dieti-
pacientes é a deprivação andrógena. lestibestrol (DES), PC-SPES, dexametasona, amino-
No final de uma deprivação andrógena contínua, glutetamida e altas doses de bicalutamida têm sido
encontra-se, na maioria dos casos, uma insensibilidade reportados em algumas ocasiões para pacientes com
hormonal das células cancerosas. O carcinoma resi- progressão, mesmo sob terapia antiandrógena. A
dual não é mais dependente de andrógenos e a depri- bicalutamida, na dose de 150 mg/dia, proporciona
vação andrógena não apresenta efeitos terapêuticos uma redução de 50% do PSA de 20% dos pacientes
efetivos. Não está claro se este clone de células insen- com CaPHR, além de estar associada a uma sobrevida
sitivas ao efeito hormonal existe desde o início da média de 15 meses (estudo SWOG).
doença (e durante o tratamento supera o crescimento Há cerca de 40 anos são conhecidas as tentativas de
do clone de células sensitivas) ou se ele se desenvolve utilização de estrogênios em pacientes com doença
posteriormente devido a um mecanismo de seleção progressiva sob deprivação andrógena. Uma redução
determinado pela terapia antiandrógena. das dores por um período de dois a quatro meses
Também permanece indefinido se uma terapia tem sido relatada por cerca de 40% dos pacientes. As
hormonal paliativa deve ser continuada caso o pro- possibilidades de administração são dietilestibestrol
gresso da doença for diagnosticado. Existem relatos (DES) oral, com meia-vida curta e fosfestrol (meta-
indicando que a interrupção desta terapia pode, em bolizado à DES e bifosfatos), com meia-vida longa.
torno de 20% dos pacientes, determinar um decrés- DES foi utilizado com este fim (na Alemanha, conhe-
cimo (passageiro) do valor do PSA (síndrome da cido como terapia com fosfestrol 1200 mg EV/24
retirada do bloqueio antiandrógeno). Explicação pos- horas, durante 10 dias) (Tabela 1). Altas doses promo-
sível é a de que a administração contínua de antian- vem feedback negativo, ação citotóxica direta (inibe
drógeno que se ligue ao receptor androgênico possa topoisomerases) e alívio da dor (bisfosfonados – like).
induzir uma modificação deste, o qual pode, por Profilaxia para trombose venosa profunda deve ser
sua vez, até mesmo ser estimulado por esta substância realizada na fase de indução. Se possível, durante a

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Guia Prático de Urologia

Tabela 1: Esquema terapêutico para uso de fosfestrol

continuidade deste tratamento, deve-se administrar B) cT3-4, PSA > 20 ng/mL ou Gleason escore 8 a
antiagregantes plaquetários. 10. QT: paclitaxel, carboplatina, estramustina e
Os bisfosfonados são altamente efetivos no con- bloqueio hormonal por até quatro ciclos;
trole da dor e destruição óssea. Suas possibilidades C)cT2b, cT3-4, PSA > 15ng/mL, Gleason escore
de uso incluem os seguintes medicamentos: 8 a 10. QT: docetaxel, estramustina.
A)Pamidronato dissódico – 90 mg EV mensais; QT efetiva seria necessária para melhorar os resul-
B) Clodronato dissódico – 300 mg EV, administrar tados do tratamento da doença T3, permitindo a
em duas horas, por dois a cinco dias ou 400 eliminação de micrometástases. Com a identificação
mg VO três a quatro vezes ao dia; de novos agentes, cresce o interesse do seu emprego
C)Ácido zoledrônico – 4 mg em 100 mL de soro para doença de baixo estádio. A QT, nesta fase de
fisiológico EV (em 15 minutos) cada três a quatro doença, permanece experimental.
semanas (fácil administração). Estudo fase III
com esta medicação demonstrou maior inter- QT primária do câncer da próstata
valo (significativo) de tempo até ocorrência de metastático
eventos ósseos. Muitos estudos foram realizados nos quais, de
O tratamento com estrógenos deveria ser tentado maneira prospectiva e randomizada, a terapia antian-
em pacientes com tratamento antiandrógeno conven- drógena, em comparação com uma terapia combi-
cional já efetuado e com doença progressiva (escape nada de antiandrógenos e QT (por exemplo: estra-
hormonal) e sintomática. mustinfosfato, ciclofosfamida), foi analisada como
tratamento primário do CaP metastático. Nenhum
Quimioterapia (QT) destes estudos demonstrou melhores taxas de sobre-
vida para o grupo de pacientes tratados com terapia
combinada, ou seja, com QT adicional. Este trata-
QT neoadjuvante para doença mento não apresenta, atualmente, indicação para
localizada de alto risco pacientes com CaP metastático virgem de tratamento.
Há dois estudos sobre o uso da QT antes da pros- QT para o CAP metastático refratário
tatectomia radical, com os seguintes critérios de ao tratamento hormonal
inclusão e drogas correspondentes:
A) Pacientes com cT3; T1-2 com Gleason escore A grande maioria dos pacientes submetida à terapia
de 8 a 10; T2b-c, Gleason > 7, PSA > 10 ng/ antiandrógena irá apresentar, na sua evolução, pro-
mL; dez anos de expectativa de vida e com gressão. Estes pacientes esperam receber um trata-
menos de dois meses de bloqueio andrógeno mento alternativo quando do surgimento de dores
combinado. QT: três meses de bloqueio hor- ósseas ou mesmo já quando do aumento dos valores
monal combinado, dois ciclos de seis semanas do PSA. Para o caso de uma mudança da terapia
de cetoconazol + doxorrubicina/vimblastina + antiandrógena ou da terapia com estrogênio não ter
estramustina + agonista LH-RH + hidrocortisona sido efetiva, muitos autores recomendam QT como
(30 mg diário); ultima ratio.

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Guia Prático de Urologia

A taxa de multiplicação das células do câncer pros- esgotar as opções de tratamento hormonal, quando
tático é muito menor se comparada com outros tu- o paciente apresenta estado geral regular ou bom.
mores (por exemplo: câncer de células germinativas Em 1997, estudo prospectivo randomizado
testiculares). Como a maioria dos citostáticos exerce comparando mitoxantrona + prednisona versus
seus efeitos desejados sobre as células que se encon- prednisona (somente) demonstrou melhores resultados
tram em replicação, a QT se torna pouco efetiva para a terapia combinada. Foram verificados melhores
para este tipo de tumor. Todavia, esta taxa de repli- resultados (para alguns quesitos) de qualidade de vida.
cação de um carcinoma resistente à terapia hormonal Este estudo permitiu a liberação (FDA – EUA) do
e progressivo pode aumentar significativamente, uso desta QT para CaP metastático.
constituindo-se no momento adequado para que a
QT seja realizada. Muitas substâncias quimioterápicas,
citostáticas e citotóxicas (Tabela 2) foram estudadas A QT determina aumento do tempo de sobrevida.
com o propósito de analisar os seus efeitos (redução CaP é quimiossensível
do tamanho tumoral, melhora dos sintomas
dolorosos). Nenhuma destas substâncias se mostrou Pacientes com CaPHR têm atualmente múltiplas
especialmente eficiente. Não se constatou, com o uso opções de tratamento além das possibilidades secun-
de QT, remissão completa ou parcial duradoura. Até dárias de terapias com agentes hormonais. QT com-
o ano de 1997, a QT não estava associada ao aumento binada com agentes que afetam a integridade dos
do tempo de sobrevida. microtúbulos (taxanos – paclitaxel, docetaxel) pare-
cem apresentar boa atividade e efeitos adversos tole-
ráveis. Em especial, regimes combinados com taxanos
Regimes contemporâneos demonstram que o representam uma opção promissora, com taxas de
CaP não é tão insensível à QT como se acredi- resposta acima de 50%.
tava previamente Muitos regimes de fase II demonstraram sobre-
vida média de 18 a 24 meses, em contraste com resul-
Embora não tenha sido estabelecido de modo tados de 20 anos de estudo nos quais a sobrevida
rigoroso, é provável que a terapia atualmente disponível média de pacientes com CaPHR era de apenas dez a
para o CaPHR modifique apenas discretamente a 11 meses. Enquanto que a migração de estádio é
história natural desta doença. As indicações para a QT claramente responsável por alguns destes aparentes
podem não ser restritas somente como tratamento melhoramentos, parece provável que progressos reais
sintomático paliativo. Todavia, como é comum em também tenham sido adquiridos. Benefícios adicionais
outros contextos em que a QT tem apenas um impacto de sobrevida relatados em estudos fase II estão para
modesto sobre a sobrevida, decidir quando e como ser confirmados em estudos fase III. Dados mais
utilizá-la permanece, tanto quanto uma ciência, também recentes com único agente – docetaxel – têm demons-
uma arte. O melhor momento para sua indicação é trado atividade significativa deste. Sua administração
na progressão bioquímica/clínica da doença após semanal (36 mg/m2) está associada à menor inci-
dência de mielossupressão. Estes ensaios com doce-
Tabela 2: Quimioterápicos estudados para o tratamento de câncer
taxel como agente único dão suporte para aplicação
de próstata metastático refratário à terapia hormonal em regimes combinados.
Alguns esquemas de QT apresentados recente-
mente estão resumidos na Tabela 3. Estudos em fase
III encontram-se em desenvolvimento. Estudo do
grupo oncológico Southwest (SWOG) está tratando
pacientes com CaPHR com mitoxantrona + predni-
sona ou docetaxel e estramustina. O objetivo primá-
rio deste ensaio é determinar se existe aumento da
sobrevida global de 30% no braço dos taxanos.
No entanto, ainda não há liberação para sua
aplicação, exceto em protocolo de estudo, em países
como Alemanha e Estados Unidos. No Brasil, na

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Guia Prático de Urologia

Tabela 3: Esquemas recentes de quimioterapia (QT) para câncer de próstata

prática clínica, alguns centros já utilizam QT para androgen-independent prostate cancer. J Clin Oncol, v. 21
(1): 123-8, 2003.
pacientes com CaPHR. Novos agentes, em combi-
2. Ebert T, Bendhack ML (1997). Prostatakarzinom - Diagnostik,
nação ou como droga única associada a estes regimes, hormonelle Therapie, Radiotherapie, Chemotherapie. Urologe
serão críticos para aumentar tempo de resposta e A, 36: 570-7.
sobrevida nos pacientes com CaPHR. 3. Goodin S, Rao KV, DiPaola RS. State-of-the-art treatment
of metastatic hormone-refractory prostate cancer. The
Oncologist, 7: 360-70, 2002.
4. Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein, AJ. Campbell’s
Leitura recomendada Urology. Oitava edição, Philadelphia, 2002.
5. Wirth M. Prostatakarzinom - Therapie des lokal begrenzten
1. Beer TM, Eilers KM, Garzotto M, Egorin MJ, Lowe BA, Henner Prostatakarzinoms. Em: Rübben H (editor). Uro-Onkologie.
D. Weekly high-dose calcitriol and Docetaxel in metastatic Springer-Verlag Berlin Heidelberg New York, pp. 233-67, 2001.

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