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1. Direito Penal Substantivo e Direito Processual Penal

Começaremos a nossa aula falando sobre o termo Direito Penal (ou direito criminal),
considerado no seu sentido mais amplo, constitui um ordenamento jurídico complexo, que se
reparte por três disciplinas distintas mas mutuamente complementares: o direito penal
substantivo (material1), direito processual penal (formal ou adjectivo2) e o direito de
execução das penas (ou direito penitenciário3).

Aqui mais do que qualquer outro ramo da ciência jurídica, as relações entre o direito substantivo
e o direito adjectivo formam uma unidade tal que, em regra, o primeiro não pode realizar-se
plenamente sem o concurso do segundo. Na verdade, e de modo diverso do que sucede, por
exemplo, com o direito civil, que na maioria dos casos se realiza e aplica espontaneamente, por
livre vontade dos interessados, o direito penal não é de aplicação voluntária, só se efectiva por
via de uma actividade processual. Por isso, o corpo do art. 1 do CPP dispõe que “a todo o crime
ou contravenção corresponde uma acção penal, que será exercida nos termos deste código”.

Há assim uma relação de instrumentariedade necessária entre o direito processual penal e o


direito penal que os distingue da conexão também existente entre os demais ramos de direito e os
respectivos processos. Isto resulta do facto de ser, por meio do direito penal, globalmente
considerado, que o Estado, cumpre a importantíssima função de proteger os valores
fundamentais da sociedade humana – entre os quais sobressaem o direito a vida, a integridade
física e psíquica, a liberdade sexual, a propriedade individual ou colectiva, a ordem pública e
outras – função que se expressa no dever de administrar e realizar a justiça penal. E o que se
designa por jus puniendi ou monopólio estatual da função jurisdicional.

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Conjunto de regras gerais abstractas, hipotéticas e dotadas de coercibilidade, que regem as relações numa dada
comunidade.

2 Fala-se em direito adjectivo para significar o direito processual, isto é, o ramo do direito que disciplina a forma
de resolução de litígios surgidos em consequência do não acatamento às regras que regulam as relações entre os
sujeitos de direito.

3Expressão que se referia as normas relativas a execução das penas. Actualmente é utilizada a expressão direito
de execução de penas.
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Feitas estas considerações preliminares, podemos definir o Direito Penal como conjunto de
princípios e normas codificadas ou constantes de diplomas avulsos, que consagram os
pressupostos gerais da punição (teoria geral da infracção) que prevêem as condutas puníveis
(crimes) e estabelecem as penas e respectivos regimes, enquanto o Direito Processual Penal
constitui conjunto de normas codificadas (no Código de Processo Penal e outra legislação
avulsa) que permitem a realização de actos, com obediência a determinadas formalidades,
praticados e ordenados pelo tribunal e outras autoridades judiciais competentes com vista a
descoberta dos factos constitutivos da prática de um crime e do seu agente ou agentes, para que a
final, o tribunal possa proferir decisão sobre a aplicação ou não de uma determinada sanção ao
arguido.4

1.1. Direito Penal, Processo Penal e Direito Processual Penal

Já sabemos que o direito penal define, de modo geral e abstracto, quais os factos ou
comportamentos humanos que devem ser considerados criminosos e quais as penas que lhes
correspondem.

Podemos também dizer que o Direito Processual Penal é o conjunto de regras jurídicas que
disciplinam o processo (e o que é o processo?). O processo é o conjunto de actos, é a marcha
consubstanciada de diferentes actos realizados por pessoas legitimidade autorizadas, actos
preordenados.

Todavia averiguar se num dado caso concreto, um certo agente praticou um tipo legal de crime
qual é a sanção que lhe deve ser imposta obriga a uma actividade que de modo nenhum pode ser
arbitrária, antes exige garantias de respeito pelos direitos individuais, para que se obtenha uma
verdadeira realização da justiça penal.

A essa actividade constituída por uma sequência de actos juridicamente pré-ordenados e


praticados por certas pessoas legitimamente autorizadas com vista a lograr a decisão sobre se foi
praticado algum crime e, em caso afirmativo, quem são os seus autores e quais as respectivas
consequências jurídicas e a sua justa aplicação, é o que se costuma designar por processo penal.

4Dicionário Jurídico, 2 Edição, Vol. II, Direito Penal e Direito Processual Penal, Prata Ana; veiga Catarina e
Vilalonga, José Manuel, pag. 183.
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O conjunto de normas jurídicas que regulam e disciplinam e que forma o direito processual
penal.

Dissemos acima que o direito penal e o direito processual penal formam uma unidade,
participam do mesmo ordenamento jurídico, e que entre ambos prevalece uma relação mútua de
complementaridade. No desenvolvimento desta ideia CAVALEIRO DE FERREIRA escreve: O
direito penal e o processo penal devem por isso ajustar-se aos mesmos princípios. Uma
consideração mais profunda da personalidade do delinquente, como e exigida pelo direito
penal, permanecerá letra morte se não for acompanhada da conformação do direito
processual a identifico fim, a modificação do direito penal substantivo acarreta assim,
naturalmente, a conveniência de alterações do direito processual (…) Mas se necessariamente
o processo penal se deve conformar ao espírito do direito penal vigente, por outro será
impossível a execução do direito penal sem um processo penal a ele adaptado.

Com efeito, frequentemente o sentido e a solução de concretos problemas processuais dependem


da posição que tiver sido adoptada pelo direito substantivo como acontece relativamente aos
chamados poderes de cognição do juiz e ao caso julgado, quando se esta perante matéria relativa
ao crime continuado ou a punição do concurso de infracções.

Por outro lado, o direito processual penal exerce igualmente a sua influência na solução de certas
questões pertinentes ao direito penal substantivo. Assim, por exemplo, o actual movimento em
favor da “etilização e purificação do direito penal, ao pretender que este só intervenha nos casos
de insuportável violação de bens fundamentais da comunidade, e, sem dúvida, também
consequência da exigência processual de que os tribunais penais, não sejam submersos por uma
multidão de infracções de duvidoso relevo ético-social.

Apesar destas mútuas influencias, o certo é, porém, que não deixa de existir uma clara autonomia
entre o direito penal e o direito processual penal, resultante, desde logo, da diversidade do
respectivo objecto: o primeiro tem a ver directamente com a ordenação da vida em
sociedade, qualificando, de forma geral e abstracta, os comportamentos humanos em
função de valores jurídicos que considera fundamentais para a comunidade e prescrevendo
sanções para quem violar esses valores, o segundo visa assegurar que os actos tendentes a
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decisão sobre a prática de um crime e a aplicação da penal ao respectivo agente se realizem


com absoluto respeito pelos princípios de justiça.

1.2. Âmbito do Direito Processual Penal

A função essencial do direito processual penal cumpre-se com vimos, na decisão jurisdicional de
saber se foi praticado um crime e, em caso afirmativo, qual as consequências jurídicas que dai
derivam.

Por isso certos autores entendem que o seu âmbito de aplicação se esgota com o trânsito em
julgado da sentença, já não abrangendo a fase de execução da pena, que terá índole puramente
administrativa. Outros, pelo contrário, sustentam que o direito de execução das penas se integra,
no direito processual penal, pese embora a circunstância de a administração penitenciária estar
reservada uma esfera de actuação própria, que pode dizer-se livre da jurisdição.

Nesta ultima corrente se situa FIGUEIREDO DIAS, para quem, no entanto é necessário
distinguir a regulamentação respeitante a determinação prática do conteúdo da sentença
condenatória – e por conseguinte, a realização concreta da pena imposta – da regulamentação
referente ao efeito executivo da sentença num sentido análogo aquele em que, no processo civil,
se fala da “exequibilidade da sentença e consequentemente, aos preliminares e ao controlo geral
da execução (incluindo os incidentes da execução). No primeiro caso tratar-se-á de matéria
substantiva e no segundo de matéria processual.

Cremos poder concordar com este autor, tanto mais que, como ele próprio assinala, o CPP
vigente consagra um título específico as execuções (o titulo VIII do Livro II – arts 625 a 644) –
sem, todavia, abranger a parte respeitante as penas privativas de liberdade – o que reforça o
argumento de ser esta, essencialmente, uma área de actuação do direito processual.

1.3. Objecto do Processual Penal

A determinação do objecto do processo — ou seja, da matéria a volta da qual se desenvolvem as


actividades processuais é de extrema importância teórica e prática.

A estrutura do sistema processual penal vigente entre nós e conforme viremos adiante é
basicamente acusatória, se bem que integrado por um princípio de investigação. Isso implica
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que o tribunal só possa intervir quando solicitado por uma acusação formulada por entidades dele
distinta e independente (o Ministério Publico), e que o conteúdo da acusação delimite a própria
actividade processual do tribunal.

Existe assim uma identidade essencial entre o conteúdo da acusação e a pronúncia e a sentença
final, que constitui importante garantia para o arguido, na medida em que só terá de defender-se
do que é acusado (é pronunciado) e só pelo que é acusado poderá ser julgado.

Disto resulta que a sentença final, salvo casos excepcionais que a lei expressamente o prevê, só
pode condenar por factos constantes do despacho de pronúncia ou equivalente. É o que dispõe o
artigo 447 do CPP: “O tribunal poderá condenar por infracção diversa daquele para que o
réu foi acusado, ainda que seja mais grave, desde que os seus elementos constitutivos sejam
factos que constem do despacho de pronúncia ou equivalente”.

Pode pois, concluir-se que o objecto do processo penal engloba um conjunto de factos humanos
devidamente situados no tempo e no espaço que integram os pressupostos de que depende a
aplicação ao seu autor de uma pena (penas maiores arts. 55 e 56 do CP; penas correccionais
arts. 62;63;64 do CP e penas especiais arts. 57;65 e 66 do CP) ou medidas de segurança (art. 70
do CP), ou seja o objecto do DPP é o crime do artigo 1 do CP.

O objecto do processo penal não se apresenta delimitado desde o inicio deste. É susceptível de
diferentes graus de apreciação consoante a evolução que o próprio processo vai tendo, quer dizer,
de acordo com as fases em que se desenvolve, há um primeiro juízo de suspeita sobre o facto,
segue-se uma fase instrutória, destinada precisamente a obter a confirmação desse juízo de
suspeita. Com a acusação e a pronúncia, o juiz de suspeita transforma-se num juízo de
probabilidade. Por último, para que a decisão final seja condenatória é necessária a formulação
de um juízo de certeza sobre o facto objecto do processo. E no momento de passagem do juízo
de suspeita para o juízo de probabilidade – com o transito em julgado do despacho de pronuncia
ou equivalente – que se fixa, em termos definitivos, o objecto do processo.

1.4. Natureza jurídica do Direito Processual Penal

1.4.1. O Direito Processual Penal como parte do direito processual


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Para uma certa corrente do pensamento jurídico, desenvolvida entre os finais do século 19 e o
começo do século 20, a existência de distintos ramos de direito processual – da qual são
exemplos o processo civil, o processo penal, o processo administrativo, o processo fiscal, o
processo constitucional entre outros – com princípios básicos semelhantes, idêntica estrutura
fundamental e problemas comuns ou análogos, justificaria o surgimento de uma nova ciência,
que se ocupasse da teoria geral do processo.

Os seus defensores não conseguiram, porém, escapar as críticas que lhe foram endereçadas, a
principal das quais reside no facto de que a teoria geral opera com abstracções, no mundo dos
conceitos, esquecendo-se da vida e a realidade social. É capaz de construir um direito lindo, que
de autogratificação aos seus elaboradores, mas inadequado a resolução dos problemas concretos.

Não obstante o inconveniente de elaboração de uma teoria geral do processo, deve reconhecer-se
a utilidade de estabelecer a comparação entre o processo penal e o processo civil, quer por se
tratar de dois tipos processuais inteiramente jurisdicionais – ou seja submetidos ao domínio da
actividade jurisdicional – quer porque, por força da lei, o processo civil funciona como direito
subsidiário relativamente ao processo penal.

Vejamos, pois alguns traços diferenciadores destes dois tipos de processo.

 Enquanto no processo civil se dirimem conflitos de interesses particulares, tutelados pelo


direito privado, no processo penal, esta, em causa a justiça da pressão do Estado,
derivado de um crime, isto e, da violação de interesses fundamentais da ordem jurídica
(interesses comunitários) tutelados pelo direito público;

 O processo civil não é forçosamente chamado a intervir para que, através da decisão
judicial, se concretize uma relação de direito privado – na generalidade dos casos, a
realização concreta do direito privado tem lugar independentemente do processo; ao passo
que o processo penal é o pressuposto necessário da realização do direito substantivo – a
submissão do agente de um ilícito criminal as sanções, previstas na lei só podem realizar-se
por via de um processo e da consequente decisão jurisdicional: vigora aqui o princípio nulla
poena sine processus (ou nukka poena sine judicio);
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 No processo civil tem plena aplicação o princípio da disponibilidade do objecto processual


pelas partes – este goza da faculdade de fazerem valer no processo as suas pretensões ou de
renunciarem a elas; no processo penal o objecto do processo e indisponível pelos sujeitos
processuais, pois de outra forma seria impossível satisfazer o interesse da comunidade e do
próprio Estado em esclarecer os crimes e punir os seus responsáveis.

Destes três principais elementos de distinção entre o processo civil e o processo penal (resultam
outras diferenças que impõe salientar: em processo penal, contrariamente ao que sucede no
processo civil, não domina o principio da auto responsabilidade das partes em matéria de
prova, e, por consequência, é inexigível o ónus de provar, contradizer e impugnar, em processo
penal o juiz goza de uma ampla discricional idade na apreciação dos factos que constituem
o objecto do processo, por forca do principio da investigação ou da verdade material, o que
não acontece no processo civil; entre os participantes processuais não existe, em processo
penal uma verdadeira contraposição de interesses, pois, como veremos na altura devida, o
Ministério Publico não actua no sentido de obter a condenação do arguido a qualquer
preço, mas esta como o acusador particular ou o próprio defensor obrigado a um dever de
objectividade, contraposição de interesses existe sim entre as partes no processo civil.

1.5. Fim do Processual Penal

Vimos acima que o processo penal visa a aplicação do direito penal substantivo aos casos
concretos. Essa função instrumental que lhe é característica exprime-se de forma simples nestas
duas máximas latinas: impunnitum non relinqui facinus (nenhum criminoso deve ficar sem
punição) e innocentum non condennari (nenhum inocente deve ser condenado).

De acordo com uma certa maneira de encarar o direito e o processo penal em particular, a
aludida natureza instrumental impõe a este, como fim a prosseguir, a ideia de realização da
justiça, que só e possível obter com a descoberta da verdade material e o restabelecimento da
paz jurídica violada.

O Processo penal tem como fim a realização da justiça, lograr uma sentença com forca de caso
julgado.
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2.2. Fontes do Direito Processual Penal Moçambicano

Para mero interesse de clareza de exposição, adopta-se a seguinte sistematização no que


respeita às fontes do direito processual penal: A: Fonte material ou imediata (direito legal);
B: fonte legislativa internacional; C: fonte doutrinária e D: fonte jurisprudencial.

Fonte material ou imediata – direito legal

2.2.1. A Constituição da Republica de Moçambique

2.2.2. Código de Processo Penal

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2.2.1. A Constituição da Republica de Moçambique

A Constituição, porque lei fundamental e hierarquicamente superior, é a fonte primária do DPP.


Tanto é assim que alguns autores consideram o Direito Processual Penal como Direito
Constitucional aplicado, pois, o DPP deve conformar-se com a Constituição. Na verdade, ele
conte preceitos respeitantes aos direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão que são
directamente aplicáveis, vinculando entidades públicas e privadas

Há princípios gerais inclusive relativos ao DPP, exemplo o de presunção da inocência – dentro


da Constituição como lei mãe.

Especial referência deve ser feita aos seguintes dispositivos constitucionais como fonte do DPP:
os arts. 35; 40; Capitulo V, p.e artigos 98, 99, Capítulo VII todos da CRM.

2.2.2. O Código de Processo Penal e legislação avulsa

O CPP é sem duvidas uma das mais importantes fontes do DPP. Este diploma foi aprovado e
publicado através do Decreto n. 16489, de 15 de Fevereiro de 1929 e mandado aplicar às então
províncias ultramarinas através do Decreto n. 19271, de 24 de Janeiro de 1931 com as alterações
nele constantes.

Outro diploma de relevo é o Decreto-Lei n. 35007, de 13 de Outubro de 1945, mandado aplicar à


Moçambique com algumas modificações pela Portaria 17076 de 20 de Março de 1959. Por sua
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vez o Decreto-Lei nº. 185/72, de 31 de Maio, contem a última e mais extenso e importante das
reformas sofridas desde 1929, pelo Código de processo penal, reforma esta que implicou a
revogação de várias disposições do Decreto-Lei n. 35007.

O CPP de 1929 tem por fontes principais o direito anterior, a jurisprudência portuguesa e a
pratica dos tribunais, além de vários projectos que antecederam a sua aprovação. Considerando o
estado caótico da legislação e das práticas processuais anteriores, o CPP de 1929 teve o grade
mérito de englobar numa concepção unitária e ordenada os princípios de direito processual penal
e de os regulamentar dentro de um sistema livre de contradições. Com ele deu-se mais ênfase a
descoberta do fim do processo penal, ampliou-se, consequentemente, os poderes de cognição do
juiz e vedaram-se as práticas processuais abusivas e dilações voluntarias da prossecução
processual.

O Código veio substituir a anterior concepção de base acusatória, por outra, de índole
inquisitória, em que competia ao juiz, para além de julgar, realizar a investigação preliminar,
fundamentadora da acusação – a que se designou de corpo de delito. Não deixou, porem, de
respeitar formalmente a concepção acusatória, na medida em que era ao Ministério Publico que
competia deduzir a acusação. É o princípio da forma acusatório ou acusatório formal.
Coincidiam na mesma pessoa as funções de investigar e julgar, o que acarretava sérios riscos de
lhe criar, naquela primeira fase, um preconceito do qual, na segunda, dificilmente conseguia
livrar-se deste modo se lhe furtava a objectividade e a imparcialidade necessários a um correcto
julgamento.

O Decreto-Lei n. 35007 procurou eliminar estes inconvenientes. Para tanto, atribuiu ao MP não
só a titularidade da acção penal (art. 1), como, na fase da instrução preparatória, os poderes e as
funções que antes eram atribuídos a uma magistratura não dependente e hierarquicamente
estruturada funções e poderes que implicam intromissões na esfera das liberdades do cidadão,
sem fixar mecanismos de controlo judicial do exercício daquelas funções pelo MP.

O Decreto-Lei n. 185/72 não deu solução a este problema, muito embora tenha reformado
extensas zonas do processo penal relacionadas com a fase da instrução (preparatória e
contraditória) a acusação e defesa e as execuções. Deixou, portanto, persistir um dos maiores
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problemas no que respeita a instrução – o da falta de controlo judicial da actividade instrutória de


todos os órgãos do Estado (mesmo dos que cumpram funções administrativas), desde que tal
actividade se prenda com a esfera dos direitos do cidadão constitucionalmente garantidos.

Tal problema só viria a ser resolvido em Portugal pela Lei n. 2/72 e pelo Decreto que permitiram
a criação dos juízes de instrução criminal nas comarcas em que o processo assim o exigisse. Tais
diplomas não chegaram, porém, a ser tornados extensivos aos territórios sob administração
colonial. No nosso pais só recentemente, com a aprovação e publicação da Lei n. 2/93, de 24 de
Junho, a questao veio a ser parcialmente colmatada.

Para além do CPP, há que considerar legislação avulsa pertinente ao processo penal como fonte
do nosso direito processual penal.

 O Decreto-lei n. 28/75, de 1 de Marco – que alarga o ambito de aplicação do processo


sumario e simplifica o formalismo do processo de transgressões;

 O Decreto-Lei n. 4/75, de 16 de Agosto – que alem de ter proibido o exercício da advocacia a


título de profissão liberal, continha disposições, relativas ao exercício da acção penal pelo
Ministério Público e a impossibilidade de constituição de assistente;

 A Lei n. 9/92, de 6 de Maio - que imprime alterações ao formalismo processual penal e


reintroduz a figura do assistente, derrogando os arts. 17 e 19 do Decreto-Lei n. 4/75;

 A Lei n. 2/93, de 23 de Junho – relativa a institucionalização dos juízes da instrução criminal

 A Lei n. 5/81, de 8 de Dezembro – extingue o Tribunal de Execução de Penas e transita a


competência para os tribunais populares provinciais.

2.1.3. Fonte legislativa Internacional

Os textos jurídicos internacionais são fonte do direito processual penal na medida em que
vigorem na ordem jurídica interna. Afigura-se aqui o problema da aplicabilidade e vigência
interna do Direito Internacional, cujo desenvolvimento encontra sede em disciplina própria.
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Assim sendo, e sem pretender esgotar a matéria nomeia-se apenas os textos mais significativos a
saber:

 Declaração Universal dos Direitos do Homem de 10 de Dezembro de 1948;

 Pacto Internacional dos Direitos Políticos;

 Convenção contra a Tortura e outras formas desumanas de tratamento ou punição cruel ou


degradante de 26 de Junho de 1987;

 A Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos de Junho de 1981.

2.1.4. Fontes Doutrinarias

A doutrina tem um papel fundamental na construção da dogmática jurídico processual penal. A


renovação e o desenvolvimento da doutrina resultam necessariamente da busca incessante de
soluções justas e adequadas para concretos problemas da vida em comunidade.

2.1.5. Fontes jurisprudenciais

Tal como a doutrina, a jurisprudência não constitui fonte em sentido formal, mas cabe-lhe de
algum modo uma função criadora do direito. Na verdade, não se coloca ela ao mesmo nível de
obrigatoriedade geral própria da lei, nem tão pouco em conflito com ela, o que poderá suscitar
uma questao de prevalência ou hierarquização. A sua forca reside no facto de o direito ter
deixado de ser um conjunto de princípios gerais e abstractos, achando-se aqui aplicado a um caso
concreto.

Todavia, tem a jurisprudência desempenhado um papel de relevo, de parceria com a doutrina


processual penal, na construção teórica e dogmática do respectivo direito. Tal contribuição
patenteia-se hoje na afirmação de princípios jurídicos com reflexos de tal ordem no direito
positivo, que nele alcançam assento por via de consagração legal. Exemplos clássicos nesse
sentido são-nos relevados pelos princípios respeitantes a conexão de processos e consequente
unidade de cognição, sobretudo em via de recurso – art. 663; a convolação – arts. 148 e segts e
447 e segts; ao recurso de revisão com base em factos novos – art. 673 todos do CPP.
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Uma questao particular e específica é a suscitada pela figura dos assentos, que se traduz na
fixação, pelos tribunais, de doutrina com forca obrigatória geral (v. art. 2 do C.Civil e 763 e
segts do CPP). Resulta ela da necessidade de se saber se o conteúdo normativo do assento
assumira a mesma natureza e valor próprios da lei em sentido formal. Se atentarmos ao facto de
que a função do tribunal assenta na aplicação do direito ao caso concreto, não se coadunando,
portanto, com a fixação de doutrina com forca obrigatória geral, facilmente se apreendera da
delicadeza do problema em análise.

Trata-se, com efeito, de uma questao actual e pertinente, dividindo opiniões e correntes entre a
aceitação e rejeição desta figura por inconstitucional e se traduzir no uso pelos tribunais de
poderes que são próprios de um órgão legislativo. Entre nós a questao ainda não foi levantada.

2.2. Interpretação e integração da lei processual. A analogia

2.2.1. Regras de Interpretação

As normas do DPP suscitam como os do direito material, problemas de interpretação. Buscar e


encontrar o sentido e o espírito da norma para esclarecer a sua obscuridade ou para determinar
seu alcance, ou mesmo decidir sobre qual a norma aplicável aos casos não expressamente
previstos é problemas comuns a todos os ramos de direito

Interpretar a lei significa fixar exactamente o seu conteúdo e alcance determinando qual é a
vontade expressa pela norma em conexão com as demais normas e com as exigências sempre
novas da vida comunitária. É tentar descobrir o alcançável significado das palavras que contem,
quer na sua literal idade, quer no seu espírito.

Há, em princípio, quanto aos elementos utilizados, a interpretação literal e a interpretação lógica.
Quanto aos efeitos ou resultados a interpretação pode ser declarativa – quando a letra e o espírito
coincide, não há obstáculos à sua utilização no processo penal, restritiva – quando o legislador
disse mais do que aquilo que queria dizer. Tem de se restringir a letra ao seu espírito. Não há
obstáculos à sua utilização no processo penal e extensiva — quando o legislador disse menos do
que aquilo que queria dizer. Aqui entendemos o espírito da lei. Sempre que a posição processual
do arguido sai enfraquecida a interpretação extensiva não é aplicável.
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Em todas estas formas de interpretação está sempre implícito o pressuposto de que entre a
verdadeira vontade do legislador e a sua imperfeita manifestação. E por via disso a necessidade
de rectificação desta com o objectivo de assegurar a supremacia e o predomínio daquela.

A letra da lei é o ponto de partida da interpretação e é o limite da interpretação – nº. 2 do Artigo


9 do C.C. “O intérprete não deve criar uma nova lei”.

2.2.2. Integração de Lacunas

Por mais perfeito que seja o legislador é impotente de regular todas as situações que surgem ao
aplicador do Direito, estas com relevância jurídica. Se estivermos em face de uma situação
imperfeitamente prevista, a situação não é de lacuna jurídica, mas sim de interpretação. Se
estivermos em face de uma situação em que o direito não previu devendo prever estamos diante
de uma lacuna do direito, cuja solução passa necessariamente pela integração da lacuna.

Assim, designa-se de integração a operação através da qual, na falta de disposição legal que se
aplique directamente a uma qualquer situação jurídica, se procura encontrar forma de
indirectamente, solucionar o vazio da lei.

O problema de integração de lacunas em processo penal tem um tríplice caminho a percorrer a


saber - parágrafo único do artigo 1º do CPP:

 A analogia;

 As regras do processo civil que se harmonizem com o processo penal (os princípios gerais do
processo civil)

 Os Princípios Gerais do Processo Penal

A analogia de lei “analogia legis”, é a via o mecanismo que procura integrar as lacunas através
do recurso a preceitos do próprio CPP que contemplam situações análogas a omissa, por
contraposição a “analogia júris” que supõe, a elaboração de um princípio normativo, extraído
de uma ou varias disposições legais e a sua subsequente aplicação ao caso omisso. O CPP ao
referir-se às disposições do código (do mesmo) deve-se entender que inclui também a legislação
avulsa.
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O recurso a analogia é permitido no DPP, ao contrário do Direito Penal substantivo


relativamente à fundamentação da pena (incriminação), ou ao seu agravamento (art. 18 do CP).

A analogia é vedada em processo criminal se enfraquecer a posição do arguido.

A mesma morte encontra as normas excepcionais, que não são de aplicação analógica (a regra é
a liberdade e a prisão uma excepção - essa não deve ser de aplicação analógica. Também as
normas quase substantivas (as que aparecem no direito adjectivo e no substantivo ‘ não são de
aplicação analógica, atingem os direitos do sujeito).

Mas o facto de a analogia ser permitida em processo penal não significa que ela possa ser usada
em detrimento dos direitos processuais do arguido ou para enfraquecer, prejudicados não sendo
possível integração por via de analogia, há que recorrer, as regras do processo civil que se
harmonizam com o processo penal. De referir que estas não podem estar em contradição com
os princípios e interesses que o DPP visa realizar, isto é assim, porque nestes dois ramos de
direito processual vigoram princípios profundamente diferentes (quanto à prova, objecto,
disponibilidade, etc.).

O recurso às normas do processo civil não deve ser aceite se da sua aplicação resultar distorção
dos princípios do processo penal, dominado todo ele por valores muito próprios.

Os Princípios Gerais do Processo Penal só poderão ser usados para integração de lacunas sempre
e quando não seja possível a aplicação analógica, o recurso às normas do processo civil que se
harmonizem com o processo penal.

2.3. Aplicação da Lei Processual Penal no Tempo e no Espaço.

Âmbito de aplicação material

O âmbito de aplicação material do DPP coincide com os estritos limites da jurisdição


moçambicana em matéria penal. É pois, exactamente demarcada pela especificidade do objecto
do processo penal, abrangendo o crime acusado, as contravenções e as reacções criminais que em
abstracto lhe caibam.
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Esta, naturalmente, fora de questao a autonomia das jurisdições penal e civil. Todavia, a lei
manda que o pedido civil de indemnização por perdas e danos derivado de um crime deve ser
deduzido em processo penal (art. 29 do CPP). Optou, assim, o legislador pelo chamado sistema
da interdependência ou da adesão da acção civil a penal.

Âmbito de aplicação espacial

O âmbito de aplicação do direito processual penal no espaço assenta na ideia de que a jurisdição
penal se confina aos limites territoriais do Estado – aqui vigora o princípio da territorialidade,
ou seja, a lei processual penal moçambicana se aplica, sem excepções, a todos os procedimentos
que nele corram os seus termos, qualquer que seja a nacionalidade dos agentes do facto
criminoso – art. 45 do CPP.

Nada impede, porém, que a jurisdição penal moçambicana se aplique a crime cometidos no
estrangeiro (Cfr. artigos 46, 48, 49 e 50 do CPP), o que acontece naqueles precisos casos em que
é aplicável a lei penal substantiva. Significa isto que é inadmissível, salvo tratado internacional
em contrario, executar em território estrangeiro actos processuais cabidos na jurisdição nacional
e vice-versa5.

Em consequência do princípio acima aludido – que domina as relações entre a jurisdição


nacional e estrangeira - a sentença penal proferidas pelos tribunais estrangeiros não lhes são
reconhecidas efeitos positivos nem executórios, embora possam ser admitidos efeitos negativos.
Assim, no caso de infracções cometidas no estrangeiro, a sentença ai proferida impede que a
questao seja de novo julgada em Moçambique (art. 53, ns. 3 e 5 do CPP) e, em caso de novo
processo, ter-se-á em conta a pena já cumprida pelo réu no estrangeiro (n. 3 do art. 53 e bem
assim o & 4 do art. 35 do CPP).

Excepções ao princípio da territorialidade resultam de tratados internacionais firmados por


Moçambique com outros países, de entre os quais se destacam os acordos de cooperação jurídica
e judiciaria com Cuba e Portugal.

Âmbito de aplicação pessoal

5 Veja-se a Lei n. 17/2011, de 10 de Agosto – que rege os casos e termos da efectivação da extradição.
16

Estão sujeitos à jurisdição penal moçambicana via de regra aquelas pessoas a quem lhes sejam
aplicável o direito penal moçambicano. Existem algumas limitações à esta aplicação resultante
do direito internacional público, são as chamadas imunidades diplomáticas que atingem Chefes
de Estado, diplomatas, seus familiares, pessoal administrativo e agentes equiparados das
representações diplomáticas.

Existe outro grupo de limitações que resultam do direito constitucional que atingem o Presidente
da Republica6, deputados· e estendem-se às entidades nomeadas pelo Presidente da Republica,
magistrados judiciais7 e do Ministério Publico8.

Aplicação da lei processual no tempo

Todas as leis têm a sua aplicabilidade limitada no tempo, entre o início da vigência e o seu
termo. Uma lei que sucede a outra começa a vigorar no momento em que a anterior cessa a sua
vigência, donde surge o problema da lei aplicável ao caso concreto, dentro das leis que se
sucedem no tempo.

A colocação clássica do problema parte da consideração de que a lei processual penal como lei
adjectiva deve ser de aplicação imediata.

Sobre o assunto Cavaleiro de Ferreira disse: “ Se um processo termina no domínio de uma lei
revogada, o processo mantém pleno valor. Se o processo se não iniciou ainda, embora o facto
que constitua o seu objecto tenha sido cometido no domínio da lei antiga, é-lhe inteiramente
aplicável a nova lei. Se a lei nova surge durante a marcha do processo são válidos todos os
actos ulteriormente praticados”.

Eduardo Correia disse que “aceitar tal posição não permite notar que os actos processuais em
concreto constituem na sua tramitação o desenvolvimento de outros anteriores, pelo que
respeitar os elementos de um processo é aceitá-los com as suas consequências que

6 Art. 153, n. 1 e 2 da CRM

7Arts217 e 218 da CRM conjugado com o Arts. 5, 6,7,48,49 da Lei n. 7/2009, de 11 de Marco que aprova o Estatuto
dos Magistrados Judiciais

8 Art. 52, 53, 69, 119, 120 da Lei n. 22/2007, de 1 de Agosto


17

dinamicamente pressupõe. Por outro lado, a lei nova pode mudar o estatuto dos sujeitos
processuais, máxime do arguido, já que a lei processual assume por vezes natureza quase
substantiva nomeadamente quando regula matérias respeitantes aos direitos processuais dos
mesmos”.

O problema da aplicação da lei processual penal deve ser visto em torno do artigo 12 do C.C que
estatui que a lei só dispõe para o futuro. Daí que a solução a dar tem a ver com o momento da
entrada em vigor da lei em causa.

A aplicação da lei processual penal há actos ou situações que decorram na sua vigência mas que
se ligam à uma infracção cometia no domínio da lei antiga não deve contrariar nunca o conteúdo
da garantia conferida pelo princípio da legalidade. Não deve aplicar-se a nova lei processual há
um acto ou situação processual que ocorra num processo pendente de um crime cometido na
vigência da lei antiga. Sempre que da nova lei possa resultar o agravamento da posição
processual do arguido ou em particular uma limitação do seu direito de defesa9.

*****

2. PRINCIPIOS GERAIS DO PROCESSO PENAL

2.1. Princípios relativos a promoção ou iniciativa processual

2.2. Princípios relativos a prossecução ou decurso processual

2.3. Princípios relativos Prova:

2.4. Princípios relativos Forma

São princípios constitucionais do processo penal que consubstanciam os valores preferenciais e


os bens prevalecentes em dado momento, numa certa comunidade.

9O Decreto n. 19271, de 24 de Janeiro de 1931 – que põe em vigor o CPP nas províncias ultramarinas,
especialmente o artigo 23, debruçasse sobre a aplicação da lei processual penal.
18

Tais princípios há-de reduzir necessariamente ao mínimo de modo a terem acolhimento ou


aceitação geral dos membros da comunidade e o correspondente a sua consciência ético-jurídico.

Pesem embora tais limitações, são estes princípios gerais do processo penal que dão sentido a
vastidão de normas vigentes, orientação ao legislador, e permitem a dogmática, não apenas
explicar, mas sobretudo, compreender os problemas do direito processual e caminhar no sentido
da sua superação.

A importância da sistematização e estudo dos princípios gerais do processo penal tem por fim
proporcionar maior clareza e uma exposição didáctica desses princípios, por um lado, por outro,
é de carácter pedagógico, pois, permite-nos fazer uma apreciação sintética dos valores
fundamentais em que assente o sistema processual penal vigente; tem uma função politico-
legislativa, enquanto permitem confrontar o sistema processual com os valores sociopolíticos
dominantes e uma função de carácter prático – que tem a ver com a problemática da aplicação do
direito processual penal em termos de integração de lacunas.

Em termos de sistematização vamos agrupar os princípios em categorias para fácil compreensão:

 Princípios relativos a promoção ou iniciativa processual (incluímos neles os que nos


dizem algo em relação ao que se deve fazer quando se quiser iniciar uma acção penal –
princípios da oficialidade, legalidade e de acusação);

 Princípios relativos a prossecução ou decurso processual (principio da investigação, da


contrariedade e audiência, da suficiência e da concentração);

 Princípios relativos Prova: princípios da investigação, da livre apreciação da prova e “in


dúbio pró reo”;

 Princípios relativos Forma: princípios da publicidade, da oralidade e da imediação.

3.1. PRINCÍPIOS RELATIVOS A PROMOÇÃO PROCESSUAL OU INICIATIVA


PROCESSUAL

3.1.1. O Principio da oficialidade, também conhecido por princípio monopolista.


19

Sobre este princípio há a indagar logo sobre a quem compete a iniciativa (o impulso) de
investigar a pratica de uma infracção e a decisão de a submeter ou não a julgamento.

A luz do direito positivo moçambicano por excelência incumbe ao MP a promoção da acção


penal – art. 236 da CRM – arts 1 e 14 do DL 35007, art. 5 do CPP) que pode delegar -
excepcionalmente a outros entes públicos – art. art. 16 e 17 DL 35007).

Ao contrário do que se passa em matéria civil, no DPP vigora o princípio da legalidade da acção
penal, no sentido de que sendo o Estado, o titular da acção penal, órgão competente para a
promoção da mesma, não pode escolher se quer ou não exercer a acção penal. Isto porque a
realização de justiça penal enquanto assunto público e não privado deve caber oficiosamente ao
Estado e não pode depender da vontade e da actuação dos particulares, nomeadamente a vítima
do crime, isto é a regra para os crimes de natureza pública. Ex: o homicídio – e de natureza
publica.

Porem, o exercício da acção penal tem tido limitações nalguns casos, atento a natureza do crime
cometido e dos bens jurídicos especialmente tutelados pela incriminação. Nem sempre que o MP
toma conhecimento dum facto criminoso pode promover a acção penal, há vezes que depende da
queixa, participação ou da acusação particular, conforme a situação em concreto.

O critério para a determinação da natureza do crime consiste na regra de exclusão: os crimes que
não forem semi-públicos, nem particulares são públicos.

Para saber se os crimes são semi-públicos ou particulares consulta-se a lei substantiva: quando a
lei penal utiliza o termo queixa, participação o crime é semi-publico – ex: 359 $ único; 360 $
único; 363$ único; 363 $ único; 369 $1; 379, $ 2; 399, referido aos arts. 369, $ 2, in fine, 391 SS.
430 e $ 1; 431 $ 2. 438; 450 $ único; 451 $ 2; 455 $ único, 472 $ 1; 473 $ único e 477 — quando
utiliza a expressão acusação particular; requerimento da parte o crime é particular – arts. 254, $
único; corpo do artigo 416 todos do CP.

Importa referir que a maior parte dos crimes tem natureza pública e nestes casos o MP tem
legitimidade incondicionada para promover a acção penal. Porem, importa referir que há casos
excepcionais em que, mesmo nos crimes públicos para que o MP promova a acção penal e
necessário a remoção de certos obstáculos legais em relação a certas entidades.
20

A título de exemplo temos os crimes públicos cometidos pelo Presidente da Republica no


exercício das suas funções. Aqui, para que o M. P promova a acção penal é necessário que a
“Assembleia da Republica requeira ao Procurador-Geral da Republica o exercício da acção penal
contra ele”, devendo a proposta ser feita por “pelo menos um terço e aprovada por maioria de
dois terços dos deputados da Assembleia da Republica – n. 3 do art. 153 da CRM.

Quando se trate de crimes semi-públicos o MP só tem legitimidade quando a pessoa a quem o


direito assiste apresentar a queixa, que pode ser feita directamente a ele ou a outras instâncias
competentes para receber queixas e/ou denuncias, nomeadamente, a Policia da Republica de
Moçambique, MP e a Policia de Investigação Criminal – art. 3 do DL 35007, devendo levantar
autos de notícia nos termos do art. 166 do CPP e remeter directamente ao Tribunal competente, o
que valera para todos os efeitos como acusação em processo penal.

Denuncia – é a comunicação da prática de um crime que é feita ao MP ou a outra autoridade de


comunicar nos termos estabelecidos na lei – art. 7 do DL 35007.

A denúncia por ser feita por queixa ou participação.

A queixa é um acto voluntário/ e a expressão de vontade do titular do respectivo direito,


manifestando por requerimento e na forma prescrita na lei manifestando a sua vontade de que
seja responsabilizado algum pela pratica de um determinado crime. Esta tem carácter facultativo,
é renunciável e é passível de desistência a ser proposta pelo ofendido através do mandatário
devidamente constituído.

A participação é a manifestação de vontade por parte de uma autoridade, de que deseja que seja
instaurado procedimento criminal contra alguém.

Quando a queixa ou denúncia for feita a uma entidade diferente do MP deve ser a este
transmitido imediatamente – art. 8, $ único do DL 35007.

3.1.2. Princípio da Legalidade

De acordo com este princípio é dever da autoridade pública competente – MP – proceder


criminalmente contra o autor de um facto que reúna os pressupostos substanciais e processuais
21

da incriminação, o que significa que não esta nas mãos do MP optar ou não pelo procedimento,
quando reunidos os respectivos requisitos legais.

Os fundamentos que alicerçam o princípio da legalidade encontram-se em várias disposições


legais, designadamente os arts. 1 e 165 e 349 do CPP e 26 do DL n. 35007. De acordo com tais
comandos normativos o MP esta obrigado a proceder e dar acusação por todas as infracções de
cujos pressupostos – factuais e jurídicos, substantivos e processuais – tenham tido conhecimento
e tenha logrado recolher, na instrução, indícios suficientes.

Significa que o MP devera promover a acção penal sempre que se verifiquem os seguintes
requisitos:

a) Pressupostos processuais (ex: a competência e inexistência de obstáculos processuais como,


por exemplo as imunidades)

b) Punibilidade do comportamento segundo o direito penal substantivo (ex: ilicitude, culpa,


condições objectivas de punibilidade);

c) Conhecimento da infracção (art. 165 CPP)

d) E existência de indícios suficientes (art. 349) ou prova bastante (a contrario dos arts. 345 do
CPP e 26 do DL 35007) que fundamenta a acusação.

A actividade do MP desenvolve-se assim, sob estrita vinculação da lei – dai o princípio da


legalidade e não segundo considerações de oportunidade (Ex. de ordem politica – faison d’ Etat
ou financeira – custos).

O interesse do Estado neste principio é de tal ordem e carácter que a sua omissão pode
consubstanciar-se num crime de denegação de justiça – artigo 287 e 288 CP.

3.1.3.Princípio da Imutabilidade da Acusação

Como corolário deste princípio da legalidade no que respeita a acusação pública, resulta o
chamado princípio da imutabilidade da acusação, de acordo com este princípio, a acusação não
pode ser retirada a partir do momento em que um tribunal for chamado a decidir sobre ela. Por
essa via esta excluída a (renuncia a acusação – art. 18 do CPP) e bem, assim, a desistência dela.
22

Ressalva-se no entanto, a eficácia do perdão dos ofendidos no caso dos crimes particulares ($
único do art. 3 do DL 35007) e semi-publico, exceptuando os casos em que a sentença
condenatória haja transitado em julgado, e ainda nos caos especificamente fixados por lei10.

Resumindo: Sobre este princípio da imutabilidade ou indisponibilidade, os sujeitos processuais


não podem dispor da relação processual, o MP não pode desistir da acusação, o arguido não pode
por fim ao processo, mesmo que confesse, as partes não podem transigir.

Este princípio é dominante nos crimes públicos em relação aos quais o MP só tem a
obrigatoriedade e legitimidade para promover a acção penal bem como o dever de com ela
prosseguirem depois de requerida.

Nos crimes semi-públicos é reconhecido aos participantes ou denunciantes o direito de perdoar


ou renunciar a queixa, extinguindo-se assim o procedimento criminal (art. 125, n. 4 do CP e art.
7 & 2 do CPP).

3.1.4. Princípio da Acusação

Significa que a jurisdição dos tribunais nunca intervêm oficiosamente, apenas intervêm mediante
um pedido formulado pelo MP que assume uma forma (Acusação), por um lado, por outro, feito
esse pedido tem um conteúdo concreto. Então a jurisdição não pode alargar o seu puder de julgar
a pessoas e factos distintos daqueles que são objecto da acusação. Este princípio da acusação é
um princípio directamente decorrente da estrutura acusatória do processo penal e exige que seja
necessário respeitar o princípio da separação de funções. Temos que ter por um lado, a entidade
que investiga e deduz formalmente a acusação (que e o MP) e por outro lado, temos que ter uma
entidade distinta e autónoma que julga (o tribunal).

O tribunal a quem cabe o julgamento, não pode por sua iniciativa começar uma investigação
tendente ao esclarecimento de uma infracção e a determinação dos seus agentes. Isto para
preservar a sua imparcialidade, objectividade. E porque o tribunal tem que limitar o seu poder
cognitivo (de tomar conhecimento ao que vem na acusação) ele não poderá ser responsabilizado
se A for absolvido porque a acusação foi deficiente.

10 Art. 125 $ 6 do CP
23

A acusação define e fixa perante o tribunal o objecto do processo (principio da vinculação


temática), ou seja, o objecto do processo deve manter-se o mesmo desde a acusação ao transito
em julgado da sentença, deve ser conhecido e julgado na totalidade (de forma unitária e
indivisível) e deve considerar-se irrepetivelmente decidido. Trata-se de uma garantida de defesa
do arguido na medida em que a partir da acusação ele sabe exactamente de que é que tem de se
defender, não podendo ser surpreendido com novos factos ou novas perspectivas dos mesmos
factos para os quais não estruturou a sua defesa.

3.2. PRINCIPIOS RELATIVOS A PROCESSUCAO PROCESSUAL

3.2.1. Princípio da investigação ou da verdade material

O princípio da investigação significa que é o tribunal que investiga os factos sujeitos a


julgamento embora as partes possam dar o seu contributo:

Assim, a dedução e esclarecimento do material de facto e dos elementos probatórios não


pertence exclusivamente as partes, mas em último termo ao juiz. É sobre ele que recai o ónus de
investigar e esclarecer oficiosamente – independentemente das contribuições das partes – o facto
submetido a julgamento11.

Também, não impenda nunca sobre as partes em processo penal, qualquer ónus de afirmar,
contradizer e impugnar como, igualmente, que se não atribua qualquer eficácia a não
apresentação de certos factos ou ao acordo expresso ou tácito, que se formaria sobre os factos
não contraditados, como finalmente, que o tribunal não tenha de limitar a sua convicção por
sobre os meios de prova apresentados pelos interessados. Por isso se diz que em processo penal
esta em causa, não a verdade formal, mas a verdade material, entendida como verdade subtraída
a influência do comportamento processual da acusação e da defesa e como verdade judicial,
pratica e processualmente valida.

11 Ver arts. 9 e sobre problemas específicos — arts. 330 && 1 e 2; 332; 333 &&1 e 2; 404 & 1; 425 & 3; 435; 443;
465 & único, etc. todos do CPP.
24

O princípio da investigação, em que se busca a verdade material, contrapõe-se ao princípio do


dispositivo (ou da contradição, ou da discussão), que se satisfaz com a verdade formal e em que
o processo se desenrola como um duelo entre as partes, sob a arbitragem do juiz. Aqui este
principio não tem aplicação, pois se esta perante a indisponibilidade do objecto processual, a
impossibilidade de desistência da acusação publica de aspectos eficazes entre a acusação e a
defesa e de limitações postas ao tribunal na apreciação jurídica do caso submetido a julgamento.
Este último ponto vale, sobretudo nas alegações orais na audiência de discussão e julgamento 12.
Pode o MP ter pedido a absolvição do arguido e o tribunal condená-lo, como pode a defesa
considerando provado o crime pedir apenas a condenação em uma pena leve e o tribunal
absolver o arguido.

3.2.2. Princípio da contraditoriedade ou audiência

Cabendo ao juiz penal cuidar de reunir as bases necessárias a sua decisão, não deve ele, todavia,
levar a cabo a sua actividade isoladamente, pelo contrário deve ouvir tanto a acusação como a
defesa.

Tal não significa que o juiz deva permanecer passivo a ouvir o debate que perante ele se
desenrola, antes sim, que toda a prossecução processual deve cumprir-se de modo a fazer
ressaltar as razoes da acusação mas também as da defesa e, portanto aceitando a iniciativa
própria destes sujeitos processuais.

Este princípio encontra-se plasmado em diferentes fases do processo.

Na fase de acusação e defesa, a contrariedade transparece sobretudo na contestacao 13, sendo ela
própria fundamento da fase da instrução contraditória14.

Na fase de julgamento o juiz ouvira sempre o MP e os representantes da parte acusadora sobre os


requerimentos dos representantes da defesa e estes sobre o que tenham requerido aqueles, e a

12 Arts. 467; 533 e 539 do CPP.

13 Arts. 379, 390 e 398 do CPP

14 Art. 326 do CPP).


25

contestacao do réu, quando deduzida na audiência de julgamento, será apresentada por escrito
pelo seu defensor”15.

É de resto para assegurar o contraditório que se considera como nulidade a falta de notificação
do despacho de pronúncia ou equivalente ao arguido e seu defensor, bem como a falta de entrega
do rol de testemunhas16.

O princípio da audiência traduz-se na oportunidade conferida a todo o participante processual de


influir, através da sua audição pelo tribunal do desenrolar do processo.

3.2.3. Princípio da suficiência – as questões prejudiciais

O princípio da suficiência tem como conteúdo o facto de o processo penal, em regra, se bastar a
si próprio, o que significa que a sua promoção é independente e autónoma de qualquer outro
processo e que nele se podem e devem, também em regra, decidir todas as questões que
interessem a decisão da causa penal: obrigatoriamente se forem de natureza penal, sempre que
possível se tiverem outra natureza.

O princípio da suficiência vem consagrado no art. 2 do CPP. De acordo com este princípio, o
processo penal é o lugar adequado ao conhecimento de todas as questões cuja solução se revele
necessário a decisão a tomar (as excepções estão referidas nos artigos seguintes).

Na tramitação do processo penal para conduzir a uma decisão podem surgir questões de diversa
natureza (penal, civil, administrativa, etc.), cuja resolução condiciona o ulterior desenvolvimento
do processo. Ao dar competência ao juiz penal para delas conhecer, a lei considera que o
processo penal se basta a si mesmo, que é auto-suficiente.

Entende-se por questões prejudiciais aquelas cujo objecto é diferente do que constitui a questão
principal do processo em que surgem, e sendo susceptíveis de constituírem objecto de um
processo autónomo, são de resolução prévia indispensável para se conhecer em definitivo da
questão principal.

15 Artigos 415 e 423 do CPP

16 Nºs 5 e 6 do artigo 98 do CPP


26

No que tange ao conhecimento das questões prejudiciais pelo tribunal criminal podem ser
indicadas três teses: a tese do conhecimento obrigatório de todas as questões, a tese da devolução
do conhecimento e uma terceira, intermédia.

Quanto as questões prejudiciais não penais em processo penal vêm regulamento do art. 3 do
CPP. Reconhece-se neste dispositivo legal, a excepção ao princípio da suficiência. Teve o
legislador, o cuidado de acautelar que não se criem obstáculos ao exercício do processo penal,
com a devolução da questão prejudicial para o tribunal normalmente competente17.

No que respeita as questões prejudiciais penais em processo não penal, a matéria vem regulado
nos arts. 4, 152 e 154 do CPP e art. 97 do CPC.

3.2.4. Princípio da concentração

O principio da concentração significa que os actos processuais devem ser praticados numa só
audiência se possível, ou em audiências próximas no tempo, para que as impressões colhidas
pelo juiz não desapareçam da sua memoria.

Este princípio exige uma prossecução tanto quanto possível unitária e continuada de todos os
termos e os actos processuais, devendo, no seu conjunto em todas as fases do processo
desenvolver-se concentradamente, quer no espaço, quer no tempo.

Embora presente em todas as fases do processo ganha mais relevo e autonomia na audiência de
julgamento, associando-se aos princípios de forma, enquanto corolário dos princípios da
oralidade e de imediação18

A concentração espacial respeita ao desenrolar da audiência por inteiro no mesmo local, onde
deverão comparecer todos os participantes processuais. A concentração temporal significa que a
audiência, uma vez iniciada, decorre seguidamente. Todavia, não significa que não possa haver
interrupções ou adiamentos. A audiência pode ser interrompida para alimentação e repouso dos

17 $ 3 do art. 3 do CPP

18Arts. 76. $ 1; 337, 334, 403 e 414 do CPP


27

participantes processuais ou por outros motivos, designadamente por necessidade de produção de


prova superveniente, incapacidade acidental dos sujeitos processuais ou decisão de questões
prévias ou prejudiciais – 414, 514, 421, 422.

3.3. PRINCÍPIOS RELATIVOS A PROVA

3.3.1. Princípio da livre apreciação da prova

Com a produção da prova em julgamento tem-se em vista oferecer ao tribunal as condições


necessárias para que forme a sua convicção sobre a existência ou não dos factos ou situações
relevantes para a sua decisão – a sentença.

Segundo este princípio, a valoração das provas pelo juiz não esta sujeito a critérios legais, as
regras pré-determinadas que indicam o valor de certo meio de prova. Esta valoração é feita
segundo a livre convicção do juiz, convicção essa que não pode ser puramente subjectiva,
emocional, imotivável, portanto, arbitraria. A apreciação da prova deve ser racional e apoiar-se
nos elementos de prova produzidos. O juiz não pode servir-se, para fundamentar a sua decisão,
de factos conhecidos fora do processo. “Quond non est in actis non est in mundo.”.

O princípio da livre apreciação da prova e da livre convicção do juiz vale, em geral, no nosso
direito processual penal para todo o domínio da prova produzida. No entanto, considerados os
singulares meios de prova admitidos, há que assinalar algumas questões que, por vezes, se
traduzem em importantes limitações ou mesmo excepções a este princípio.

a) No que respeita a prova testemunhal e por declarações (art. 214 e segts do CPP) o principio
vale hoje sem quaisquer limitações, sendo este seu campo de eleição. Todavia, a lei da a
entender, por diversos modos, não ter a prova por declarações a mesma dignidade probatória
que as testemunhas, mas nada disso se reflecte em termos de critério de apreciação da prova.
O juiz é livre de formar a sua convicção na base do depoimento de um declarante em
desfavor de testemunho (s) contrário (s).

b) No que toca ao depoimento do arguido (arts 244, 250 e segts e 425 e segts do CPP) há que
distinguir duas situações, conforme este negue ou confesse os factos. Em caso de negação,
recorre-se por inteiro ao princípio da livre apreciação e convicção. A confissão, contudo, esta
28

sujeita, quanto ao seu valor, a um verdadeiro critério legal de apreciação. Com efeito, o art.
174 do CPP dispõe que “a confissão desacompanhada de quaisquer outros elementos de
prova não vale como corpo de delito”. E acrescenta, no seu & único: “ainda que o arguido
tenha confessado a infracção, o juiz devera proceder a todas as diligências para o apuramento
da verdade, devendo investigar, com todos os elementos de que dispuser, se a confissão é ou
não verdadeira”.

c) Quanto a prova pericial, afirma-se no nosso direito a ideia da absoluta liberdade da sua
apreciação pelo juiz, — arts. 179 e 180 do CPP;

d) A apreciação de factos constantes de documentos autênticos ou autenticados traduz-se num


verdadeiro critério legal (arts. 169 & 3, 468 & único todos do CPP).

3.3.3. Principio in dúbio pró reo

Vimos já que em processo penal cabe ao juiz o dever de, oficiosamente, instruir e esclarecer o
facto sujeito a julgamento; não há, em processo penal, qualquer ónus verdadeiro de prova que
recaia sobre o acusador ou o arguido. Em direito processual penal, não há, seguramente o
chamado ónus de prova formal, segundo o qual as partes teriam o dever de produzir as provas
necessárias como fundamentos das suas afirmações de facto sob pena de os mesmos factos não
serem tidos como provados.

Se, o tribunal em processo penal, através da sua actividade probatória não lograr obter a certeza
dos factos, mas antes permanecer na dúvida, terá de se decidir em desfavor da acusação,
absolvendo o arguido por falta de provas. Este e o conteúdo do princípio de, na dúvida, dever
decidir-se a favor do réu.

3.2. PRINCÍPIOS RELATIVOS A FORMA

3.2.1. O princípio da publicidade

O princípio da publicidade significa que as audiências dos tribunais são públicas, que o publico
pode assistir a realização de actos processuais.
29

Nos termos do artigo 407 do CPP e artigo 16 da LOTJ, as audiências dos tribunais são públicas.
Significa isto que qualquer cidadão tem direito a assistir ao (e a ouvir) desenrolar da audiência de
julgamento, mas também que são admissíveis os relatos públicos daquela audiência. As
excepções estão previstas no art. 407 do CPP, e visam salvaguardar a dignidade das pessoas e a
moral e para garantir o seu normal funcionamento.

A publicitação ou não do processo através dos órgãos de comunicação social é questao que por
vezes oferece dificuldades, por haver direitos ou bens conflituantes a tomar em consideração: a
sociedade tem direito a ser informada do que se passa nos tribunais e, vista a questao por este
lado, os órgãos de comunicação social devem ter as maiores possibilidades de actuação pois
cabe-lhes o direito e a obrigação de informarem a comunidade. Deve no entanto ter-se presente
que os interesses ligados a reserva da intimidade da vida privada do arguido há-de ser
acautelados por merecem igualmente tutela constitucional. O necessário exercício da justiça não
pode fazer-se a custa de ilegal intromissão na reserva da vida privada do arguido, atribuindo-lhe
crimes ou fazendo contra si campanhas demagógicas que maculem a sua imagem.

Publicidade sim, desde que dela não possa resultar perigo para a eficácia do acto judicial ou para
a defesa do arguido nem para o jus punied do Estado.

3.2.2. Princípio da oralidade e da imediação.

O princípio da oralidade significa que os actos processuais devem ser praticados na presença dos
participantes processuais, oralmente. Mas o facto de os actos serem praticados oralmente não
significa que não possa ser registados, registo que, alias, é aconselhável para efeitos de controlo
da prova, com vista a possibilidade de recurso em matéria de facto.

Este principio, têm maior preponderância na fase da audiência, discussão e julgamento19.

A importância deste princípio reside no facto de permitir o contacto indispensável vivo e


imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só a
oralidade permite, por um lado, avaliar o mais correctamente possível da credibilidade das
declarações prestadas pelos participantes processuais. E só ela permite, por ultimo, uma plena

19 Art.466 do CPP.
30

audiência destes mesmos participantes, possibilitando-lhes da melhor forma que tomem posição
perante o material de facto recolhido e comparticiparem na declaração do direito do caso.

Oralidade não significa exclusão da escrita no sentido de proibição de que os actos que tenham
lugar oralmente fiquem registados em actas ou protocolos (que servem por exemplo, fins de
controle de produção da prova, sobretudo em matéria de recurso). Significa, tão-somente, que a
actividade processual é exercida na presença dos participantes do processo e, portanto,
oralmente.

Quando se fala de oralidade como princípio geral do processo penal, tem-se em vista a
forma oral de atingir a decisão; o processo será dominado pelo princípio da escrita quando
o juiz profere a decisão na base de actos processuais que forem produzidos por escrito
(exames, peritagens, etc.) e será, pelo contrário, dominado pelo princípio da oralidade
quando a decisão é proferida com base em uma audiência de discussão oral da matéria a
considerar.

Porem, este princípio sofre algumas limitações quando a audiência de julgamento se realiza sem
a presença do arguido20. Do mesmo modo a fase dos recursos decorre sob a forma escrita.

O princípio da imediação significa que a decisão jurisdicional só pode ser proferida por quem
tenha assistido a produção das provas e a discussão da causa pela acusação e pela defesa, que a
decisão deve ter lugar o mais breve possível, no termo da audiência de discussão e julgamento, e
que deve dar-se preferência aos meios de prova que estejam em relação mais directa com os
factos probandos, os imediatos.

A imediação é afinal “a relação de proximidade entre o tribunal e os participantes no


processo, de modo tal que aquele possa obter uma percepção própria da matéria que há-de
servir de base a decisão. Por exemplo, a exibição de documentos (art. 426 do CPP) é uma
manifestação do princípio da imediação.

20 Arts. 413; 547 e 562 e segts do CPP


31

Através deste princípio é possível fazer a avaliação da credibilidade das declarações prestadas
pelos participantes processuais, assim permitindo ao tribunal formar a sua convicção sobre a
matéria de facto.

4.OS SUJEITOS PROCESSUAIS

Como dissemos atrás, o processo penal pode se definir como uma sequência de actos
juridicamente pré-ordenados e praticados por certas pessoas legitimamente autorizadas, com
vista a lograr a decisão sobre se foi praticado algum crime e, em caso afirmativo, sobre as
respectivas consequências jurídicas e a sua justa aplicação.

Essas pessoas e entidades que, investidos nas mais diversas funções, desenvolvem actividades no
processo recebem a designação genérica de participantes processuais.

Mas nem todos os participantes processuais realizam uma função determinante, a ponto de
imprimirem ao processo uma certa direcção ou uma fisionomia própria. Os funcionários
judiciais, por exemplo, colaboram no processo e, no entanto, a sua actuação não é decisiva. O
mesmo se passa com as testemunhas, os declarantes e os peritos, que intervêm como meios de
prova, mas não tem poder de iniciativa nem de decisão relativamente as questões processuais.

Aos participantes a quem, por forca da sua particular posição jurídica, são reconhecidos direitos
e deveres processuais autónomos, no sentido de poderem condicionar a concreta tramitação do
processo costuma chamar-se sujeitos processuais.

Assim, são sujeitos processuais além do tribunal (ou por outras palavras, do juiz penal, o
Ministério Publico, o arguido e o seu defensor o ofendido e o assistente.

Iremos estudar detalhadamente cada um deles. Antes, porem, convirá fazer uma breve referência
a estrutura fundamental do processo penal, com particular relevo para o que resulta da legislação
em vigor.

4.1. O conceito de “parte” e os modelos estruturais do processo penal.

Discute-se muito se o processo penal é ou não um processo de partes (a semelhança do processo


civil) considerando o significado adjectivo ou instrumental do conceito.
32

Alguns autores – EDUARDO CORREIA, CAVALEIRO DE FERREIR, CASTANHEIRA


NEVES, definem como partes os sujeitos processuais que discutem a causa e esperam do juiz
uma apreciação do mérito dela. E nesta perspectiva que estes consideram o processo penal como
um processo de partes, não em sentido puro, mas em sentido meramente formal, porquanto os
sujeitos processuais que discutem a causa – o Ministério Publico e o acusado – apenas
formalmente estão colocados em campos opostos.

Na verdade, ao MP – já o dissemos – não cabe o dever de obter a condenação do arguido, mas tal
como ao juiz um dever de objectividade21. Por outro lado, ao arguido cabe indiscutivelmente um
direito de defesa, mas não, por certo, um dever de defesa (não se lhe exige que se oponha a
acusação), pelo que bem pode acontecer não se verificar uma necessária contraposição de
interesses entre o MP e a defesa.

FIGUEIREDO DIAS, define o conceito de parte num sentido processual material como tal os
titulares de interesses contrapostos que no processo se discutem e se encontram concretamente
em jogo. Para estes não se pode relativamente ao processo penal, falar em processo de partes,
nem mesmo em sentido formal, já que, precisamente por não existir uma necessária
contraposição de interesses entre a acusação e a defesa; a distinção que se pretende assinalar
(entre os sujeitos que pretendem fazer valer perante o juiz as suas posições) nada contribui para
explicar a estrutura íntima do processo penal.

Esta estrutura processual (resulta do modo de actuação dos sujeitos) explica-se, de acordo com
esta corrente, através da referência aos modelos estruturais que historicamente se desenvolveram
– sobretudo o de tipo inquisitório e o de tipo acusatório.

O processo inquisitório (que, como foi referido, teve a sua consagração nas legislações
europeias continentais dos séculos XVII e XVIII, embora surja em épocas mais recentes nos
Estados de regime autoritário) é o exemplo padrão de um processo sem partes. Nele, a
investigação da verdade, e de uma forma geral, o domínio do processo estão concentradas
num único órgão – o juiz: a este compete simultaneamente inquirir, acusar e julgar, sem
que intervenha qualquer outra autoridade oficial encarregada da acusação. O processo é,

21 Arts 12& 1 e 25 do DL 35007 e art. 647, nº 1 do CPP


33

em regra, totalmente escrito e secreto, do que resulta a impossibilidade, para o arguido de


exercer efectivamente o seu direito de defesa – não há contraditório, é o juiz que investiga,
há presunção de culpabilidade e o tribunal funciona na dependência do poder político.
Todos os meios incluindo a tortura são considerados legítimos para extorquir do réu a
confissão, tida por rainha das provas.

Como e fácil de imaginar, de um órgão no qual convergem as funções de instrução, acusação e


julgamento, não pode esperar-se uma atitude de imparcialidade e de independência face ao poder
político.

O processo acusatório (que vigora, ainda hoje, nos países anglo-saxónico ou influenciados por
estes) é, pelo contrário, o exemplo marcante de um processo penal de partes. O interesse
público da perseguição e punição das infracções penais e encabeçado no representante da
acusação (que pode ser uma entidade publica ou privado), o interesse do arguido é
representado pelo defensor e o processo surge deste modo como uma discussão, uma
autêntica confrontação entre ambos, sob o olhar imparcial e passivo do juiz. A este não
cabe colher o material probatório, mas sim as partes, por meio do sistema de interrogatório
e contra-interrogatório (examination and cross-examination) das testemunhas, dos peritos
e do próprio arguido (que pode testemunhar em causa própria). O papel do juiz é
unicamente o de dirigir a audiência, velando sobretudo para que as partes não se afastem
do formalismo prescrito, e proferir a decisão final baseados nas provas apresentadas pela
acusação e pela defesa.

Princípios próprios dos sistemas acusatórios e inquisitórios

Referindo-nos muito sucintamente aos princípios apontados para cada um dos sistemas diremos
que residem essencialmente no seguinte:

 O princípio da oficialidade, consiste na existência de um órgão estatal próprio para dar inicio
ao processo e acusar. O processo não é “aberto” pelos particulares nem pelo juiz; no sistema
inquisitório não existe esse órgão;
34

 O princípio da publicidade significa que o arguido tem acesso aos autos que o povo –
comunidade – também tem acesso a justiça, podendo assistir a prática dos actos processuais,
controlando a actividade de aplicação do direito aos casos concretos pelos tribunais: no
sistema inquisitório os actos processuais seriam na sua quase totalidade praticados em
segredo – prevaleceria o segredo – argumentando-se que a publicidade geraria a ineficácia da
justiça;

 O princípio da oralidade significa que os actos processuais são praticados sob forma oral;
contrapõe-se-lhe o princípio da forma escrita, sendo este próprio do sistema inquisitório e
aquele do sistema acusatório;

 O princípio da contrariedade significa que as partes litigam entre si, na igualdade de direitos,
sendo o juiz um terceiro imparcial; no sistema inquisitório, em que não funcionaria o
princípio da contrariedade, o arguido tinha um papel passivo, não era sujeito processual, não
tinha garantias de defesa;

 O princípio da verdade formal significa que o juiz decide exclusivamente com base nos
elementos trazidos ao processo pela acusação, não lhe sendo permitido ordenar a produção de
outros meios de prova cujo conhecimento considere necessário. Ao principio da verdade
formal, próprio do sistema acusatório, opor-se-ia o principio da verdade material no sistema
inquisitório em que o juiz teria um papel activo. Só que, embora o juiz fosse livre de
investigar – ‘sistema inquisitório” – não se obtinha uma decisão final em harmonia com a
verdade material porque funcionava o sistema de prova tarifada e muitas vezes eram
utilizados todos os meios para obter a confissão, mesmo a tortura;

 O princípio da presunção de inocência significa que ate ao trânsito em julgado da decisão


condenatória o arguido deve ser considerado inocente. Contrapõe-se-lhe, no sistema
inquisitório, o princípio da presunção da presunção de culpabilidade, segundo o qual a mera
suspeita é suficiente para impor restrições a liberdade do arguido, incluindo a prisão
preventiva durante a fase de investigação.
35

 No sistema inquisitório o arguido era tratado como objecto da inquisição: não eram levados
em conta os seus direitos fundamentais; no sistema acusatório goza dos direitos fundamentais
materiais e processuais.

4.2. A estrutura fundamental do processo penal em Moçambique

Face aos modelos estruturais acabados de apresentar o nosso modelo não é modelo puro das
partes isto porque:

 Contrariamente ao que sucede com as partes naquele tipo de processo, o MP e o arguido


não se encontram de facto e de jure ao mesmo nível – as suas posições não são idênticas,
nem entre ambos se verifica uma absoluta igualdade de oportunidade no tratamento do
objecto do processo. Na realidade o MP beneficia de uma posição jurídica supra
ordenada em relação ao arguido: dispõe de um aparelho investigatório e coactivo
(formado pelos chamados órgãos auxiliares do MP – a Policia de Investigação Criminal
e as outras forcas policiais, os estabelecimentos especializados de investigação – enfim,
todos os organismos do poder do Estado) de que pode e deve fazer uso e que falta por
completo ao arguido, pode impor ao arguido a prisão (art. 293 do CPP, na nova
redacção dada pela Lei n. 2/93, de 24 de Junho) e requerer ao juiz da instrução criminal
outras medidas coercivas de limitação ou privação da liberdade.

 O MP não tem como as partes em processo civil, o domínio do objecto do processo: não
lhe cabe qualquer margem de discricionalidade em acusar ou não acusar, nem a
acusação pode ser retirada a partir do momento em que o tribunal for chamado a
decidir sobre ela. Por outro lado, a confissão do arguido não produz qualquer efeito
processual quando desacompanhada de outros elementos de prova (v. art. 174 do CPP),
nem sobre aquele recaí responsabilidade alguma pela não produção de uma prova, ao
mesmo tempo que – por força do princípio da verdade material – nada obsta a que o
tribunal por sua iniciativa realize as diligências que entender necessárias, mesmo que
tenham o arguido por objecto.

Do exposto resulta que o processo penal moçambicano é tipicamente um processo sem


partes, embora isso não signifique que a sua estrutura se confunda com a do tipo
36

inquisitório (pelo menos na sua forma pura). Ele é, na verdade, um processo


basicamente acusatório mas integrado por um princípio de investigações que como
vimos, esta consagrada com carácter geral no art. 9 do CPP.

4.3. O Juiz ou magistrado judicial

O juiz é todo aquele que, por lei ou designacao das partes (assim acontece por exemplo, no caso
do juiz arbitral), exerce funções jurisdicionais, isto é, de resolucao de litígios (conflito de
interesses) entre particulares ou entre particulares e o Estado

Para se ser juiz ou magistrado judicial é necessário que seja cidadão moçambicano com mais de
vinte cinco anos de idade, licenciado em Direito, ter sido aprovado em curso específico de
ingresso reconhecido pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial e satisfazer os demais
requisitos estabelecidos na lei para a nomeacao do exercício da funcao pública22.

O conjunto hierarquicamente organizado dos juízes forma a magistratura23 judicial que intregram
as respectiva categorias: Juiz Conselheiro – Tribunal Supremo; Juiz Desembargador – Tribunal
Superior de Recurso; Juiz de Direito A e B – Tribunal Judicial de Provincia; Juiz de Direito C e
D – Tribunal Judicial de Distrito24.

4.4.O Juiz Penal

A LOTJ no seu artigo 1 define os tribunais como “órgãos de soberania que administram justiça
em nome do povo”.

No toca ao processo penal, quer isto dizer que os tribunais são os únicos órgãos competentes
para como representantes da comunidade jurídica e do poder do Estado decidirem os casos
jurídico-penais que processualmente sejam levados a sua apreciação aplicando o direito penal
substantivo.

22 Art. 8 da Lei n. 7/2009, 11 de Marco.


23Este termo designa ou uma classe e organizacao de magistrados ou o período durante o qual se exerce a funcao
de magistrado.
24 N. 3 do artigo 9 da citada lei.
37

Sendo por conseguinte os tribunais no seu conjunto – e cada um dos juízes de per si – órgãos de
soberania e pertencendo só a eles a função judicial (cujo exercido se consubstancia na actividade
a que se costuma designar por jurisprudência), tem forçosamente de concluir-se que a
independência material (objectiva) dos tribunais – reforçada pela independência pessoal
subjectiva dos juízes que os formam – é condição indispensável da administração da justiça – art.
10 da LOTJ e art. 4 da Lei n. 7/2009, de 11 de Março.

Este princípio assume diversos significados e comporta diversas consequências:

a) Em primeiro lugar a independência perante os outros poderes do Estado ou perante os


restantes órgãos de soberania;

b) Independência perante quaisquer grupos ou entidades da vida pública, como os partidos


políticos, os grupos de interesse ou de pressão, os “lobbies”, os meios de comunicação social
e outros;

c) Independência perante a organização hierárquica dos próprios tribunais no sentido de não


puderem os juízes receber ordens ou instruções concretas vindas de outros juízes de categoria
superior, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em
via de recurso, pelos tribunais superiores.

4.3.2. Organização e competencias dos tribunais judiciais

A jurisdição penal pertence aos tribunais judiciais, hierarquicamente organizados de acordo com
o estabelecido na respectiva Lei Orgânica25.

Assim nos termos da referida lei existem as seguintes categorias de tribunais: Tribunal Supremo;
Tribunais Superiores de Recurso; Tribunais Judiciais de Província e Tribunais Judiciais de
Distrito26.

Para efeitos judiciais, a divisão judicial coincide com a divisão administrativa do País e é
determinada por critérios que atendam ao número de habitantes, ao volume e a natureza da

25 Lei nº 24/2007, de 20 de Agosto


26 Nº 1, als a), b) c) e d) do artigo 29, nº 1 da Lei nº 24/2007, de 20 de Agosto
38

procura da tutela judicial, a proximidade da justiça ao cidadão e as necessidades do sistema de


administração da justiça27.

Tribunal Supremo

O Tribunal Supremo é o mais alto órgão judicial e tem jurisdição em todo o território nacional,
com sede na capital do Pais28.

Para o exercicio da função jurisdicional o Tribunal Supremo conhece duas modalidades de


funcionamento: plenário, como tribunal de segunda instancia e de instância única e em secções,
como tribunal de primeira e segunda instancia29:

Funcionando como tribunal de segunda instancia, o plenário do Tribunal supremo é constituído


pelo Presidente, Vice-Presidente e juízes profissionais; ao funcionar como tribunal de instância
única é constituído pelo Presidente, Vice-presidente, juízes profissionais e juízes eleitos30. Em
qualquer dos casos, o plenário só poderá deliberar estando presentes dois terços dos seus
membros.

As secções funcionando como tribunal de segunda instancia, são compostas por um mínimo de
dois juízes profissionais, sendo um presidente e outro adjunto; ao funcionar como tribunal de
primeira instância é composta por um mínimo de dois juízes profissionais e por um mínimo de
dois juízes eleitos, não podendo deliberar sem que estejam presente dois juízes profissionais e
um juiz eleito.

Cada secção é presidida pelo juiz profissional mais antigo no cargo, atribuindo a lei aos
Presidente de Secção competência para dirigir as sessões de julgamento (sem prejuízo da

27Art. 25 da LOTJ

28 Ns. 1 e 3 do artigos 39 da LOTJ


29Artigo 43 da LOTJ

30 N. 1 e 2 do art.44 da LOTJ
39

possibilidade de ser o Juiz do Tribunal supremo a faze-lo), para alem de poderes de natureza
administrativa e do exercício da acção disciplinar sobre os funcionários do cartório.

Do plenário em instância única compete em matéria criminal entre outras art. 46:

 Julgar os processos crimes em que sejam arguidos o presidente da República, o Presidente da


Assembleia da Republica e o Primeiro-ministro;

 Julgar os processos-crime instaurados contra os juízes eleitos do mesmo tribunal, por actos
relacionados com o exercício das suas funções.

Do plenário, em segunda instancia, compete entre outras – art. 45

 Uniformizar a jurisprudência quando no domínio da mesma legislação e sobre uma mesma


questao fundamental de direito tenham sido proferidas decisões contraditórias nas várias
instâncias do Tribunal Supremo ou nos tribunais superiores de apelação;

 Decidir de conflitos de competência cujo conhecimento não esteja, por lei, reservado a outros
tribunais.

Das secções como tribunal de segunda instancia, compete entre outras – art. 50

 Julgar em matéria de direito, os recursos das decisões proferidas pelos tribunais superiores de
recurso, que nos termos da lei são interpostos para o Tribunal Supremo;

 Conhecer dos conflitos de competência entre os tribunais superiores de apelação e dentre


estes os tribunais judiciais de província.

 Da secção como tribunal de primeira instancia, compete entre outras – art. 51.

 Julgar os processos crimes em que sejam arguidos deputados da Assembleia da Republica,


membros do Conselho de Ministros, membros do Conselho de Estado e outras entidades
nomeadas pelo Presidente da Republica nos termos da Constituição, e todas as demais
entidades que gozam de foro especial nos termos da lei e não estejam abrangidas nas
disposições do artigo 46 da LOJ;
40

 Julgar os processos-crime em que sejam arguidos juízes profissionais dos tribunais superiores
de recurso e magistrados do Ministério Publico junto dos mesmos tribunais.

Tribunais Superiores de Recurso

Os tribunais Superiores de Recurso são por essência tribunais de recurso e tem as suas sedes na
cidade de Maputo, Beira e Nampula31.

Do tribunal de segunda instancia, compete entre outras – ver art. 62

 Julgar dos recursos das decisões proferidas pelos tribunais judiciais de província, nos termos
das leis de processo;

 Julgar dos conflitos de competência entre os tribunais judiciais e outras entidades da área da
sua jurisdição.

Do tribunal de primeira instancia, compete entre outras – ver art. 63

 Julgar os processos crimes em que sejam arguidos juízes profissionais dos tribunais judiciais
de província e magistrados do Ministério publico junto dos mesmos;

 Julgar os processos crimes em que sejam arguidos juízes eleitos dos tribunais judiciais de
província, por actos relacionados com exercício das suas funções.

Tribunais Judiciais de Província

Os tribunais judiciais de província são tribunais intermédios cuja área territorial de jurisdição
corresponde a área territorial da província e da cidade capital. Estes tribunais podem, a imagem
das secções do Tribunal Supremo, funcionar como tribunais de primeira instancia quanto a
determinadas matérias ou como tribunal de recurso relativamente as decisões proferidas pelos
tribunais de escalão inferior, os tribunais de distrito.

31 Artigo da 114 da LOTJ conjugado com a Resolução n…… do Tribunal Supremo


41

O TJP quando funciona como tribunal de segunda instância é composto por 3 juízes
profissionais.

Como tribunal de primeira instancia, compõe-se de um juiz profissional e quatro juízes eleitos.

Os tribunais judicias de províncias têm o seu Juiz-Presidente e nos casos em que esteja
organizado em secções, estas dispõem igualmente do respectivo Juiz-Presidente.

Competencias

Os tribunais judiciais de província funcionando como tribunal em primeira instância, é, em


matéria civil e criminal, o tribunal comum na sua área de jurisdição, por terem competência para
todas as causas daquela natureza que não se encontrem atribuídas a outros tribunais. Para além
disso compete-lhes ainda conhecer de causas de natureza civil ou criminal contra magistrados
(juízes e magistrados do Ministério Publico) colocados nos tribunais de escalão inferior.

Como tribunal de segunda instancia, conhece dos recursos interpostos das decisões dos tribunais
judiciais de distrito e outros que, por lei, lhe devam ser submetidos, e ainda dos conflitos de
competência entre tribunais judiciais de distrito da sua área de jurisdição.

Tribunais Judiciais de Distrito

Estes tribunais exercem jurisdição na área territorial do distrito e dividem-se em tribunais de


primeira classe e de segunda classe32.

Composicao, estrutura e funcionamento

O tribunal Judicial de Distrito é integrado por um presidente, que será um juiz profissional, e por
juízes eleitos. Quando o tribunal se encontre organizado em secção integrar ainda os respectivos

32De acordo com a Resolução n. 1/2009, de 18 de Maio do Tribunal Supremo, classificam-se como tribunais de 1`
classe os tribunais judiciais dos seguintes distritos:

Na província do Niassa

Na Província de Inhambane (Tribunal Judicial da Cidade de Inhambane; Tribunais Judiciais dos Distritos de Maxixe,
Vilanculos e Massinga)
42

presidentes. Do ponto de vista funcional, o tribunal de distrito funciona em tribunal colectivo na


realização de julgamentos, o qual é constituído por um juiz profissional e quatro juízes eleitos.

Competências

Aos tribunais judiciais de distrito de 1 classe em primeira instancia, compete entre outras – ver
art. 84, julgar em matéria civil as questões respeitante a relações familiares e julgar acções cujo
valor não exceda cem vezes o salário mínimo nacional; em matéria criminal, julgam as acções
não atribuídas a outros tribunais desde que ao crime não corresponda pena superior a 12 anos de
prisão maior.

Aos tribunais judiciais de distrito de 2 classe em primeira instância, compete entre outras ver art.
85; em matéria civil, decidir processos jurisdicionais de menores e julgar acções de valor não
superior a cinquenta vezes o salário mínimo nacional; em matéria criminal julgam as acções não
atribuídas a outros tribunais desde que ao crime não corresponda pena superior a 8 anos de prisão
maior.

Aos tribunais judiciais de distrito de 1 e 2 classe em segunda instancia, compete entre outras –
art. 86, julgar os recursos interpostos das decisoras proferidas pelos tribunais comunitários;
conhecer dos pedidos de habeas corpus que lhe devam ser remetidos nos termos da lei
processual.

O juiz presidente do tribunal tem, essencialmente, funções administrativas e de representação.

4.4.1. Competência do tribunal em matéria penal

4.4.1.1. O princípio do juiz natural

O princípio da legalidade em matéria penal obriga, como se sabe, ao afastamento da analogia em


matéria de incriminação e determinação das penas: nullum crimen, nulla poena sine lege”.

Não se ficam, no entanto, por aqui, as implicações deste princípio fundamental. Também no
processo penal ele se manifesta através do chamado princípio do juiz natural, ou do juiz legal,
que representa o direito fundamental dos cidadãos a que uma causa seja julgada por um
tribunal previsto como competente por lei anterior e não designado arbitrariamente, ou
43

seja, traduz-se esta, essencialmente, na fixação previa na lei dos factos determinativos da
competência para os diversos tipos de causa e a estabilidade da competência depois de
iniciada a acção, proibindo-se a criação de tribunais ad hoc ou o desaforamento de
qualquer causa, mediante atribuição arbitraria de competência a um tribunal diferente do
que era legalmente competente a data do facto atributivo da competência.

O princípio do juiz natural (ou juiz legal) está consagrado no n. 6 do artigo 223 da CRM e
significa que a repartição de competencias pelos tribunais há-de ser feita por lei e que esta deve
ser anterior a prática do facto que vai ser objecto do processo.

Ao se consagrar este princípio pretendesse evitar que sejam criados tribunais especiais ou
extraordinários e que o executivo pudesse proceder ao desaforamento. Mas não há uma proibição
total de desaforamento: o que esta essencialmente em causa são as garantias de imparcialidade e
independência. Nem a Constituição nem as normas de direito internacional pelas quais o Estado
moçambicano se encontra vinculado impedem a criação de novos tribunais nem os processos
relativos a factos praticados na área destes sejam transferidos para os tribunais posteriormente
criados. O que não é permitido é criar tribunais de excepção para o julgamento de delitos
determinados nem o desaforamento discricionário, por forma arbitrária, desrespeitando a
independência e a imparcialidade.

Este princípio tem um triplo significado:

a) Só a lei pode instituir o tribunal e fixar-lhe a competência;

b) A fixação do tribunal e da sua competência tem de ser feitas por uma lei vigente ao
tempo em que foi praticado o facto criminoso que será objecto do processo;

c) A fixação legal da competência visa excluir qualquer possibilidade de arbítrio ou


discricionalidade na determinação do juiz competente.

Muito embora tenha assento constitucional, o princípio do juiz natural esta claramente aflorado
no artigo 37 da LOTJ.
44

4.4.2. Espécies de competência33

Em relação a cada feito criminal, a cada caso penal em concreto, importa, pois que a lei
determine qual, de entre os tribunais existentes, deve apreciar e julgar a causa. É nisto que se
traduz a determinação da competência em processo penal.

Esta determinação da competência implica a resposta a três perguntas diferentes:

1. Qual o tribunal que segundo a sua espécie (porque existem diferentes espécies de tribunais
penais – os tribunais de policia, os tribunais criminais, os tribunais militares, marítimos, etc.)
deve conhecer de uma infracção penal de certa natureza (uma contravenção ao Codigo
Estrada, deserção, uma violação das leis sobre pescas nas aguas jurisdicionais, etc.). Trata-se,
aqui do problema da determinação da competência material.

2. Qual o tribunal que, entre os da mesma espécie, deve segundo a sua localização no território
ser chamado para conhecer do mérito da causa. E o problema da determinação da
competência territorial;

3. Qual o tribunal competente para a prossecução de certos fases, ainda ao nível da primeira
instancia, ou para o desenvolvimento do processo na fase de recurso. Trata-se da
determinação da competência funcional.

Deste modo o problema da determinação da competência resolve-se definindo a natureza


territorial do tribunal e a sua categoria, dando lugar as três espécies de competências (material,
territorial e funcional).

4.4.3.1. Competência material

Na distribuição da competência para apreciação dos feitos criminais pelas várias espécies de
tribunais existentes, pode o legislador servir-se de um de dois métodos ou vias de procedimento;

33Competencia é a parcela de jurisdicao que cabe a cada tribunal, competência essa que é determinada pela CRM,
disposicoes do Codigo e pela Lei Organica dos Tribunais Judiciais.
45

a) O método de determinação abstracta da competência – que resulta directamente da lei,


atribuindo esta a cada tribunal poderes para o conhecimento e decisão de certo tipo de crimes
ou para a aplicação de certo tipo de penas34;

b) O método de determinação concreta da competência – que deriva de uma previsão do


crime, tal como e de esperar que venha a ser definido concretamente na sentença ou da pena
que vira a ser aplicada em concreto.

As legislações que se baseia no método de determinação concreta da competência - como e o


caso do que vigora entre nos – utilizam, geralmente, três tipos de critérios distintos:

i) Um critério quantitativo – que atende a gravidade dos infracções, determinada pelo


máximo da pena aplicável;

ii) Um critério qualitativo – que leva em conta a espécie ou categorais de crimes em causa35.

iii) Um critério fundado na qualidade da pessoa do arguido – em que a especifica função


pública por este exercida (ou o grau de perigosidade demonstrada pelo delinquente)
funciona como um elemento de conexão determinante da competência36.

Embora o critério mais na nossa legislação seja o quantitativo – os outros também aparecem
referenciados.

E de realçar a lei que permite a criação de tribunais de competência especializada como e o caso
do Tribunal de Menores de Maputo, a quem cabe a aplicação de medidas de prevenção criminal
(relativas a menores inimputáveis) – Decreto n. 40/93, de 31 de Dezembro.

Relacionado com a problemática da competência material pode pôr-se a questão da prorrogação


da competência de acordo com as regras enunciadas nos $$ 1 e 2 do art. 447 e no art. 61 ambos
do CPP.

34 Lei do Contencioso Administrativo; n. 2 do artigo 228 da CRM


35 Art. 65 CPP; 34 als. a) b) e 38 als. a) e 61 da LOTJ
36 Reincidencia – art. 100 do CP; al. a) do art. 46 da Lei n. 24/2007, de 20 de Agosto
46

A prorrogação da competência resulta do facto de o tribunal, ao qualificar diversamente a


matéria que constitui objecto do processo, condenar em penas que caberiam na competência de
um tribunal inferior, a qual e, deste modo, absorvida (tendo em conta o principio quem pode o
mais pode o menos.

A situação inversa não pode verificar-se, pois que se estaria perante a excepção da
incompetência prevista no art. 138, n. 1 do CPP, pelo que o caminho a seguir será o de proceder
nos termos do $ 2 do art. 447, com a consequente aplicabilidade do art. 145 (remessa do processo
ao tribunal competente) ambos do CPP.

Nestes termos, a competência por excesso esta coberta pela prorrogação, mas se ela for por
defeito da lugar a excepção atrás referida.

4.4.3.2. Competência territorial

A competência territorial obtêm-se estabelecendo a conexão entre o tribunal e o facto


criminoso objecto do processo de acordo com um critério de localização geográfica e tendo em
vista a afirmação do princípio da imediação.

A regra geral no processo comum para a determinação territorial é o do locus delicti segundo o
qual é competente para o conhecimento da infracção o tribunal do local da sua pratica ou da sua
ocorrência.

Mas como apurar o local da ocorrência de uma infracção para efeitos de determinação da
competência?

São três os critérios adoptados para obter a resposta a esta questão:

i) O critério da actividade – de acordo com o qual o local da ocorrência do delito é o


espaço geográfico em que se processou a actividade típica, independentemente do local
de produção de eventos;

ii) O critério do resultado – de acordo com o qual o locus delicti é o da ocorrência do


evento, ou seja, do resultado típico, sendo competente o tribunal com jurisdição nessa
área – art. 45 CPP;
47

iii) O critério da antecipação da consumação - a qual leva a definição do locus delicti como
sendo o espaço em que tenha começado a produção do evento, mesmo que a produção do
resultado típico só finde noutra área.

O art. 45 do CPP, reporta-se aos crimes materiais, consagra o critério do resultado.

Mas, como nem todos os crimes atingem o estádio da consumação, é evidente que o princípio
geral da determinação da competência territorial – baseado no critério do resultado – não se
aplica sem excepção.

Assim, o $ 1 do art. 45 do CPP estabelece que “se a infracção não chegou a consumir-se é
competente o tribunal em cuja área praticou o ultimo acto de execução ou facto punível”. Este
preceito aplica-se as hipóteses de tentativa e frustração, bem como aos actos preparatórios, cuja
punição esteja prevista como crime autónomo37e, por identidade de razão aos crimes formais.

Nos termos do $ 2 do mesmo preceito, sendo a consumação efectuada através de factos


sucessivos ou reiterados, como acontece nos crimes habituais (Ex. Lenocínio art. 405 do CP) ou
de um acto ou omissão susceptível de se prolongar no tempo e no espaço, como sucede com os
crimes permanentes (ex; cárcere privado – art. 330 do CP), o locus delicti é a cessação da
consumação (que se verifica com o termo do evento nos crimes materiais) ou da prática do
último facto (que se verifica com o termo da execução nos crimes formais)

Relativamente aos crimes só parcialmente cometidos em território moçambicano, o critério do


locus delicti sofre uma restrição resultante da regra de absorção, que então se aplica, e que leva a
atribuição da competência aos tribunais moçambicanos, mesmo que o iter criminis (ou seja, o
processo executivo do delito) só findar no estrangeiro. Competente será, neste caso, o tribunal
moçambicano em cuja área se praticou o último facto de consumação, execução ou
comparticipação que seja punível pela lei moçambicana, conforme estabelece o art. 46 do CPP
com as especificações referidas nos $$ 1 e 2.

Outras restrições ao princípio geral do locus delicti verificam-se relativamente:

37Ex. art. 444 do CP – fabrico de gazuas e artifícios para abrir fechaduras – arts. 5 e 6 da Lei nº 19/91, de 16 de
Agosto - Lei dos Crimes contra a Segurança do Estado.
48

 Aos crimes cometidos no estrangeiro a que seja aplicável o lei moçambicana38;

 Aos crimes cometidos nos limites territoriais de diversos tribunais da mesma espécie (por
exemplo nos limites de dois ou mais tribunais judiciais de distrito) quando houver duvidas
acerca do lugar em que o foi – v $ 3 do art. 45 (principio de prevenção da jurisdição)

 Aos crimes praticados em local desconhecido – art. 47 do CPP (Principio do fórum


deprehensionis)

 Aos crimes cometidos a bordo de navio ou aeronave – art. 48 do CPP

4.4.3.3. Problemas comuns a determinação da competência material e territorial – a


competência por conexão

Alem das restrições que acabamos de ver, as regras de atribuição da competência material e
territorial, sofre outras alterações por força da existência de conexões (ou ligações) especiais
entre diversas infracções criminais. Dá-se então a chamada competência por conexão.

A competência por conexão traduz-se, pois, no poder conferido a um certo tribunal para
proceder criminalmente em relacao a ilícitos criminais, e que, segundo as regras gerais o não
tinham”39.

A conexão pode ser subjectiva ou pessoal, quando se fixa com base na pessoa do agente, que é
responsável por uma pluralidade de crimes e objectiva ou material, quando se observa uma
pluralidade de agentes e de crimes, estando estes particularmente inter-relacionados.

A conexão subjectiva refere-se o art. 56 do CPP. Como se pode ver por este dispositivo legal, a
conexão ocorre quando as infracções são praticadas pelo mesmo agente, ou seja, no caso de
concurso real de infracções (em que as penas não se acumulam materialmente mas juridicamente
– art. 102, nºs 1 e 2 do CP

38 Arts. 49 e 40 do CPP

39 Nocoes de Processo Penal, pag. 80


49

A regra é, pois, no sentido de julgamento conjunto das infracções, sendo excepcional o


conhecimento separado (&& 2 e 3 do art. 55). Tem-se aqui em vista permitir a apreciação
unitária da personalidade do réu, garantir a economia processual, evitar decisões contraditórias e
possibilitar o cúmulo jurídico das penas.

No caso de se ter de efectuar o julgamento separado, resta saber qual e o tribunal competente
para proceder ao cumulo jurídico das penas – será, naturalmente, o que proferir a última
sentença condenatória – parte final do & 2 do artigo 55.

A conexão objectiva verifica-se quando uma determinada infracção foi levada a cabo por
diversos agentes (dá-se, assim, uma comparticipação criminosa a que se refere o art. 56) ou
quando diversas infracções forem levadas a cabo na mesma ocasião, reciprocamente ou por
varias pessoas reunidas (art. 57), ou ainda quando, tratando-se de diversas infracções cometidas
em ocasiões diferentes, umas forem causa ou efeito das outras (art., 58). Nos dois primeiros
casos (dos arts. 56 e 57) a conexão e obrigatória, pois funciona ope legis e, no terceiro caso (art.
58) é facultativo, sendo declarado ope judicis.

Remoção da competência territorial ou desaforamento.

Alem dos exemplos acabados de referir de conexão entre várias infracções ou agentes da mesma
infracção, a regra geral de determinação da competência territorial pode sofre ainda um outro
desvio. Trata-se dos casos de remoção da competência, também chamada de desaforamento por
motivos muito especiais, que tem de estar previstos na lei, a infracção criminal é julgada por um
tribunal diferente do normalmente competente.

A essas situações de desaforamento e ao seu carácter excepcional se referem os arts. 671, 683 e
698 do CPP.

4.4.3. Competência funcional

Já acima se disse que a questão essencial da determinação da competência funcional é a de saber


qual o tribunal competente para a prossecução de certas fases processuais – estando o processo a
decorrer em primeira instancia – ou para o seu conhecimento na fase de recurso.
50

Este tipo de competência pode, pois, sintetizar-se em duas categorias distintas (há quem se refira
a uma terceira categoria, mas veremos em seguida que não tem aplicação no nosso caso).

a) Competência funcional por graus – deriva da circunstancia de as decisões penais não


adquirirem carácter definitivo logo que são proferidas, mas permitir a lei o seu reexame
sucessivo por parte de outros órgãos judiciais. De acordo com a nossa organização judiciária,
e no que diz respeito a jurisdição comum, temos a considerar, como tribunais de primeira
instancia, os tribunais judiciais de distrito, de província, tribunal superior de recurso (e, só
excepcionalmente, o Tribunal Supremo). Como tribunais de segunda instancia temos o
Tribunal Supremo (Secções), relativamente aos recursos interpostos das decisões dos
tribunais judiciais de província, e estes, em relação, aos recursos interpostos das decisões dos
tribunais judiciais de distrito. A última instancia pertence ao plenário do Tribunal Supremo,
que julga, unicamente sobre matéria de direito, os recursos interpostos das decisões
proferidas nas diversas jurisdições previstas na lei (incluindo, portanto, a jurisdição penal)

b) Competência funcional por fases – tendo em conta a complexidade do decurso do processo


penal, necessário para que este atinja plenamente o seu fim, ele desenvolve-se numa
pluralidade de fases: três dessas fases aos determinantes para a fixação da competência
funcional: a fase de instrução – em que intervêm os juízes da instrução criminal instituídos
pela Lei n. 2/93, de 24 de Junho; a fase de julgamento – em que as decisões pertencem
exclusivamente aos tribunais (de jurisdição comum ou especializada) e a fase de execução –
que no nosso pais, já pertenceu ao chamado Tribunal de Execução de Penas – entretanto
extinto pela Lei n. 5/81, de 8 de Dezembro, e hoje decorre nos tribunais criminais.

c) A terceira categoria admitida por alguns autores, é a da competência funcional por órgãos –
pela qual se faz a distinção entre juiz monocrático ou singular e o juiz colegial. Ora, como
sabemos segundo a Lei da Organização dos Tribunais Judiciais, todos os tribunais da
Republica de Moçambique tem uma composição colegial, não existindo a figura de juiz
singular, pelo menos para efeito de julgamento e decisão.

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