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Desacato

Art. 331 - Desacatar funcionário público no


exercício da função ou em razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou
multa

Há dois elementos que atingem esse delito:

1- A conduta de desacatar funcionário público.

2- No exercício da função ou em razão dela.

No primeiro caso, no momento da ofensa o funcionário está realizando um ato de seu ofício; no
segundo, embora o funcionário não esteja praticando ato oficial algum, a ofensa contra ele é
proferida em razão da função.

Já na Exposição de Motivos do Código Penal de 1940, o Ministro


Francisco Campos destacava: “O desacato se verifica não só
quando o funcionário se acha no exercício da função (seja, ou
não, o ultraje infligido propter officium), senão também quando
se acha extra officium, desde que a ofensa seja propter
officium”.

Deve-se, no entanto, analisar com muito cuidado essa elementar normativa para que se possa
atribuir-lhe corretamente seu verdadeiro significado.

O exercício da função não se limita ao local-sede em que administrativamente está situada a


repartição pública respectiva.“no exercício da função” significa que a ofensa irrogada necessita,
obrigatoriamente, relacionar-se a fato inerente à função do ofendido, isto é, que a moti-vação do
sujeito ativo represente sua insatisfação com a prática ou postura do ofendido no exercício de dita
função pública.

Como se configura:

Configura-se o desacato quando a ofensa ao funcionário público tem a finalidade de humilhar o


próprio funcionário e o prestígio da atividade pública. Por isso, é imprescindível que a ofensa
seja proferida na presença do funcionário público, pois somente assim estará demonstrada a
dupla finalidade de inferiorizar o funcionário público e, via oblíqua, a própria função pública.
Portanto, somente é admissível o desacato direto e imediato do funcionário público cumulado com
ofensa desarrazoada da própria função pública.

Bem Jurídico Protegido:

Bem jurídico protegido é a Administração Pública, especialmente sua moralidade e


probidade administrativa. Protege-se, na verdade, a probidade de função pública, sua
respeitabilidade, bem como a integridade de seus funcionários. Objetiva-se, especificamente,
garantir o prestígio e a dignidade da “máquina pública” relativamente ao cumprimento de
determinações legais, expedidas por seus agentes. É considerado crime pluriofensivo, atingindo
tanto a honra do funcionário como o prestígio da Administração Pública. Nessa linha
argumentativa, é insuperável a síntese de Magalhães Noronha (Direito Penal, cit., v. 2, p. 317): “O
bem jurídico considerado é a dignidade, o prestígio, o respeito devido à função pública. É o
Estado diretamente interessado em que aquele seja protegido e tutelado, por ser
indispensável à atividade e à dinâmica da administração pública”.

A Ação Tipificada:

A ação tipificada consiste em desacatar, ou seja, desrespeitar, ofender, menosprezar


funcionário público no exercício da função ou em razão dela. A ofensa constitutiva do desacato
“é qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência
ao funcionário.” Segundo Hungria “ É a grosseira falta de acatamento, podendo consistir em
palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos
obscenos, gritos agudos etc.”. O crime de desacato significa menosprezo ao funcionário
público e, por extensão, à própria função pública por ele exercida. Reclama, por isso, elemento
subjetivo, voltado para a desconsideração, para a humilhação. Não se confunde apenas com o
vocábulo grosseiro, que, em si mesmo, restringe-se à falta de educação ou de nível cultural, quando
desacompanhado do fim especial de ultrajar.

É condição essencial do crime de desacato a presença do ofendido. Mesmo no caso


de ofensa oral, o funcionário deve ser atingido diretamente. Não é necessário, porém, que a ofensa
seja irrogada facie ad faciem, bastando que, próximo ao ofendido, seja por este percebida. É
indispensável que o funcionário encontre-se no local onde a ofensa é proferida, pois, repetindo, faz-
se necessário que esta seja cometida na sua presença. No entanto, não é conditio sine qua non que
o desacatado veja o ofensor e perceba o ato ofensivo, sendo suficiente que possa tomar
conhecimento direta e imediatamente da ofensa, como, por exemplo, tendo-a ouvido. Razão pela
qual o crime de desacato não pode ser cometido por telefone, fax, telegrama ou carta. O Código
Penal Rocco — apenas para mencionar, e evitar comparações inadequadas — equipara essas
situações à presença do funcionário público. Se o ato se realizar na ausência deste, o sujeito
ativo poderá responder pelo delito de injúria majorada (arts. 140 e 141, II, do CP), não por
desacato.

A injúria majorada (art. 140, combinado com o art. 141, II do CP)

Já o crime de injúria atinge a honra subjetiva do ofendido. Logo, o crime de injúria consuma-se
quando a ofensa à dignidade ou ao decoro chega ao seu conhecimento, direta ou indiretamente,
ofendendo e menosprezando o conceito que tem de si mesmo. Por isso, é indiferente que a ofensa
tenha sido proferida na presença da vítima (injúria imediata) ou que tenha chegado ao seu
conhecimento por intermédio de interposta pessoa (injúria mediata). Quando a injúria for praticada
contra funcionário público, incidirá uma causa de aumento de pena.

Ainda sobre Desacato, vale ressaltar:

É necessário que o sujeito ativo tenha consciência que está diante de funcionário público e que
este se encontra no exercício de suas funções (ou em razão dela). O erro, portanto, tanto sobre a
qualidade de funcionário público quanto sobre encontra-se no exercício de sua função constitui erro
de tipo,que afasta a tipificação do crime de desacato, podendo, dependendo das circunstâncias,
caracterizar outra infração penal, nesse caso, contra a honra pessoal. Por isso, o particular que
devolve a provocação de funcionário público, como mencionamos anteriormente, não comete
desacato, posto que não pretende desprestigiá-lo ou à sua função pública, mas apenas responder à
agressão, que considera injusta e indevida.

Consuma-se:

Consuma-se o crime de desacato com a prática efetiva, pelo sujeito ativo, da ofensa ou da
manifestação ou exteriorização oral ofensiva (palavra). Em outras palavras, consuma-se o desacato
no lugar e no momento em que o sujeito ativo pratica a ofensa ou profere palavras injuriosas, na
presença do ofendido. São irrelevantes, em princípio, as consequências da ação delituosa, isto é,
que o funcionário tenha-se sentido ofendido ou que tenha resultado abalado o prestígio ou o decoro
da função exercida.

Sua tentativa:

A tentativa é, teoricamente, admissível, embora, por vezes, de difícil caracterização.


Será inadmissível, contudo, quando o desacato for praticado oralmente, como ocorre, via de regra,
nos crimes contra a honra.

As penas cominadas, alternativamente, são de detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. É
aplicável a transação penal, considerando-se que se integra perfeitamente na definição legal de
infração de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei n. 9.099/95, com-binado com as disposições da
Lei n. 10.259/2001). A ação penal é pública incondicionada.

STF e a Comissão de direitos humanos:

Em 2016 o STJ decidiu não considerar o desacato a autoridade como crime, já que as Leis
Internacionais de direitos humanos em sua tipificação é contrária ao Artigo 13 da convenção
Americana de Direitos Humanos, que garante a qualquer pessoa o direito à liberdade de pensamento
e de expressão a qual tem status supralegal e garante a liberdade de pensamento e de expressão, a
exemplo de nossa Carta Magna.Dessa forma, com elogiável interpretação STJ, na senda da
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, afastou a superproteção adicional a funcionários
públicos contra as insatisfações dos “súditos”, na comparação com os cidadãos em geral.
Reconheceu que um Estado democrático de direito deve submeter-se ao controle popular e deve
procurar atender aos anseios dos cidadãos exercendo uma boa atenção às suas demandas, sem
criminalizar eventuais demonstrações mais agressivas de sua insatisfação com a administração
pública. Porém, não quer dizer que qualquer pessoa tenha essa liberdade para agredir verbalmente
agentes públicos, assim, mesmo não tendo uma tipificação criminal do desacato, não impede a
responsabilidade ulterior, civil ou figura típica penal como a Calúnia, difamação, injúria.
o atual Código Penal de 1940 ampliou o alcance da tipificação penal
para abranger as ofensas proferidas contra funcionário público no exercício da função como também
em razão dela.
Quanto à constitucionalidade do tipo penal, Barroso destacou que a Corte Suprema tem ampla
jurisprudência no sentido da defesa da liberdade de expressão, mas que a mesma "encontra seus
limites quando é utilizada como pretexto para violações graves a outros interesses e direitos
fundamentais". O ministro destacou que ambas as turmas deste Tribunal já decidiram pela recepção
da norma do art. 331 do CP pela CF/88. Lembrou, por sua vez, que "o tipo penal deve ser limitado a
casos graves e evidentes de menosprezo à função pública".

Súmula 714
É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério
público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime
contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções.

Exige-se, para o fim de balizar a legitimação concorrente do Ministério Público (Súmula


714, deste STF) quando o funcionário público é ofendido em razão de suas funções,
contemporaneidade entre as ofensas e o exercício do cargo, mas não contemporaneidade
entre a data da denúncia e o exercício do cargo. O ordenamento jurídico confere
legitimação ao Ministério Público em razão da necessidade de se tutelar, nessas
hipóteses, além da honra objetiva ou subjetiva do funcionário, o interesse público
atingido quando as ofensas são irrogadas em razão da função exercida. Ocorre que,
nesses casos - quando há nexo de causa e efeito entre a função exercida pelo ofendido e
as ofensas por ele sofridas -, também vulnerado resta de forma reflexa o bem jurídico
Administração Pública.

[Inq 3.438, rel. min. Rosa Weber, 1ª T, j. 11-11-2014, DJE 27 de 10-2-2015.]

FONTE: Código Penal Comentado por Cezar Roberto Bitencourt


https://www.migalhas.com.br/quentes/329333/stf--e-constitucional-tipo-penal-do-delito-de-desacato-a-
agente-publico

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