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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL

Ano lectivo 2021-2022

§ Direitos de Personalidade

I
Durante uma manifestação política em frente ao Palácio de S. Bento, Ana, que
gritava várias palavras de ordem, viu-se abalroada e alguém lhe colocou uma fita à
frente da boca, de forma a impedi-la de falar ou gritar. Furiosa, virou-se para enfrentar o
agressor, e reparou para seu espanto que não se tratava de um agente da P.S.P., mas de
um simples cidadão que, em desacordo com o protesto, tinha pretendido silenciá-la.
Sentindo que os seus direitos, nomeadamente o direito à liberdade de expressão, foram
violados, Ana pretende obter junto dos tribunais uma indemnização. Quid iuris?

Resposta:
Ana, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de ser
titular de direitos e de estar adstrita a deveres e obrigações) desde o momento do seu
nascimento completo e com vida [artigo 66º nº1 CC].
Portanto, Ana é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua
qualidade enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem
para o titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma relação
jurídica) ou mais ainda, verdadeiros direitos subjetivos (Menezes Cordeiro: permissão
normativa de aproveitamento de um bem em específico).
Os direitos de personalidade são tutelados de modo geral no artigo 70º CC, isto
é, a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ou ameaça à sua integridade física
ou moral [artigo 70º nº2 CC] , para além de permitir ao sujeito recorrer às providências
necessárias para atenuar a ofensa cometida ou ameaçada [artigo 70º nº2]
No artigo 26º nº1 da CRP, está constatado que a todos são reconhecidos os
direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à
cidadania, ao bom nome e à proteção legal contra quaisquer formas de descriminação.
Neste caso, estamos perante uma violação da liberdade de expressão, ou seja,
integridade moral, o artigo 37º da CRP nº1 relata que todos têm o direito de exprimir e
divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro
meio, bem como o direito de informar, de se informa e de ser informados, sem
impedimentos nem descriminações. Ou seja, neste caso o cidadão está a impedir que
Ana possa expressar os seus pensamentos pela palavra na manifestação política.
No caso de violação da liberdade de expressão, Ana pode requerer as
providências necessárias para evitar ou atenuar os efeitos da ofensa ou ameaça [artigo
70º/2 CC], dando lugar a imputação do dano a causador sob a forma de
responsabilidade civil extracontratual, nos termos do artigo 483º/1.
Para haver responsabilidade civil têm de se verificar os cincos seguintes
pressupostos: existência de um dano (supressão de uma vantagem tutelada pelo
Direito); facto ilícito (violação de direitos de personalidade); culpa, apreciada segundo o
critério da diligência de «um bom pai de família» [artigo 487º/2 CC]; nexo de
causalidade [artigo 563º CC] e imputabilidade (capacidade do autor da lesão de
entender o facto que praticou, apreciada nos termos do artigo 488º CC). Consideramos,
através de tudo o que foi exposto anteriormente, que os cinco pressupostos se encontram
preenchidos.
Havendo responsabilidade civil, gera-se uma obrigação de indemnizar, nos
termos do artigo 562º CC, devendo essa indemnização compreender não só os danos
emergentes (“o prejuízo causado”), como também os lucros cessantes (“os benefícios
que o lesado deixou de obter em consequência da lesão”), à luz do artigo 564º/1 CC.
Perante violação de direitos de personalidade, a indemnização funciona normalmente
enquanto sanção compensatória e, portanto, é fixada em dinheiro [artigo 566º/1 CC].

Correção: Não é só integridade moral, mas também física


Art. 18º da CRP- os direitos de liberdade de expressão têm também eficácia entre
particulares
O bem jurídico do art. 37º CRP é a liberdade de expressão que pertence à personalidade
moral de uma pessoa cuja tutela está vinculada no art. 70º CC.

II
Bernardo Ribas Cardoso goza de grande reputação como advogado dos mais
mediáticos processos. O seu primo, de nome idêntico (Bernardo Riba Cardoso),
tentando indevidamente aproveitar-se da fama e bom nome do primo, estabeleceu-se
num escritório na mesma rua. Este último, também advogado, especializou-se na defesa
de perigosos criminosos, gozando da fama de ser “amigo dos mafiosos”.
Bernardo Cardoso intentou uma ação contra o primo, pedindo que este seja
condenado a:
i. Abster-se de usar os seus apelidos;

ii. Mudar o seu domicílio profissional para outra área, que diste a pelos
menos 2 km, do escritório de Bernardo Ribas Cardoso;

iii. Acrescentar aos seus apelidos a palavra “Primo”


Como deverá o tribunal decidir a presente ação?

Resposta:
Bernardo Ribas enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica
(suscetibilidade de ser titular de direitos e de estar adstrita a deveres e obrigações) desde
o momento do seu nascimento completo e com vida [artigo 66º/1 CC]. Portanto,
Bernardo Ribas é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua qualidade
enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem para o
titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma relação
jurídica) ou, mais ainda, verdadeiros direitos subjetivos (MENEZES CORDEIRO:
permissão normativa de aproveitamento de um bem em específico). Os direitos de
personalidade são tutelados de modo geral no artigo 70º CC, isto é, a lei protege os
indivíduos contra qualquer ofensa ou ameaça à sua integridade física ou moral [artigo
70º/1 CC], para além de permitir ao sujeito recorrer às providências necessárias para
atenuar a ofensa cometida ou ameaçada [artigo 70º/2 CC].
Na hipótese sub judice, encontramo-nos perante eventuais violações de direitos
de personalidade, nomeadamente do direito ao nome [artigo 72º CC]. No caso do direito
ao nome, o artigo 72º/1 CC consagra a regra geral “Toda a pessoa tem direito a usar o
seu nome, completo ou abreviado, e a opor-se a que outrem o use ilicitamente para sua
identificação ou outros fins.” No seguimento deste artigo, podemos ficar com a ideia de
que o primo de Bernardo Ribas tem o direito de usar a seu bel-prazer o seu nome,
mesmo que o gozo desse direito sirva para prejudicar o seu primo.
Todavia, o artigo 72º/2 CC limita esse mesmo gozo, consagrando a seguinte
regra “O titular do nome não pode, todavia, especialmente no exercício de uma
actividade profissional, usá-lo de modo a prejudicar os interesses de quem tiver nome
total ou parcialmente idêntico; nestes casos, o tribunal decretará as providências que,
segundo juízos de equidade, melhor conciliem os interesses em conflito.” Nesse sentido,
o primo de Bernardo Ribas usar o seu nome, especialmente no exercício da sua
atividade de advocacia, a qual está integrada num mercado concorrencial, utilizar o seu
nome de forma a prejudicar os interesses do seu primo, seu concorrente profissional.
Assim, caberá ao tribunal, tendo por base os interesses em conflito, segundo
juízos de equidade, decretar as providências necessárias [artigo 72º/2 CC]. Como por
um lado temos o interesse do primo de Bernardo Ribas de desenvolver atividade
profissional na área, e por outro temos o interesse de Bernardo Ribas de não ver o seu
nome e, por conseguinte, a sua atividade profissional confundida com a do primo, o
tribunal deverá decretar providências que vão ao encontro da satisfação destes dois
interesses. Tendo em conta que a confusão entre os dois sujeitos se deu, por um lado,
por uma semelhança nos seus nomes e, por outro, pela curta distância que situava o
escritório de ambos, o tribunal deverá decretar providências que eliminem ou atenuem
estas razões subjacentes à confusão entre os dois sujeitos, sem colocar em causa o
exercício profissional do primo de Bernardo Ribas. Nesse sentido, as providências
propostas por Bernardo Ribas poderão ter seguimento.

Correção: Não viola o direito de personalidade de direito ao nome, pois os nomes são
apenas parecidos e cada um tem direito ao bom nome, nenhum deles tem culpa do nome
que tem.
Utilizar o seu nome não pode ser considerado ilícito. Não é um problema de atuação
ilícita, mas há consequências negativas para um dos lados.
Não cabe nas providências do art. 72º nº2
Há também o direito de abreviar o seu próprio nome, um nome reduzido que se utiliza
profissionalmente.
Acrescentar ao nome a palavra “primo”. Os advogados não podem ter nomes iguais uns
aos outros, para evitar erros pelos clientes.
Violação do direito à honra, na vertente do prestígio profissional, medidas no âmbito no
art. 70º/2.

III
Helena e João eram muito apaixonados. O seu amor um pelo outro era tanto que
várias vezes enviavam selfies um ao outro. Cedendo à pressão do namorado, Helena
acabou por enviar-lhe fotografias em roupa interior. Passados uns dias, uma amiga de
Helena avisou-a de que tinha ouvido falar dessas fotografias estarem no telemóvel de
outro amigo. Afinal, João tinha ficado tão entusiasmado que tinha partilhado com
alguns amigos as fotografias. Quid iuris?

Resposta:
Helena, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de ser
titular de direitos e de estar adstrita a deveres e obrigações) desde o momento do seu
nascimento completo e com vida [artigo 66º nº1 CC].
Portanto, Helena é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua
qualidade enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem
para o titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma relação
jurídica). Os direitos de personalidade são tutelados de modo geral no artigo 70º CC,
isto é, a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ou ameaça à sua integridade
física ou moral [artigo 70º/1 CC], para além de permitir ao sujeito recorrer às
providências necessárias para atenuar a ofensa cometida ou ameaçada [artigo 70º/2 CC].
Na hipótese, encontramo-nos perante eventuais violações de direitos de
personalidade, nomeadamente do direito à imagem, consagrado no art. 79º do CC. No
seguimento deste artigo, podemos ficar com a ideia de que João, o namorado de Helena,
o violou. Simplesmente pelo facto de ter divulgado imagens de Helena, sem o seu
consentimento, já está necessariamente a incorrer numa violação dos seus direitos de
personalidade (Art. 79º 1.).
Para além disso, independentemente de ser ou não uma figura como notoriedade,
o que não é explícito, mas se parte do princípio que não seja, os direitos de Helena estão
a ser violados com uma gravidade ainda superior na medida em que João divulgou
imagens da sua namorada, que certamente resultariam num prejuízo para a honra,
reputação e decoro dela (Art. 79º 3.).
No caso de violação dos direitos à imagem, bem como quaisquer outros direitos
de personalidade, Helena pode requerer as providências necessárias para evitar ou
atenuar os efeitos da ofensa ou ameaça [artigo 70º/2 CC], ideia que é ainda concretizada
no artigo 483º, onde se afirma que “aquele que, com dolo e mera culpa violar
ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger
interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da
violação”. Também nesta situação está a ser posto em causa o bom nome de Helena, ao
serem publicadas fotografias que a comprometem, e por essa razão se recai no artigo
484º, onde se enuncia que João terá de responder pelos danos causados.
Correção:
Confidencialidade das cartas missivas- Art. 75º/ 2
O art. 76º/1 diz nos que as fotografias só podem ser partilhadas com autorização do
sujeito em questão
Direito à imagem- art. 79º
1. Proíbe a divulgação das fotografias
Direito à reserva sobre a intimidade à vida privada- art. 80º
Mencionar a teoria das esferas, pois a extensão da reserva depende do titular e da sua
vida.
Direito à honra- Art. 70º + 484º
A reputação social dela fica em causa pela divulgação de fotografias intimas.
São todas violações ilícitas que resultaram em indemnização segundo o Art. 483º. Ainda
responsabilidade civil por danos morais segundo o Artº 496
Art. 81º

IV
Durante a campanha eleitoral, o político Dr. Dionísio Elias, candidato do seu
partido à pasta do Ministério da Família, difundiu cartazes e publicou anúncios em que
se apresentou rodeado pelos seus familiares mais próximos, dando a imagem de uma
família feliz. Num certo dia, um jornalista, enquanto passava junto à casa de Dionísio, é
surpreendido por gritos de medo provenientes dessa habitação. Escondido atrás de uma
vedação e munido de uma objectiva potente, espera pelo momento oportuno e capta
uma fotografia em que se vê distintamente a mulher de Dionísio fugir de um golpe que
este lhe desferia, enquanto os filhos do casal testemunhavam o acontecimento.
Na manhã seguinte, o jornal com mais tiragem reproduz a dita fotografia na
primeira página, com as paragonas ´Violência doméstica em casa de famoso políticoµ.
Nesse mesmo dia, assessores de imprensa do partido fazem um comunicado repudiando
todas as insinuações feitas pelo jornal. Por outro lado, o Dr. Dionísio Elias intenta uma
acção contra o jornalista, pedindo que este seja condenado à entrega dos ficheiros onde
tem armazenada a fotografia, bem como ao pagamento de uma avultada indemnização.
Quid iuris?
Resposta:
Durante a campanha eleitoral, o político Dr. Dionísio Elias, candidato do seu partido à
pasta do Ministério da Família, difundiu cartazes e publicou anúncios em que se
apresentou rodeado pelos seus familiares mais próximos, dando a imagem de uma
família feliz. Num certo dia, um jornalista, enquanto passava junto à casa de Dionísio, é
surpreendido por gritos de medo provenientes dessa habitação. Escondido atrás de uma
vedação e munido de uma objectiva potente, espera pelo momento oportuno e capta
uma fotografia em que se vê distintamente a mulher de Dionísio fugir de um golpe que
este lhe desferia, enquanto os filhos do casal testemunhavam o acontecimento. Na
manhã seguinte, o jornal com mais tiragem reproduz a dita fotografia na primeira
página, com as paragonas V ́ iolência doméstica em casa de famoso político. Nesse
mesmo dia, assessores de imprensa do partido fazem um comunicado repudiando todas
as insinuações feitas pelo jornal. Por outro lado, o Dr. Dionísio Elias intenta uma ação
contra o jornalista, pedindo que este seja condenado à entrega dos ficheiros onde tem
armazenada a fotografia, bem como ao pagamento de uma avultada indemnização. Quid
iuris?
Dionisio elias, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de ser
titular de direitos e de estar adstrito de direitos e obrigações), desde o momento do seu
nascimento completo e com vida art 66-1cc
Portanto dionisio elias é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua
qualidade enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem
para o titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma situação
jurídica) ou, mais ainda, verdadeiros direitos subjetivos (segundo menezes cordeiro –
permissão normativa de aproveitamento um bem em específico).

Dionísio Elias é político, portanto figura pública notória, e neste âmbito e num contexto
próprio como identifica o art 79.2cc (de lugares públicos, ou na de factos de interesse
publico ou que hajam decorrido publicamente), o próprio poderia ter o seu retrato
reproduzido, exposto ou lançado no comércio. No entanto este caso remete-nos para o
contexto privado, íntimo e familiar de dionisio elias, que ainda como agressor e
perpetuador de violência doméstica, usufrui do direito à imagem evocado no artigo
79.2cc, dado que só no seio público poderá ter o seu retratado exposto, reproduzido ou
lançado no comercio sem o seu consentimento. Nunca neste contexto seria lícita a ação
do fotografo ao fotografar, de forma furtiva o sucedido, nem posteriormente ao lançar
no comércio. Neste caso, incorrendo numa violação de um direito de personalidade, o
art 483.1cc vem a fundamentar a ação de dionioso elias aquando da exigência de uma
avultada indemnização, dado que “aquele que com dolo ou mera culpa, violar
ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger
interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da
violação” ação equivalente à do jornalista. Dado que com o lançamento do retrato no
comércio, a integridade moral de dionisio elias é ofendida por resultar no prejuízo da
honra, reputação ou simples decoro da pessoa tratada, como vem a fundamentar o art
79.3cc, a exigência de dionisio elias a condenação do jornalista a entregar os ficheiros
que contêm a tais retratos difamatórios.

V
Isaura, por ser contra certas coisas que se passavam na sua Faculdade, escreveu
uma carta aberta à direcção da associação de estudantes na qual dava conta dos vários
casos de má gestão da sua Faculdade, tendo afixado a dita carta num dos corredores do
edifício. Jaime, presidente da associação de estudantes, concordando com Isaura e sem
se sentir capaz de mudar o que fosse na sua Faculdade, pegou na dita carta e afixou
cópias em todas as Faculdades do campus. Isaura, incomodada por ver a sua carta tão
espalhada, exigiu a Diogo Tapada dos Santos Jaime que recolhesse todas as cópias, mas
este respondeu-lhe negativamente alegando que a carta era aberta e que a associação
podia fazer com ela o que quisesse. Quid iuris?

Resolução:
Isaura, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de ser
titular de direitos e de estar adstrito de direitos e obrigações), desde o momento do seu
nascimento completo e com vida art 66-1cc.
Portanto é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua qualidade
enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem para o
titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma situação
jurídica).
Isaura, por ser dotada de direitos de personalidade, é também, em específico,
dotada do Direito à liberdade de expressão, referido no Art 37º n1 da constituição da
república portuguesa 1. (“Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu
pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito
de se informar, sem impedimentos nem discriminações.”). Ao ser dotada desta
liberdade, Isaura estava no seu direito ao enviar a carta para a associação de estudantes,
tornando pública a sua revolta, com vista a defender não só os seus interesses, como os
de uma grande parte da comunidade onde se inseria (sendo essa a característica que a
torna uma carta aberta). Ao ser quem escreveu a carta, Isaura tem o direito de a afixar
onde entende e de a enviar para quem também entender, neste caso, para a associação
de estudantes.
A associação de estudantes, no entanto, ao ser o destinatário da carta, e sendo
esta uma carta aberta não confidencial, teria o direito de usar dela e partilhar essa
mesma informação, desde que esse uso não contrariasse a expectativa do autor, segundo
o Art. 78º CC.
Ora, ao ser uma carta aberta, a Isaura está a defender os seus interesses e
também os de todos os alunos da universidade em si, logo o propósito da carta seria
exatamente esse: causar um impacto e fazer com que houvesse alguma reação por parte
da universidade, mudando a sua gestão.
Jaime, ao concordar e querer também defender os seus interesses, divulgou a
carta, fazendo com que esta se tornasse efetivamente pública e visível por todos.
Neste caso, Jaime tem razão, dado que, ao afixar a carta no corredor, Isaura tinha
como objetivo fazer cumpridos os seus objetivos de melhorar a gestão, e foi exatamente
com esse interesse que o Jaime divulgou a carta, nunca fugindo às expectativas da
autora e não violando o art. 78ºCC.

VI
Aprecie fundadamente a licitude dos seguintes comportamentos:
a) Venda de um rim, venda de sangue e venda do coração;
b) Participação num reality show;
c) Exercício da actividade de lutador de wrestling;
d) Propriedade de uma conta de instagram aberta ao público.
Resolução:
Qualquer um dos atos enunciados são ilícitos. A venda de um rim (pressupondo a
existência de mais que um no dador) e de sangue são ambos atentados à integridade
física (art. 70º/1 CC) na medida em que atenta contra a salvaguarda do ser biológico e
das suas funções, nos casos em que não esteja em causa a sua sobrevivência e tendo em
conta a natureza não-patrimonial deste direito de personalidade. O direito à integridade
física apresenta uma natureza não patrimonial (ou não patrimonial em sentido fraco pois
não pode ser trocado por dinheiro, embora, dentro de certas, regras possam ser objeto de
negócios patrimoniais, estando estas exceções previstas na lei, e como tal, o mercado de
órgãos não estando previsto na lei não se insere dentro das exceções à natureza não
patrimonial do direito à integridade física. Quanto ao coração, a venda deste implica
uma violação do direito à vida (art. 70º/1 CC e 24º CRP) pois este é um órgão vital e o
mesmo direito assegura a preservação do organismo biológico. Sendo o direito à vida o
exemplo maior do caso dos direitos de personalidade não patrimoniais é impossível
conceber um cenário em que a venda de um órgão vital, ou seja, o sacrifício da vida do
dador em troca de determinada quantia de dinheiro, seja um ato lícito. O facto de para
determinado direito ser limitado voluntariamente pressupor a revogação dessa limitação
em qualquer altura (art. 81º/2 CC) é demonstrativa da impossibilidade de limitar
voluntariamente o direito à vida pelo próprio tendo em conta que uma vez morto não é
possível ressuscitar. Não se enquadra aqui a possibilidade da limitação voluntária dos
direitos de personalidade (art. 81º CC), pois, como consagra o art. 81º/1 “Toda a
limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade é nula, se for contrária
aos princípios da ordem pública.” Considerando o mercado de órgãos contrário a
princípios de ordem pública não é exequível avaliar como lícito qualquer um dos atos
referidos.
VII
Fernanda, modelo de roupa interior, celebrou com uma agência de modelos um
contrato para ser representada por essa agência durante cinco anos. Nos primeiros dois
anos, Fernanda participou em várias campanhas, e as fotografias da sua cara e corpo
estiveram nas montras de várias lojas de roupa íntima. Infelizmente, durante o terceiro
ano desse contrato, Fernanda veio a morrer vítima de um acidente. Aproveitando-se do
burburinho na comunicação social causado pelas notícias da inesperada morte da
modelo, a agência de modelos decidiu vender a uma revista de conteúdo para adultos
algumas fotografias de Fernanda em que esta aparecia em pose mais ousada. Gustavo,
viúvo de Fernanda, ainda não recuperado do choque de ter perdido a sua mulher, vai ao
centro comercial Amoras e aí depara-se com a cara da mulher olhando para si do lado
de lá das montras de várias lojas. Para seu ainda maior desgosto, num quiosque de
revistas vê uma publicação cuja capa anuncia que no próximo número serão publicadas
em exclusivas fotografias “picantes” da defunta.
Gustavo pretende saber:
i. Se pode impedir, e através de que meios, que as fotografias de Fernanda
voltem a ser usadas em montras de lojas, e sejam retiradas nos casos em
que estiverem a ser usadas;
ii. Se pode exigir que a agência de modelos retire do seu portefólio todas as
fotografias de Fernanda, tendo em conta que a agência o informou de que
o contrato é de cinco anos e por isso continuará a usar as fotografias até
ao termo do mesmo;
iii. Se pode intimar de qualquer forma a revista para que as fotografias de
Fernanda não venham a ser publicadas.
Resolução:
Fernanda, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de ser
titular de direitos e de estar adstrito de direitos e obrigações), desde o momento do seu
nascimento completo e com vida art 66-1cc.
Portanto é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua qualidade
enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem para o
titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma situação
jurídica).
Com a sua morte, a sua personalidade cessou, segundo o Art.68º1.CC. Por essa razão,
quem passa a tutelar os seus direitos de personalidade é o cônjuge sobrevivo ou
qualquer descendente, ascendente, irmão, sobrinho ou herdeiro do falecido, segundo o
Art.71º2. do CC. É, então, Gustavo quem passa a agir segundo os interesses presumíveis
da sua falecida mulher, protegendo-a contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa
à sua personalidade física ou moral.
Com o cessar da personalidade jurídica de Fernanda, também o seu contrato com a
agencia, por muito que fosse durante 5 anos, fica sem efeito, e por essa razão a empresa
não tem legitimidade para por assim em causa o bom nome de Fernanda, que aparecia
em poses mais ousadas. Por outro lado, essas poses mais ousadas, sendo ela uma
modelo de roupa interior, não resultam num prejuízo da sua honra, mas de qualquer das
formas não há consentimento para tal publicação, a não ser caso Gustavo o desse.
Em suma, Gustavo pode impedir que estas fotografias voltem a ser publicadas, alegando
que estão a ser colocados em causa direitos de personalidade da sua falecida esposa, e
pode, segundo o Art.71º3. requerer providencias previstas no art.70º2., com o fim de
atenuar os efeitos da ofensa já cometida por parte da empresa.
Não pode fazer com que a agencia apague todas as fotografias que estão no portefólio,
pois Fernanda, ainda viva, autorizou que estas fossem tiradas. O erro aqui é a sua
publicação sem consentimento, e não o facto de as fotos existirem em si e estarem nas
mãos da agencia.
Pode intimar a revista de forma que as fotografias de Fernanda não sejam publicadas,
dado que é necessária uma abdicação do direito à imagem, que pode ser feita por
Gustavo segundo os termos do art.71º2., dado que é ele que tutela os direitos de
personalidade de Fernanda aquando do seu falecimento.

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